ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

7 de Outubro de 2004 ( *1 )

No processo C-136/02 P,

que tem por objecto um recurso nos termos do artigo 49.° do Estatuto do Tribunal de Justiça,

entrado em 8 de Abril de 2002,

Mag Instrument Inc., com sede em Ontario, California (Estados Unidos da America), representada inicialmente por A. Nette, G. Rähn, W. von der Osten-Sacken e H. Stratmann e, em seguida, por W. von der Osten-Sacken, U. Hocke e A. Spranger, Rechtsanwälte,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), representado por D. Schennen, na qualidade de agente,

recorrido em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: C. W. A. Timmermans, presidente de secção, C. Gulmann, J.-P. Puissochet, J. N. Cunha Rodrigues e F. Macken (relatora), juízes,

advogado-geral: D. Ruiz-Jarabo Colomer,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 5 de Fevereiro de 2004,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 16 de Março de 2004,

profere o presente

Acórdão

1

Através do seu recurso, a Mag Instrument Inc. pede a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Fevereiro de 2002, Mag Instrument/IHMI (forma de lanternas de bolso) (T-88/00, Colect., p. II-467, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este negou provimento ao seu recurso destinado a obter a anulação da decisão da Segunda Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «IHMI») de 14 de Fevereiro de 2000 (processos R-237/1999-2 a R-41/1999-2), que recusa o registo de cinco marcas tridimensionais constituídas por formas de lanternas de bolso (a seguir «decisão controvertida»).

Enquadramento jurídico

2

O Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), no seu artigo 7.°, cuja epígrafe é «Motivos absolutos de recusa», dispõe o seguinte:

«1.

Será recusado o registo:

[...]

b)

De marcas desprovidas de caracter distintivo,

[...]

3.

As alíneas b), c) e d) do n.° 1 não são aplicáveis se, na sequência da utilização da marca, esta tiver adquirido um carácter distintivo para os produtos ou serviços para os quais foi pedido o registo.»

Antecedentes do litígio

3

Em 29 de Março de 1996, a recorrente apresentou, ao abrigo do Regulamento n.° 40/94, cinco pedidos de marcas tridimensionais comunitárias ao IHMI.

4

As marcas tridimensionais cujo registo foi pedido correspondem às formas de cinco lanternas de bolso comercializadas pela recorrente e aqui reproduzidas.

Image

5

Os produtos para os quais foi pedido o registo da marca são abrangidos pelas classes 9 e 11 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e alterado, e correspondem à seguinte descrição: «Acessórios para aparelhos de iluminação, em particular para lanternas (archotes)» e «Acessórios para iluminação, em particular lanternas (archotes), incluindo partes e acessórios para os artigos atrás referidos».

6

Por três decisões de 11 de Março de 1999 e duas decisões de 15 de Março de 1999, o examinador do IHMI indeferiu esses pedidos com o fundamento de que as marcas em questão eram desprovidas de carácter distintivo.

7

Através da decisão controvertida, a Segunda Câmara de Recurso do IHMI confirmou as decisões do examinador.

8

Nessa decisão, após ter recordado o conteúdo do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, a referida Câmara considerou que, na falta de uso, e para que a forma de um produto possa constituir o único sinal distintivo da origem do produto, essa forma deve apresentar características suficientemente diferentes da forma habitual do produto para que um potencial comprador a veja, desde logo, como uma indicação da origem do produto e não como uma representação do próprio produto. A Câmara de Recurso afirmou ainda que no caso de a forma não ser suficientemente diferente da forma habitual do produto e, portanto, de o potencial comprador a ver apenas como a representação do produto, essa forma é descritiva, sendo abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, do mesmo modo que uma palavra constituída unicamente pelo nome do produto. Segundo a Câmara de Recurso, a questão essencial está em saber se a representação de uma das marcas controvertidas indica imediatamente ao comprador médio de lanternas de bolso que se trata de uma lanterna de bolso com uma determinada origem ou simplesmente de uma lanterna de bolso. A Câmara de Recurso acrescenta, por um lado, que o facto de o design dos produtos da recorrente ser atractivo não implica necessariamente que seja intrinsecamente distintivo. Afirma, por outro lado, que o facto de um sinal dever ser recusado nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 por ser desprovido de qualquer caracter distintivo não significa que uma marca com uma aparência mínima de tal caracter deva ser registada. Considera que decorre da própria essência do Regulamento n.° 40/94 que o grau de caracter distintivo exigido deve ser tal que a marca possa funcionar como uma indicação de origem. A Câmara de Recurso conclui que, apesar dos numerosos atractivos de cada forma, nenhuma é intrinsecamente distintiva para o comprador médio de uma lanterna de bolso.

Tramitação processual no Tribunal de Primeira Instância e acórdão recorrido

9

A recorrente interpôs um recurso no Tribunal de Primeira Instância a fim de obter a anulação da decisão controvertida com o fundamento de que as marcas em causa não são desprovidas de caracter distintivo.

