PARECER DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

14 de Dezembro de 1991

Em 14 de Agosto de 1991, deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça um pedido de parecer, formulado pela Comissão das Comunidades Europeias ao abrigo do artigo 228.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia, nos termos do qual:.

«O Conselho, a Comissão ou qualquer Estado-membŕo podem obter previamente o parecer do Tribunal de Justiça sobre a compatibilidade do projecto de acordo com as disposições do presente Tratado. Se tal parecer for desfavorável, o acordo só pode entrar em vigor nos termos do artigo 236.°»

I — Exposição do pedido de parecer

Através deste pedido, a Comissão solicitou o parecer do Tribunal de Justiça sobre a compatibilidade com as disposições do Tratado CEE de um projecto de acordo relativo à criação do Espaço Económico Europeu (a seguir, respectivamente, «acordo» e «Espaço EE») e, em especial, do mecanismo jurisdicional que esse acordo pretende instituir. Tratar-se-ia de um acordo global de associação a concluir pela Comunidade com base no artigo 238.° do Tratado.

O acordo é objecto de negociações entre a Comissão, nos termos do mandato do Conselho de 18 de Março de 1990, agindo em nome da Comunidade em conformidade com uma decisão do Conselho, e os países da Associação Europeia de Comércio Livre e o Principado do Liechtenstein, que apresentou oficialmente o seu pedido de adesão à EFTA em 1 de Março de 1991 (a seguir «países da EFTA» ou «Estados da EFTA»).

O texto do acordo (cujos termos não eram definitivos) foi junto ao pedido de parecer.

O Tribunal emite o seu parecer com base na versão inglesa do texto do acordo. Esse texto foi transmitido pela Comissão, por carta de 30 de Outubro de 1991, no estado antes de rubricado.

Para fundamentar o pedido de parecer, a Comissão indicou que o acordo prevê um sistema de fiscalização jurisdicional para a resolução dos diferendos entre as Partes Contratantes, a resolução dos conflitos internos à EFTA e processos para reforçar a homogeneidade jurídica no Espaço EE. Embora convicta de que este sistema apresenta garantias inegáveis para a Comunidade, a Comissão, numa preocupação de segurança jurídica, entendeu ser oportuno consultar o Tribunal de Justiça ao abrigo do artigo 228.° do Tratado, designadamente a propósito de determinados pontos específicos do sistema previsto.

II — Tramitação

Em conformidade com o artigo 107.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, o pedido de parecer foi notificado ao Conselho e aos Estados-membros. A Comissão, bem como os governos do Reino Unido, do Reino da Bélgica e do Reino de Espanha, apresentaram observações escritas.

A Comissão, o Conselho e os governos dos Estados-membros foram convidados pelo Tribunal a responder a algumas perguntas a eles dirigidas por escrito. Estiveram representados na audiência não pública que se realizou no Tribunal de Justiça, em 26 de Novembro de 1991, tendo aí respondido a essas perguntas.

Os advogados-gerais foram ouvidos pelo Tribunal em conferência, em 3 de Dezembro de 1991, nos termos do artigo 108.°, n.° 2, do Regulamento de Processo.

III — Análise do acordo

Antecedentes

Desde 1973, as relações comerciais entre a Comunidade e os países da EFTA, bem como com o Liechtenstein, são reguladas por acordos bilaterais de comércio livre. Em Janeiro de 1989, o presidente da Comissão propôs, no Parlamento Europeu, uma melhoria e uma intensificação das relações entre a Comunidade e a EFTA. Tendo essa proposta sido acolhida favoravelmente pelos países da EFTA, realizaram-se contactos que conduziram à decisão de iniciar negociações formais. Para esse efeito, a Comissão foi autorizada pelo Conselho «a encetar negociações com os países da EFTA e com o Liechtenstein, com vista à conclusão de um acordo entre a Comunidade e os referidos países, actuando como interlocutor único, relativo à criação do Espaço Económico Europeu». Essas negociações foram oficialmente iniciadas em 1 de Julho de 1990.

Conteúdo do acordo

O acordo consiste em nove partes precedidas de um preâmbulo: 1) objectivos e princípios; 2) livre circulação de mercadorias; 3) livre circulação de pessoas, de serviços e de capitais; 4) concorrência e outras regras comuns; 5) disposições horizontais relativas às quatro liberdades acima enunciadas (em matéria de política social, de protecção dos consumidores, de ambiente, de estatísticas e de direito das sociedades); 6) modalidades de cooperação para além das quatro liberdades; 7) disposições institucionais; 8) fundos e 9) disposições finais.

O considerando único do preâmbulo do acordo tem a seguinte redacção:

«Considering the objective to establish a dynamic and homogeneous European Economic Area, based on common rules and equal conditions of competition and providing for the adequate means of enforcement including at the judicial level, and achieved on the basis of equality and reciprocity and of an overall balance of benefits, rights and obligations for the Contracting Parties.»

O artigo l.°, n.° 1, do acordo dispõe que:

«The aim of this Agreement of association is to promote a continuous and balanced strengthening of trade and economic relations between the Contracting Parties with equal conditions of competition, and the respect of the same rules, with a view to creating a homogeneous European Economic Area, hereinafter referred to as the EEA.»

O artigo 6.° do acordo tem a seguinte redacção :

«Without prejudice to future developments of case law, the provisions of this Agreement, in so far as they are identical in substance to corresponding rules of the Treaty establishing the European Economic Community and the Treaty establishing the European Coal and Steel Community and to acts in application of these two Treaties, shall in their implementation and application be interpreted in conformity with the relevant rulings of the Court of Justice of the European Communities given prior to the date of signature of this Agreement.»

O artigo 7.° do acordo dispõe:

«Acts referred to or contained in the Annexes to this Agreement or in decisions of the EEA Joint Committee shall be binding upon the Contracting Parties and be, or be made, part of their internal legal order as follows :

(a)

an act corresponding to an EEC regulation shall as such be made part of the internal legal order of the Contracting Parties;

(b)

an act corresponding to an EEC directive shall leave to the authorities of the Contracting Parties the choice of form and method of implementation.»

O protocolo 35, intitulado «Protocol 35 on the implementation of EEA rules», cujo artigo l.° faz referência ao artigo 7.° do acordo, tem a seguinte redacção:

«Whereas this Agreement aims at achieving a homogeneous European Economic Area, based on common rules, without requiring any Contracting Party to transfer legislative powers to any institution of the European Economic Area;

and

whereas this consequently will have to be achieved through national procedures;

Article 1

The Contracting Parties take into account that when implementing a part of an act corresponding to an EEC directive, which is clear, precise and unconditional, subparagraph (a) of Article 7 of the Agreement shall apply.

Article 2

For cases of possible conflicts between implemented EEA rules and other statutoryprovisions, the Contracting Parties undertake to introduce, if necessary, a statutory provision to the effect that EEA rules shall prevail in these cases.»

A parte VII, intitulada «Institutional provisions» (artigos 89.°- 120.°) é composta por quatro capítulos. O capítulo 1, intitulado «The structure of the association» contém cinco secções, dizendo a 1 respeito ao Conselho do Espaço EE. O Conselho do EEE, composto pelos membros do Conselho e pelos membros da Comissão das Comunidades Europeias e por um membro do Governo de cada país da EFTA, fica encarregado, designadamente, de definir as orientações gerais e de dar o impulso político no quadro da implementação do acordo. A secção 2 diz respeito à Comissão Mista, composta por representantes das Partes Contratantes, encarregada de implementar o acordo e de velar pelo seu funcionamento. A secção 3, intitulada «The EEA courts», contém as seguintes disposições:

«Artide 95

1.   An independem EEA Court, functionally integrated with the Court of Justice of the European Communities, is hereby established. The EEA Court shall exercise the functions which follow from Article 96. Each EFTA State shall nominate one Judge to the Court.

2.   The Court, when sitting in plenary session ( 1 ), shall be composed of five Judges of the Court of Justice of the European Communities and, on the basis of rotation, three of the Judges nominated by the EFTA States.

3.   At the request of the Court, the EEA Council may allow it to establish Chambers, each consisting of three or five Judges ( 2 ).

