CONCLUSÕES DO ADVOGADO-GERAL

GEORGES COSMAS

apresentadas em 4 de Julho de 1996 ( *1 )

1. 

No processo ora em apreço, o Tribunal é solicitado pelo Polymeles Protodikeio Athinon (tribunal colectivo de primeira instância de Atenas) a interpretar, pela primeira vez, o artigo 7.o, n.o 2, da Directiva 86/653/CEE do Conselho, de 18 de Dezembro de 1986, relativa à coordenação do direito dos Estados-Membros sobre os agentes comerciais (profissionais independentes) ( 1 ) (a seguir «directiva»).

I — O processo principal

2.

Como resulta do despacho de reenvio, G. Kontogeorgas intentou, no Polymeles Protodikeio Athinon, uma acção contra a sociedade anónima com sede na freguesia de Neochorouda em Tessalónica, com a denominação «Kartonpak AE Anonymos Viomichaniki kai Emboriki Etairia Eidon Syskevasias» (a seguir «Kartonpak»). Na petição desta acção, o autor expõe o seguinte: em 10 de Fevereiro de 1981, celebrou com a ré um contrato de representação comercial, pelo qual se comprometeu a ser, a partir de 1 de Janeiro de 1981, agente comercial da ré para a colocação dos produtos desta nas províncias de Achaïa e Ileïa, contra uma comissão de 3% sobre as vendas nesta zona. Segundo alega o autor, a ré, a partir de 1988, distribuiu as suas mercadorias a clientes desta região, escondendo ao autor as respectivas transacções, com o objectivo de o privar das comissões a que tinha direito. O autor alega ainda que a ré rescindiu o contrato que os ligava sem respeitar o pré-aviso acordado de dois meses. O autor pede, pois, que a ré seja condenada a pagar-lhe um determinado montante a título de comissão e uma indemnização pelo desrespeito do prazo de pré-aviso de dois meses para a rescisão do contrato.

3.

A ré contesta as alegações do autor e alega, em conclusão dos articulados que apresentou no Polymeles Protodikeio Athinon, que: a) em 1985, a sociedade com a denominação «Anonymos Etairia kataskevis kai emborias kartokivotion kai loipon eidon syskevasias Kartonpak AE» fusionou com a sociedade «Saint Ritzis Elias AVEE», que tinha o mesmo objecto social que a sociedade ré, e que b) o autor não tinha direito a comissão porque, por um lado, os clientes a que ele se refere não são clientes por ele angariados, mas antigos clientes da sociedade Saint Ritzis e, por outro, porque alguns desses clientes não tinham a sua sede na zona em que o autor desenvolvia a sua actividade.

4.

O Polymcles Protodikeio Athinon considerou que sc colocava neste processo um problema de interpretação do direito comunitário e, concretamente, do artigo 7.o, n.o 2, da directiva c, portanto, decidiu suspender a instância e remeter ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.o do Tratado CE, determinadas questões prejudiciais.

II — As questões prejudiciais

5.

O Polymcles Protodikeio Athinon solicita ao Tribunal que responda às seguintes questões prejudiciais ( 2 )

«a)

No caso de a competência do agente comercial abranger um sector geográfico determinado, o seu direito a comissão também lhe advém das relações jurídicas criadas sem a sua intervenção, em qualquer fase, c independentemente de ter sido ou não ele próprio a angariar esses clientes, ou apenas das relações jurídicas criadas no seu sector de actividade, após a sua intervenção, c relativamente a clientes que ele próprio tenha angariado?

b)

Qual é o sentido da expressão ‘cliente pertencente’ a esse sector? Mais especificamente, se o cliente for uma sociedade cuja sede se encontre em local diferente daquele em que exerce a sua actividade empresarial e comercial, a palavra ‘pertencente’ aplica-se à sede ou ao local onde efectivamente exerce a sua actividade comercial e/ou eventualmente onde se encontram também as suas instalações fabris ou outros estabelecimentos seus, a favor dos quais foi constituída a relação jurídica relativamente à qual é solicitada a comissão, local este integrado no sector geográfico de actividade do agente comercial cm que a referida relação jurídica se constituiu c a partir da qual ele tem direito à comissão?» ( 3 )

III — Enquadramento jurídico

6.

