61997J0329

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 16 de Março de 2000. - Sezgin Ergat contra Stadt Ulm. - Pedido de decisão prejudicial: Bundesverwaltungsgericht - Alemanha. - Acordo de Associação CEE-Turquia - Livre circulação dos trabalhadores - Artigo 7.º, primeiro parágrafo, da Decisão n.º 1/80 do Conselho de Associação - Membro da família de um trabalhador turco - Prorrogação da autorização de residência - Conceito de residência regular - Pedido de prorrogação de uma autorização de residência temporária apresentado antes de expirar a sua validade. - Processo C-329/97.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-01487


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


Acordos internacionais - Acordo de associação CEE-Turquia - Conselho de Associação instituído pelo Acordo de Associação CEE-Turquia - Decisão relativa à livre circulação de trabalhadores - Reagrupamento familiar - Acesso dos membros da família de um trabalhador turco integrado no mercado regular de trabalho de um Estado-Membro a uma actividade assalariada de sua escolha nesse Estado-Membro - Direito correlativo à prorrogação da autorização de residência

(Decisão n._ 1/80 do Conselho de Associação CEE-Turquia, artigo 7._, primeiro parágrafo)

Sumário


$$Um cidadão turco, autorizado a entrar num Estado-Membro a título de reagrupamento familiar com um trabalhador turco inserido no mercado regular de trabalho desse Estado, que aí tenha residido legalmente durante mais de cinco anos e exercido, com algumas interrupções, diversos empregos regulares, não perde o benefício dos direitos que lhe são conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80 do Conselho de Associação CEE-Turquia e, em especial, o direito à prorrogação da autorização de residência no Estado-Membro de acolhimento, mesmo que a autorização de residência esteja caducada na data em que apresentou o pedido da sua prorrogação que foi indeferido pelas autoridades nacionais competentes. (cf. n.o 67 e disp.)

Partes


No processo C-329/97,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), pelo Bundesverwaltungsgericht (Alemanha), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Sezgin Ergat

e

Stadt Ulm,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 7._, primeiro parágrafo, da Decisão n._ 1/80, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação, adoptada pelo Conselho de Associação criado pelo Acordo de Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: R. Schintgen (relator), presidente da Segunda Secção, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, P. J. G. Kapteyn e G. Hirsch, juízes,

advogado-geral: J. Mischo,

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação do Governo alemão, por E. Röder, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, na qualidade de agente,

- em representação do Governo francês, por K. Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e A. de Bourgoing, encarregada de missão na mesma direcção, na qualidade de agentes,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. Sack, consultor jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações do Governo alemão, representado por W.-D. Plessing, Ministerialrat no Ministério Federal das Finanças, na qualidade de agente, do Governo francês, representado por A. de Bourgoing, e da Comissão, representada por J. Sack, na audiência de 22 de Abril de 1999,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 3 de Junho de 1999,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 15 de Julho de 1997, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 22 de Setembro seguinte, o Bundesverwaltungsgericht apresentou, nos termos do artigo 177._ do Tratado CE (actual artigo 234._ CE), uma questão prejudicial sobre a interpretação do artigo 7._, primeiro parágrafo, da Decisão n._ 1/80 do Conselho de Associação, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação (a seguir «Decisão n._ 1/80»). O Conselho de Associação foi instituído pelo acordo que criou uma associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, que foi assinado, em 12 de Setembro de 1963, em Ancara, pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados-Membros da CEE e pela Comunidade, por outro, e que foi concluído, aprovado e confirmado em nome da Comunidade pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de Dezembro de 1963 (JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18).

2 Esta questão foi suscitada no âmbito de um litígio que opõe S. Ergat, nacional turco nascido em 1967, em Stadt Ulm, a propósito da recusa de prorrogação da sua autorização de residência na Alemanha.

A Decisão n._ 1/80

3 Os artigos 6._, 7._ e 14._ da Decisão n._ 1/80 constam do respectivo capítulo II intitulado «Disposições sociais», secção 1, referente às «Questões relativas ao emprego e livre circulação dos trabalhadores».