4.   The Presidency of the Court shall be held alternatively by one of the Judges of the Court of Justice of the European Communities and by one of the Judges nominated by the EFTA States.

Article 96

1.   The EEA Court is competent for:

(a)

the settlement of disputes between the Contracting Parties;

(b)

actions concerning the surveillance procedure regarding the EFTA States;

(c)

appeals concerning decisions in the field of competition initiated by the EFTA Surveillance Authority.

2.   The EEA Court may be seized by:

(a)

the EEA Joint Committee or the Contracting Parties in cases for settlement of disputes in accordance with Article 117;

(b)

a natural or legal person or by the EFTA Surveillance Authority on appeal against decisions given by the EEA Court of First Instance in the field of competition in accordance with Article 102;

(c)

the EC Commission or the EFTA Surveillance Authority in cases of conflict of competence arising under the provisions of Chapter 1 of Part IV.

3.   In addition, the EEA Court may be seized under the provisions of a separate agreement between the EFTA States establishing an EFTA Surveillance Authority by:

(a)

the EFTA Surveillance Authority under the surveillance procedure referred to in Article 116 regarding the fulfilment of the obligations under this Agreement by the EFTA States;

(b)

an EFTA State or a natural or legal person in actions against the EFTA Surveillance Authority.

Article 97

The Contracting Parties concerned, and the surveillance authorities, i. e. the EC Commission and the EFTA Surveillance Authority, as the case may be, shall take the necessary measures to comply with the judgments of the EEA Court.

Article 98

The EEA Court shall have unlimited jurisdiction in regard to penalties imposed by the EFTA Surveillance Authority.

Article. 99

Actions brought before the EEA Court shall not have suspensory effect. The EEA Court may, however, if it considers that circumstances so require, order that application of the contested act be suspended.

Article 100

The EEA Court may, where seized in accordance with Article 96 (2) (b) or (3), prescribe any necessary interim measures.

Article 101

1.   An independent EEA Court of First Instance, attached to the EEA Court, is hereby established. It shall ensure the legal control of decisions of the EFTA Surveillance Authority relating to competition rules applicable to undertakings. Each EFTA State shall nominate one Judge to the Court.

2.   The EEA Court of First Instance shall be composed of three of the Judges nominated by the EFTA States, on the basis of rotation, and two Judges of the First Instance of the European Communities.

3.   The Presidency of the Court shall be held alternatively by one of the Judges nominated by the EFTA States and by one of the Judges of the Court of First Instance of the European Communities.

Article 102

The EEA Court of First Instance shall have jurisdiction at first instance in actions brought by a natural or legal person against a decision by the EFTA Surveillance Authority, relating to the implementation of the competition rules applicable to undertakings, if that decision is addressed to that person or if it is of direct and individual concern to him.

In addition, the EEA Court of First Instance shall have the competences conferred on the EEA Court in Articles 98 to 110.

The EEA Court of First Instance shall also be competent to give rulings in actions against the EFTA Surveillance Authority in accordance with provisions to be laid down in a separate agreement between the EFTA States establishing the EFTA Surveillance Authority.

Article 103

1.   The Statutes of the EEA Court and of the EEA Court of First Instance, including, in particular, the rules on the functioning of the two Courts, the appointment of the Judges and the Presidents and their terms of office are laid down in Protocol 33 ( 3 ).

2.   The EEA Court and the EEA Court of First Instance shall adopt their rules of procedure, to be approved by the EEA Council.

Article 104

1.   In order to ensure as uniform as possible an interpretation of this Agreement, in full deference to the independence of courts, the EEA Court, the EEA Court of First Instance, the Court of Justice of the European Communities, the Court of First Instance of the European Communities and the Courts of the EFTA States shall, when applying and interpreting respectively the provisions of this Agreement or provisions of the Treaty establishing the European Economic Community and the Treaty establishing the European Coal and Steel Community, as amended or supplemented, or of the acts adopted in pursuance thereof, which are identical in substance to the provisions of this Agreement, pay due account to the principles laid down by any relevant decisions delivered by the other Courts.

A system of exchange of information concerning judgements by courts of last instance shall be set up by the EEA Joint Committee. This system shall comprise:

(a)

transmission to the Registrar of the EEA Court of judgments delivered by such courts on the interpretation and application of, on the one hand, this Agreement or, on the other hand, the Treaty establishing the European Economic Community and the Treaty establishing the European Coal and Steel Community, as amended or supplemented, as well as the acts adopted in pursuance thereof in so far as they concern provisions which are identical in substance to those of this Agreements;

(b)

classification of these judgements by the Registrar of the EEA Court including, as far as necessary, the drawing up and publication of translations and abstracts;

(c)

communication by the Registrar of the EEA Court of the relevant documents to the competent national authorities, to be designated by each Contracting Party.

2.   Provisions on the possibility for an EFTA State to allow a court or tribunal to ask the Court of Justice of the European Communities to express itself ( 4 ) on the interpretation of an EEA rule are laid down in Protocol 34.

Article 105

Decisions under this Agreement by the EFTA Surveillance Authority and the EC Commission which impose a pecuniary obligation on persons other than States, shall be enforceable. The same shall apply to such judgments under this Agreement by the EEA Court, the EEA Court of First Instance, the Court of Justice of the European Communities and the Court of First Instance of the European Communities.

Enforcement shall be governed by the rules of civil procedure in force in the State in the territory of which it is carried out. The order for its enforcement shall be appended to the decisión, without other formality than verification of the authenticity of the decision, by the authority which each Contracting Party shall designate för this purpose and shall make known to the other Contracting Parties, the EFTA Surveillance Authority, the EC Commission, the EEA Court, the EEA Court of First Instance, the Court of Justice of the European Communities and the Court of First Instance of the European Communities.

When these formalities have been completed on application by the party concerned, the latter may proceed to enforcement in accordance with the law of the State, in the territory of which enforcement is to be carried out, by bringing the matter directly before the competent authority.

Enforcement may be suspended only by decision of the EEA Court or. of the EEA Court of First Instance. However, the courts of the States concerned shall have jurisdiction over complaints that enforcement is being.carried out in an irregular manner.»

O protocolo 34, a que se refere o artigo 104.°, n.° 2, intitulado «Protocol 34 on the possibility for courts and tribunals of EFTA States to request the Court of Justice of the European Communities to express itself on the interpretation of EEA rules corresponding to EC rules», tem a seguinte redacção:

«Article 1

When a question of interpretation of provisions of the Agreement, which are identical in substance to the provisions of the Treaties establishing the European Communities, as amended or supplemented, or, of acts adopted in pursuance thereof, arises in a case pending before a court or tribunal of an EFTA State, the court or tribunal may, if it considers this necessary, ask the Court of Justice of the European Communities to express itself on such a question.

Article 2

An EFTA State which intends to make use of this Protocol shall notify the Depositary and the Court of Justice of the European Communities to what extent and according to what modalities the Protocol will apply to its courts and tribunals.

Article 3

The Depositary shall notify the Contracting Parties of any notification under Article 2.»

As secções 4 e 5 do capítulo 1 da parte VII do acordo referem-se, respectivamente, à cooperação parlamentar e à cooperação entre os parceiros económicos e sociais.

O capítulo 2 é dedicado ao processo de tomada de decisões.

O capítulo 3, intitulado «Surveillance procedure and settlement of disputes», contém as seguintes disposições:

«Article 116

1.   The EFTA States shall establish an independent surveillance authority (EFTA Surveillance Authority) as well as procedures similar to those existing in the Community including procedures for ensuring the fulfilment of obligations under this Agreement and for control of the legality of acts of the EFTA Surveillance Authority regarding competition.

The fulfilment of the obligations under this Agreement shall be monitored by, on the one hand, the EFTA Surveillance Authority and, on the other, the EC Commission.acting in conformity with the Treaty establishing the European Economic Community, the Treaty establishing the European Coal and Steel Community and this Agreement.

2.   In order to ensure a uniform surveillance throughout the EEA, the EFTA Surveillance Authority and the EC Commission shall cooperate, exchange information and consult each other on surveillance policy issues and individual cases.