O artigo 7.o da directiva determina, no seu n.o 1, o seguinte:

«Pelas operações comerciais concluídas durante a vigência do contrato de agencia, o agente comercial tem direito à comissão:

a)

se a operação tiver sido concluída cm consequência da sua intervenção, ou

b)

se a operação tiver sido concluída com um terceiro já seu anterior cliente para operações do mesmo género.»

7.

O n.o 2 do mesmo artigo, cuja interpretação é pedida no presente processo, prevê:

«O agente comercial tem igualmente direito à comissão por operações concluídas durante a vigência do contrato de agência:

se estiver encarregado de um sector geográfico ou de um grupo de pessoas determinadas,

ou se gozar de um direito de exclusividade para um sector geográfico ou um grupo de pessoas determinadas,

e a operação tiver sido concluída com um cliente pertencente a esse sector ou a esse grupo.

Os Estados-Membros devem inserir na sua lei uma ou outra das possibilidades previstas nos dois travessões anteriores.»

8.

O legislador helénico transpôs a regulamentação do artigo 7.o, n.o 2, da directiva para a ordem jurídica interna, através do artigo 6.o, n.o 1, do Decreto presidencial n.o 219/91 ( 4 ), que estabelece:

«O agente comercial tem direito à comissão por operações comerciais concluídas durante a vigência do contrato de agência se estiver encarregado de um sector geográfico e a operação tiver sido concluída com um cliente pertencente a esse sector» ( 5 ).

IV — Observações sobre a admissibilidade

9.

Na audiência, a sociedade ré no processo principal, referindo-se a quanto tinha exposto a este respeito na fase esenta do processo, sustentou que as questões prejudiciais não deveriam receber resposta quanto ao mérito. E isto porque, na sua opinião, tal não é objectivamente necessário à solução do litígio no processo principal, uma vez que o autor no processo principal nunca teve uma relação contratual com a sociedade que fusionou com a Kartonpak, a Saint Ritzis c, portanto, não tem direito, em nenhum caso, a comissão por contratos celebrados com clientes desta última sociedade.

10.

Com efeito, a ré tinha alegado no tribunal de reenvio (v. supra, n.o 3) que o pedido devia ser julgado improcedente, entre outras razões porque os clientes a que o autor se referia eram antigos clientes da sociedade Saint Ritzis, sociedade cm relação à qual o autor não tinha qualquer vínculo contratual. Apesar disso, o juiz nacional considerou (talvez por o autor ter invocado que «tem direito à comissão... independentemente da questão de saber se angariou ele próprio os clientes ou se estes eram clientes da sociedade... Saint Ritzis e de... não ter tido qualquer intervenção nas vendas com estes relacionadas») que, antes de decidir sobre a procedência ou improcedência das alegações da ré, deveria submeter ao Tribunal questões prejudiciais, para esclarecer o significado exacto do artigo 7.o, n.o 2, da directiva, reservando-se, como expressamente refere no despacho de reenvio, a faculdade de examinar «as excepções invocadas pela r黫caso os pedidos iniciais venham a revelar-se juridicamente fundados».

11.

Segundo a jurisprudência do Tribunal, compete ao tribunal nacional, tendo cm consideração as especificidades do processo pendente, apreciar a necessidade e a utilidade de uma decisão prejudicial ( 6 ), e igualmente escolher a fase do processo cm que essas questões devem ser formuladas ( 7 ). Pelo que, e dado que as questões prejudiciais submetidas pelo Polymeles Protodikcio Athinon não podem ser consideradas manifestamente destituídas de pertinência para a solução do litígio pendente, as alegações da ré no processo principal sobre o facto de estas questões não serem objectivamente necessárias à solução do litígio não merecem, de qualquer modo, acolhimento. E isto, tanto mais quanto este fundamento alegado pela ré se liga à apreciação de matéria de facto cujo diagnóstico (quando, como acontece no presente caso, existe desacordo entre as partes a esse respeito ( 8 )) constitui, no sistema definido pelo artigo 177.o do Tratado, uma função da exclusiva competência do tribunal nacional ( 9 ).