4 O artigo 6._, n._ 1, da Decisão n._ 1/80 tem a seguinte redacção:

«Sem prejuízo do disposto do artigo 7._ relativamente ao livre acesso ao emprego dos membros da sua família, o trabalhador turco, integrado no mercado regular de trabalho de um Estado-Membro:

- tem direito, nesse Estado-Membro, após um ano de emprego regular, à renovação da sua autorização de trabalho para a mesma entidade patronal, se dispuser de um emprego;

- tem direito, nesse Estado-Membro, após três anos de emprego regular e sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados-Membros da Comunidade, a responder, dentro da mesma profissão, a uma entidade patronal de sua escolha, a outra oferta de emprego, feita em condições normais e registada nos serviços de emprego desse Estado-Membro;

- beneficia, nesse Estado-Membro, após quatro anos de emprego regular, de livre acesso a qualquer actividade assalariada de sua escolha.»

5 O artigo 7._ da Decisão n._ 1/80 prevê:

«Os membros da família de um trabalhador turco que esteja integrado no mercado regular de trabalho de um Estado-Membro, que tenham sido autorizados a reunir-se-lhe:

- têm o direito de responder - sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados-Membros da Comunidade - a qualquer oferta de emprego, desde que residam regularmente nesse Estado-Membro há pelo menos três anos;

- beneficiam, nesse Estado-Membro, de livre acesso a qualquer actividade assalariada de sua escolha, desde que aí residam regularmente há pelo menos cinco anos.

Os filhos dos trabalhadores turcos que tenham obtido uma formação profissional no país de acolhimento poderão, independentemente da duração da sua residência nesse Estado-Membro, desde que um dos pais tenha legalmente trabalhado no Estado-Membro interessado há pelo menos três anos, responder, nesse Estado, a qualquer oferta de emprego.»

6 O artigo 14._, n._ 1, estabelece:

«As disposições da presente secção são aplicáveis sob reserva das limitações justificadas por razões de ordem pública, segurança e saúde pública.»

Processo principal

7 Decorre do processo principal que, em Outubro de 1975, S. Ergat foi autorizado a entrar na Alemanha para se juntar aos seus pais que, ambos, aí exerciam uma actividade assalariada.

8 A partir de 1983, S. Ergat passou a ser titular nesse Estado-Membro de uma autorização de trabalho por tempo determinado, tendo trabalhado, com algumas interrupções, para diversas entidades patronais. Em 19 de Dezembro de 1989, obteve uma autorização de trabalho por tempo indeterminado.

9 De acordo com o direito nacional aplicável quando da sua entrada na Alemanha, S. Ergat não era obrigado a ser titular de uma autorização de residência.

10 A seu pedido, foi-lhe concedida, em 1983, uma autorização de residência válida por um ano. Essa autorização foi prorrogada por quatro vezes, primeiro por um ano e, em seguida, por dois anos de cada vez.

11 É pacífico que as autoridades competentes lhe concederam as três últimas prorrogações apesar de S. Ergat ter apresentado o respectivo pedido depois de findo o prazo de validade da sua autorização de residência e que o atraso aumentou com os anos, tendo-se respectivamente elevado a nove, quinze e vinte dias.

12 A validade da última autorização de residência do interessado expirou em 28 de Junho de 1991.

13 S. Ergat solicitou nova prorrogação da autorização de residência em formulário assinado em 10 de Junho de 1991, que, porém, só deu entrada no serviço de estrangeiros competente em 24 de Julho seguinte, ou seja, vinte e seis dias após expirar a validade da sua última autorização de residência.

14 Por decisão de 22 de Janeiro de 1992, o referido serviço rejeitou esse pedido por apresentado fora de prazo e, considerando que a estadia de S. Ergat se tornara irregular após a expiração da sua autorização, exigiu a sua partida, ameaçando-o com a expulsão.