10

Entre outros argumentos, apresentou uma série de elementos, descritos nos n.os 18, 19, 21 e 22 do acórdão recorrido, destinados a demonstrar que as marcas em causa não são desprovidas de caracter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Em primeiro lugar, apresentou um parecer do professor Stefan Lengyel «sobre a originalidade, a criatividade e o caracter distintivo da forma das lanternas [de bolso] em causa», que conclui pelo caracter distintivo de cada uma das referidas formas. Em seguida, alegou que o caracter distintivo das formas para as quais foi pedido o registo é reconhecido internacionalmente, conforme demonstram as várias referências às referidas lanternas em várias obras, o facto de fazerem parte de colecções de vários museus e a obtenção de prémios internacionais. Por último, sustentou que a aptidão das marcas em questão para indicar a origem do produto era demonstrada pelo facto de lhe terem sido enviadas por consumidores contrafacções dos modelos originais da recorrente para reparação, embora as mesmas não exibissem o nome «Mag Lite», e os autores destas contrafacções terem, frequentemente, feito publicidade dos seus produtos recorrendo ao design original das lanternas de bolso Mag Lite.

11

O IHMI defendeu, no essencial, que as formas em causa deviam ser consideradas usuais e não podiam, pois, exercer a função de indicação da origem atribuída à marca.

12

O Tribunal de Primeira Instância decidiu que a Segunda Câmara de Recurso do IHMI concluíra legitimamente que as marcas tridimensionais em causa eram desprovidas de caracter distintivo, e isto pelos seguintes motivos:

«28

Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo ‘de marcas desprovidas de caracter distintivo’.

29

Uma marca possui caracter distintivo quando permite distinguir, segundo a sua origem, os produtos ou serviços para os quais foi pedido o seu registo.

30

O carácter distintivo de uma marca deve ser apreciado, por um lado, relativamente a esses produtos ou serviços e, por outro lado, relativamente à percepção do público-alvo, que é constituído pelo consumidor destes produtos ou serviços.

[...]

32

Importa reconhecer, além disso, que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, que prevê a recusa do registo de marcas desprovidas de caracter distintivo, não faz qualquer distinção entre as várias categorias de marcas. Por conseguinte, na apreciação do caracter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela forma dos próprios produtos, como aquelas cujo registo foi pedido no presente processo, não cabe aplicar critérios ou colocar exigências mais rigorosos do que os aplicáveis a outras categorias de marcas.

33

Todavia, a apreciação do caracter distintivo de uma marca implica que se tenham em consideração todos os elementos relevantes associados às circunstâncias específicas do caso em presença. Entre esses elementos, não se pode excluir que a natureza da marca cujo registo é pedido possa influenciar a percepção que o público-alvo terá da marca.

34

Por outro lado, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, é suficiente provar que a marca tem um mínimo de caracter distintivo para que não se aplique este motivo absoluto de recusa. Importa, assim, apurar — no quadro de um exame apriori e independentemente de qualquer utilização efectiva do sinal na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 — se a marca requerida permitirá ao público-alvo, quando chamado a fazer uma escolha no momento da aquisição de produtos ou serviços, distinguir os produtos ou serviços em causa dos que provêm de outras empresas.

35

O carácter distintivo das marcas deve ser apreciado à luz da presumível expectativa dum consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido [acórdãos do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect, p. I-3819, n.° 26, e do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV7IHMI (EuroHealth), T-359/99, Colect, p. II-1645, n.° 27]. Os produtos de cuja forma foi pedido o registo como marca no presente caso, ou seja, cinco formas de lanternas [de bolso], são bens de consumo geral, devendo considerar-se que o público-alvo é constituído por todos os consumidores.

36

Para apreciar se as cinco formas de lanternas [de bolso] cujo registo como marca foi pedido podem agir sobre a memória do consumidor médio como indicação da origem, ou seja, de forma a individualizar os produtos e a associá-los a uma determinada origem comercial, importa acentuar, em primeiro lugar, que aquelas se caracterizam por serem cilíndricas. Esta forma cilíndrica constitui uma das formas habituais das lanternas [de bolso]. Em quatro dos pedidos apresentados, o corpo cilíndrico das lanternas [de bolso] alarga-se na extremidade em que se encontra a lâmpada, ao passo que no quinto pedido a lanterna não apresenta esse alargamento, sendo absolutamente cilíndrica. Em todos os pedidos, as marcas correspondem a formas vulgarmente utilizadas por outros fabricantes de lanternas [de bolso] existentes no mercado. Assim, as marcas requeridas fornecem ao consumidor uma indicação sobre um produto, não permitindo individualizá-lo e associá-lo a uma origem comercial determinada.

37

Em seguida, quanto às características às quais a recorrente se refere para considerar as formas requeridas como marcas intrinsecamente aptas para distinguir os seus produtos dos produtos dos concorrentes, nomeadamente, as suas qualidades estéticas e o seu design de rara originalidade, cabe acentuar que tais formas, pelas características que possuem, mais parecem variantes de uma das formas habituais das lanternas [de bolso] do que formas susceptíveis de individualizar os produtos em causa e de assinalar, por si próprias, uma origem comercial determinada. O consumidor médio está habituado a ver formas análogas às que estão em causa, apresentando uma grande variedade de design. As formas cujo registo foi pedido não se diferenciam das formas do mesmo tipo de produtos que se encontram frequentemente no comércio. Por isso, não é correcto sustentar, como faz a recorrente, que as particularidades das formas das lanternas [de bolso] em causa, tais como, nomeadamente, a sua estética, atraem a atenção do consumidor quanto à origem comercial dos produtos.

