61999J0383

Acórdão do Tribunal de 20 de Setembro de 2001. - Procter & Gamble Company contra Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos). - Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Admissibilidade - Marca comunitária - Regulamento (CE) n.º 40/94 - Motivo absoluto de recusa de registo - Carácter distintivo - Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações descritivas - Sintagma Baby-dry. - Processo C-383/99 P.

Colectânea da Jurisprudência 2001 página I-06251


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Admissibilidade - Parte parcialmente vencida

[Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, artigo 49.° ]

2. Marca comunitária - Definição e obtenção da marca comunitária - Motivos absolutos de recusa - Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações podendo servir para designar as características de um produto - Critérios

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigos 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), e 12.° ]

3. Marca comunitária - Definição e obtenção da marca comunitária - Motivos absolutos de recusa - Marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações podendo servir para designar as características de um produto - Sintagma «Baby-dry»

[Regulamento n.° 40/94 do Conselho, artigo 7.° , n.° 1, alínea c)]

Sumário


1. Uma vez que o Tribunal de Primeira Instância apenas procedeu a uma anulação parcial do acto submetido ao seu controlo, e não obstante o facto de o dispositivo do acórdão não retomar expressamente essa limitação, o referido acórdão, de facto, só dá parcialmente satisfação ao recorrente. Este último, que foi por conseguinte parcialmente vencido, tem interesse em recorrer desse acórdão. O recurso, que tem por objecto a anulação, nessa medida, do acórdão recorrido, deve, assim, ser julgado admissível.

( cf. n.os 22, 25-27 )

2. Resulta do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94 sobre a marca comunitária, conjugado com o disposto no seu artigo 12.° , que o objectivo da proibição de registo como marca de sinais ou de indicações exclusivamente descritivos é o de evitar que sejam registados como marcas sinais ou indicações que, em virtude de se identificarem com modalidades habituais de designação dos produtos ou serviços em causa ou das respectivas características, não permitiriam o preenchimento da função de identificação da empresa que os coloca no mercado e seriam, por isso, desprovidos do carácter distintivo que essa função pressupõe.

Os sinais e as indicações referidas no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do referido regulamento são, assim, apenas os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do consumidor, para designar, seja directamente seja por referência a uma das suas características essenciais, um produto ou um serviço como aquele para o qual é pedido o registo. Além disso, não se deveria recusar o registo de uma marca que contivesse sinais e indicações correspondentes a esta definição, desde que não incluísse outros sinais ou outras indicações e, além disso, que os sinais e as indicações exclusivamente descritivos que a compõem não fossem apresentados ou dispostos de uma forma que distinga a composição assim obtida das modalidades habituais de designar os produtos ou serviços a que se referem ou as respectivas características essenciais.

Quanto às marcas compostas por palavras, deve verificar-se o seu eventual carácter descritivo não só em relação a cada um dos termos considerado separadamente mas também em relação ao todo que aqueles compõem. Todo o afastamento perceptível na formulação do sintagma proposto a registo relativamente à terminologia empregue, na linguagem corrente da categoria de consumidores em causa, para designar o produto ou o serviço ou as respectivas características essenciais, é adequado para conferir a esse sintagma um carácter distintivo que lhe permite ser registado como marca.

( cf. n.os 37, 39-40 )

3. Quanto ao registo como marca comunitária do sintagma «Baby-dry» para fraldas descartáveis de papel ou celulose e para fraldas de tecido, os referidos termos não podem ser vistos como apresentando, em conjunto, um carácter descritivo; resultam, pelo contrário, de uma invenção lexical que permite à marca assim composta desempenhar um papel distintivo e não podem ser objecto de uma recusa de registo nos termos do artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

Com efeito, embora cada um dos dois termos que compõem o conjunto seja susceptível de fazer parte de expressões da linguagem corrente para designar a função das fraldas para bebés, a sua justaposição, invulgar na sua estrutura, não constitui uma expressão conhecida da língua inglesa para designar os referidos produtos ou para apresentar as suas características essenciais.