15 O recurso administrativo interposto dessa decisão pelo interessado foi indeferido em 4 de Maio de 1992.

16 S. Ergat, que regressara à Turquia em Agosto de 1992 para apenas voltar à Alemanha no Outono de 1993, Estado-Membro em que se encontra de novo na situação de empregado desde Junho de 1994, interpôs então recurso jurisdicional das decisões de indeferimento de 22 de Janeiro e de 4 de Maio de 1992.

17 Este recurso obteve provimento na primeira instância, tendo-lhe porém sido negado provimento na segunda instância.

18 Considerando ter direito à prorrogação da autorização de residência com fundamento no primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, S. Ergat interpôs então recurso para o Bundesverwaltungsgericht.

19 Este órgão jurisdicional constatou que S. Ergat não tinha qualquer direito à prorrogação da autorização de residência nos termos do direito alemão. O Bundesverwaltungsgericht suscitou no entanto a questão de saber se o interessado não gozaria de um direito de residência por força do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80.

20 A este respeito, não é contudo claro se o conceito de residência regular a que se refere esta disposição significa que o membro da família de um trabalhador turco deve ainda de ser titular de uma autorização de residência válida no Estado-Membro de acolhimento na data decisiva para a apreciação do pedido de prorrogação dessa autorização, se o interessado for já titular, algumas semanas antes, de uma autorização de residência válida e de, mesmo antes da respectiva expiração, poder prevalecer-se dos direitos conferidos pelo primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80.

A questão prejudicial

21 Por considerar que, nestas condições, a resolução do litígio exigia a interpretação dessa disposição da Decisão n._ 1/80, o Bundesverwaltungsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Um cidadão turco que, enquanto membro da família de um trabalhador turco inserido no mercado regular do trabalho, tenha entrado na Alemanha sem dispor de uma autorização de residência, de acordo com o direito nacional de estrangeiros vigente no momento da entrada, e que sucessivamente esteve com algumas interrupções em posse de autorização de residência, mas que apresentou um pedido de renovação da sua última autorização de residência 26 dias depois de ter expirado a sua validade, preenche as condições do artigo 7._ n._ 1 da Decisão n._ 1/80 do Conselho de Associação CEE-Turquia relativa ao desenvolvimento da associação, o qual exige que este `resida regularmente pelo menos desde há três anos' (primeiro travessão) ou `pelo menos desde há cinco anos' (segundo travessão) quando as autoridades nacionais recusaram a renovação?»

22 Saliente-se, a título liminar, que esta questão diz respeito à situação de um nacional turco que, na qualidade de filho de um casal de trabalhadores migrantes turcos inseridos no mercado regular de trabalho num Estado-Membro, foi autorizado a juntar-se-lhes no território deste Estado a título de reagrupamento familiar e aí solicitou a prorrogação da respectiva autorização de residência invocando o primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80.

23 O órgão jurisdicional de reenvio constatou que o interessado, apesar de ter estado regularmente ocupado durante determinados períodos no Estado-Membro em causa, não pode prevalecer-se do artigo 6._ da Decisão n._ 1/80, que confere ao trabalhador migrante turco direitos progressivamente mais amplos em matéria de emprego em função da duração e modalidades de exercício de uma actividade assalariada no Estado-Membro de acolhimento. Com efeito, S. Ergat não preenchia as condições estabelecidas por esta disposição, em virtude de, na data do pedido de prorrogação da sua autorização de residência cuja validade expirara em Junho de 1991, não exercer um trabalho regular para qualquer entidade patronal há pelo menos um ano sem interrupção.

24 Além disso, é pacífico que o interessado cometeu na Alemanha diversos actos delituosos pelos quais foi condenado a coimas penais.

25 A este respeito, o Bundesverwaltungsgericht considerou contudo que o indeferimento da prorrogação da autorização de residência de S. Ergat não podia ser justificado à luz do n._ 1 do artigo 14._ da Decisão n._ 1/80. Com efeito, tal como para os nacionais dos Estados-Membros, o conceito de ordem pública na acepção desta disposição apenas pode ser invocado no caso de a presença do interessado no território do Estado-Membro de acolhimento constituir uma ameaça efectiva e suficientemente grave que afecte um interesse fundamental da sociedade. Ora, no processo principal, as infracções cometidas por S. Ergat não são de particular gravidade e, além disso, foram, na maior parte dos casos, sancionadas por coimas de montante reduzido.