[...]

39

A possibilidade de o consumidor médio ter adquirido o hábito de reconhecer os produtos da recorrente com base exclusivamente na sua forma não pode afastar, no caso vertente, a aplicação do motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Semelhante percepção das marcas requeridas apenas poderia ser tomada em consideração no quadro da aplicação do artigo 7.°, n.° 3, do mesmo regulamento, o qual não foi invocado pela recorrente em nenhum momento do processo. Todos os elementos apresentados pela recorrente, evocados supra, nos n.os 17 a 19,21 e 22, que se destinam a demonstrar o caracter distintivo das marcas requeridas, estão associados à possibilidade de tal caracter ser adquirido pelas lanternas [de bolso] em causa após a utilização que delas se tenha feito, não podendo, assim, ser considerados pertinentes no quadro da apreciação do seu caracter distintivo intrínseco, em conformidade com o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

40

À luz das considerações precedentes, as marcas tridimensionais requeridas no caso vertente não podem, assim, tal como são interpretadas por um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e advertido, individualizar os produtos em causa e distingui-los dos que têm outra origem comercial.

[...]»

13

Consequentemente, o Tribunal de Primeira Instância negou provimento ao recurso da recorrente e condenou-a nas despesas.

O recurso

14

No seu recurso, em apoio do qual apresenta sete fundamentos, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido, declarando que não existe qualquer motivo absoluto de recusa, na acepção do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94, que se oponha ao registo das marcas em causa;

anular a decisão controvertida;

condenar o IHMI nas despesas.

15

O IHMI pede ao Tribunal de Justiça que negue provimento ao recurso e que condene a recorrente nas despesas.

Quanto ao primeiro fundamento

Argumentos das partes

16

Através do seu primeiro fundamento, a recorrente alega que, no âmbito da sua apreciação do caracter distintivo das marcas em causa, o Tribunal de Primeira Instância não analisou, como deveria, a impressão de conjunto suscitada por cada uma delas, tendo, ao invés, adoptado, no n.° 36 do acórdão recorrido, um método de apreciação erróneo que consiste em decompor as referidas marcas, ao declarar que «aquelas se caracterizam por serem cilíndricas» e que, em quatro das mesmas, «o corpo cilíndrico das lanternas [de bolso] alarga-se na extremidade em que se encontra a lâmpada». Deste modo, o Tribunal de Primeira Instância violou, segundo a recorrente, o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

17

A recorrente, que apresenta uma descrição extremamente detalhada das características das lanternas de bolso em questão, alega que, se o Tribunal de Primeira Instância tivesse procurado os critérios ópticos e estéticos que caracterizam cada uma delas na sua globalidade, teria necessariamente chegado à conclusão de que as marcas em causa são desprovidas de caracter distintivo.

18

O IHMI alega ser, pelo contrário, a recorrente quem, pelas suas descrições detalhadas das referidas lanternas de bolso, adopta um método erróneo que consiste em decompor a forma.

Apreciação do Tribunal de Justiça

19

O carácter distintivo de uma marca, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, deve ser apreciado relativamente, por um lado, aos produtos ou serviços para os quais foi pedido o registo da marca e, por outro, à percepção do público interessado. Trata-se da presumível percepção de um consumidor médio dos referidos produtos ou serviços, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado [v., neste sentido, a respeito do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), disposição esta que é idêntica ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, acórdão de 12 de Fevereiro de 2004, Henkel, C-218/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 50, e jurisprudência referida; v., igualmente, acórdão de 29 de Abril de 2004, Henkel/IHMI, C-456/01 P e C-457/01 P, Colect, p. I-5089, n.° 35, e jurisprudência referida],

20

Conforme o Tribunal de Justiça declarou de forma reiterada, o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo e não procede a uma análise das suas diferentes particularidades. De igual modo, para apreciar se urna marca é ou não desprovida de caracter distintivo, há que ter em consideração a impressão de conjunto que produz (v., no que se refere a uma marca nominativa, acórdão de 19 de Setembro de 2002, DKV/IHMI, C-104/00 P, Colect., p. I-7561, n.° 24, e, em relação a uma marca tridimensional constituída pela forma do próprio produto, acórdão de 29 de Abril de 2004, Procter & Gamble/IHMI, C-468/01 P a C-472/01 P, Colect, p. I-5141, n.° 44).

21

As observações feitas pelo Tribunal de Primeira Instância nos n.os 36 e 37 do acórdão recorrido não têm como objectivo decompor cada uma das marcas em causa, mas, ao invés, examinar a impressão geral que a respectiva marca produz. A crítica formulada pela recorrente, segundo a qual o Tribunal de Primeira Instância não apreciou o carácter distintivo de cada marca no seu todo, não tem, pois, fundamento.

22

Nestas condições, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao sexto fundamento

Argumentos das partes

23

Através do seu sexto fundamento, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, ao aplicar critérios não previstos por este regulamento e demasiado estritos no que se refere ao caracter distintivo das marcas em questão.