( cf. n.os 43-44 )

Partes


No processo C-383/99 P,

Procter & Gamble Company, com sede em Cincinnatti (Estados Unidos), representada por T. van Innis, avocat, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

que tem por objecto um recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Segunda Secção) de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY-DRY) (T-163/98, Colect., p. II-2383), em que se pede a anulação desse acórdão na medida em que o Tribunal de Primeira Instância considerou que a Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) não violou o artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), ao adoptar a sua decisão de 31 de Julho de 1998 (processo R 35/1998-1),

sendo a outra parte no processo:

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), representado por O. Montalto e E. Joly, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrido em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, C. Gulmann, M. Wathelet e V. Skouris, presidentes de secção, J.-P. Puissochet (relator), P. Jann, L. Sevón, R. Schintgen, F. Macken, N. Colneric e S. von Bahr, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,

secretário: D. Louterman-Hubeau, chefe de divisão,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 30 de Janeiro de 2001, na qual Procter & Gamble Company foi representada por T. van Innis e por F. Herbert, avocat, e o Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), por O. Montalto e E. Joly,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 5 de Abril de 2001,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 8 de Outubro de 1999, Procter & Gamble Company (a seguir «Procter & Gamble») interpôs, nos termos do artigo 49.° do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY-DRY) (T-163/98, Colect., p. II-2383, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este, baseando-se num só fundamento decorrente da violação do artigo 62.° , n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), anulou a decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «IHMI»), de 31 de Julho de 1998 (processo R 35/1998-1, a seguir «decisão litigiosa»), que negara provimento ao recurso interposto pela Procter & Gamble da recusa de registo como marca comunitária do sintagma Baby-dry para fraldas descartáveis de papel ou celulose e fraldas de tecido.

O Regulamento n.° 40/94

2 Nos termos do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94:

«1. Será recusado o registo:

a) Dos sinais que não estejam em conformidade com o artigo 4.° ;

b) De marcas desprovidas de carácter distintivo;

c) De marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes;

[...]

2. O n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade.

3. As alíneas b), c) e d) do n.° 1 não são aplicáveis se, na sequência da utilização da marca, esta tiver adquirido um carácter distintivo para os produtos ou serviços para os quais foi pedido o registo.»

3 Nos termos do artigo 62.° , n.° 1, do Regulamento n.° 40/94:

«Depois de analisar o mérito do recurso, a Câmara de Recurso delibera sobre ele. A referida câmara pode exercer as competências da instância que tomou a decisão contestada, ou remeter o processo à referida instância, para lhe ser dado seguimento.»

Factos do litígio

4 A Procter & Gamble requereu ao IHMI, por carta de 3 de Abril de 1996, o registo, como marca comunitária, do sintagma Baby-dry para fraldas descartáveis de papel ou celulose e para fraldas de tecido.

5 O examinador do IHMI indeferiu esse pedido em 29 de Janeiro de 1998. Através da decisão litigiosa, a Primeira Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso que a Procter & Gamble interpôs da decisão do examinador. Esta câmara considerou que o sintagma Baby-dry era exclusivamente composto por termos que podiam servir, no comércio, para designar o destino do produto em causa, que também era desprovido de carácter distintivo e que, por conseguinte, não podia ser registado, por força do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94. Além disso, a referida câmara declarou inadmissível a argumentação da Procter & Gamble relativa ao carácter distintivo que a marca teria adquirido na sequência da sua utilização, de acordo com o artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, pelo facto de essa argumentação não ter sido previamente apresentada ao examinador do IHMI.

O acórdão recorrido

6 O acórdão recorrido admitiu, em primeiro lugar, que o sintagma Baby-dry não era susceptível de constituir uma marca comunitária, confirmando, nessa matéria, a apreciação formulada na decisão litigiosa.

7 Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância considerou que os sinais compostos exclusivamente por termos que possam servir, no comércio, para designar o destino de um produto deviam, pela sua própria natureza, ser considerados inadequados para distinguir os produtos de uma empresa dos de outra empresa, mesmo que o fundamento da recusa só seja válido para uma parte da Comunidade. Tendo as fraldas uma função de absorção com vista a manter os bebés secos, o Tribunal de Primeira Instância deduziu que o sintagma Baby-dry se limitava a informar o consumidor quanto ao destino do produto, sem que contivesse elementos adicionais adequados para lhe conferir um carácter distintivo.