12.

A ré no processo principal sustentou, além disso, na audiência no Tribunal, que, a considerar admissíveis as questões prejudiciais, a primeira terá que ser reformulada. Segundo argumenta, terá que se admitir que, da interpretação do conjunto do despacho de reenvio, resulta que a questão do tribunal nacional é a de saber se, na acepção do artigo 7.o, n.o 2, segundo travessão, da directiva, tendo em consideração os artigos 17.o e 19.o da terceira directiva sobre as fusões de sociedades anónimas ( 10 ), o agente comercial tem direito a comissão por contratos concluídos com clientes de uma terceira sociedade que foi absorvida pela sociedade com a qual esse agente contratou.

13.

Quanto a este aspecto, bastará lembrar que, segundo jurisprudência assente, o artigo 177.o do Tratado distribui as competências no quadro da adopção de decisões prejudiciais de modo que o tribunal nacional é o único competente para definir o objecto das questões que pretende colocar; o Tribunal de Justiça não pode, por conseguinte, por sugestão de uma parte no processo principal, examinar questões que não lhe foram submetidas pelo tribunal nacional ou alargar o objecto das questões por este colocadas ( 11 ). No caso ora em apreço, o despacho de reenvio não contém elementos que permitam a interpretação, proposta pela ré no processo principal, da primeira questão colocada. Aceitar essa interpretação constituiria, de facto, um alargamento do objecto da questão que, pela razão exposta, não seria admissível.

14.

Antes de passar à questão de mérito, convirá afirmar o seguinte: o artigo 11.o do Decreto presidencial n.o 219/91 prevê disposições transitórias que correspondem às disposições transitórias previstas no n.o 1 do artigo 22.o da directiva. Nos termos do n.o 1 do artigo 11.o, o disposto no Decreto presidencial n.o 219/91 aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor. O n.o 2 do mesmo artigo dispõe, por outro lado: «Relativamente aos direitos e obrigações das partes decorrentes de contratos celebrados antes da entrada em vigor do presente decreto presidencial aplicar-se-ão as disposições deste decreto em 1 de Janeiro de 1994». Consequentemente, como o Decreto presidencial n.o 219/91 foi publicado no Jornal Oficial da República Helénica de 30 de Maio de 1991, o direito que estabelece este decreto aplica-se aos novos contratos, ou seja, aos contratos concluídos a partir desta data. Inversamente, o decreto presidencial não se aplica aos contratos anteriores, isto é, aos contratos celebrados antes dessa data, relativamente aos quais é previsto um período de transição que vai até 1 de Janeiro de 1994. Assim, até 31 de Dezembro de 1993, era o regime anterior que estava em vigor relativamente a esses contratos.

15.

Como decorre dos autos, o contrato de representação comercial cm discussão foi celebrado antes da entrada em vigor do Decreto presidencial n.o 219/91, ou seja, concretamente, em 10 de Fevereiro de 1981. Não está, pois, abrangido pelo novo direito estabelecido por este decreto, salvo se ainda estivesse em vigor cm 1 de Janeiro de 1994, ou seja, na data em que este decreto começou a aplicar-se também aos contratos anteriores. Pode ver-se aliás no despacho de reenvio que a ré tinha resolvido o contrato numa data que, no entanto, não é especificada. Nestas circunstâncias, se o contrato cm discussão foi resolvido antes de 1 de Janeiro de 1994, fica fora do âmbito de aplicação do Decreto presidencial n.o 219/91, eventualidade que retiraria automaticamente às questões prejudiciais qualquer influência para o desfecho do processo principal. Como, porém, o tribunal nacional considera um facto que o litígio pendente naquele tribunal se enquadra no âmbito de aplicação do Decreto presidencial n.o 219/91, as questões prejudiciais cm causa devem ser examinadas quanto ao mérito.