3.   The EC Commission and the EFTA Surveillance Authority shall receive any complaints concerning the application ( 5 ) of this Agreement, they shall inform each other of complaints received.

4.   Each of these bodies shall examine all complaints falling within its competence and shall pass to the other body any complaints which fall within the competence of that body.

5.   In case of disagreement between these two bodies with regard to the action to be taken in relation to a complaint or with regard to the result of the examination, either of the bodies may refer the matter to the EEA Joint Committee which shall deal with it in accordance with Article 117.

Article 117

1.   The EEA Joint Committee or a Contracting Party may bring a matter under dispute which concerns the application ( 6 ) of this Agreement before the EEA Court in accordance with the following provisions.

2.   The EEA Joint Committee shall be provided with all information which might be of use in making possible an in-depth examination of the situation, with a view to settling the dispute and finding a solution acceptable to the Contracting Parties.

3.   A Contracting Party may bring a matter under dispute before the EEA Court. In doing so it shall, however, first submit the matter to the EEA Joint Committee. If it is not resolved after two consecutive meetings of the Committee, either the Committee shall, unless otherwise decided, or a Contracting Party may, bring the matter before the EEA Court. For the Community, it shall be for the EC Commission to bring the matter before the EEA Court.»

IV — Resumo das observações escritas apresentadas pelas instituições e pelos Governos

Observações gerais

A Comissão salienta que o acordo tem uma natureza muito diferente da dos acordos de associação até agora concluídos pela Comunidade. O acordo incluirá não só o acervo comunitário existente à data da sua assinatura, mas igualmente o direito comunitário a estabelecer nos domínios abrangidos pelo acordo. Quanto ao conteúdo do acordo, a Comissão sublinha que as relações entre a Comunidade e os países da EFTA assentam directamente no Tratado CEE e nos actos adoptados pelas instituições da Comunidade com basé neste. O processo de tomada de decisões previsto pelo acordo reflecte, por um lado, o interesse de alargar ao Espaço EE o acervo comunitário e a sua evolução futura, ao mesmo tempo que salvaguarda a autonomia de decisão da Comunidade e, por outro, o respeito da vontade dos Estados soberanos que não pretendem transferir competências ou atribuir um poder legislativo aos órgãos do acordo.

O objectivo do acordo é o de criar um espaço económico homogéneo no qual deveria ser aplicado do modo mais uniforme possível um direito substancialmente idêntico ao que se encontra em vigor no interior da CEE.

Após recordar que o sistema jurisdicional previsto pelo acordo prossegue três objectivos, ou seja, a resolução dos diferendos entre as Partes Contratantes, a resolução dos conflitos internos à EFTA e o reforço da homogeneidade jurídica interna do Espaço EE, a Comissão esclarece que estas diferentes competências serão exercidas ou por um Tribunal do Espaço Económico Europeu (a seguir «Tribunal EEE», independente mas funcionalmente integrado no Tribunal de Justiça, e por um Tribunal de Primeira Instância EEE, independente mas ligado ao Tribunal EEE, ou pelo próprio Tribunal de Justiça. A composição do Tribunal EEE e a do Tribunal de Primeira Instância EEE permitiriam aos juízes do Tribunal de Justiça que integrem essas duas instâncias fazer valer a sua grande experiência do direito comunitário na Comunidade e assegurar assim a uniformidade na aplicação desse direito e garantir a sua projecção no Espaço EE.

Para efeitos da resolução dos diferendos entre as Partes Contratantes, podem recorrer ao Tribunal EEE quer a Comissão Mista, quer directamente uma Parte Contratante, se a Comissão Mista não tiver resolvido o conflito após duas reuniões consecutivas.

No que se refere aos conflitos internos da EFTA, podem distinguir-se dois tipos. Em primeiro lugar, os diferendos entre a autoridade de fiscalização e os países membros da EFTA, ou seja, os processos por infracção que a Autoridade de Fiscalização da EFTA seja levada a instaurar contra os países membros da EFTA por incumprimento das obrigações que lhes incumbem por força do acordo, bem como os recursos interpostos das decisões proferidas por esta autoridade no domínio dos auxílios de Estado. Competiria ao Tribunal EEE decidir destas questões. Em segundo lugar, o contencioso da concorrência, que o Tribunal de Primeira Instância EEE seria competente para julgar em primeira instância, podendo ser interposto recurso das suas decisões para o Tribunal EEE.

Relativamente ao reforço da homogeneidade jurídica, o acordo prevê três procedimentos específicos. O primeiro corresponde em grande parte ao instituído pelo Protocolo n° 2 anexo à Convenção relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Convenção de Lugano), sobre a interpretação uniforme dessa convenção. O segundo visa a possibilidade de os países da EFTA intervirem em processos de reenvio prejudicial perante o Tribunal de Justiça. O terceiro atribui aos órgãos jurisdicionais dos países da EFTA a possibilidade de submeterem ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais sobre qualquer questão de interpretação relativa ao acordo.

O sistema jurisdicional em perspectiva evita, sempre de acordo com a Comissão, um determinado número de dificuldades. Permite, com efeito, evitar que qualquer outro órgão jurisdicional, que não o Tribunal de Justiça, seja competente para interpretar a título prejudicial o acordo; que a aplicação do acordo, pelo Tribunal EEE, se faça ignorando o direito comunitário e a jurisprudência do Tribunal de Justiça; que a aplicação das regras de concorrência se faça de maneira descoordenada; que os operadores económicos não possam beneficiar da fiscalização jurisdicional por meio dos reenvíos prejudiciais e que os Estados da EFTA sejam submetidos a jurisdições a ele estranhas.

A Comissão pretende obter o parecer do Tribunal de Justiça sobre quatro pontos:

1)

a compatibilidade da presença de juízes do Tribunal de Justiça, no Tribunal EEE, com os termos do parecer do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1977 (sobre o projecto de acordo relativo à instituição de um Fundo Europeu de Imobilização da Navegação Interior: parecer 1/76, Recueil, p. 741);

2)

a compatibilidade com o Tratado CEE de um direito de intervenção alargado aos países da EFTA nos processos comunitários pendentes no Tribunal de Justiça;

3)

a possibilidade de permitir aos órgãos jurisdicionais dos países da EFTA a apresentação de questões de interpretação do acordo ao Tribunal de Justiça, sem modificação do Tratado CEE;

4)

se o artigo 238.° do Tratado CEE permite a construção jurisdicional prevista no acordo.

A participação dos membros do Tribunal de Justiça noutro órgão jurisdicional

A Comissão interroga-se sobre se se deverá considerar, à semelhança do citado parecer 1/76, que os juízes do Tribunal de Justiça não podem participar noutro órgão jurisdicional ou se, pelo contrário, se deverá considerar que os termos desse parecer não são relevantes para o caso em apreço. A Comissão esclarece, a este respeito, que o acordo se distingue do acordo. que foi objecto do parecer 1/76. Por um lado, o Tribunal EEE não teria a competência que foi atribuída ao Tribunal do Fundo Europeu de Imobilização da Navegação Interior, ou seja, a de decidir a título prejudicial sobre a interpretação do acordo, e, por outro, o Tribunal EEE e o Tribunal de Primeira Instância EEE estariam, apesar da sua independência jurisdicional, funcionalmente integrados no Tribunal de Justiça.

Para o Governo espanhol, a resposta à questão colocada só pode ser negativa, e isso por diversas razões. Em primeiro lugar, o objectivo do disposto no artigo 167.° do Tratado CEE e nos artigos 2.°, 4.° e 16.° do Estatuto do Tribunal de Justiça é o de garantir que o Tribunal de Justiça possa cumprir a missão que lhe foi cometida, ou seja, o respeito do direito na interpretação e aplicação dos Tratados, de forma completamente imparcial, evitando quaisquer pressões ou opiniões preconcebidas.

