Acórdão do Tribunal de 10 de Junho de 1997. - Parlamento Europeu contra Conselho da União Europeia. - Nacionais dos países terceiros - Processo legislativo - Consulta do Parlamento Europeu. - Processo C-392/95.
Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-03213
Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória
1 Actos das instituições - Processo de elaboração - Consulta regular do Parlamento - Formalidade essencial - Nova consulta em caso de modificação essencial feita à proposta inicial - Notoriedade das pretensões do Parlamento - Irrelevância
2 Aproximação das legislações - Legislações uniformes - Obrigação de visto para os nacionais dos países terceiros - Regulamento n._ 2317/95 - Diferenças essenciais em relação à proposta inicial da Comissão - Falta de nova consulta do Parlamento - Violação de formalidades essenciais - Ilegalidade
(Tratado CE, artigo 100._-C; Regulamento n._ 2317/95 do Conselho)
3 Recurso de anulação - Acórdão de anulação - Efeitos - Limitação pelo Tribunal de Justiça - Regulamento - Dever do Conselho de sanar num prazo razoável a irregularidade essencial na origem da anulação
(Tratado CE, artigos 173._ e 174._, segundo parágrafo)
4 A consulta regular do Parlamento nos casos previstos pelo Tratado constitui uma formalidade essencial cuja inobservância implica a nulidade do acto em questão. A participação efectiva do Parlamento no processo legislativo da Comunidade, segundo os procedimentos previstos no Tratado, representa efectivamente um elemento essencial do equilíbrio institucional pretendido pelo Tratado. Esta competência constitui a expressão de um princípio democrático fundamental segundo o qual os povos participam no exercício do poder por intermédio de uma assembleia representativa.
A exigência de consulta do Parlamento Europeu durante o processo legislativo, nos caso previstos pelo Tratado, implica a exigência de uma nova consulta sempre que o texto finalmente adoptado, considerado no seu conjunto, se afaste na sua substância daquele sobre o qual já foi consultado o Parlamento, com excepção dos casos em que as modificações correspondam, na essência, às pretensões formuladas pelo próprio Parlamento.
Não é possível à instituição que adopta o texto final não cumprir essa exigência pelo facto de conhecer perfeitamente as pretensões do Parlamento relativamente aos pontos essenciais em causa, porque isso levaria a comprometer gravemente a participação efectiva do Parlamento no processo legislativo da Comunidade, que é essencial para a manutenção do equilíbrio institucional pretendido pelo Tratado, e significaria não ter em conta a influência que pode ter na adopção do acto em causa a consulta regular do Parlamento.
5 Resulta da comparação da proposta da Comissão na origem do Regulamento n._ 2317/95 e do seu conteúdo, tal como foi adoptado pelo Conselho, que, tratando-se de determinar os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de um visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros e da elaboração de uma lista comum para esse efeito, a proposta da Comissão só previa, depois de 30 de Junho de 1996, a existência dessa lista designando de forma limitada os países terceiros cujos nacionais são sujeitos à obrigação de visto, ao passo que o regulamento permite aos Estados-Membros manter, durante um período indeterminado, a sua lista dos países terceiros que não figuram na lista comum cujos nacionais são sujeitos à referida obrigação.
Essa alteração é essencial. Afectando o sistema do projecto no seu conjunto, pressupunha, tratando-se de um processo legislativo regido pelo artigo 100._-C do Tratado, uma nova consulta do Parlamento. O facto de não ter assim procedido constitui uma violação de formalidades essenciais que deve implicar a anulação do Regulamento n._ 2317/95.
6 A necessidade de evitar que a anulação, por violação da obrigação de proceder a uma consulta regular do Parlamento, do Regulamento n._ 2317/95, que determina quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros, crie uma descontinuidade na harmonização das disposições nacionais em matéria de vistos e importantes motivos de segurança jurídica justificam que o Tribunal de Justiça exerça o poder que lhe confere expressamente o artigo 174._, segundo parágrafo, do Tratado em caso de anulação de um regulamento e decida manter provisoriamente os efeitos do regulamento anulado até que o Conselho adopte um novo regulamento, tendo este, todavia, o dever de sanar, num prazo razoável, a irregularidade cometida.