V — Quanto à primeira questão prejudicial

16.

Com esta questão, o juiz nacional convida o Tribunal de Justiça a esclarecer se o agente comercial que, nos termos de um contrato, foi encarregado ou tem direito exclusivo a um determinado sector geográfico tem direito a comissão, ainda que a operação comercial não tenha sido concluída por seu intermédio.

17.

No despacho de reenvio, o juiz nacional exprime o ponto de vista de que «ainda que a operação se tenha efectuado sem a intervenção do agente comercial e com um cliente que não tenha sido por ele angariado, desde que se desenvolva no seu sector geográfico de actividade, o agente comercial tem direito à comissão». Com excepção da sociedade ré, alinham-se por esta posição a Comissão e os Governos da República Francesa, da República Federal da Alemanha e da República Helénica, que apresentaram observações escritas.

18.

Concorrem para sustentar este ponto de vista a redacção e a estrutura dos n.os 1 e 2 do artigo 7o da directiva. Nas hipóteses do primeiro c segundo travessões do n.o 1 do artigo 7.o da directiva, o legislador parte do princípio de que, para que surja o direito a comissão do agente comercial, o contrato deve ser consequência da sua intervenção pessoal. Exige-se, por conseguinte, um nexo causal entre a conclusão do contrato cm causa c a actividade de intermediação do agente. Inversamente, a hipótese regulada no n.o 2 do artigo 7.o não pressupõe a existência desse tipo de relação. O agente comercial ao qual foi atribuído um sector geográfico tem direito a comissão por cada relação jurídica constituída com clientes desse sector. A condição para o nascimento do direito a comissão é, neste caso, única e exclusivamente a conclusão de um contrato com um diente da região e não a sua celebração por intermédio da acção do agente. O direito a comissão é, por conseguinte, neste caso, independente dessa intervenção. O direito a comissão não é, pois, afectado pelo facto de o contrato ter sido celebrado directamente com o mandante quando o co-contratante é cliente da região atribuída ao agente comercial.

19.

Esta interpretação coincide com a redacção do n.o 2 do artigo 7.o, segundo a qual o agente «tem igualmente direito à comissão» nos casos previstos por esta disposição. Da redacção desta resulta que o disposto no n.o 2 do artigo 7o prevalece sobre o disposto no n.o 1 do mesmo artigo e, portanto, a celebração de um contrato mediante intervenção do agente comercial não constitui, de acordo com o disposto no n.o 2, uma condição do nascimento do direito a comissão. Aliás, se fosse igualmente necessário satisfazer esta condição nos casos a que se refere o n.o 2, a existência deste n.o 2 seria supérflua.

20.

Deve, assim, responder-se à primeira questão que: «Na acepção do artigo 7.o, n.o 2, da directiva, no caso de o agente comercial ter sido encarregado de um sector geográfico determinado, o seu direito a comissão existe igualmente em relação aos contratos concluídos sem a sua intervenção».

VI — Quanto à segunda questão prejudicial

21.

A segunda questão prejudicial respeita à interpretação da expressão «cliente pertencente», particularmente quando este é uma sociedade. Neste caso, a palavra «pertencente» pode referir-se quer ao lugar em que se encontra a sede da sociedade, quer ao lugar onde, de facto, exerce a sua actividade comercial, quer ainda ao lugar onde eventualmente se encontram os seus estabelecimentos ou outras instalações.

22.