Em segundo lugar, o Tribunal declarou no parecer 1/76 que o acordo sobre o Fundo Europeu de Imobilização da Navegação Interior era incompatível com o Tratado CEE em virtude de o tribunal previsto por esse acordo ser composto por seis membros do Tribunal de Justiça e estes poderem ter de se pronunciar, como membros desse tribunal, sobre questões que deveriam igualmente decidir enquanto membros do Tribunal de Justiça, de forma que a total imparcialidade com que este deve actuar ficaria comprometida. Ora, haveria o risco de tal situação se repetir no caso em apreço. Com efeito, é imaginável quê os juízes do Tribunal de Justiça interpretem e apliquem, enquanto membros do Tribunal EEE, normas comunitárias que deverão, em seguida, interpretar ou aplicar de novo, enquanto membros do Tribunal de Justiça. O Governo espanhol entende que, nesse caso, o juiz que tenha participado nas deliberações do Tribunal EEE deixará de se pronunciar com a imparcialidade exigida. Se ele se abstivesse de intervir, em conformidade com o artigo 16.° do Estatuto, poderia acontecer, como é referido no citado parecer, que o Tribunal de Justiça se encontrasse na impossibilidade material de reunir o quorum previsto no artigo 15.° do mesmo diploma.

O Governo espanhol acrescenta ainda três considerações. Alega, antes de mais, que se o Tribunal EEE não é competente para decidir a título prejudicial sobre a interpretação do acordo, o mesmo não se passa com o Tribunal de Justiça, que será, nos termos da sua jurisprudência, sempre competente para interpretar a título prejudicial qualquer acordo concluído entre a Comunidade e os países da EFTA. Por conseguinte, os termos do referido parecer 1/76 não são nem afectados nem desnaturados na sua essência.

O Governo espanhol declara, em seguida, não partilhar a opinião da Comissão segundo a qual o parecer 1/76 não seria aplicável no caso em apreço visto o Tribunal EEE e o Tribunal de Primeira Instância EEE estarem funcionalmente integrados no Tribunal de Justiça. O artigo 7.° das disposições institucionais do acordo estabelece, com efeito, que o Tribunal EEE é um organismo independente e que não se encontra de forma alguma subordinado ao Tribunal de Justiça.

O Governo espanhol observa, por último, que o artigo 104.° das disposições institucionais do projecto de acordo não responde à questão de saber em que medida um acórdão do Tribunal EEE vincula o Tribunal de Justiça, quando este tem de apreciar uma questão sobre a qual o Tribunal EEE já se pronunciou.

O Governo belga partilha a análise da Comissão a propósito da pertinência do Parecer 1/76 no caso em apreço. O Tribunal EEE não será competente para decidir a título prejudicial, contrariamente ao que se previa para o Tribunal do Fundo Europeu de Imobilização. Além disso, o Tribunal EEE estará funcionalmente integrado no Tribunal de Justiça, mas.manterá toda a independência. A presença de juízes do Tribunal de Justiça não modifica a natureza jurídica do Tribunal EEE. No que se refere à falta de competência para decidir a título prejudicial, o Governo belga observa que tanto o Tribunal de Justiça como o Tribunal EEE têm de se pronunciar sobre as mesmas normas de direito comunitário.

Segundo o Governo do Reino Unido, é compatível com o Tratado CEE e com o parecer 1/76 que juízes do Tribunal de Justiça façam parte do Tribunal EEE. A fundamentação do Tribunal de Justiça naquele parecer estava condicionada pelo facto de a competencia do Tribunal do Fundo, para decidir sobre a interpretação do acordo, se exercer paralelamente à do Tribunal de Justiça.

O artigo 16.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, relativo à incapacidade de um juiz para conhecer de um processo em que tenha anteriormente intervindo como advogado, consultor ou juiz, corresponde à impossibilidade de se ser sucessivamente juiz e parte no mesmo processo. Não diz respeito à posição de um juiz que tem de se pronunciar sucessivamente em diferentes processos, que incidem sobre questões semelhantes ou mesmo idênticas, como por exemplo quando o Tribunal de Justiça se pronuncia a título prejudicial sobre questões de direito que são semelhantes ou idênticas a outras sobre que já se pronunciou no quadro de um processo por incumprimento, em conformidade com o artigo 169.° do Tratado. Não estando vinculado pelas suas decisões anteriores, o Tribunal pode sempre afastar-se da sua jurisprudência decidindo uma questão de direito de forma diferente.

Após ter analisado o acordo e os instrumentos conexos que foram objecto do parecer 1/76, o Governo do Reino Unido conclui que teria sido possível nesse processo que os juízes comunitários em questão fossem influenciados pelas decisões anteriores do Tribunal do Fundo. Assim, o acervo comunitário poderia ser comprometido de forma indirecta, por exemplo, pela incidência dos princípios de direito internacional público não consagrados na ordem jurídica comunitária. Foi este risco que conduziu o Tribunal de Justiça a opor-se, no seu parecer 1/76, a que os juízes do Tribunal de Justiça fizessem parte do Tribunal do Fundo. Além disso, o Reino Unido observa que as dificuldades que estão na origem do pedido de parecer 1/91 são muito diferentes das que estiveram na origem do parecer 1/76. No respeitante às regras relativas ao Fundo de Imobilização, punha-se o problema de os juízes do Tribunal de Justiça, què seriam chamados a fazer parte do Tribunal do Fundo, terem de desempenhar duas tarefas incompatíveis. Por um lado, competia-lhes, enquanto membros do Tribunal de Justiça, preservar o acervo comunitário na interpretação de determinados actos adoptados pelas instituições e, por outro, enquanto membros do Tribunal do Fundo, fiscalizar um sistema jurídico baseado em princípios de direito internacional público diferentes dos que formam o acervo comunitário. No entender do Reino Unido, o acordo projectado não levanta nenhuma dificuldade a este respeito, na medida em que os juízes do Tribunal de Justiça e os do Tribunal EEE são obrigados a aplicar as mesmas regras: e princípios e a preservar, assim, o acervo comunitário.

No que se refere à composição do Tribunal EEE, o Governo do Reino Unido observa que dele farão parte cinco dos treze membros do Tribunal de Justiça. Dado que bastam sete juízes para que o Tribunal reúna em sessão plenária, deveria ser possível reunir uma sessão plenária sem que um deles tivesse participado numa decisão anterior do Tribunal EEE. Em caso de a participação de cinco juízes do Tribunal de Justiça nas actividades do Tribunal EEE levantar problemas administrativos, o artigo 165.° do Tratado CEE contém um dispositivo que permite fazer face à situação que resultaria da aprovação do acordo.

O alargamento do direito de intervenção

Segundo a Comissão, o Tribunal de Justiça já admitiu a intervenção de países terceiros com base no artigo 37.° do Estatuto. No entanto, no caso em apreço, trata-se de um direito mais sistemático que implicaria uma notificação das questões prejudiciais aos países da EFTA do mesmo modo que a feita aos Estados-membros. A Comissão interroga-se, por conseguinte, sobre se não seria necessário modificar o artigo 20.° do Estatuto.

De acordo com o Governo espanhol, a resposta à segunda questão deve ser afirmativa. O artigo 20.° do Estatuto é suficientemente claro. Prevê expressamente que apenas os destinatários de notificações, taxativamente enumerados, podem apresentar observações escritas num processo prejudicial e intervir na audiência. Embora o Tribunal nunca se tenha pronunciado sobre a possibilidade de um Estado terceiro apresentar observações num processso prejudicial, efectuou, todavia, uma interpretação restritiva da lista dos interessados referidos no artigo 20.° do Estatuto.

Para o Governo espanhol, a Comissão'confundiu, ao referir o artigo 37.° do Estatuto, dois tipos de processos que são radicalmente diferentes. Com efeito, no caso da intervenção em apoio dos pedidos de uma das partes, existem diversas partes que defendem teses diversas, ou seja, uma parte demandante, uma parte demandada e um terceiro que aparece posteriormente. Este terceiro é qualificado de «coadyuvante» na terminologia processual espanhola. Deve limitar-se intervir em apoio dos pedidos de uma das partes principais. A este respeito, importa tomar em consideração o facto de o artigo 37.° sujeitar a intervenção de outras pessoas que não os Estados-membros e as instituições comunitárias a duas condições: devem demonstrar ter interesse na resolução do litígio e este não deve ter lugar entre Estados-membros, entre instituições da Comunidade ou entre Estados-membros, de um lado, e instituições da Comunidade, de outro. Daqui resulta que a intervenção de um Estado terceiro, admitida pelo Tribunal de Justiça no despacho de 23 de Fevereiro de 1983, Chris International Foods/Comissão (91/82 e 200/82, Recueil, p. 417), exija que estas duas condições sejam respeitadas.