24

Segundo a recorrente, à semelhança das marcas nominativas (acórdão de 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI, dito «Baby-dry», C-383/99 P, Colect, p. I-6251, n.° 40), todo o afastamento perceptível relativamente aos produtos correntes é suficiente para que a marca tridimensional, constituída pela forma do produto para o qual o registo é pedido, não seja desprovida de caracter distintivo.

25

Nestas condições, uma vez que afirmou, no n.° 37 do acórdão recorrido, que as formas em causa parecem «variantes de uma das formas habituais das lanternas [de bolso]», o Tribunal de Primeira Instância deveria ter concluído que as marcas em causa não eram desprovidas de caracter distintivo, visto que as variantes constituem necessariamente modificações.

26

O IHMI reconhece que, na apreciação do caracter distintivo de marcas tridimensionais, não devem ser aplicados critérios mais rigorosos do que os aplicáveis a outras categorias de marcas. Todavia, no n.° 33 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância observou, com razão, que a natureza da marca cujo registo é pedido pode influenciar a percepção que o público-alvo terá da marca.

27

No entender do IHMI, os consumidores não estabelecem geralmente uma ligação precisa entre a forma tridimensional de um produto e uma origem determinada do mesmo, limitando-se a apreender esta forma como vantajosa do ponto de vista técnico ou sob determinados aspectos estéticos, ou não lhe atribuindo sequer qualquer significado particular. Para que os consumidores apreendam a própria forma do produto como um meio de identificação da origem deste, não basta que esta se distinga de um modo ou de outro de todas as outras formas de produtos disponíveis no mercado, mas essa forma deve ter uma «particularidade» qualquer que desperte a atenção. Por esta razão, a forma de um produto é, em qualquer caso, desprovida de caracter distintivo quando seja banal para os produtos do sector em questão e do mesmo gênero do que as formas habituais destes.

28

O IHMI considera que, no caso em apreço, o Tribunal de Primeira Instância aplicou correctamente os critérios supramencionados às marcas cujo registo era pedido pela recorrente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

29

O carácter distintivo de uma marca, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, significa que essa marca permite identificar os produtos ou serviços para os quais é pedido o registo como provenientes de uma empresa determinada e, portanto, distinguir esses produtos ou serviços dos das outras empresas (v. acórdão Henkel/IHMI, já referido, n.° 34, e jurisprudência referida).

30

Os critérios de apreciação do caracter distintivo das marcas tridimensionais constituídas pela forma do próprio produto não são diferentes dos aplicáveis às outras categorias de marcas. No entanto, no âmbito da aplicação destes critérios, a percepção do público interessado não é necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional, constituída pela forma do próprio produto, e no caso de uma marca nominativa ou figurativa, que consiste num sinal independente do aspecto dos produtos que designa. Com efeito, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando-se na sua forma ou no seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, e, por isso, pode tornar-se mais difícil provar o carácter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa (v. acórdão Henkel/IHMI, já referido, n.° 38, e jurisprudência referida).

31

Nestas condições, quanto mais a forma cujo registo como marca é pedido se aproxima da forma mais provável que terá o produto em causa, mais provável é que a referida forma seja desprovida de caracter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Só não é desprovida de caracter distintivo na acepção da referida disposição uma marca que, de forma significativa, diverge da norma ou dos hábitos do sector e, por essa razão, é susceptível de cumprir a sua função essencial de origem (v., neste sentido, acórdão Henkel/IHMI, já referido, n.° 39, e jurisprudência referida).

32

Por conseguinte, ao contrário do que é defendido pela recorrente, quando uma marca tridimensional é constituída pela forma do produto para o qual é pedido o registo, o simples facto de esta forma constituir uma «variante» de uma das formas habituais deste tipo de produtos não é suficiente para demonstrar que a dita marca possui carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Deve verificar-se sempre se essa marca permite ao consumidor médio desse produto, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado, distinguir, sem proceder a uma análise e sem demonstrar particular atenção, o produto em questão dos de outras empresas.

33

A recorrente não demonstra, portanto, que o Tribunal de Primeira Instância aplicou critérios não previstos pelo regulamento e demasiados estritos, ao considerar que as marcas tridimensionais em causa são desprovidas de caracter distintivo.

34

Consequentemente, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao sétimo fundamento

Argumentos das partes

35

Através do seu sétimo fundamento, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, na medida em que se baseou, no n.° 37 do acórdão recorrido, na afirmação de que «[o] consumidor médio está habituado a ver formas análogas às que estão em causa, apresentando uma grande variedade de design», para concluir que as marcas em causa não têm caracter distintivo.

36

Segundo a recorrente, mesmo que se admita que essa afirmação é exacta, duas conclusões contrárias daí podem ser inferidas quanto à percepção que o consumidor tem das marcas. Ou o consumidor é indiferente à forma enquanto indicação da proveniência porque está, de modo geral, «habituado a ver estas formas». Mas, segundo a recorrente, esta conclusão deve ser excluída, pois, ao introduzir no Regulamento n.° 40/94 a categoria de marcas constituídas pela forma do produto, o legislador comunitário considerou que a forma do produto constitui uma indicação da sua proveniência. Ou a grande variedade de design conduz precisamente o consumidor a dar atenção à forma dos produtos e, portanto, às variantes que existem na concepção de produtos de proveniencias diferentes. Segundo a recorrente, impõe-se esta última conclusão, uma vez que é pacífico que o consumidor não é indiferente às formas. O raciocínio seguido pelo Tribunal de Primeira Instância no n.° 37 do acórdão recorrido comporta, pois, uma contradição interna.