No processo C-392/95,
Parlamento Europeu, representado por Johann Schoo, chefe de divisão no Serviço Jurídico, e José-Luis Rufas Quintana, administrador principal no mesmo serviço, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no Secretariado-Geral, Kirchberg
recorrente,
contra
Conselho da União Europeia, representado por Jean-Paul Jacqué, director do Serviço Jurídico, e Michael Bishop, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Bruno Eynard, director da Direcção dos Assuntos Jurídicos do Banco Europeu de Investimento, 100, boulevard Konrad Adenauer,
recorrido,
apoiado pela
República Francesa, representada por Catherine de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Anne Bourgoing, encarregada de missão na mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 9, boulevard du Prince Henri,
interveniente,
que tem por objecto a anulação do Regulamento n._ 2317/95 do Conselho, de 25 de Setembro de 1995, que determina quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros (JO L 234, p. 1),
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, G. F. Mancini, e J. L. Murray, presidentes de secção, P. J. G. Kapteyn (relator), C. Gulmann, D. A. O. Edward, J.-P. Puissochet, G. Hirsch, P. Jann, M. Wathelet e R. Schintgen, juízes,
advogado-geral: N. Fennelly,
secretário: D. Lauterman-Hubeau, administradora-principal,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações das partes na audiência de 4 de Fevereiro de 1997,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 20 de Março de 1997,
profere o presente
Acórdão
1 Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 15 de Dezembro de 1995, o Parlamento Europeu, nos termos do artigo 173._ do Tratado CE, pediu a anulação do Regulamento (CE) n._ 2317/95 do Conselho, de 25 de Setembro de 1995, que determina quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros (JO L 234, p. 1, a seguir «regulamento»).
2 O regulamento é baseado no artigo 100._-C do Tratado CE e tem a sua origem numa proposta de regulamento que determina os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de um visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros, que a Comissão apresentou ao Conselho em 10 de Dezembro de 1993 (JO 1994, C 11, p. 15).
3 O texto dessa proposta tem a seguinte redacção:
«O Conselho da União Europeia,
Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia e, nomeadamente, o seu artigo 100._ C,
Tendo em conta a proposta da Comissão,
Tendo em conta o parecer do Parlamento Europeu,
Considerando que o artigo 100._-C do Tratado estabelece que a Comunidade determinará quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros; que a sua posição no Tratado revela que este artigo faz parte integrante das disposições respeitantes ao mercado interno;
Considerando que, em conformidade com o terceiro parágrafo do artigo 3._-B do Tratado, a acção da Comunidade não deve exceder o necessário para atingir os objectivos do Tratado; que o reconhecimento mútuo pelos Estados-Membros de vistos emitidos por outros Estados-Membros, necessário para assegurar que o artigo 100._-C produza plenamente os seus efeitos, constitui uma medida de acompanhamento essencial para a consecução do objectivo estabelecido no artigo 7._-A no que respeita à livre circulação das pessoas;
Considerando que os países terceiros devem ser classificados em função da sua situação política e económica e das relações que mantêm com a Comunidade e com os Estados-Membros, tomando em consideração o grau de harmonização atingido a nível dos Estados-Membros;
Considerando que o artigo 100._-C consiste em harmonizar as regulamentações e práticas dos Estados-Membros nesta matéria; que as divergências existentes entre as regulamentações e práticas dos Estados-Membros devem ser autorizadas por um período limitado enquanto medidas transitórias, desde que não sejam susceptíveis de dar origem a controlos contrários ao disposto no artigo 7._-A; que deveria estabelecer-se que este regime transitório deverá terminar em 30 de Junho de 1996 e que antes dessa data o Conselho deverá decidir em relação a cada país terceiro se os seus nacionais serão objecto da exigência de visto ou se dela deverão ser isentos;
Considerando que, com vista a assegurar, uma gestão transparente do sistema, bem como a informação das pessoas interessadas, as medidas adoptadas pelos Estados-Membros ao abrigo do regime transitório excepcional devem ser notificadas aos outros Estados-Membros e à Comissão; que, pelas mesmas razões, esta informação deve também ser publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias;
Considerando que a informação prevista no n._ 3 do artigo 1._ do presente regulamento deve ser publicada antes que os n.os 1 e 2 do artigo 1._ e o artigo 2._ se tornem aplicáveis; que, por conseguinte, é necessário adiar a aplicação das referidas disposições por um mês relativamente à entrada em vigor do presente regulamento,
adoptou o presente regulamento:
Artigo 1._
1. Os nacionais dos países terceiros enumerados no anexo ao presente regulamento devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros.