26 No que se refere ao primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, que é objecto da questão prejudicial, o Governo alemão contestou antes de tudo, na audiência, a qualidade de membro da família de um trabalhador turco, na acepção dessa disposição, de um nacional turco na situação de S. Ergat, por, na data em que formulou o pedido de prorrogação da autorização de residência, ser maior e ter tido uma vida independente na Alemanha.

27 A este respeito, basta salientar ser pacífico, no processo principal, que S. Ergat obteve, com oito anos de idade, a autorização para se juntar aos seus pais na Alemanha que aí exerciam então uma actividade assalariada regular, pelo que deve ser considerado membro da família de um trabalhador turco na acepção da referida disposição. Nestas condições, foi a justo título que o órgão jurisdicional de reenvio partiu da premissa de que S. Ergat tinha a qualidade de membro da família de um trabalhador turco inserido no mercado regular de trabalho do Estado-Membro de acolhimento.

28 Constate-se, além disso, que, quando em Junho de 1991 expirou a validade da sua última autorização de residência, S. Ergat, que beneficiara de uma autorização de residência na Alemanha para efeitos de reagrupamento familiar nos termos do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, residira no território desse Estado-Membro durante mais de quinze anos, aí se encontrando numa situação jurídica estável e não precária.

29 O facto de S. Ergat ter solicitado por três vezes, entre 1985 e 1989, a prorrogação da sua autorização de residência temporária após a respectiva expiração, pelo que não estivera na posse de uma autorização de residência válida durante breves períodos, é, em qualquer caso, irrelevante para este efeito, na medida em que as autoridades competentes do Estado-Membro de acolhimento não impugnaram com esse fundamento a regularidade da residência do interessado no território nacional, sendo que, pelo contrário, lhe concederam de cada vez nova autorização de residência (v., neste sentido, acórdãos de 17 de Abril de 1997, Kadiman, C-351/95, Colect., p. I-2133, n._ 54, e de 30 de Setembro de 1997, Ertanir, C-98/96, Colect., p. I-5179, n._ 69).

30 S. Ergat, tendo residido regularmente na Alemanha durante mais de cinco anos consecutivos, cai sob a alçada do segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, por força do qual beneficia no Estado-Membro de acolhimento de livre acesso a qualquer actividade assalariada de sua escolha.

31 Aliás, o interessado fez uso dessa faculdade, visto que, desde 1983, exerceu, com algumas interrupções, diversas actividades assalariadas abrangidas por uma autorização de trabalho. Desde 1989, S. Ergat é titular de uma autorização de trabalho sem qualquer limitação de prazo nem outra condição, seja ela de que natureza for.

32 As autoridades alemãs competentes consideram contudo que tinham o direito de indeferir a prorrogação da última autorização de residência temporária de S. Ergat por este já não residir regularmente no Estado-Membro de acolhimento, na acepção do segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, visto ter solicitado a prorrogação da referida autorização vinte e seis dias após a data em que expirava a respectiva validade.

33 Nestas condições, deve entender-se a questão prejudicial como perguntando, no essencial, se um nacional turco, autorizado a entrar num Estado-Membro a título do reagrupamento familiar com um trabalhador turco inserido no mercado regular de trabalho desse Estado, que aí residiu legalmente durante mais de cinco anos e aí exerceu, com algumas interrupções, diversos empregos regulares, perde o benefício dos direitos que lhe são conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80 e, em especial, o direito à prorrogação da sua autorização de residência no Estado-Membro de acolhimento, no caso de a sua autorização de residência estar caducada na data em que apresentou o pedido da respectiva prorrogação, que foi indeferido pelas autoridades nacionais competentes.