O Governo espanhol conclui que o artigo 20.° do Estatuto deve ser modificado se se pretende que todos os Estados da EFTA possam apresentar observações num processo prejudicial e que o artigo 37.° continue limitado à intervenção, no quadro de uma acção ou recurso, ao apoio dos pedidos de uma parte principal. A intervenção é completamente diferente da participação num processo prejudicial, de modo que mesmo uma interpretação extensiva do artigo 37.° não poderia, em caso algum, modificar o conteúdo claro e preciso do artigo 20.°

O Governo belga observa que se impõe uma revisão do artigo 37.° se se pretende permitir que os Estados da EFTA intervenham nas três categorias de litígios em que a intervenção de uma pessoa colectiva não é possível. Para autorizar os Estados da EFTA, que não são partes no processo, a apresentar observações no âmbito de um processo de reenvio prejudicial, é necessário proceder à revisão do artigo 20.°

O Governo do Reino Unido entende que o processo previsto para a intervenção dos países membros da EFTA nos litígios pendentes no Tribunal de Justiça exige uma modificação do artigo 37.° Não seria suficiente prever, no acordo, um direito de intervenção para esses países, visto esse acordo não modificar, em si, o Estatuto. Dever-se-ia, portanto, recorrer ao processo do artigo 188.°, segundo parágrafo, do Tratado CEE. Esta disposição prevê que o Conselho, a pedido do Tribunal de Justiça e após consulta da Comissão e do Parlamento Europeu, pode alterar as disposições do título III do Estatuto. O Governo do Reino Unido entende igualmente que se deve modificar o artigo 20.°, a fim de os países membros da EFTA poderem apresentar observações num processo prejudicial. Além disso, há que modificar os artigos 17.°, 18.° e 39.° do Estatuto.

As questões prejudiciais submetidas pelos órgãos jurisdicionais dos países da EFTA

No entender do Governo espanhol, a resposta à terceira questão deve ser negativa. O processo prejudicial é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os juízes nacionais. Esta natureza de processo de cooperação entre juízes tem por consequência directa que apenas os órgãos jurisdicionais dos Estados-membros têm o direito de interrogar o Tribunal de Justiça nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE. Para que os órgãos jurisdicionais dos países da EFTA possam igualmente interrogar o Tribunal de Justiça a título prejudicial, torna-se necessário modificar o artigo 177.° do Tratado CEE acrescentando ao texto «órgão jurisdicional de um dos Estados--membros» uma referência aos órgãos jurisdicionais de um Estado terceiro com o qual a Comunidade tenha concluído um acordo internacional.

O Governo belga entende que o artigo 177.° deve ser revisto para permitir que os órgãos jurisdicionais dos países membros da EFTA apresentem questões ao Tribunal de Justiça.

O Governo do Reino Unido observa, antes de mais, que o artigo 177.° diz igualmente respeito a um órgão jurisdicional de um Estado-membro que tenha a sua sede nos territórios ultramarinos regulados pela parte IV do Tratado CEE (ver acórdão de 12 de Dezembro de 1990, Kaefer e Procacci, C-100/89 e C-101/89, Colect., p. I-4647). Embora aquela disposição apenas se aplique strido sensu aos órgãos jurisdicionais dos Estados-membros, o Tribunal de Justiça considerou que o segundo parágrafo da mesma disposição se aplica a um órgão jurisdicional que não faça parte da organização judiciária de um Estado-membro quando ele se situe num território dependente de um Estado-membro, quando o direito comunitário se aplique em medida limitada a esse território e quando uma disposição adequada esteja prevista, para esse efeito, pelo direito comunitário (acórdão de 3 de Julho de 1991, Barr e Montrose, C-355/89, Colect., p. I-3479).

O Reino Unido observa em seguida que o artigo 177.° permite ao Tribunal de Justiça pronunciar-se á título prejudicial sobre a interpretação dos acordos internacionais em que a Comunidade é parte. O Tribunal de Justiça pode igualmente pronunciar-se a título prejudicial sobre a interpretação dos acordos concluídos em aplicação do artigo 220.° do Tratado. O acordo será um acordo internacional concluído nós termos do artigo 238.° do Tratado. Tratar-sè-á, portanto, ao mesmo tempo, de um acordo internacional concluído em aplicação do Tratado e de um acto adoptado pelas instituições. Nada se opõe, portanto, a que o Tribunal de Justiça se pronuncie a título prejudicial sobre a interpretação do acordo. Os acórdãos do Tribunal de Justiça citados militam em favor da compatibilidade das disposições projectadas com o Tratado CEE.

O artigo 238. ° do Tratado

A Comissão interroga-se sobre se o artigo 238.° permite uma'construção jurisdicional do tipo da que seria instituída pelo acordo. Se assim não fosse, haveria que modificar essa disposição do Tratado de forma a que os procedimentos especiais aí referidos, incluíssem a instituição de um sistema jurisdicional, funcionalmente integrado no Tribunal de Justiça e que garantisse a especificidade e a integridade do direito comunitário.

Para o Governo espanhol, o artigo 238.° constitui uma base suficiente para a conclusão pela Comunidade de um acordo de associação com uma união de Estados ou uma organização internacional, tal como o acordo a concluir com a EFTA. O mesmo não se passa, todavia, se o conteúdo desse acordo for incompatível com o Tratado. No caso em apreço, a incompatibilidade resulta do mecanismo jurisdicional previsto. Deve, portanto, modificar-se o Tratado antes de se concluir o acordo.

O Governo belga observa que o artigo 238.° não permite a instituição do mecanismo jurisdicional previsto sem prévia alteração do Tratado CEE. Em princípio, nada se.opõe a uma modificação do artigo 238.° do Tratado. Todavia, parece mais criterioso, no caso em apreço, alargar a modificação aos outros artigos relevantes do Tratado, bem como aos artigos do Estatuto do Tribunal de Justiça, a fim de se garantir um máximo de coerência e de segurança jurídica.

No entender do Governo do Reino Unido, os termos «acções em comum e procedimentos especiais», que figuram no artigo 238.° do Tratado, permitem que sejam incluídos processos jurisdicionais nos acordos abrangidos por esta disposição. Tais processos podem mesmo contribuir para o bom funcionamento desses acordos. E o que se verifica, em especial, no que se refere às disposições que prevêem uma composição judicial dos eventuais litígios, pois favorecem a correcta execução do acordo pelas partes.


( 1 ) All disputes between Contracting Parties or cases when the EEA Court is seized by the EEA Joint Committee will be dealt with in plenary session.

( 2 ) An appropriate balance of ECJ and EFTA Judges, taking into account the nature of the cases, shall be laid down in the Statute of the EEA Court.

( 3 ) The Statutes shall contain provisions on qualifications for the Judges.

( 4 ) In French «s'exprime».

( 5 ) Agreed Minutes will ensure that the term «application» also covers implementation of the Agreement.

( 6 ) In an agreed Minute it will be clarified that this also includes interpretation in the sense of the Ministerial Declaration of 14 May 1991.


Tomada de posição do Tribunal de Justiça

I

1

No presente parecer, o Tribunal de Justiça limita-se a apreciar, em conformidade com o pedido da Comissão, a compatibilidade do sistema de fiscalização jurisdicional, que o acordo pretende instituir, com o Tratado CEE. As outras disposições do acordo, e designadamente as que dizem respeito ao processo de decisão e à repartição de competências em matéria de concorrência, não são tratadas no presente parecer.

2

O acordo será concluído entre, por um lado, os Estados que são membros da Associação Europeia de Comércio Livre e, por outro lado, a Comunidade Europeia e os seus Estados-membros. No que diz respeito à Comunidade, o acordo será concluído pelo Conselho, após parecer favorável do Parlamento Europeu, com base no artigo 238.° do Tratado CEE.