2. Até 30 de Junho de 1996, os Estados-Membros decidirão se exigirão ou não vistos aos nacionais de países terceiros que não constem do anexo. Antes dessa data, o Conselho decidirá, em conformidade com o procedimento estabelecido no artigo 100._-C, se acrescenta esses países à referida lista ou se isenta os seus nacionais da exigência de visto.
3. No prazo de dez dias úteis a contar da entrada em vigor do presente regulamento, os Estados-Membros notificarão aos outros Estados-Membros e à Comissão as medidas que tenham adoptado ao abrigo do n._ 2. Quaisquer novas medidas adoptadas em conformidade com o n._ 2 devem do mesmo modo ser notificadas no prazo de cinco dias úteis. A Comissão publicará as informações notificadas nos termos do presente número no Jornal Oficial das Comunidades Europeias.
Artigo 2._
Um Estado-Membro não pode exigir um visto a uma pessoa que pretenda transpor as suas fronteiras externas e seja detentor de um visto emitido por outro Estado-Membro, desde que tal visto seja válido em toda a Comunidade.
Artigo 3._...
Artigo 4._... .»
4 Por ofício de 11 de Janeiro de 1994, o Conselho consultou o Parlamento Europeu acerca de proposta da Comissão. Na resolução legislativa que contém o parecer do Parlamento de 21 de Abril de 1994 (JO C 128, p. 350), o Parlamento propôs quatorze alterações e solicitou que fosse novamente consultado no caso de o Conselho pretender fazer alterações essenciais à proposta da Comissão.
5 Na sua alteração 3, o Parlamento insistiu para que a determinação dos países terceiros incluídos na lista negativa seja baseada em critérios claramente compreendidos, objectivos e publicamente conhecidos para que os Estados-Membros não possam impor a obrigação de visto aos países que por motivos objectivos foram excluídos da nessa lista. Nas alterações 5 e 15, incluiu uma definição das diferentes categorias de vistos referidos no regulamento proposto. Na alteração 7, o Parlamento encurtou o período fixado aos Estados-Membros para decidirem se exigem ou não um visto aos nacionais dos países terceiros que não fazem parte da lista anexa e insistiu no sentido de ser consultado sobre cada actualização. Na alteração 8, reforçou a proibição feita a um Estado-Membro de exigir um visto de uma pessoa que seja detentora de um visto uniforme ou de um título de residência emitido por outro Estado-Membro e que pretenda fazer uma permanência de curta duração no seu território. Por último, nas alterações 9 e 10, sugeriu que se fixassem as condições para a emissão dos vistos e fossem previstos recursos no caso de recusa de concessão do visto.
6 Em 25 de Setembro de 1995, o Conselho adoptou o regulamento que tem a seguinte redacção:
«O Conselho da União Europeia
Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia e, nomeadamente, o seu artigo 100._-C,
Tendo em conta a proposta da Comissão...
Tendo em conta o parecer do Parlamento Europeu...
Considerando que, por força do artigo 100._-C do Tratado, o Conselho determina quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros;
Considerando que a elaboração da lista comum constante do anexo do presente regulamento constitui um importante passo para a harmonização das políticas em matéria de vistos; que o segundo parágrafo do artigo 7._A do Tratado dispõe, nomeadamente, que o mercado interno compreende um espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação de pessoas é assegurada de acordo com as disposições do Tratado; que os outros aspectos da harmonização das políticas de vistos, nomeadamente as condições de emissão, são determinados no âmbito do título VI do Tratado da União Europeia;
Considerando que na elaboração da lista comum devem ser tidos prioritariamente em conta os riscos relacionados com a segurança e com a imigração ilegal; que, além disso, as relações internacionais dos Estados-Membros com os países terceiros desempenham igualmente um papel;
Considerando que será conveniente determinar, no âmbito do título VI do Tratado da União Europeia, os princípios segundo os quais um Estado-Membro não pode exigir visto a uma pessoa que deseje transpor as suas fronteiras externas, se essa pessoa possuir um visto emitido por outro Estado-Membro, que corresponda às condições harmonizadas de emissão de vistos e seja válido em toda a Comunidade, ou se essa pessoa possuir um documento apropriado emitido por um Estado-Membro;
...