34 Para responder a esta questão, recorde-se desde já resultar da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o artigo 7._, primeiro parágrafo, da Decisão n._ 1/80 tem efeito directo nos Estados-Membros, de modo que os nacionais turcos que preencham as condições nele estabelecidas podem invocar directamente os direitos que esta disposição lhes confere; em especial têm direito, por força do primeiro travessão da referida disposição, a responderem, sem prejuízo da prioridade a conceder aos trabalhadores dos Estados-Membros, a qualquer oferta de trabalho quando tenham residido regularmente no Estado-Membro de acolhimento desde há pelo menos três anos, bem como, de acordo com o segundo travessão, o direito de livre acesso a qualquer actividade assalariada de sua escolha no Estado-Membro em cujo território tenham residido regularmente há pelo menos cinco anos (acórdão Kadiman, já referido, n.os 27 e 28).

35 Além disso, o Tribunal de Justiça julgou também que o referido primeiro parágrafo do artigo 7._ confere o direito de os membros da família de um trabalhador turco que esteja integrado no mercado regular de trabalho de um Estado-Membro aí exercerem uma actividade assalariada depois de terem residido regularmente nesse Estado-Membro durante certo tempo, sem com isso afectar a competência do Estado-Membro em causa para autorizar os interessados a reunirem-se ao trabalhador turco que aí tenha um emprego regular e para regulamentar a sua estadia até ao momento em que tenham o direito de responder a qualquer oferta de trabalho (acórdão Kadiman, já referido, n.os 32 e 51).

36 O Tribunal de Justiça deduziu daqui que o primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80 exige que o reagrupamento familiar, que justificou a entrada do membro da família no território do Estado-Membro de acolhimento, se manifeste durante um certo tempo através da coabitação efectiva em comunhão doméstica com o trabalhador, e que tal deve suceder sempre que o interessado não preencha, ele próprio, as condições para aceder ao mercado de trabalho nesse Estado (acórdão Kadiman, já referido, n.os 33, 37 e 40).

37 Em consequência, o Tribunal de Justiça interpretou a Decisão n._ 1/80 no sentido de que não se opõe, em princípio, a que as autoridades de um Estado-Membro subordinem a prorrogação da autorização de residência de um membro da família de um trabalhador turco à condição de o interessado manter efectivamente vida em comum com o trabalhador durante o período de três anos previsto pelo artigo 7._, primeiro parágrafo, primeiro travessão (acórdão Kadiman, já referido, n.os 41 e 44).

38 Decorre contudo logicamente do acórdão Kadiman, já referido, que os Estados-Membros deixam, porém, de poder estabelecer condições à residência de um membro da família de um trabalhador turco para além do referido período de três anos.

39 Por maioria de razão, o mesmo será de aplicar a um emigrante turco que, como S. Ergat, preencha as condições do segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80.

40 Assim, pelo menos a partir do momento em que o nacional turco referido no primeiro parágrafo do artigo 7._ beneficie, após cinco anos de residência regular a título do reagrupamento familiar com o trabalhador, do direito de livre acesso ao emprego no Estado-Membro de acolhimento, de acordo com o segundo travessão daquela disposição, não só o efeito directo de que esta goza tem por consequência que o interessado retira um direito individual em matéria de emprego directamente da Decisão n._ 1/80, mas também, além disso, que o efeito útil desse direito implica necessariamente a existência de um direito correlativo de residência igualmente fundado no direito comunitário e independente da manutenção das condições de acesso a tais direitos (v., por analogia, relativamente ao terceiro travessão do primeiro parágrafo do artigo 6._ da Decisão n._ 1/80, os acórdãos de 20 de Setembro de 1990, Sevince, C-192/89, Colect., p. I-3461, n.os 29 e 31, e de 23 de Janeiro de 1997, Tetik, C-171/95, Colect., p. I-329, n.os 26, 30 e 31; relativamente ao segundo parágrafo do artigo 7._ da mesma decisão, os acórdãos de 5 de Outubro de 1994, Eroglu, C-355/93, Colect., p. I-5113, n._ 20, e de 19 de Novembro de 1998, Akman, C-210/97, Colect., p. I-7519, n._ 24).