Apreciação do Tribunal de Justiça

37

Por um lado, não resulta, de modo algum, do n.° 37 do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância tenha considerado que o consumidor é, em princípio, indiferente à forma enquanto indicação da proveniencia.

38

Por outro lado, quanto à afirmação da recorrente de que a grande variedade de design conduz precisamente o consumidor a dar atenção à forma dos produtos e, portanto, às variantes existentes na concepção de produtos de proveniências diferentes, essa afirmação destina-se, na realidade, a conduzir o Tribunal de Justiça a substituir pela sua própria apreciação dos factos a que foi efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância no n.° 37 do acórdão recorrido.

39

Ora, tal como decorre dos artigos 255.° CE e 58.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, o recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância é limitado às questões de direito. O Tribunal de Primeira Instância é, portanto, o único competente para apurar e apreciar os factos pertinentes bem como para apreciar os elementos de prova. A apreciação destes factos e elementos de prova não constitui, portanto, excepto em caso de desvirtuação dos mesmos, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância (v., neste sentido, acórdãos DKV/IHMI, já referido, n.° 22, e de 2 de Outubro de 2003, Thyssen Stahl//Comissão, C-194/99 P, Colect, p. I-10821, n.° 20).

40

Uma vez que a desvirtuação, por parte do Tribunal de Primeira Instância, dos factos ou dos elementos de prova que lhe foram submetidos não foi alegada no âmbito do presente fundamento, este deve ser rejeitado por inadmissível.

Quanto ao quarto fundamento

Argumentos das partes

41

Através do seu quarto fundamento, a recorrente sustenta que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, ao não tomar em consideração, no âmbito da sua apreciação do carácter distintivo das marcas em causa, a percepção efectiva destas pelos consumidores.

42

Segundo a recorrente, como o próprio Tribunal de Primeira Instância indicou no n.° 33 do acórdão recorrido, a apreciação do carácter distintivo de uma marca implica que se tenham em consideração todos os elementos relevantes associados às circunstâncias específicas do caso concreto. Por conseguinte, em contradição flagrante com esta afirmação, nos n.os 34 e 39 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância limitou-se, ilicitamente, a proceder a um exame a priori e independentemente de qualquer utilização da marca, ao não ter em conta os elementos de prova relativos à percepção pelo público das marcas em causa após a sua utilização.

43

Razões puramente jurídicas justificam, segundo a recorrente, que se tenha em consideração a percepção efectiva que o público tem de uma marca para apreciar o seu carácter distintivo ab initio. Em primeiro lugar, nos termos do sétimo considerando do Regulamento n.° 40/94, o objectivo da protecção conferida pela marca comunitária consiste em garantir a função de origem da marca; ora, o único meio de determinar com segurança se a função de origem da marca é garantida é tomar por base a percepção efectiva da marca pelo público interessado. Seguidamente, decorre da própria redacção do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 — nomeadamente da utilização dos termos «no comércio» no n.° 1, alínea e), e «o público» no n.° 1, alínea g) — que todos os motivos absolutos de recusa previstos no n.° 1 deste artigo devem ser apreciados em função da opinião do público interessado. Finalmente, esta interpretação foi várias vezes confirmada pelo Tribunal de Justiça (acórdão Baby-dry, já referido, n.° 42) e pelo Tribunal de Primeira Instância [acórdãos de 31 de Janeiro de 2001, Taurus-Film/IHMI (Cine Action), T-135/99, Colect., p. II-379, n.° 27, e Mitsubishi HiTec Paper Bielefeld//IHMI (Giroform), T-331/99, Colect., p. II-433, n.° 24], e foi igualmente a adoptada pelos órgãos jurisdicionais alemães.

44

O IHMI considera que o Tribunal de Primeira Instância apreciou correctamente o carácter distintivo das marcas em causa, cujo registo foi pedido em conformidade com o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, no âmbito de um exame a priori e independentemente de qualquer utilização efectiva do sinal. Com efeito, a regra do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, que diz respeito ao carácter distintivo adquirido pela utilização, seria privada de utilidade se, logo na apreciação do carácter distintivo ab initio de uma marca, fosse necessário ter em conta elementos ligados à sua utilização.

45

O IHMI considera que é pacífico que a recorrente não invocou a utilização feita da sua marca na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94. Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância procedeu correctamente ao examinar o carácter distintivo das marcas em causa do ponto de vista de um consumidor que conhece as formas das lanternas de bolso presentes no mercado e é confrontado pela primeira vez com as lanternas de bolso em causa.

Apreciação do Tribunal de Justiça

46

Conforme foi recordado no n.° 29 do presente acórdão, o carácter distintivo de urna marca na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 significa que essa marca permite identificar os produtos ou serviços para os quais é pedido o registo como provenientes de urna empresa determinada e, portanto, distinguir esses produtos ou serviços dos das outras empresas.

