RELATÓRIO PARA AUDIÊNCIA

apresentado no processo C-179/90 ( *1 )

I — Matéria de facto e tramitação processual

1.

O porto de Génova, como todos os portos marítimos italianos, é gerido por um organismo público, concretamente, o Consorzio autonomo del porto (a seguir «CAP»), que constitui, nos termos do artigo 202.° do Regulamento da Navegação Marítima (Decreto do presidente da República n.° 328, de 15 de Fevereiro de 1952, a seguir «regulamento»), a autoridade encarregada da regulamentação do trabalho portuário.

2.

Por força do artigo 110.° do Código da Navegação (Decreto real n.° 327, de 30 de Março de 1942, a seguir «código»), o pessoal utilizado nas operações portuárias é associado em companhias ou grupos, dotados de personalidade jurídica própria e sujeitos à fiscalização da autoridade encarregada da regulamentação do trabalho portuário.

3.

A execução das operações de embarque, desembarque, transbordo, armazenagem e do movimento em geral das mercadorias e de qualquer material no porto é reservada, pelo mesmo artigo 110.°, às companhias ou aos grupos anteriormente referidos.

O exclusivo da realização das operações portuárias é assegurado pelo artigo 1172.° do código, que prevê sanções penais para todo o utilizador que infrinja as normas sobre a utilização do pessoal.

4.

Os trabalhadores portuários são inscritos, nos termos do artigo 150.° do regulamento, em registos. Essa inscrição e a sua manutenção estão sujeitas, por força dos artigos 152.° e 156.° do regulamento, a um certo número de condições, entre as quais a da nacionalidade italiana.

As mesmas condições valem, em aplicação dos artigos 194.° e 194.°-B, para a inscrição no registo dos trabalhadores temporários.

5.

A actividade operacional no porto é concedida, por força do artigo 111.°, primeiro parágrafo, do código, pela autoridade portuária a empresas que constituem, regra geral, pessoas jurídicas de direito privado. Essas empresas devem, nos termos do último parágrafo desse texto, em todos os casos, recorrer exclusivamente, para a execução das operações portuárias, ao pessoal das companhias.

No porto de Génova, essas actividades empresariais foram concedidas, no que se refere às mercadorias convencionais, à Merci convenzionali porto di Genova SpA (a seguir «Merci») e, no que se refere aos contentores, à Terminal contenitori porto di Genova SpA, sendo o CAP o único accionista de ambas as sociedades.

6.

As tarifas e putras normas referentes às prestações dos serviços das companhias e dos grupos portuarios, tal como ocorre com as empresas, são estabelecidas, por força dos artigos 112.° do código e 203.° do regulamento, pela autoridade portuária.

7.

A Siderurgica Gabrielli SpA (a seguir «Siderurgica»), com sede em Pádua (Italia), importou, em proveniência da República Federal da Alemanha, uma partida de aço pelo porto de Génova. Embora o navio fretado pela Siderurgica estivesse dotado da maquinaria necessária para o desembarque dos materiais, o desembarque directo não foi autorizado, quer devido à proibição de utilizar mão-de-obra estrangeira, quer devido ao direito exclusivo de realizar as operações portuárias de que dispõe a companhia.

8.

Para efeitos do desembarque, a Siderurgica dirigiu-se então à Merci, que, por sua vez, recorreu à companhia.

9.

Na sequência de um atraso na entrega das mercadorias, devido, especificamente, a uma série de greves levadas a cabo pelos trabalhadores da companhia, a Siderurgica pediu e obteve do presidente do Tribunale di Genova uma decisão que ordenou à Merci a entrega imediata da mercadoria.

10.

No âmbito do processo contraditório instaurado ná sequência da impugnação pela Merci dessa decisão, a Siderurgica pediu a condenação da Merci na reparação do dano sofrido pelo atraso na entrega e o reembolso das quantias cobradas pelas prestações de mão-de-obra impostas e não solicitadas, alegando a Siderurgica que poderia ter procedido directamente ao desembarque.

11.