8 Em segundo lugar, o Tribunal de Primeira Instância examinou a argumentação desenvolvida a título subsidiário pela recorrente, nos termos da qual foi erradamente que, na decisão litigiosa, se terá declarado inadmissível, por não ter sido previamente submetida à apreciação do examinador, a proposta de prova apresentada pela Procter & Gamble quanto ao carácter distintivo que o sintagma Baby-dry teria adquirido pelo seu uso, em conformidade com o artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94. O Tribunal de Primeira Instância considerou que, ao declarar a inadmissibilidade, a Câmara de Recurso ignorou o artigo 62.° do Regulamento n.° 40/94, que, lido à luz da economia deste mesmo diploma e pressupondo uma continuidade, no seio do IHMI, entre a intervenção do examinador e a das Câmaras de Recurso, não autoriza a câmara a rejeitar uma argumentação apenas porque esta não foi apresentada ao examinador.

9 Por conseguinte, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que a decisão litigiosa devia ser anulada, na medida em que a Câmara de Recurso do IHMI recusou, sem razão, examinar a argumentação da Procter & Gamble baseada no artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94.

10 O Tribunal de Primeira Instância negou provimento aos outros pedidos da Procter & Gamble e anulou a decisão litigiosa.

O presente recurso

11 A Procter & Gamble conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne anular o acórdão recorrido na medida em que o Tribunal de Primeira Instância julgou que a Primeira Câmara de Recurso do IHMI não violou o artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, ao adoptar a decisão litigiosa. Pede, igualmente, a condenação do IHMI nas despesas.

12 O IHMI conclui pedindo que seja negado provimento ao recurso e que a Procter & Gamble seja condenada nas despesas.

Quanto à admissibilidade do presente recurso

Argumentos das partes

13 A recorrente alega, por um lado, que foi parcialmente vencida no pedido que apresentara ao Tribunal de Primeira Instância, já que invocou, em relação à decisão litigiosa, a violação do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94, argumentação essa que o Tribunal de Primeira Instância rejeitou.

14 Afirma, por outro lado, que pode invocar interesse em recorrer, dado que, para tomar as medidas necessárias à execução do acórdão recorrido, o IHMI só reexaminará o pedido de registo em causa à luz do artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, e não do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do mesmo regulamento. Com efeito, a interpretação que a decisão litigiosa fez destas duas últimas disposições foi aceite pelo Tribunal de Primeira Instância e o âmbito da obrigação de execução do acórdão recorrido é apreciado em função dos fundamentos que constituem a base necessária do seu dispositivo.

15 O IHMI admite que a recorrente tem interesse em agir e, no que diz respeito à admissibilidade, apenas exprime dúvidas quanto à questão de saber se o fundamento invocado, baseado numa alegada violação do direito comunitário, pode servir de fundamento a um recurso. Remete-se, no entanto, para o douto entendimento do Tribunal de Justiça, uma vez que se trata de uma questão de ordem pública.

Apreciação do Tribunal de Justiça

16 Nos termos do artigo 49.° , primeiro e segundo parágrafos, do Estatuto (CE) do Tribunal de Justiça:

«Pode ser interposto recurso para o Tribunal de Justiça das decisões do Tribunal de Primeira Instância que ponham termo à instância, bem como das decisões que apenas se pronunciem parcialmente sobre o mérito da causa ou que ponham termo a um incidente processual relativo a uma excepção de incompetência ou de inadmissibilidade. O recurso deve ser interposto no prazo de dois meses a contar da notificação da decisão impugnada.

O recurso pode ser interposto por qualquer das partes que tenha sido total ou parcialmente vencida. [...]»

17 Nos termos do artigo 92.° , n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça:

«O Tribunal pode, a todo o tempo e oficiosamente, verificar se estão preenchidos os pressupostos processuais ou, ouvidas as partes, declarar que a acção ou o recurso ficaram sem objecto e que não conhecerá do mérito da causa; a decisão é tomada nos termos do disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 91.° do presente regulamento.»

18 Tendo a Procter & Gamble pedido ao Tribunal de Primeira Instância a anulação da decisão litigiosa e tendo o dispositivo do acórdão recorrido revestido a forma de uma anulação pura e simples da referida decisão, cabe ao Tribunal de Justiça apreciar oficiosamente a questão de saber se a recorrente foi vencida, pelo menos parcialmente, e se é, pois, admissível o recurso, para o Tribunal de Justiça, do acórdão recorrido.