41 Com efeito, o direito incondicional de aceder a qualquer actividade livremente escolhida pelo interessado, sem que lhe possa ademais ser oposta qualquer prioridade dos trabalhadores dos Estados-Membros, previsto no segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, seria esvaziado de qualquer conteúdo se as autoridades nacionais competentes tivessem a possibilidade de condicionar ou restringir de que forma seja os direitos precisos que a referida decisão conferiu directamente aos migrantes turcos (v. designadamente, por analogia, o acórdão de 30 de Setembro de 1997, Günaydin, C-36/96, Colect., p. I-5143, n.os 37 a 39 e 50).

42 Os Estados-Membros, embora tenham conservado no estádio actual do direito comunitário competência para regulamentar tanto a entrada no seu território de um membro da família de um trabalhador turco como as condições da sua residência durante o período inicial de três anos que precede aquele em que goza do direito de responder a qualquer oferta de emprego, já não dispõem, pelo contrário, da faculdade de adoptar medidas relativas à residência susceptíveis de entravar o exercício dos direitos expressamente conferidos pela Decisão n._ 1/80 ao interessado que preencha as respectivas condições e, em consequência, esteja já regularmente integrado no Estado-Membro de acolhimento, uma vez que o direito de residência é indispensável ao acesso e ao exercício de qualquer actividade assalariada (v., neste sentido, designadamente o acórdão Eroglu, já referido, n._ 20).

43 Assim, a finalidade da Decisão n._ 1/80, que consiste em melhorar, no domínio do social, o regime de que beneficiam os trabalhadores e os membros das suas famílias com vista à progressiva realização da livre circulação de trabalhadores (v., por último, o acórdão de 26 de Novembro de 1998, Birden, C-1/97, Colect., p. I-7747, n._ 52), não seria atingida se restrições impostas por um Estado-Membro, designadamente em matéria de residência, pudessem ter por efeito privar o interessado do benefício dos direitos que lhe são incondicionalmente conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da referida decisão, precisamente no momento em que, por via do livre acesso a um emprego de sua escolha, tem a possibilidade de se inserir duradouramente no Estado-Membro de acolhimento.

44 Esta interpretação é, aliás, confirmada pelo referido acórdão Akman, já referido. Neste acórdão, relativo ao segundo parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, que regulamenta o direito do livre acesso ao emprego dos filhos dos trabalhadores turcos no Estado-Membro em que obtiveram uma formação profissional, o Tribunal de Justiça declarou, com efeito, que, no momento em que o filho termina os seus estudos e adquire o direito, directamente conferido pela referida decisão, de aceder ao mercado de emprego do Estado-Membro de acolhimento e, em consequência, de aí obter autorização de residência para esse efeito, não é necessário que o respectivo progenitor possua ainda a qualidade de trabalhador, nem sequer que ainda resida no território do referido Estado, desde que, no passado, aí tenha trabalhado regularmente durante pelo menos três anos.

45 É certo que esse direito de residência, enquanto corolário do direito de acesso ao mercado de trabalho e de exercício efectivo de um emprego, não é ilimitado.

46 Em primeiro lugar, o próprio n._ 1 do artigo 14._ da Decisão n._ 1/80 confere a possibilidade de os Estados-Membros estabelecerem, em caso individuais e na presença de uma justificação adequada, restrições à presença de um migrante turco no território do Estado-Membro de acolhimento quando, pelo seu comportamento pessoal, constitua um perigo efectivo e grave para a ordem pública, a segurança ou a saúde públicas.

47 O órgão jurisdicional de reenvio constatou contudo que, no processo principal, tal disposição não constituía obstáculo à prorrogação da autorização de residência de S. Ergat.

48 Em segundo lugar, o membro da família devidamente autorizado a juntar-se a um trabalhador turco num Estado-Membro, que, porém, abandone o território do Estado de acolhimento durante um período significativo e sem motivos legítimos (v., a este respeito, acórdão Kadiman, já referido, n._ 48), perde em princípio o estatuto jurídico que adquirira nos termos do primeiro parágrafo do artigo 7._

49 Daqui decorre, por um lado, que as autoridades do Estado-Membro em causa têm o direito de exigir que o interessado, caso pretenda ulteriormente instalar-se no referido Estado, apresente novo pedido no sentido de ser autorizado ou a juntar-se ao trabalhador turco se continuar a dele depender, ou a ser admitido para trabalhar com fundamento no artigo 6._ da Decisão n._ 1/80.