3

O acordo visa a criação de um Espaço Económico Europeu que abrange os territórios dos Estados-membros da CEE e os dos países da EFTA. Resulta do preâmbulo do acordo que as Partes Contratantes pretendem instituir um Espaço EE dinâmico e homogéneo, baseado em regras comuns e condições de concorrência iguais, e prevêem meios adequados para o implementar, inclusive no plano jurisdicional. Nos termos do artigo 1.° do acordo, o mesmo visa promover um reforço contínuo e equilibrado das relações comerciais e económicas entre as Partes Contratantes em condições de concorrência iguais, bem como o respeito das mesmas regras.

4

As regras aplicáveis nas relações entre os Estados que fazem parte do Espaço EE incidem sobre a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais, assim como sobre o regime de concorrência. Essas regras são, em substância, as das disposições correspondentes dos tratados CEE e CECA e dos actos adoptados em aplicação desses tratados. Como a Comissão indicou no pedido de parecer, as Partes Contratantes têm a intenção de alargar ao Espaço EE o direito comunitário aplicável nos domínios abrangidos pelo acordo, à medida que ele seja criado, evolua ou se modifique.

II

5

O objectivo de homogeneidade na interpretação e aplicação do direito no Espaço EE, tal como vem especificado no artigo 1.° do acordo, deveria ser assegurado pela utilização de disposições textualmente idênticas às disposições correspondentes do direito comunitário e pela instauração de um sistema jurisdicional.

6

O acordo institui um órgão jurisdicional, o Tribunal EEE, a que está ligado um Tribunal de Primeira Instância. A competência do Tribunal EEE é definida no artigo 96.°, n.° 1, do acordo. Essa competência visa a resolução dos diferendos entre as Partes Contratantes, as acções intentadas no âmbito do processo de fiscalização relativamente aos Estados da EFTA e, em matéria de concorrência, os recursos interpostos das decisões adoptadas pela Autoridade de Fiscalização da EFTA.

7

O sistema jurisdicional prevê igualmente os mecanismos seguintes :

8

O artigo 6.° do acordo dispõe que, para a sua implementação e aplicação, as disposições do acordo devem ser interpretadas em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça anterior à datą de assinatura do mesmo e relativa às disposições correspondentes do Tratado GEE, do Tratado CECA e dos actos de direito comunitário derivados.

9

O artigo 104.°, n.° 1, do acordo dispõe que, na aplicação ou interpretação das suas disposições ou das disposições dos tratados CEE e CECA, tal como vierem a ser alteradas ou completadas, ou dos actos adoptados em aplicação dos mesmos tratados, o Tribunal de Justiça, o Tribunal EEE, o Tribunal de Primeira Instância da CE, o Tribunal de Primeira Instância EEE e os tribunais dos Estados da EFTA terão em devida conta os princípios decorrentes das decisões proferidas pelos outros tribunais, a fim de assegurar uma interpretação do acordo tão uniforme quanto possível.

10

O artigo 95.° do acordo dispõe que o Tribunal EEE é composto por oito juízes, cinco dos quais do Tribunal de Justiça. A seu pedido, o Conselho EEE pode autorizar o Tribunal EEE a criar secções de três ou cinco juízes. Tomando em consideração a natureza dos litígios submetidos a juízo, será especificado no Estatuto do Tribunal EEE um número equilibrado e adequado de juízes do Tribunal de Justiça e da EFTA. O artigo 101.° dispõe que o Tribunal de Primeira Instância EEE se compõe de cinco juízes, três dos quais nomeados pelos Estados da EFTA e dois juízes do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias.

11

O protocolo 34, para o qual remete o n.° 2 do artigo 104.° do acordo, contém disposições que permitem aos Estados da EFTA autorizar os seus órgãos jurisdicionais a solicitar ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a interpretação de uma disposição do acordo.

12

Por fim, uma apostila ao protocolo 34 prevê um direito de intervenção dos Estados da EFTA nos processos submetidos ao Tribunal de Justiça.

III

13

Antes de apreciar as questões suscitadas pelo pedido de parecer da Comissão, devem comparar-se os objectivos e o contexto do acordo com os do direito comunitário.

14

A identidade dos termos das disposições do acordo e das disposições comunitárias correspondentes não significa que devam necessariamente ser interpretadas de modo idêntico. De facto, um tratado internacional deve ser interpretado não apenas em função dos termos em que está redigido, mas também à luz dos seus objectivos. O artigo 31.° da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 23 de Maio de 1969, esclarece a este respeito que um tratado deve ser interpretado de boa-fé, segundo o sentido comum atribuível aos termos do tratado no seu contexto, e à luz dos respectivos objecto e fim.

15

No que respeita à comparação dos objectivos das disposições do acordo e dos objectivos das do direito comunitàrio, deve notar-se que o acordo visa a aplicação de um regime de comércio livre e de concorrência nas relações económicas e comerciais entre as Partes Contratantes.

16

Em contrapartida, no caso da Comunidade, o regime de comércio livre e de concorrência, que o acordo visa alargar à totalidade do território das Partes Contratantes, desenvolveu-se e integra-se na ordem jurídica comunitária, cujos objectivos vão mais além do que é prosseguido pelo acordo.

17

Com efeito, decorre designadamente dos artigos 2.°, 8.°-A e 102.°-A do Tratado CEE que este visa alcançar uma integração económica que culmine no estabelecimento de um mercado interno e de uma união econòmica e monetária. O artigo 1.° do Acto Único Europeu especifica, por outro lado, que o conjunto dos Tratados comunitários tem como objectivo contribuir para fazer progredir concretamente a União Europeia.

18

Resulta do que antecede que as disposições do Tratado CEE que regulam a livre circulação e a concorrência, longe de representarem uma finalidade em si, são apenas meios para a realização desses objectivos.

19

O contexto em que se insere o objectivo do acordo é também diferente daquele em que são prosseguidos os objectivos comunitários.

20

De facto, o Espaço EE deve ser realizado com base num tratado internacional que, em substância, apenas cria direitos e obrigações entre as Partes Contratantes e não prevê qualquer transferência de direitos soberanos em benefício dos órgãos intergovernamentais que institui.

21

Em contrapartida, o Tratado CEE, embora concluído sob a forma de acordo internacional, nem por isso deixa de constituir a carta constitucional de uma comunidade de direito. Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os Tratados comunitários instituíram uma nova ordem jurídica em cujo benefício os Estados limitaram, em domínios cada vez mais vastos, os seus direitos soberanos, e cujos sujeitos são não apenas os Estados-membros, mas também os seus nacionais (ver, designadamente, acórdão de 5 de Fevereiro de 1963, Van Gend en Loos, 26/62, Recueil, p. 1). Às características essenciais da ordem jurídica comunitária assim constituída são em especial o seu primado relativamente aos direitos dos Estados-membros e o efeito directo de toda uma série de disposições aplicáveis aos seus nacionais e a eles próprios.

22

Resulta destas considerações que a homogeneidade das normas jurídicas na totalidade do Espaço EE não está garantida pela identidade de conteúdo ou de redacção das disposições do direito comunitário e das disposições correspondentes do acordo.

23

Deve, pois, examinar-se se o.acordo prevê outros meios para garantir essa homogeneidade.

24

O artigo 6.° prossegue esse objectivo ao prever que as normas do acordo devem ser interpretadas em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às normas correspondentes do direito comunitário.

25

Todavia, este mecanismo de interpretação não permite assegurar a homogeneidade jurídica pretendida, e isso por duas razões.

26

Em primeiro lugar, aquele artigo apenas diz respeito à jurisprudência do Tribunal de Justiça anterior à data da assinatura do acordo. Uma vez que essa jurisprudência irá evoluir, será difícil distinguir a jurisprudência nova em relação à anterior e, portanto, o passado do futuro.

27

Em seguida, embora o artigo 6.° do acordo não especifique claramente se visa a jurisprudência do Tribunal de Justiça no seu todo, e, designadamente, a jurisprudência sobre o efeito directo e o primado do direito comunitário, resulta do protocolo 35 do acordo que, sem reconhecerem os princípios do efeito directo e do primado que se impõem por força dessa jurisprudência, as Partes Contratantes se comprometem apenas a introduzir nas respectivas ordens jurídicas uma disposição legislativa que permita que os termos do acordo prevaleçam sobre as disposições legislativas contrárias.