19 Decorre do n.° 9 do acórdão recorrido que a recorrente concluiu pedindo, nomeadamente, ao Tribunal de Primeira Instância, por um lado, e a título principal, que anulasse a decisão impugnada na medida em que esta considerou que a marca não era conforme às condições previstas pelo artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94, e, por outro lado, a título subsidiário, que anulasse a decisão litigiosa na medida em que esta declarou inadmissível a argumentação da recorrente baseada no artigo 7.° , n.° 3, do mesmo regulamento.

20 O Tribunal de Primeira Instância começou por rejeitar expressamente a parte principal do pedido ao afirmar, no n.° 28 do acórdão recorrido, que foi com razão que a Primeira Câmara de Recurso do IHMI concluíra, com base no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, que o sintagma Baby-dry não era susceptível de constituir uma marca comunitária. Só depois o Tribunal de Primeira Instância concluiu que a referida câmara ignorara as disposições do artigo 62.° do mesmo regulamento ao declarar inadmissível a argumentação da recorrente baseada no artigo 7.° , n.° 3, desse diploma, acolhendo, deste modo, o pedido subsidiário do recurso.

21 O Tribunal de Primeira Instância extraiu da sua apreciação das duas partes do recurso a conclusão geral, constante do n.° 54 do acórdão recorrido, de que havia que anular a decisão litigiosa na medida em que a Primeira Câmara de Recurso do IHMI recusara, sem razão, examinar a argumentação da recorrente baseada no artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94; o Tribunal de Primeira Instância acrescentou que incumbia ao IHMI tomar as medidas necessárias à execução do acórdão.

22 Nestas condições, e não obstante o facto de o dispositivo do acórdão recorrido não retomar expressamente a limitação constante do n.° 54, deve observar-se que o referido acórdão, de facto, só dá parcialmente satisfação à recorrente.

23 Com efeito, sob a forma de um único acto que constitui a decisão litigiosa, a Primeira Câmara de Recurso do IHMI adoptou, de facto, duas medidas: uma, recusando o registo do sintagma Baby-dry pelos motivos previstos no artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94; outra, rejeitando, por inadmissível, a argumentação da recorrente relativa ao artigo 7.° , n.° 3, desse regulamento.

24 Ao anular a decisão litigiosa, por não se debruçar sobre a argumentação relativa ao artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, e só nessa medida, o acórdão recorrido deixou subsistir a parte dessa decisão respeitante à conformidade do sintagma Baby-dry às exigências do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do mesmo regulamento.

25 Assim, o Tribunal de Primeira Instância apenas procedeu a uma anulação parcial do acto submetido ao seu controlo. Daqui resulta que, para adoptar as medidas necessárias à execução do acórdão recorrido, como as referidas no seu n.° 54, o IHMI pôde limitar-se a proceder ao exame da aplicação, ao caso concreto, do artigo 7.° , n.° 3, do Regulamento n.° 40/94, sem reapreciar a interpretação que fez do artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do referido regulamento, que o Tribunal de Primeira Instância considerou válida.

26 A Procter & Gamble demonstra, por conseguinte, ter interesse em recorrer do acórdão do Tribunal de Primeira Instância, porquanto este negou provimento ao seu pedido de anulação da recusa de registo da marca Baby-dry decidida com base no artigo 7.° , n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94.

27 O presente recurso, que tem por objecto a anulação, nessa medida, do acórdão recorrido, deve, assim, ser julgado admissível.

Quanto ao mérito do presente recurso

Argumentos das partes

28 Em apoio do presente recurso, a recorrente invoca um fundamento único, segundo o qual o Tribunal de Primeira Instância atribuíra um alcance demasiado amplo ao motivo absoluto de recusa de registo baseado no carácter exclusivamente descritivo dos sinais e das indicações que compõem uma marca. Com efeito, para fins de registo como marca comunitária, apenas podem ser recusados, com fundamento no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, os sinais e indicações que só possam ser entendidos, pelo público, como sendo uma designação das características do produto em causa e que, como tal, se consideram inadequados para desempenhar o papel distintivo de uma marca, que deve permitir associar um produto à empresa que o comercializa, distinguindo-o dos produtos do mesmo tipo provenientes de empresas concorrentes.