50 Por outro lado, em caso de contestação, incumbe regra geral ao membro da família, que pretenda prevalecer-se dos direitos em matéria de emprego que lhe são conferidos pelo primeiro parágrafo do artigo 7._, sem que disponha de uma autorização de residência válida, provar por todos os meios que se manteve no território do Estado-Membro de acolhimento ou que apenas o abandonou por motivos legítimos.

51 No que se refere ao regresso de S. Ergat à Turquia durante cerca de um ano a partir de Agosto de 1992, há que constatar que, para além do facto de tal circunstância, posterior à data do pedido de prorrogação da autorização de residência não ser, em qualquer caso, susceptível de justificar o respectivo indeferimento, não se impondo pois perguntar se o interessado partiu de livre vontade ou por força da ameaça de expulsão de que era objecto, é pacífico que as autoridades alemãs competentes não condicionaram a sua readmissão na Alemanha à emissão de nova autorização de entrada, pelo que S. Ergat pôde exercer um novo emprego com fundamento na autorização de trabalho por prazo ilimitado que obtivera em 1989.

52 No que se refere mais especificamente a uma situação como a 0em causa no processo principal, em que o Estado-Membro de acolhimento se recusou a prorrogar a autorização de residência temporária de um nacional turco com fundamento em que deixara de ser titular durante algum tempo de uma autorização de residência válida, é certo que os Estados-Membros têm a faculdade de exigir que os estrangeiros presentes no seu território possuam, por um lado, uma autorização de residência válida e, por outro, quando tal autorização seja concedida por prazo determinado, que apresentem em tempo útil o respectivo pedido de prorrogação.

53 Essas obrigações que estão assim a cargo dos estrangeiros correspondem, no essencial, a exigências inerentes à gestão administrativa.

54 Com efeito, o direito comunitário não afastou a competência dos Estados-Membros relativamente às medidas destinadas a assegurar o exacto conhecimento, pelas autoridades nacionais, dos movimentos de população que afectam o seu território (v., por analogia, o acórdão de 7 de Julho de 1976, Watson e Belmann, 118/75, Colect., p. 465, n._ 17).

55 Além disso, os Estados-Membros mantêm-se sempre em princípio competentes para sancionar a violação de tais obrigações.

56 A este respeito, resulta de jurisprudência constante, relativa ao incumprimento de formalidades exigidas para a verificação do direito de estada de um trabalhador protegido pelo direito comunitário, que os Estados-Membros podem decerto sujeitar a inobservância das obrigações dessa natureza a sanções comparáveis às que se apliquem a infracções nacionais de menor importância, mas que seria injustificado prever uma sanção desproporcionada que criaria um entrave a esse direito de residência (v., por analogia, os acórdãos de 3 de Julho de 1980, Pieck, 157/79, Recueil., p. 2171, n._ 19, e de 12 de Dezembro de 1989, Messner, C-265/88, Colect., p. 4209, n._ 14).

57 É esse, nomeadamente, o caso de uma pena de prisão e, por maioria de razão, de expulsão que constitui a negação mesmo do direito de residência conferido e garantido pela Decisão n._ 1/80 (v., por analogia, os acórdãos já referidos Watson e Belmann, n._ 20, Pieck, n._ 19, e Messner, n._ 14).

58 Como resulta já dos n.os 40 a 43 do presente acórdão, os Estados-Membros não têm, pelo contrário, o poder de limitar o direito directamente conferido pelo direito comunitário ao nacional turco de aceder livremente a qualquer actividade profissional e, correlativamente, de residir para esse efeito no território do Estado-Membro de acolhimento, recusando-se a prorrogar a autorização de residência do interessado com o fundamento de este a ter apresentado fora de prazo.