Considerando que o aditamento de novas entidades a essa lista deve tomar em consideração as implicações diplomáticas e as orientações tomadas pela União Europeia; que, de qualquer forma, a inscrição de um país terceiro na lista comum em nada afecta o seu estatuto internacional;
Considerando que a determinação dos países terceiros cujos nacionais devam ser detentores de visto para transpor as fronteiras externas dos Estados-Membros deve ser efectuada de forma progressiva; que os Estados-Membros envidarão continuamente esforços no sentido de harmonizar as respectivas políticas de vistos em relação aos países terceiros que não constam da lista comum; que a concretização da livre circulação de pessoas prevista no artigo 7._A do Tratado não deve ser afectada pelas presentes disposições; que, após um período de cinco anos, a Comissão deverá apresentar um relatório sobre o estado da harmonização;
Considerando que, com vista a assegurar a transparência do sistema e a informação das pessoas interessadas, os Estados-Membros devem comunicar aos outros Estados-Membros e à Comissão as medidas por si adoptadas no âmbito do presente regulamento; que, pelas mesmas razões, essas informações devem igualmente ser publicadas no Jornal Oficial das Comunidades Europeias;
Considerando que as informações previstas no n._ 4 do artigo 2._ e no n._ 2 do artigo 4._ devem ser publicadas antes da entrada em vigor das outras disposições do presente regulamento; que, por conseguinte, o n._ 4 do artigo 2._ e o n._ 2 do artigo 4._ serão aplicáveis antes das outras disposições do presente regulamento,
adotpou o presente regulamento:
Artigo 1._
1) Os nacionais dos países terceiros que constam da lista comum em anexo devem ser portadores de um visto para transpor as fronteiras externas dos Estados-Membros.
2) Os nacionais de países criados a partir de países constantes da lista comum ficarão sujeitos aos requisitos constantes do n._ 1, até que o Conselho tome qualquer decisão em contrário nos termos do artigo 100._-C do Tratado.
Artigo 2._
1) Os Estados-Membros determinarão se os nacionais de países terceiros que não constem da lista comum ficam sujeitos à obrigação de visto.
2) Os Estados-Membros determinarão se os apátridas e os refugiados beneficiando oficialmente desse estatuto ficam sujeitos à obrigação de visto.
3) Os Estados-Membros determinarão se os titulares de um passaporte ou de um documento de viagem emitido por uma entidade ou autoridade territorial que não seja reconhecida como Estado por todos os Estados-Membros ficam sujeitos à obrigação de visto, caso essa entidade ou autoridade territorial não conste da lista comum.
4) Os Estados-Membros comunicarão aos outros Estados-Membros e à Comissão, no prazo de dez dias úteis após a entrada em vigor do presente número, as medidas que tiverem tomado por força do disposto nos n.os 1, 2 e 3. As medidas tomadas ulteriormente em cumprimento ao disposto no n._ 1 serão de igual modo comunicadas dentro de um período de cinco dias úteis.
A Comissão publicará no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, para informação, as medidas notificadas nos termos do presente número, assim como a respectiva actualização.
Artigo 3._
Cinco anos após a entrada em vigor do presente regulamento, a Comissão apresentará um relatório sobre a situação da harmonização da política dos Estados-Membros em matéria de vistos em relação aos países terceiros não incluídos na lista comum e, se necessário, apresentará ao Conselho propostas de medidas complementares necessárias para realizar o objectivo de harmonização previsto no artigo 100._C.
Artigo 4._...
Artigo 5._... Artigo 6._
O presente regulamento não prejudica uma harmonização mais completa entre os Estados-Membros, que vá além da lista comum, no que se refere à determinação dos países terceiros cujos nacionais devam possuir um visto para transpor as fronteiras externas.
Artigo 7._
O presente regulamento entra em vigor seis meses após a sua publicação no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, com excepção do n._ 4 do seu artigo 2._ e do n._ 2 do seu artigo 4._, que entrarão em vigor no dia seguinte ao da publicação.»
Quanto à anulação do regulamento
7 Em apoio do seu recurso, o Parlamento Europeu invoca uma violação do seu direito de participar no processo legislativo comunitário, resultante da omissão do Conselho de o consultar uma segunda vez antes de adoptar o regulamento em questão. Essa nova consulta seria necessária, no âmbito do procedimento previsto no artigo 100._-C do Tratado, uma vez que, como no caso em apreço, o texto adoptado pelo Conselho contém alterações essenciais relativamente à proposta da Comissão.