29 Ao considerar que o sintagma Baby-dry informa directamente o consumidor do destino dos produtos e não é acompanhado de qualquer elemento adicional susceptível de tornar o sinal, no seu conjunto, apto a distinguir os produtos da recorrente dos de outras empresas, o Tribunal de Primeira Instância interpretou e aplicou incorrectamente a disposição em causa.

30 Segundo a recorrente, o Tribunal de Primeira Instância proferiu um acórdão inspirado numa concepção ultrapassada da marca, de acordo com a qual o registo de uma marca confere ao seu titular o monopólio do uso dos sinais ou das indicações que a compõem, decorrendo desse monopólio que todos os sinais ou indicações de natureza descritiva, que devem ser deixados livres para os usos do comércio, são, por definição, impróprios para constituírem marcas.

31 A concepção moderna que inspirou o Regulamento n.° 40/94 exclui, pelo contrário, qualquer direito monopolístico sobre os sinais ou as indicações que constituem uma marca, que poderiam continuar a ser usados normalmente por terceiros. Correlativamente, nenhuma categoria de sinais ou de indicações seria, em abstracto, considerada inadequada para constituir uma marca. O carácter descritivo, assim como o carácter genérico, de um sinal ou de uma indicação mais não era do que uma sub-rubrica do motivo de recusa decorrente da ausência de carácter distintivo dos sinais ou das indicações propostos como marca, devendo ambas as noções - carácter distintivo e carácter não exclusivamente descritivo - ser apreendidas em conjunto para se verificar se os sinais ou as indicações propostos são aptos a identificar os produtos a que se referem como provenientes de uma empresa específica.

32 O IHMI não contesta a pertinência desta análise teórica e afirma que o carácter distintivo constitui o elemento determinante para apreciar a aptidão de um sinal para constituir uma marca, sendo o carácter exclusivamente descritivo, a este respeito, um caso em relação ao qual existe uma presunção de ausência de carácter distintivo.

33 Segundo o IHMI, uma recusa de registo fundada no carácter descritivo pressupõe o preenchimento de três condições, a saber:

- a ausência de modalidades de apresentação ou de junção de elementos cuja presença tornaria o sinal não exclusivamente descritivo;

- a referência do sinal a uma qualidade essencial do produto e não a uma qualidade secundária ou que lhe não seja particular;

- o carácter perceptível dessa referência para o público interessado no consumo do produto.

34 O sintagma Baby-dry, como declarado pelo Tribunal de Primeira Instância, satisfazia as condições exigidas para ser considerado exclusivamente descritivo.

Apreciação do Tribunal de Justiça

35 Recorde-se que, nos termos do artigo 7.° , n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo, em conformidade com a alínea b) do mesmo número, de marcas desprovidas de carácter distintivo, e, de acordo com a sua alínea c), de marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes.

36 Além disso, por força do artigo 12.° do Regulamento n.° 40/94, o direito conferido pela marca não permite proibir a terceiros a utilização, na vida comercial, de indicações relativas à espécie, à qualidade, à quantidade, ao destino, ao valor, à proveniência geográfica, à época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou a outras características destes, desde que essa utilização seja feita em conformidade com os usos honestos em matéria industrial ou comercial.

37 Da conjugação das referidas disposições decorre que o objectivo da proibição de registo como marca de sinais ou de indicações exclusivamente descritivos é, como a Procter & Gamble e o IHMI admitem, o de evitar que sejam registados como marcas sinais ou indicações que, em virtude de se identificarem com modalidades habituais de designação dos produtos ou serviços em causa ou das respectivas características, não permitiriam o preenchimento da função de identificação da empresa que os coloca no mercado e seriam, por isso, desprovidos do carácter distintivo que essa função pressupõe.

38 Esta interpretação é a única que também é compatível com o artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, nos termos do qual podem constituir marcas comunitárias todos os sinais susceptíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, os desenhos, as letras, os algarismos e a forma do produto ou do seu acondicionamento, desde que esses sinais sejam adequados para distinguir os produtos ou os serviços de uma empresa dos de outras empresas.