Para o tribunal nacional, o agente comercial tem direito a comissão pela celebração de um contrato com um cliente que não foi por ele angariado «desde que (esse contrato) tenha sido celebrado no seu sector geográfico de actividade, independentemente da questão de saber se nesse sector se encontra a sede ou qualquer outra instalação» (da sociedade cliente). A sociedade ré no processo principal alega que o que importa é o lugar em que se encontra o centro da tomada de decisões e da prática dos actos necessários à realização da transacção. Segundo a Comissão, deve tomar-se em consideração o lugar em que o cliente exerce de facto a sua actividade comercial, salvo se do contrato de representação comercial resultar que houve vontade diversa das partes. Do ponto de vista do Governo helénico, cabe ao tribunal nacional definir, à luz dos factos respeitantes a cada transacção, se o cliente em causa pertence ao sector geográfico confiado ao agente comercial. O Governo alemão observa que, neste caso, o legislador comunitário adoptou as soluções do legislador alemão e salienta que a directiva foi redigida tendo corno modelo as correspondentes disposições do direito alemão, em vigor desde 1953, e propõe assim uma interpretação destas disposições análoga à dada pela jurisprudência alemã ao parágrafo 87, n.o2, do HGB (Handelsgesetzbuch). Esta disposição tem uma redacção semelhante à do artigo 7.o, n.o 2, da directiva ( 12 ). Assim, para o Governo alemão, a questão decisiva é que o cliente tenha um estabelecimento ou a sede no sector geográfico em causa. Quando um cliente tem várias empresas ou quando uma empresa tem vários estabelecimentos, o critério decisivo é a empresa ou o estabelecimento do qual emana a encomenda.

23.

Julgo que o significado da expressão «cliente pertencente a um sector geográfico determinado» deve ser definido com base no contrato de representação comercial celebrado entre as partes. Dado que se trata de relações contratuais que se regem, por regra, pelo princípio da autonomia da vontade, a definição, numa base geográfica ou noutra, do círculo de clientes abrangidos na área de actividade de intermediação do agente comercial, incumbe, em primeiro lugar, às partes ( 13 ). Deve, assim, indagar-se cm cada caso qual a vontade das partes. Esta averiguação da vontade das partes é naturalmente da competência exclusiva do tribunal nacional.

24.

Porém, nos casos em que não resulta do contrato a vontade das partes, tem que ser definido o critério com base no qual se decide se um cliente pertence à área do agente comercial. Relativamente às pessoas singulares, o critério essencial é o de saber se a residência da pessoa se encontra no sector atribuído ao agente. Quando se tratar de um comerciante, deve considerar-se como residência, cm princípio, o lugar onde se encontra o seu estabelecimento profissional ( 14 ).

25.

Relativamente às pessoas colectivas c, mais particularmente, às sociedades, o principal critério de que nos podemos socorrer é o da sede. Este critério não pode ser considerado absoluto, sob pena de surgirem problemas nos casos em que existem, por exemplo, vários estabelecimentos profissionais, sucursais, etc. A presente questão prejudicial põe claramente em evidência estes problemas. De entre os factos postos à consideração do tribunal nacional, a sede de um dos clientes era a província da Ática, e a fábrica da sociedade estava situada noutra província e, mais concretamente, na província onde o autor exerce a sua actividade como agente comercial. A aplicação do critério da sede neste caso levaria a reconhecer o direito a comissão só ao agente que exercesse a sua actividade na província da sede da sociedade.

26.