8 A este respeito, o Parlamento sustenta em primeiro lugar que, enquanto o artigo 1._, n._ 2, da proposta da Comissão previa a elaboração, antes de 30 de Junho de 1996, de uma lista definitiva dos países cujos nacionais deveriam ser detentores de um visto para transporem as fronteiras externas da Comunidade, o artigo 2._ do regulamento permite aos Estados-Membros decidir se os nacionais dos países terceiros que não figuram na lista comum estão sujeitos ou não à obrigação de visto. O Parlamento acrescenta que o novo sistema adoptado conduziu à elaboração de uma lista expressa, que é objecto do anexo do regulamento, e de listas tácitas, na medida em que cada Estado-Membro poderá elaborar a sua própria lista. Assim, o regulamento ter-se-á afastado do objectivo de harmonização em matéria de vistos fixado no artigo 100._-C do Tratado.
9 Em seguida, o Parlamento observa que a lista dos países que figura no anexo da proposta foi consideravelmente restringida no regulamento, uma vez que o Conselho reduziu de 126 para 98 o número dos países que nela constam.
10 Por último, o Parlamento alega que o artigo 2._ da proposta da Comissão que previa o reconhecimento mútuo dos vistos emitidos pelos Estados-Membros foi suprimido. Além disso, sublinha que, nos termos do segundo e quarto considerandos do regulamento, esses elementos de harmonização das políticas em matéria de vistos relevam do Título VI do Tratado da União Europeia.
11 Em contrapartida, o Conselho, apoiado pelo Governo francês, considera, em primeiro lugar, que o artigo 2._, n._ 1, do regulamento, apenas especifica o alcance da proposta da Comissão, segundo a qual na expectativa de uma decisão do Conselho quanto aos países terceiros que não figuram no anexo cada Estado-Membro é livre de decidir se impõe ou não a obrigação de visto aos nacionais desses países. O Conselho acrescenta que a única diferença que existe a este respeito entre a proposta e o regulamento reside no facto de este último prever um período transitório mais longo durante o qual os Estados-Membros são competentes para regulamentar as exigências de visto relativas aos nacionais dos países terceiros que não figuram na lista comum.
12 Em segundo lugar, o Conselho observa que a lista comum dos países terceiros só foi alterada pontualmente; com efeito, apenas três países foram acrescentados e as não inclusões na lista são respeitantes a antigas colónias de determinados Estados-Membros cujos fluxos migratórios são baixos.
13 Por último, o Conselho sublinha que o reconhecimento mútuo dos vistos não estava previsto na proposta da Comissão. O artigo 2._ dessa proposta limitava-se a especificar que o reconhecimento mútuo de um visto só podia ocorrer na medida em que este último fosse válido em toda a Comunidade, sem todavia determinar as condições em que um visto devia ser válido em toda a Comunidade. Tendo esta disposição apenas um efeito declaratório, foi necessário suprimi-la, numa preocupação de clareza jurídica.
14 Há que recordar, que a consulta regular do Parlamento nos casos previstos pelo Tratado constitui uma formalidade essencial cuja inobservância implica a nulidade do acto em questão. A participação efectiva do Parlamento no processo legislativo da Comunidade, segundo os procedimentos previstos no Tratado, representa efectivamente um elemento essencial do equilíbrio institucional pretendido pelo Tratado. Esta competência constitui a expressão de um princípio democrático fundamental segundo o qual os povos participam no exercício do poder por intermédio de uma assembleia representativa (v., nomeadamente, acórdão de 5 de Julho de 1995, Parlamento/Conselho, C-21/94, Colect., p. I-1827, n._ 17).
15 Segundo jurisprudência constante, a exigência de consulta do Parlamento durante o processo de legiferação, nos caso previstos pelo Tratado, implica a exigência de uma nova consulta sempre que o texto finalmente adoptado, considerado no seu conjunto, se afaste na sua substância daquele sobre o qual foi consultado o Parlamento, com excepção dos casos em que as modificações correspondam, na essência, às pretensões formuladas pelo próprio Parlamento (v., nomeadamente, acórdãos de 1 de Julho de 1994, Parlamento/Conselho, C-388/92, Colect., p. I-2067, n._ 10 e de 5 de Outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C-280/93, Colect., p. I-4973, n._ 38).
16 Assim há que examinar se as alterações referidas pelo Parlamento dizem ou não respeito à própria essência do texto considerado no seu conjunto.
17 A este respeito há que recordar que a proposta da Comissão, sobre a qual o Parlamento deu o seu parecer previa no artigo 1._, n._ 1, que os nacionais dos países enumerados na lista anexa deveriam ser detentores de um visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros. Nos termos do n._ 2 dessa disposição, os Estados-Membros podiam decidir, até 30 de Junho de 1996, exigir um visto aos nacionais dos países terceiros que não constassem da lista referida no n._ 1. Antes dessa data, o Conselho devia decidir no sentido de acrescentar cada um desses países a essa lista ou isentar os seus nacionais da exigência de visto.