59 No que se refere ao processo principal, cabe recordar antes de mais não ter sido objecto de contestação que S. Ergat preenche todas as condições para beneficiar dos direitos conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80.

60 Saliente-se, em seguida, que o interessado se encontrava numa situação estável e não precária na data de expiração da sua última autorização de residência e que teria obtido a respectiva prorrogação sem dificuldade se tivesse apresentado em tempo útil o respectivo pedido.

61 Importa acrescentar, por último, que a concessão de uma autorização de residência não constitui, em qualquer caso, o fundamento do direito de residência, que é directamente conferido pela Decisão n._ 1/80, independentemente da emissão pelas autoridades do Estado-Membro de acolhimento desse documento específico, que mais não faz do que atestar a existência de tal direito.

62 É com efeito jurisprudência constante que, para efeitos de reconhecimento do direito de residência, a autorização de residência apenas pode ter mero valor declaratório e probatório (v., neste sentido, o acórdão de 6 de Junho de 1995, Bozkurt, C-434/93, Colect., p. I-1475, n.os 29 e 30, e acórdãos já referidos Günaydin, n._ 29, Ertanir, n._ 55, e Birden, n._ 65).

63 Nestas condições, um documento desse tipo não pode ser assimilado, para estrangeiros que retiram os seus direitos da Decisão n._ 1/80, a uma autorização de residência implicando um poder de apreciação das autoridades nacionais, como previsto para a generalidade dos estrangeiros (v., por analogia, o acórdão de 14 de Junho de 1977, Sagulo e o., 8/77, Colect., p. 517, n._ 8).

64 O facto de as sucessivas autorizações de residência de S. Ergat apenas lhe terem sido concedidas por prazo determinado é, pois, destituído de qualquer relevância.

65 Em consequência, o lapso de tempo durante o qual a autorização de residência de S. Ergat deixou de ter validade não pode em qualquer caso ser considerado pelas autoridades do Estado-Membro de acolhimento como um período de residência irregular, susceptível de lhe fazer perder o benefício do direito de residência que lhe é directamente conferido pela Decisão n._ 1/80 a fim de lhe permitir continuar a exercer o direito de livre acesso a qualquer actividade assalariada da sua escolha, nos termos do segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da referida decisão.

66 Tal como o Governo francês sustentou na audiência, qualquer outra interpretação seria aliás contraditória com o facto de S. Ergat ser titular de uma autorização de trabalho por prazo ilimitado desde 1989.

67 Tendo em conta o conjunto de considerações precedentes, cabe responder à questão prejudicial que um cidadão turco, autorizado a entrar num Estado-Membro a título de reagrupamento familiar com um trabalhador turco inserido no mercado regular de trabalho desse Estado, que aí tenha residido legalmente durante mais de cinco e exercido, com algumas interrupções, diversos empregos regulares, não perde o benefício dos direitos que lhe são conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80 e, em especial, o direito à prorrogação da autorização de residência no Estado-Membro de acolhimento, mesmo que a autorização de residência esteja caducada na data em que apresentou o pedido da sua prorrogação que foi indeferido pelas autoridades nacionais competentes.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

68 As despesas efectuadas pelos Governos alemão e francês e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

pronunciando-se sobre a questão submetida pelo Bundesverwaltungsgericht, por despacho de 15 de Julho de 1997, declara:

Um cidadão turco, autorizado a entrar num Estado-Membro a título de reagrupamento familiar com um trabalhador turco inserido no mercado regular de trabalho desse Estado, que aí tenha residido legalmente durante mais de cinco e exercido, com algumas interrupções, diversos empregos regulares, não perde o benefício dos direitos que lhe são conferidos pelo segundo travessão do primeiro parágrafo do artigo 7._ da Decisão n._ 1/80, de 19 de Setembro de 1980, relativa ao desenvolvimento da associação, adoptada pelo Conselho de Associação criado pelo Acordo de Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, e, em especial, o direito à prorrogação da autorização de residência no Estado-Membro de acolhimento, mesmo que a autorização de residência esteja caducada na data em que apresentou o pedido da sua prorrogação que foi indeferido pelas autoridades nacionais competentes.