28

Daqui resulta que o respeito da jurisprudência do Tribunal de Justiça, imposto pelo artigo 6.° do acordo, não abrange elementos essenciais dessa jurisprudência que são inconciliáveis com as características do acordo. Por conseguinte, o artigo 6.°, tal como está redigido, não permite assegurar o objectivo de homogeneidade do direito no conjunto do Espaço EE, tanto em relação ao passado como em relação ao futuro.

29

Resulta das considerações que antecedem que o objectivo da homogeneidade na interpretação e na aplicação do direito no Espaço EE choca com as divergências existentes entre as finalidades e o contexto do acordo, por um lado, e os do direito comunitário, por outro.

IV

30

É à luz da contradição que acaba de ser salientada que se deve apreciar se o sistema jurisdicional previsto é susceptível de pôr em causa a autonomia da ordem jurídica comunitária na prossecução dos seus objectivos específicos.

31

Essa análise recairá antes de mais sobre a interpretação do conceito de Partes Contratantes que o Tribunal EEE terá de formular no exercício das suas competências e, em seguida, sobre a incidência da sua jurisprudência na interpretação do direito comunitário.

32

Quanto ao primeiro ponto, convirá recordar que o Tribunal EEE é competente, nos termos do artigo 96.°, n.° 1, alínea a), do acordo, para a resolução dos diferendos entre as Partes Contratantes e que, nos termos do artigo 117.°, n.° 1, do mesmo acordo, a Comissão Mista do Espaço EE ou qualquer Parte Contratante pode submeter ao Tribunal EEE esse tipo de litígios.

33

A alínea c) do artigo 2.° do acordo define o conceito de Partes Contratantes. Para a Comunidade e os seus Estados-membros, esse conceito abrange, consoante os casos, quer a Comunidade e os Estados-membros, quer a Comunidade, quer os Estados-membros. A escolha a fazer entre estas três possibilidades deve ser deduzida das disposições relevantes do acordo, em cada caso concreto, e das competências respectivas da Comunidade e dos Estados-membros, tais como resultam do Tratado CEE e do Tratado CECA.

34

Assim, quando lhe seja submetido um diferendo relativo à interpretação ou aplicação de uma ou mais disposições do acordo, o Tribunal EEE pode ter de interpretar o conceito de «Parte Contratante», nos termos do artigo 2.°, alínea c), do acordo, para determinar se, na acepção da disposição controvertida, a expressão «Parte Contratante» visa a Comunidade, a Comunidade e os Estados-membros, ou apenas os Estados-membros. O Tribunal EEE será, pois, chamado a pronunciar-se sobre as competências respectivas da Comunidade e dos seus Estados-membros no que respeita às matérias regidas pelas disposições do acordo.

35

Daqui resulta que a competência atribuída ao Tribunal EEE nos termos dos artigos 2.°, alínea c), 96.°, n.° 1, alínea a), e 117.°, n.° 1, do acordo é susceptível de violar a ordem das competências definida pelos Tratados e, portanto, a autonomia do sistema jurídico comunitário, cuja observância o Tribunal de Justiça assegura, por força do artigo 164.° do Tratado CEE. Esta competência exclusiva do Tribunal de Justiça é confirmada pelo artigo 219.° do Tratado CEE, nos termos do qual os Estados-membros se comprometem a não submeter qualquer diferendo relativo à interpretação ou aplicação do mesmo Tratado a um modo de resolução diferente dos que nele estão previstos. O artigo 87.° do Tratado CECA contém uma disposição no mesmo sentido.

36

A atribuição dessa competência ao Tribunal EEE é, portanto, incompatível com o direito comunitário.

37

Quanto ao segundo aspecto, deve observar-se liminarmente que os acordos internacionais concluídos nos termos do processo do artigo 228.° do Tratado vinculam as instituições da Comunidade e os Estados-membros e que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as disposições desses acordos e os actos adoptados pelos seus órgãos são, a partir da sua entrada em vigor, parte integrante da ordem jurídica comunitária.

38

A este propósito, é conveniente precisar que o acordo é um acto adoptado por uma das instituições da Comunidade, na acepção do artigo 177.°, primeiro parágrafo, alínea b), do Tratado CEE, e que, desse modo, o Tribunal de Justiça é competente para se pronunciar a título prejudicial sobre a interpretação do mesmo. É igualmente competente para se pronunciar sobre este acordo quando os Estados-membros da Comunidade não cumpram as obrigações que lhes incumbem por força do mesmo.

39

Ora, quando um acordo internacional prevê um sistema jurisdicional próprio que compreende um tribunal competente para regular os diferendos entre as Partes Contratantes desse acordo e, por consequência, para interpretar as suas disposições, as decisões desse Tribunal vinculam as instituições da Comunidade, incluindo o Tribunal de Justiça; Essas decisões impõem-se igualmente quando este Tribunal é chamado a decidir, a título prejudicial, ou no quadro de uma acção ou recurso, sobre a interpretação do acordo internacional, na medida em que este último faz parte integrante da ordem jurídica comunitária.

40

Um acordo internacional que prevê um tal sistema jurisdicional é, em princípio, compatível com o direito comunitário. Com efeito, a competência da Comunidade em matéria de relações internacionais e a sua capacidade para concluir acordos internacionais comporta necessariamente á faculdade de se submeter às decisões de uma jurisdição criada ou designada segundo os termos desses acordos, no que diga respeito à interpretação e à aplicação das suas disposições.

41

O acordo em causa, porém, retoma uma parte essencial das normas, incluindo as de direito derivado, que regem as relações económicas e comerciais no interior da Comunidade e que constituem, na sua maior parte, disposições fundamentais da ordem jurídica comunitária.

42

Este acordo tem assim por efeito inserir na ordem jurídica comunitária um vasto conjunto de normas jurídicas que se justapõe a um conjunto de regras comunitárias cujo texto é idêntico.

43

Além disso, no preâmbulo do acordo e no seu artigo. 1.°, as Partes Contratantes exprimiram a intenção de assegurar uma aplicação uniforme das disposições do acordo na totalidade dos seus territórios; Ora, o objectivo da aplicação uniforme e da igualdade das condições de concorrência, que se pretende alcançar e que se reflecte nos artigos 6.° e 104.°, n.° 1, do acordo, visa necessariamente a interpretação tanto das disposições deste acordo como das correspondentes disposições da ordem jurídica comunitária.

44

Embora o artigo 6.° do acordo obrigue o Tribunal EEE a interpretar as disposições do acordo à luz da jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça, anterior à data da assinatura do mesmo, o Tribunal EEE já não ficará submetido a essa obrigação quanto às decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça depois dessa data.

45

Em consequência, o objectivo do acordo que visa assegurar a homogeneidade do direito no conjunto do Espaço EE comanda não apenas a interpretação das regras próprias deste acordo, mas igualmente a das regras correspondentes do direito comunitário.

46

Daqui resulta que, condicionando a interpretação futura das regras comunitárias em matéria de livre circulação e de concorrência, o mecanismo jurisdicional previsto pelo acordo infringe o artigo 164.° do Tratado CEE e, de uma forma mais geral, os próprios fundamentos da Comunidade.

V

47

O perigo que o sistema jurisdicional do acordo apresenta para a autonomia da ordem jurídica comunitária não é de modo algum atenuado pelo facto de os seus artigos 95.° e 101.° visarem criar laços orgânicos entre o Tribunal EEE e o Tribunal de Justiça ao prever que juízes do Tribunal de Justiça tenham assento no Tribunal EEE e nas suas secções e que juizes do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias tenham assento no Tribunal de Primeira Instância EEE.

48

É de recear, pelo contrário, que a aplicação dessas disposições acentue os problemas gerais que decorram do sistema jurisdicional previsto pelo acordo.

49

A este propósito, convém recordar que o Tribunal EEE deve assegurar o bom funcionamento de um regime de comércio livre e de concorrência no quadro de um tratado internacional que não cria obrigações senão entre as Partes Contratantes.