Trata-se de uma solução particularmente restritiva, que tem consequências severas, nos casos em que a encomenda ou a iniciativa da encomenda provém do estabelecimento ou das instalações que se encontram na área de outro agente. Num caso como este, a encomenda ou a celebração do contrato que se lhe segue, pode, no fundo, ser fruto do conjunto das actividades desenvolvidas por aquele agente em defesa dos interesses do mandante na região que lhe foi atribuída. O direito a comissão do agente relativamente a contratos celebrados com clientes pertencentes ao sector que lhe foi atribuído, ainda que independente da sua actividade de intermediação in concreto, constitui uma remuneração essencial (indirecta) não só por cada um dos contratos, mas do conjunto da actividade do agente no sector geográfico que lhe foi atribuído ( 15 ). Estas considerações levam-me a concluir que se deve preferir ao critério formal da sede, o critério material de quem efectuou a encomenda. Quando o estabelecimento ou as instalações funcionarem como estabelecimentos independentes, com direito a efectuar encomendas, direito este que lhes é reconhecido pela administração central da pessoa colectiva, devem considerar-se, na acepção da disposição a interpretar, como clientes pertencentes ao sector geográfico atribuído ao agente. Se, ao invés, o estabelecimento ou as instalações não tiverem liberdade de agir autonomamente, deve então considerar-se cliente a própria sociedade, cuja sede se encontra fora do sector geográfico atribuído ao agente. Esta foi a solução adoptada, como explica o Governo alemão nas suas observações, pela jurisprudência dos tribunais alemães ao interpretar o no 2 do parágrafo 87 do HGB que, como já foi referido, contém uma disposição semelhante à do artigo 7o, n.o 2, da directiva ( 16 ). Com base nesta interpretação, o agente comercial tem direito a comissão pelos contratos concluídos pelo mandante, na sequência de uma encomenda proveniente de um estabelecimento de uma sociedade que funcione como unidade independente no seu sector, mesmo que esse contrato tenha sido concluído fora do sector que lhe foi atribuído. Inversamente, o agente comercial não pode exigir comissão por um contrato concluído pelo mandante com um cliente que não pertença ao seu sector, no sentido acima exposto, mesmo que o contrato tenha sido celebrado na sua zona ( 17 ). Portanto, o critério suplementar que, como resulta da redacção da segunda questão prejudicial, o tribunal nacional parece também ter tomado em consideração, ou seja o do lugar onde foi concluído o contrato, não tem qualquer influência no sistema da directiva.

27.

Por conseguinte, deve dar-se a seguinte resposta à segunda questão prejudicial: «A interpretação que deve ser dada à expressão ‘cliente pertencente’, constante do final do primeiro parágrafo do n.o 2 do artigo 7o da directiva é a de que, salvo disposições em contrário do contrato, se refere ao estabelecimento que efectua a encomenda, sempre que o cliente seja uma pessoa colectiva com vários estabelecimentos».

VII — Conclusão

Tendo em consideração quanto acima fica dito, proponho que o Tribunal dê a seguinte resposta às questões prejudiciais que lhe submeteu o Polymeles Protodikeio Athinon:

«1)

Na acepção do artigo 7o, n.o 2, da Directiva 86/653/CEE, no caso de o agente comercial ter sido encarregado de um sector geográfico determinado, o seu direito a comissão existe igualmente em relação aos contratos concluídos sem a sua intervenção.

2)

A interpretação que deve ser dada à expressão ‘cliente pertencente’, constante do final do primeiro parágrafo do n.o 2 do artigo 7.o da Directiva 86/653/CEE, é a de que, salvo disposições em contrário do contrato, se refere ao estabelecimento que efectua a encomenda, sempre que o cliente seja uma pessoa colectiva com vários estabelecimentos.»


( *1 ) Língua original: grego.

( 1 ) JO L 382, p. 17.

( 2 ) JO 1995, C 174, p. 3.

( 3 ) Sublinlic-sc nuc o Governo helénico, embora concluindo que deve ser dada resposta às questões prejudiciais, observa a título incidental que o litígio cm causa deriva de uma situação interna. Tal é naturalmente indiferente no presente caso, porque as questões prejudiciais se referem a disposições de uma directiva para harmonização dos direitos nacionais num sector determinado, adoptada com base no disposto nos artigos 57.o, n.o 2, c 100.o do Tratado CE.

( 4 ) Decreto presidencial n.o 219/91, «relativo aos agentes comerciais, cm harmonia com a Directiva 86/653/CEE do Conselho das Comunidades Europeias» (Jornal Oficial da República Helénica A 81, de 30 de Maio de 1981).