47

Se uma marca não têm, ab initio, caracter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, pode adquiri-lo, relativamente aos produtos ou serviços reivindicados, na sequência da sua utilização, em conformidade com o n.° 3 do mesmo artigo. Este carácter distintivo pode ser adquirido, designadamente, após um processo normal de familiarização do público em causa (v. acórdão de 6 de Maio de 2003, Libertei, C-104/01, Colect., p. I-3793, n.° 67).

48

A fim de apreciar se uma marca tem ou não carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, o IHMI ou, em sede de recurso, o Tribunal de Primeira Instância tomam em consideração todos os factos e circunstâncias pertinentes [v., a respeito do artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104, acórdão de 12 de Fevereiro de 2004, Koninklijke KPN Nederland, C-363/99, Colect, p. I-1619, n.° 35).

49

A este respeito, mesmo que, conforme foi recordado no n.° 19 do presente acórdão, essa apreciação deva ser efectuada relativamente à percepção presumida de um consumidor médio dos produtos ou serviços para os quais é pedido o registo da marca, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado, não se pode excluir que elementos de prova relativos à percepção efectiva da marca pelos consumidores possam, em certos casos, esclarecer o IHMI ou, em sede de recurso, o Tribunal de Primeira Instância.

50

Todavia, para servirem como meios de prova do caracter distintivo de uma marca na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, estes elementos devem demonstrar que os consumidores não tiveram necessidade de se familiarizar com a marca pela via da utilização, mas que esta lhes permitiu imediatamente distinguir os produtos ou serviços que a ostentavam dos produtos ou serviços das empresas concorrentes. Com efeito, como o IHMI correctamente alega, o artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94 não teria qualquer utilidade se uma marca devesse ser registada em conformidade com o n.° 1, alínea b), do mesmo artigo pelo facto de ter adquirido carácter distintivo na sequência da utilização que dela foi feita.

51

Os elementos de prova relativos à percepção efectiva das marcas em causa pelos consumidores, apresentados pela recorrente, são resumidos nos n.os 21 e 22 do acórdão recorrido. Destinam-se a provar que alguns consumidores consideraram que as cópias das lanternas de bolso comercializadas pela recorrente provinham desta e que alguns concorrentes elogiaram os seus produtos afirmando que estes apresentavam o mesmo design das lanternas da recorrente.

52

Contrariamente ao que é sustentado pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não se recusou, de modo nenhum, a examinar estes elementos de prova.

53

Por um lado, ao referir, no n.° 34 do acórdão recorrido, que importava apurar se as marcas em causa permitiriam ao público-alvo distinguir os produtos ou serviços em causa dos provenientes de outras empresas «no quadro de um exame a priori e independentemente de qualquer utilização efectiva do sinal na acepção do artigo 7°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94», o Tribunal de Primeira Instância limitou-se a indicar que não iria apurar se as marcas em causa tinham podido adquirir carácter distintivo na acepção desta disposição, extraindo assim essa consequência do facto de a recorrente não ter invocado esta circunstância em nenhum momento do processo.

54

Por outro lado, decorre do n.° 39 do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância examinou os elementos de prova resumidos nos n.os 21 e 22 do acórdão recorrido, mas afastou-os, na medida em que não permitiam demonstrar o caracter distintivo das marcas em causa na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

55

Quanto a esta questão, há que observar que estes elementos de prova dizem respeito à percepção efectiva das marcas litigiosas pelos consumidores num momento em que as lanternas de bolso em causa eram comercializadas há já vários anos e em que os consumidores estavam, portanto, familiarizados com a sua forma. De resto, a própria recorrente reconheceu na sua petição que os referidos elementos «também podem dizer respeito ao facto de o público interessado ter associado a forma das lanternas à recorrente [...], nomeadamente em razão da sua utilização no comércio».

56

Nestas condições, o Tribunal de Primeira Instância pôde, no n.° 39 do acórdão recorrido, considerar, sem os desvirtuar, que os elementos de prova resumidos nos n.os 21 e 22 do acórdão recorrido não demonstravam que as marcas em causa possuíam caracter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e que eram somente susceptíveis de demonstrar que essas marcas podiam adquirir um carácter distintivo na sequência da utilização que delas seria feita na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do mesmo regulamento.

57

Em consequência, o quarto fundamento do recurso deve ser julgado improcedente.

Quanto ao segundo fundamento

Argumentos das partes

58

No seu segundo fundamento, a recorrente alega que, no n.° 39 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância desvirtuou os elementos de prova indicados nos n.os 18, 19, 21 e 22 do acórdão recorrido, que aquela apresentara em apoio do seu recurso, ao julgar, contra toda a lógica, que tais elementos se referiam apenas ao caracter distintivo adquirido pela utilização na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, o que conduziu o Tribunal de Primeira Instância a ignorá-los.

59

Com efeito, segundo a recorrente, estes elementos de prova referem-se, exclusiva ou principalmente, ao caracter distintivo ab initio das marcas em causa, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

60

O IHMI alega que, nos n.os 18, 19, 21 e 22 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância sintetizou todos os elementos de prova invocados pela recorrente e, seguidamente, no n.° 39 do acórdão recorrido, apreciou o alcance material destes elementos relativamente ao mérito. Segundo o IHMI, o Tribunal de Primeira Instância concluiu legitimamente, e sem violar as regras gerais da lógica, que os factos invocados pela recorrente podiam ter tido relevância no âmbito de uma análise com base no artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, mas não com base no n.° 1, alínea b), do mesmo artigo.