50

Em contrapartida, o Tribunal de Justiça deve assegurar o respeito de uma ordenjurídica particular e contribuir para o seu desenvolvimento, com vista a atingir os objectivos enunciados, designadamente, nos artigos 2.°, 8.°-A e 102.°-A do Tratado CEE e a realizar entre os Estados-membros uma União Europeia, conforme resulta da declaração solene de Estugarda, de 19 de Junho de 1983 (n.° 2.5), a que se refere o primeiro considerando do preâmbulo do Acto Único Europeu Neste quadro, o comércio livre e a concorrência não constituem senão meios destinados a atingir esses objectivos.

51

Em consequência, os juízes do Tribunal de Justiça, membros do Tribunal EEE, conforme participem no Tribunal de Justiça ou no Tribunal EEE, terão de aplicai e interpretar as mesmas disposições mas segundo perspectivas, métodos e conceitos diferentes, a fim de ter em conta a natureza de cada tratado e os objectivos que lhe são próprios.

52

Nestas condições, será muito difícil, ou mesmo impossível, para esses juízes abordar, com plena independência de espírito, quando integrarem o Tribunal de Justiça, as questões em cuja decisão tiverem participado no âmbito do Tribunal EEE.

53

Todavia, uma vez que o sistema jurisdicional do acordo é, de qualquer forma, incompatível com o Tratado CEE, não é necessário examinar mais detalhadamente esta questão, nem tão-pouco a de saber se esse sistema não é de molde a suscitar sérias reservas quanto à confiança que os particulares possam ter na possibilidade de o Tribunal de Justiça exercer as suas funções corri toda a independência.

VI

54

Convém, agora, examinar se o mecanismo previsto pelo artigo 104.°, n.° 2, do acordo, para a interpretação das disposições deste, é compatível com o direito comunitário.

55

Nos termos do disposto no artigo 104.°, n.° 2, do acordo, as disposições que permitem a um Estado da EFTA autorizar as suas jurisdições a solicitarem ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a interpretação do acordo figuram no protocolo 34.

56

Segundo o artigo 1.° desse protocolo, quando uma questão de interpretação das disposições do acordo, que são idênticas, em substância, às disposições dos tratados comunitários, for suscitada num processo pendente perante um dos órgãos jurisdicionais de um Estado da EFTA, esse órgão pode, se o considerar necessário, pedir ao Tribunal de Justiça que sobre ela se pronuncie.

57

O artigo 2.° do protocolo 34 dispõe que um Estado da EFTA, que pretenda fazer uso desse protocolo, notifique o depositário do acordo e o Tribunal de Justiça em que medida e segundo que modalidades o protocolo se aplica às suas jurisdições.

58

Resulta daí que este processo se caracteriza pelo facto de que deixa aos Estados da EFTA a faculdade de autorizar ou não os seus órgãos jurisdicionais a submeter questões ao Tribunal de Justiça e não prevê nenhuma obrigação para os órgãos jurisdicionais desses Estados cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso. Além disso, não há garantia de que as respostas, que o Tribunal de Justiça assim seja chamado a dar, tenham efeito obrigatório para as jurisdições que a ele recorreram. Este processo é fundamentalmente diferente do previsto no artigo 177.° do Tratado CEE.

59

É certo que nenhuma disposição do Tratado CEE se opõe a que um acordo internacional atribua ao Tribunal de Justiça competência para a interpretação das disposições de um tal acordo para efeitos da sua aplicação em Estados terceiros.

60

Nenhuma objecção de princípio pode tão-pouco ser formulada contra a liberdade deixada aos Estados da EFTA para autorizarem ou não os seus órgãos jurisdicionais a submeter questões ao Tribunal, nem tão-pouco à inexistência da obrigação, para alguns desses órgãos jurisdicionais, de recorrerem ao Tribunal de Justiça.

61

Em contrapartida, é impossível admitir que as respostas que o Tribunal de Justiça dê aos órgãos jurisdicionais dos Estados da EFTA tenham um valor meramente consultivo e sejam desprovidas de efeitos obrigatórios. Semelhante situação desnaturaria a função do Tribunal de Justiça, tal como ela é concebida pelo Tratado CEE, ou seja, a de uma jurisdição cujos acórdãos são vinculativos. Mesmo no caso muito particular do artigo 228.°, o parecer do Tribunal de Justiça tem o efeito vinculativo precisado nesse artigo.

62

Há, ainda, que observar que a interpretação do acordo dada pelo Tribunal de Justiça em resposta às questões submetidas pelos órgãos jurisdicionais dos Estados da EFTA deve igualmente ser tomada em conta pelas jurisdições dos Estados-membros da Comunidade, quando sejam chamadas a pronunciar-se sobre a aplicação do acordo. Ora, o efeito não vinculativo dessas respostas para os órgãos jurisdicionais da EFTA pode provocar incerteza quanto ao seu valor jurídico para as jurisdições dos Estados-membros da Comunidade.

63

Além disso, não é de excluir que as jurisdições dos Estados-membros sejam levadas a considerar que o efeito não vinculativo das interpretações dadas pelo Tribunal de Justiça, nos termos do protocolo 34, se estende igualmente aos acórdãos que este profere nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE.

64

Nesta medida, o referido mecanismo põe em causa a segurança jurídica que é indispensável ao bom funcionamento do processo de reenvio prejudicial.

65

Resulta das considerações que precedem que o artigo 104.°, n.° 2, do acordo e o seu Protocolo 34 são incompatíveis com o direito comunitário, na medida em que não garantem um efeito vinculativo às respostas que o Tribunal de Justiça possa ser chamado a dar nos termos desse protocolo.

VII

66

Convém apreciar, a seguir, o direito previsto para os Estados da EFTA de intervirem nos processos pendentes perante o Tribunal. Uma apostila ao protocolo 34 prevê que os artigos 20.° e 37.° do Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça sejam alterados de modo a permitirem esse direito de intervenção.

67

Basta observar a este propósito que esses dois artigos figuram no título III do Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal e que, segundo o artigo 188.°, segundo parágrafo, do Tratado CEE, o Conselho, deliberando por unanimidade, a pedido do Tribunal de Justiça e após consulta da Comissão e do Parlamento Europeu, pode alterar as disposições deste título.

68

Resulta daí que a atribuição aos Estados da EFTA do direito de intervenção nos processos pendentes perante o Tribunal de Justiça não exige uma modificação do Tratado CEE, na acepção do seu artigo 236.°

VIII

69

A última questão da Comissão visa saber se o artigo 238.° do Tratado CEE, que se refere à conclusão, pela Comunidade, de acordos de associação com um Estado terceiro, uma união de Estados ou uma organização internacional, autoriza a instauração de um sistema jurisdicional como o previsto pelo acordo. A este propósito, a Comissão anunciou que, no caso de um parecer negativo do Tribunal, esta disposição poderia ser modificada de maneira a permitir a instauração desse sistema.

70

Como já se observou no n.° 40, um acordo internacional que prevê um sistema jurisdicional dotado de um tribunal competente para a interpretação das suas disposições não é, em princípio, incompatível com o direito comunitário e pode, por consequência, encontrar o seu fundamento jurídico no artigo 238.° do Tratado CEE.

71

O artigo 238.° do Tratado CEE, no entanto, não fornece nenhuma base para instituir um sistema jurisdicional que viole o artigo 164.° desse Tratado e, de um modo mais geral, os próprios fundamentos da Comunidade.

72

Pelas mesmas razões, uma modificação desta disposição, no sentido indicado pela Comissão, não poderia remediar a incompatibilidade do sistema jurisdicional do acordo com o direito comunitário.

Em conclusão

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

emite o parecer seguinte:

O sistema de fiscalização jurisdicional que o acordo prevê instaurar é incompatível com o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia.

Due

presidente

Slynn

presidente de secção

Joliet

presidente de secção

Schockweiler

presidente de secção

Grévisse

presidente de secção

Kapteyn

presidente de secção

Mancini

juiz

Kakouris

juiz

Moitinho de Almeida

juiz

Rodríguez Iglesias

juiz

Diez de Velasco

juiz

Zuleeg

juiz

Murray

juiz

Feito no Luxemburgo, em 14 de Dezembro de 1991.

O secretário

J.-G. Giraud