18 Em contrapartida, o regulamento, no seu artigo 2._, n._ 1, dispõe que os Estados-Membros determinarão se os nacionais de países terceiros que não constem da lista comum ficam sujeitos ou não à obrigação de visto.
19 Resulta da comparação da proposta da Comissão e do regulamento que, segundo este último, a determinação pelos Estados-Membros dos países terceiros que não figuram na lista comum cujos cidadãos são obrigados a obter um visto não está sujeita ao limite temporal que figura no artigo 1._, n._ 2, da proposta.
20 Como o advogado-geral o observou no n._ 28 das suas conclusões, enquanto a proposta da Comissão só previa, depois de 30 de Junho de 1996, a existência de uma lista comum designando de forma limitada os países terceiros cujos nacionais deviam ser detentores de um visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros, o regulamento permite aos Estados-Membros manter durante um período indeterminado a sua lista dos países terceiros que não figuram na lista comum cujos nacionais são sujeitos à obrigação de visto. Estas alterações afectam o próprio cerne do dispositivo estabelecido e devem ser qualificadas de essenciais.
21 Apesar disso, o Conselho considera que, mesmo no caso em que o texto finalmente adoptado, considerado no seu conjunto, se afasta na sua própria essência do texto sobre o qual o Parlamento foi consultado, é dispensado de consultar novamente essa instituição, desde que, como no caso em apreço, conheça perfeitamente as suas intenções acerca dos aspectos essenciais em causa.
22 A este respeito, há que recordar que, como o Tribunal de Justiça já decidiu no acórdão de 5 de Julho de 1995, Parlamento/Conselho, já referido, no n._ 26, a consulta regular do parlamento nos casos previstos no Tratado constitui um dos meios que lhe permitem participar efectivamente no processo legislativo da Comunidade; ora, acolher a tese do Conselho levaria a comprometer gravemente essa participação, essencial para a manutenção do equilíbrio institucional pretendido pelo Tratado e significaria não ter em conta a influência que pode ter na adopção do acto em causa a consulta regular do Parlamento.
23 Dado que a alteração acima examinada, que afecta o sistema do projecto no seu conjunto, é suficiente para exigir uma nova consulta do Parlamento, não é necessário examinar os outros argumentos invocados pelo Parlamento.
24 Assim, há que concluir que o facto de o Parlamento não ter sido consultado uma segunda vez no processo legislativo previsto no artigo 100._-C do Tratado constitui uma violação das formalidades essenciais que deve implicar a anulação do regulamento.
Quanto à manutenção dos efeitos do regulamento
25 Na sua contestação, o Conselho pediu ao Tribunal de Justiça, no caso de anulação do regulamento, para manter os efeitos deste até que o Conselho adopte uma nova regulamentação. A este respeito, o Parlamento não apresentou observações.
26 É de deferir este pedido. Como o advogado-geral salientou no n._ 40 das conclusões, a necessidade de evitar uma descontinuidade na harmonização das disposições nacionais em matéria de vistos e importantes motivos de segurança jurídica justificam que o Tribunal de Justiça exerça o poder, que lhe confere expressamente o artigo 174._, segundo parágrafo, do Tratado CE em caso de anulação de um regulamento, de manter provisoriamente os efeitos do regulamento anulado até que o Conselho adopte um novo regulamento.
27 A este respeito, todavia, deve-se recordar que o Conselho tem o dever de corrigir, num prazo razoável, a irregularidade cometida (acórdão de 5 de Julho de 1995, Parlamento/Conselho, já referido, n._ 33).
Quanto às despesas
28 Por força do artigo 69._, n._ 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Tendo o Conselho sido vencido, há que condená-lo nas despesas. Nos termos do n._ 4, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, a República Francesa, que interveio no processo, suportará as suas despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
decide:
29 É anulado o Regulamento (CE) n._ 2317/95 do Conselho, de 25 de Setembro de 1995, que determina quais os países terceiros cujos nacionais devem ser detentores de visto para transporem as fronteiras externas dos Estados-Membros.
30 Os efeitos do regulamento anulado mantêm-se até que o Conselho da União Europeia adopte uma nova regulamentação na matéria.
31 O Conselho é condenado nas despesas.
32 A República Francesa suportará as suas despesas.