Apreciação do Tribunal de Justiça

61

No que se refere, em primeiro lugar, aos elementos de prova resumidos nos n.os 21 e 22 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância pôde, pelos motivos referidos nos n.os 55 e 56 do presente acórdão, considerar, sem os desvirtuar, que esses elementos apenas podiam demonstrar que as marcas em causa tinham podido adquirir um caracter distintivo na sequência da utilização que delas tinha sido feita.

62

No que concerne, em segundo lugar, aos elementos de prova sintetizados nos n.os 18 e 19 do acórdão recorrido, esses elementos destinam-se a demonstrar que, tendo em conta as qualidades funcionais e estéticas das formas das lanternas de bolso em causa e o seu design excepcional, estas têm caracter distintivo.

63

Contrariamente ao que é alegado pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não se recusou, de nenhuma forma, a tomar estes elementos de prova em consideração.

64

Com efeito, decorre do n.° 37 do acórdão recorrido que o Tribunal de Primeira Instância analisou os argumentos da recorrente baseados nas qualidades estéticas e no design das lanternas de bolso em causa, mas que, no termo da sua análise, considerou que essas características não eram suficientes para conferir às marcas controvertidas um carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

65

Acresce que, no n.° 39 do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância se limitou a salientar que os elementos de prova destinados a demonstrar a excelência do design das referidas lanternas bem como as suas qualidades estéticas e funcionais não demonstravam que as marcas em causa tinham, ab initio, um carácter distintivo, mas que eram somente susceptíveis de demonstrar que aquelas podiam adquirir um carácter distintivo após o uso que delas seria feito.

66

Ao contrário do que é sustentado pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não desvirtuou, de forma alguma, estes elementos de prova.

67

Quanto ao parecer apresentado pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não estava vinculado a adoptar a opinião do seu autor e podia efectuar a sua própria apreciação do carácter distintivo das marcas em causa.

68

De igual modo, no que se refere ao reconhecimento que, segundo a recorrente, o design das lanternas de bolso em questão goza a nível internacional, deve referir-se que a circunstância de alguns produtos beneficiarem de um design de qualidade não implica necessariamente que uma marca constituída pela forma tridimensional desses produtos permita ab initio distinguir os referidos produtos dos de outras empresas, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

69

Nestas condições, o segundo fundamento deve ser considerado improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento

Argumentos das partes

70

Através do seu terceiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o seu direito a ser ouvida na acepção das disposições combinadas dos artigos 6.°, n.° 2, UE, 6.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e 41.°, n.° 2, primeiro travessão, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, proclamada em Nice em 7 de Dezembro de 2000 (JO C 364, p. 1).

71

De facto, por um lado, o Tribunal de Primeira Instância recusou incorrectamente os elementos de prova já referidos no âmbito do segundo fundamento. A recorrente critica o Tribunal de Primeira Instancia pelo facto de ter recusado a sua proposta de ouvir como perito o autor do parecer que ela apresentou, na qualidade de «testemunha pericial».

72

Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância não teve em conta elementos de prova apresentados pela recorrente que, no seu entender, demonstram que os outros fabricantes utilizam uma enorme variedade de formas de lanternas de bolso e que as marcas em causa são claramente distintas de todas essas formas. Segundo a recorrente, o Tribunal de Primeira Instância afirmou sem qualquer fundamento que as lanternas de bolso controvertidas têm formas habitualmente utilizadas por outros fabricantes.

73

O IHMI alega que, através do seu terceiro fundamento, a recorrente procura, na realidade, pôr em causa no Tribunal de Justiça a apreciação dos factos realizada pelo Tribunal de Primeira Instância.

74

Quanto ao facto de o Tribunal de Primeira Instância não ter querido ouvir o autor do parecer apresentado pela recorrente, esta decisão não constitui uma violação das regras processuais, visto que apenas àquele compete decidir da necessidade de um parecer ou da audição de uma testemunha.

Apreciação do Tribunal de Justiça

75

Antes de mais, na parte em que acusa o Tribunal de Primeira Instância de não ter tomado em consideração os elementos de prova resumidos nos n.os 18, 19, 21 e 22 do acórdão recorrido, o terceiro fundamento confunde-se com o segundo e deve, em consequência, ser rejeitado pelos mesmos motivos.

76

Seguidamente, quanto à crítica feita ao Tribunal de Primeira Instância pelo facto de não ter querido proceder à audição do autor do parecer apresentado pela recorrente, tal como propunha esta última, deve recordar-se que o Tribunal de Primeira Instância é o único juiz da eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe sobre os processos que lhe são submetidos. O caracter probatório ou não das peças processuais releva da sua apreciação soberana dos factos, que, conforme já foi lembrado no n.° 39 do presente acórdão, escapa à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito do recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância, salvo em caso de desvirtuação dos elementos de prova apresentados ao Tribunal de Primeira Instância ou quando a inexactidão material das conclusões do Tribunal de Primeira Instância sobre a matéria de facto resulta dos documentos juntos aos autos (acórdãos de 10 de Julho de 2001, Ismeri Europa//Tribunal de Contas, C-315/99 P, Colect, p. I-5281, n.° 19, e de 7 de Novembro de 2002, Glencore e Compagnie Continentale/Comissão, C-24/01 P e C-25/01 P, Colect, p. I-10119, n.os 77 e 78).