Considerando que o litígio suscitava uma questão referente à compatibilidade do regime italiano com o direito comunitário, o tribunal de Génova, por despacho de 6 de Abril de 1990, suspendeu a instância até que o Tribunal de Justiça tenha decidido sobre a questão relativa à interpretação das disposições dos artigos 7.°, 30.°, 37.°, 52.°, 59.°, 85.°, 86.°, e 90.° do Tratado CEE, para efeitos de clarificar o seguinte ponto:

«1)

No estado actual do direito comunitário, na hipótese da importação por via marítima, no territòrio de um Estado-membro da CEE, de mercadorias provenientes de outro Estado-membro, o disposto no artigo 90.° do Tratado que institui a CEE e as proibições estabelecidas nos artigos 7°, 0 30.°, 85.° e 86.° do mesmo Tratado atribuem aos cidadãos comunitários direitos que os Esta-dos-membros devem respeitar, nos casos em que a uma empresa e/ou companhia portuária, que utiliza exclusivamente estivadores nacionais, seja reservada, em regime de exclusivo e de preços obrigatórios, a realização das operações de carga e de descarga de mercadorias nos portos nacionais, mesmo quando seja possível efectuar tais operações com os meios e o pessoal de bordo? ou

2)

uma empresa e/ou companhia portuária que utiliza exclusivamente estivadores nacionais, à qual está reservada, em regime de exclusivo e de preços obrigatórios, a realização das operações de carga e de descarga das mercadorias nos portos nacionais, constitui uma empresa encarregada da gestão de serviços de interesse económico geral, na acepção do segundo parágrafo do artigo 90.° do Tratado que institui a CEE, relativamente à qual a aplicação do disposto no primeiro parágrafo do mesmo artigo 90.° e das proibições impostas pelos artigos 7.°, 30.°, 85.° e 86.° do referido Tratado constituem um obstáculo ao cumprimento, por parte desta, da missão particular que lhe foi confiada?»

12.

O despacho do Tribunale di Genova foi registado na Secretaria do Tribunal em 7 de Junho de 1990.

13.

Em conformidade com o disposto no artigo 5.° do Protocolo relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da CEE, foram apresentadas observações escritas, em 26 de Setembro de 1990, pela Merci, representada por Sergio Medina e Giuseppe Ferraris, advogados no foro de Génova, pela Comissão das Comunidades Europeias, representada por Enrico Traversa, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Renzo Maria Morresi, advogado no foro de Bolonha (Itália), e pela Siderurgica, representada por Giuseppe Conte e Giuseppe Michele Giacomini, advogados no foro de Génova.

14.

O Tribunal, com base no relatório preliminar do juiz-relator, ouvido o advogado-geral, decidiu dar início à fase oral do processo sem instrução.

II — Observações escritas apresentadas ao Tribunal

1.

A Merci, recorrente na causa principal, precisa que é uma empresa que procede às operações portuárias em regime de concessão, mas não é visada pelo artigo 110.°, que se aplica apenas às companhias. A este propósito, é vítima do monopólio que a leicriou a favor das companhias. Como resultará, aliás, do acórdão de reenvio, a problemática nos presentes autos versa sobre o monopólio da companhia e não sobre um hipotético monopólio, aliás inexistente, da empresa.

Quanto aos efeitos de uma decisão do Tribunal de Justiça que viesse a consistir na não aplicação dos artigos 110.° e seguintes do código nos autos da causa principal, a Merci refere que o pedido de indemnização do dano causado pela entrega tardia poderá, em abstracto, ser acolhido. Pelo contrário, no que respeita ao pedido de reembolso das quantias pagas, os encargos resultantes das operações inúteis não podem ser imputados à empresa Merci que não beneficiou de, qualquer enriquecimento, mas, quando muito, à companhia. A Merci precisa que, mesmo que a eventual decisão do Tribunal de Justiça não lhe permita obter umà vantagem imediata nos autos da causa principal, ainda assim partilharia das dúvidas do tribunal de reenvio quanto à compatibilidade da legislação italiana com õ direito comunitário, e isso também em virtude do seu interesse de ordem mais geral.

a)

A título de contribuição para a solução das questões submetidas, a Merci observa que o Tribunal de Justiça admite a aplicabilidade das normas da concorrência às activa dades portuárias em geral; assim será quer as actividades portuárias sejam incluídas na noção muito vasta de transportes marítimos, aos quais o Regulamento (CEE) n.° 4056/86 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, que determina as regras de aplicação aos transportes marítimos dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO L 378, p. 4) į estendeu a aplicação das normas processuais de apuramento e sanção das infracções às normas da concorrência, quer sejam consideradas como actividades autónomas, mas complementares, em relação aos transportes.