39 Os sinais e as indicações referidas no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 são, assim, apenas os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do consumidor, para designar, seja directamente seja por referência a uma das suas características essenciais, um produto ou um serviço como aquele para o qual é pedido o registo. Além disso, não se deveria recusar o registo de uma marca que contivesse sinais e indicações correspondentes a esta definição, desde que não incluísse outros sinais ou indicações e, além disso, que os sinais e as indicações exclusivamente descritivos que a compõem não fossem apresentados ou dispostos de uma forma que distinga a composição assim obtida das modalidades habituais de designar os produtos ou serviços a que se referem ou as respectivas características essenciais.

40 Quanto às marcas compostas por palavras, como a que constitui o objecto do litígio, deve verificar-se o seu eventual carácter descritivo não só em relação a cada um dos termos considerado separadamente mas também em relação ao todo que aqueles compõem. Todo o afastamento perceptível na formulação do sintagma proposto a registo relativamente à terminologia empregue, na linguagem corrente da categoria de consumidores em causa, para designar o produto ou o serviço ou as respectivas características essenciais, é adequado para conferir a esse sintagma um carácter distintivo que lhe permite ser registado como marca.

41 Na verdade, o artigo 7.° , n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 determina que o n.° 1 do mesmo artigo é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade. Esta disposição, que foi correctamente referida no n.° 24 do acórdão recorrido, implica que, se um sintagma tiver carácter unicamente descritivo numa das línguas utilizadas no comércio interno da Comunidade, essa conclusão basta para que seja insusceptível de ser registado como marca comunitária.

42 Para apreciar a aptidão de um sintagma, como Baby-dry, para possuir carácter distintivo, há, portanto, que adoptar o ponto de vista de um consumidor de língua inglesa. Nessa perspectiva, e tratando-se de fraldas para bebés, a apreciação a efectuar depende da resposta à questão de saber se o sintagma em causa pode ser entendido como uma forma normal de designar esse produto ou de apresentar as suas características essenciais em linguagem corrente.

43 Ora, o sintagma em causa, ainda que incontestavelmente evoque a função que o produto é suposto preencher, não satisfaz, mesmo assim, as condições recordadas nos n.os 39 a 42 do presente acórdão. Com efeito, embora cada um dos dois termos que compõem o conjunto seja susceptível de fazer parte de expressões da linguagem corrente para designar a função das fraldas para bebés, a sua justaposição, invulgar na sua estrutura, não constitui uma expressão conhecida da língua inglesa para designar os referidos produtos ou para apresentar as suas características essenciais.

44 Termos como Baby-dry não podem, por conseguinte, ser vistos como apresentando, em conjunto, um carácter descritivo; resultam, pelo contrário, de uma invenção lexical que permite à marca assim composta desempenhar um papel distintivo e não podem ser objecto de uma recusa de registo nos termos do artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

45 Assim, o Tribunal de Primeira Instância cometeu um erro de direito ao considerar que a Primeira Câmara de Recurso do IHMI podia decidir, legitimamente, com base naquela disposição, que o sintagma Baby-dry não era susceptível de constituir uma marca comunitária.

46 Nestas circunstâncias, há que anular o acórdão recorrido nos termos pedidos pela Procter & Gamble e, julgando procedentes os pedidos que esta última apresentou ao Tribunal de Primeira Instância, anular igualmente a decisão litigiosa na medida em que esta rejeitou, com fundamento no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, o pedido de registo da marca Baby-dry.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

47 Nos termos do artigo 122.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, quando o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

48 Por força do disposto no n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, aplicável aos recursos de decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do seu artigo 118.° , a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. A Procter & Gamble pediu a condenação do IHMI e este foi vencido, pelo que há que o condenar nas despesas de ambas as instâncias.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) O acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/IHMI (BABY-DRY) (T-163/98), é anulado na medida em que considerou que a Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) não violou o artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária, ao adoptar a sua decisão de 31 de Julho de 1998 (processo R 35/1998-1).

2) A decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), de 31 de Julho de 1998 (processo R 35/1998-1), é anulada na medida em que rejeitou, com fundamento no artigo 7.° , n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, o pedido de registo da marca Baby-dry.

3) O Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) é condenado nas despesas de ambas as instâncias.