77

No caso em apreço, o Tribunal de Primeira Instância pôde, após ter analisado todos os factos e elementos de prova que lhe foram submetidos, legitimamente considerar que a audição, na qualidade de testemunha, do autor de um parecer já junto aos autos não era necessária para efeitos da sua apreciação do carácter distintivo das marcas em causa, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Em consequência, ao não ordenar a referida audição, o Tribunal de Primeira Instância não violou o direito da recorrente a ser ouvida.

78

Por último, na parte em que acusa o Tribunal de Primeira Instância de não ter tido em conta outros elementos de prova apresentados pela recorrente que, segundo esta, demonstram que os outros fabricantes utilizam uma enorme variedade de formas de lanternas de bolso e que as marcas em causa se distinguem claramente de todas essas formas, o terceiro fundamento acaba por pôr em causa a apreciação da matéria de facto. Por conseguinte, pelo motivo recordado no n.° 39 do presente acórdão, e não tendo sido demonstrada uma desvirtuação dos factos ou dos elementos de prova, este fundamento é manifestamente inadmissível no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.

79

O terceiro fundamento é, portanto, julgado parcialmente improcedente e parcialmente inadmissível.

Quanto ao quinto fundamento

Argumentos das partes

80

Através do seu quinto fundamento, a recorrente alega que o Tribunal de Primeira Instância violou o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, na medida em que se baseou exclusivamente em suposições gerais, sem apoio em qualquer verificação dos factos, para concluir que as marcas cujo registo é pedido são desprovidas de caracter distintivo.

81

Com efeito, segundo a recorrente, o Tribunal de Primeira Instância concluiu nos n.os 33, 36 e 37 do acórdão recorrido que as formas em questão são usuais, que o consumidor médio está habituado às mesmas, que essas formas se encontram comummente no comércio e que a natureza das marcas influencia a sua percepção pelo público-alvo, sem basear essas afirmações em verificações de facto.

82

O IHMI alega que, no que se refere à questão de saber que lanternas de bolso devem ser consideradas usuais ou que vêm espontaneamente à memória, a Segunda Câmara de Recurso já tinha feito verificações suficientes, tendo em conta, nomeadamente, a série de representações de outras formas de lanternas apresentada pela recorrente. Acrescenta que, uma vez que os membros do Tribunal de Primeira Instância são eles próprios consumidores para os quais as lanternas de bolso constituem objectos familiares, estavam em condições de apreciar, com base nos seus próprios conhecimentos, que formas de lanternas de bolso são «normais» e usuais.

Apreciação do Tribunal de Justiça

83

Em primeiro lugar, conforme foi recordado no n.° 30 do presente acórdão, os consumidores médios não têm por hábito presumir a origem dos produtos baseando-se na sua forma ou no seu acondicionamento, na falta de qualquer elemento gráfico ou textual, e, portanto, pode tornar-se mais difícil provar o carácter distintivo quando se trata de uma marca tridimensional do que quando se trata de uma marca nominativa ou figurativa.

84

Foi, portanto, correctamente que o Tribunal de Primeira Instância, no n.° 33 do acórdão recorrido, sublinhou que não se pode excluir que a natureza da marca cujo registo é pedido possa influenciar a percepção que o público-alvo terá da marca.

85

Na parte em que critica o Tribunal de Primeira Instância por ter chegado àquela conclusão, o quinto fundamento é improcedente.

86

Em segundo lugar, contrariamente ao que é sustentado pela recorrente, o Tribunal de Primeira Instância não fez, nos n.os 36 e 37 do acórdão recorrido, afirmações sem apoio em qualquer verificação dos factos, tendo, ao invés, procedido a apreciações de natureza factual baseadas, nomeadamente, no exame das lanternas de bolso em causa que lhe tinham sido apresentadas.

87

Desta forma, o Tribunal de Primeira Instância chegou à conclusão de que as formas das referidas lanternas de bolso são desprovidas de caracter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

88

Ora, como foi recordado no n.° 39 do presente acórdão, a apreciação dos factos não constitui, excepto em caso de desvirtuação dos mesmos ou dos elementos de prova submetidos ao Tribunal de Primeira Instância, que não é alegada no âmbito do presente fundamento, uma questão de direito sujeita, como tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.

89

Face ao exposto, há que julgar o quinto fundamento parcialmente improcedente e parcialmente inadmissível e, em consequência, negar provimento ao recurso na sua totalidade.

Quanto às despesas

90

Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.° do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o IHMI pedido a condenação da recorrida e tendo esta sido vencida, há que condená-la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

E negado provimento ao recurso.

 

2)

A Mag Instrument Inc. é condenada nas despesas.

 

Assinaturas.


( *1 ) Língua do processo: alemão.