( 5 ) Paradoxalmente, do Decreto presidencial n.o 219/91, na sua versão inicial, não constava qualquer disposição de transposição do n.o 1 do artigo 7.o da directiva. Talvez o legislador helénico tenha considerado — erradamente — que o último parágrafo do n.o 2 do artigo 7.o não reconhecia aos Estados-Membros a faculdade de escolherem entre as duas soluções alternativas previstas nesse número, mas a faculdade de escolher entre o disposto no n.o 1, por um lado, c no n.o 2, por outro. Além disso, o artigo 6.o, n.o 1, do Decreto presidencial n.o 219/91, citado no texto, não se refere (apesar do artigo 7.o, n.o 2, da directiva conter uma previsão a esse respeito) ao pagamento de uma comissão ao agente comercial designado para um grupo determinado de pessoas. No entanto, cm data posterior à adopção da decisão de reenvio pelo Protodikeio Athinon, o artigo 6.o, n.o 1, do Decreto presidencial n.o 219/91, foi substituído pelo artigo 4.o, n.o2, do Decreto presidencial n.o 312/95 {Jornal Oficial da República Helénica A 168, de 22 de Agosto de 1995) que transpõe, agora correctamente, na minha opinião, o disposto no artigo 7.o, n.os 1 e 2, da directiva.

( 6 ) V., por exemplo, os acórdãos de 5 de Outubro de 1988, Alsatel (247/86, Colect., p. 5987, n.o 8), e de 30 de Novembro de 1995, Esso Española (C-134/94, Colect., p. I-4223, n.o 9).

( 7 ) V. o acórdão de 10 de Março de 1981, Irish Creamery Milk Suppliers Association c o. (36/80 c 71/80, Recueil, p. 735, n. 5 c segs.), bem como os acórdãos de 21 de Abril de 1988, Pardini (338/85, Colect., p. 2041, n.o 8), e de 27 de Junho de 1991, Mecanarte (C-348/89, Colect., p. I-3277, n.o 48).

( 8 ) Resulta do despacho de reenvio que o autor contesta as alegações da ré de que os clientes a que ele se refere na petição eram antigos clientes da Saint Ritzis.

( 9 ) V., a título de exemplo, os acórdãos de 29 de Abril de 1982, Pabst & Richarz (17/81, Recueil, p. 1331, n.o 12), e de 2 de Junho de 1994, AC-ATEL Electronics Vertriebs (C-30/93, Colect., p. I-2305, n.o' 16 e 17).

( 10 ) A ré pretende manifestamente referir-se à Directiva 78/855/CEE do Conselho, de 9 de Outubro de 1978 (JO L 295, p. 36).

( 11 ) V, a título de exemplo, os acordaos de 9 de Janeiro de 1990, SAFA (C-337/88, Colect., p.I-1, n.o20), e de 24 de Março de 1992, Syndesmos Melon tis Elefthcras Evangclikis Ekklisias e o. (C-381/89, Colect., p. I-2111, n.os 18 e 19), bem como o acórdão já referido na nota 9 AC-ATEL Electronics Vertriebs, n.o 19.

( 12 ) O parágrafo 87, n.o 2, do HGB dispõe: «Ist dem Handelsvertreter ein bestimmter Bezirk oder ein bestimmter Kundenkreis zugewiesen so hat er Anspruch auf Provision auch für Geschäfte, die ohne seine Mitwirkung mit Personen seines Bezirkes oder seines Kundenkreises während des Vertragsverhältnisses abgeschlossen sind».

( 13 ) As normas introduzidas pela directiva (c, consequentemente, as disposições pelas quais esta foi transposta parą a ordem jurídica interna) são, cm princípio, normas dispositivas (jus dispositivum; a excepção ć o disposto no artigo 5.o da directiva).

( 14 ) V. Liakopoulos, A. — Geniko limbonko Diknio (2a edição), p. 120; Brüßgemann, D. — Staub, Grosskommentar HGB (4' edição), artigo 87.o HGB, n.o' 38 c segs.

( 15 ) V. Brüggemann, op. cit. n.o 32.

( 16 ) O n.o 2 do parágrafo 87 utiliza a expressão «pessoas do seu sector» («Personen seines Bezirkes»).

( 17 ) V. Brüggemann, op. cit., n.o38.