As companhias portuárias caem indiscutivelmente na noção de empresa admitida em direito comunitário; trata-se, mais especificamente, de empresas às quais são concedidos direitos especiais ou exclusivos, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Tratado. O efeito directo dos artigos 7° e 30.° do Tratado é evidente; o mesmo se diga do n.° 1 do artigo 90.°, sobretudo caso esse texto seja invocado em conjugação com as normas substanciais dos artigos 85.° e 86.°, cujo efeito directo é indiscutível.

b)

Analisando a primeira questão, a Merci faz um apanhado dos direitos que a reserva de trabalho portuário compromete a favor das companhias.

A condição da nacionalidade imposta para a inscrição rio registo dos trabalhadores viola o artigo 7.°, bem como os artigos 48.°, 52.° e 221.° do Tratado.

O direito exclusivo das companhias limita ainda a livre concorrência e é, portanto, contrário às disposições conjugadas dos artigos 85.° e 90.°, n.° 1. É certo que a repartição do mercado nacional entre as companhias portuárias tem origem, não num acordo entre empresas, mas na lei; contudo, a jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça admite a aplicação do artigo 85;° em conjugação com os artigos 3.°, alínea f), e 5.° do Tratado, quando os Estados-membros adoptem disposições legislativas que, ao excluir a concorrência num determinado sector económico, produzem os mesmos efeitos que os acordos proibidos e as práticas concertadas entre empresas.

O direito exclusivo das companhias, em conjugação com a regulamentação em matéria da determinação e aplicação das tarifas e com os actos por meio dos quais essas tarifas são efectivamente fixadas, constitui ainda um abuso de posição dominante, na acepção do artigo 86.° do Tratado. O regime italiano redundará, designadamente, numa situação de preços e de condições não equitativos, na acepção da alínea a) do artigo 86.°, na medida em que as autoridades públicas permitem o aumento arbitrário do número dos trabalhadores que compõem as equipas, o que tem como resultado a existência de custos desproporcionados em relação ao rendimento, a imposição de tarifas a taxa fixa que englobam prestações que não são efectuadas e a obrigação, imposta aos utilizadores, de pagar equipas inactivas ou operações não efectuadas. O sistema tem ainda como resultado serem impostas condições desiguais para prestações equivalentes, na acepção da alínea c) do artigo 86.°, com a cobrança de suplementos e de majorações tarifárias, designadamente para certas operações efectuadas com meios mecânicos, ou com a aplicação diversificada das diferentes posições tarifárias, o que se presta a discriminações entre utilizadores; a este título, a Merci invoca um certo número de exemplos de práticas abusivas correntes no porto de Génova. Esses abusos levam a alterações a nível dos meios de transporte utilizados ou dos portos escolhidos, o que constitui um obstáculo às trocas comerciais. O porto de Génova, tendo em conta a sua importância a nível nacional e o volume de tráfego, constitui certamente um «relevant market», na acepção do artigo 86.° do Tratado.

No que se refere ao artigo 30.°, a Merci refere que os utilizadores dos serviços portuários são obrigados a suportar um ónus económico injustificado que, no porto de Génova, incide na ordem dos 75 % sobre as mercadorias provenientes do estrangeiro; assim sendo, esses ónus podem perfeitamente ser assimilados a medidas restritivas das importações.

c)

Quanto à segunda questão, referente ao artigo 90.°, n.° 2, do Tratado, a Merci expõe que as companhias portuárias não podem ser consideradas como «empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral». Isso resulta do próprio código da navegação, que prevê, expressamente, em função precisamente do interesse económico, derrogações a essa reserva e que não impõe qualquer condição precisa no que se refere ao cumprimento dos serviços.

A noção de interesse económico geral caracteriza serviços para os quais convém ou é necessário que os preços sejam fixados pelos poderes públicos, não com base na lei da oferta e da procura mas em função de outros critérios. O interesse económico visado no artigo 90.° deve ser de ordem geral ou pública e opõe-se à noção de interesse especial de um particular, de um indivíduo ou de um grupo. Ora, o monopólio das companhias explica-se pela salvaguarda do interesse exclusivo dos trabalhadores que nela estão associados. A análise histórica da legislação italiana põe, ainda, em evidência que o legislador dessa época não teve em vista o exercício de actividades de interesse geral, mas a defesa de um interesse coorporativo.

A título de conclusão, a Merci observa que as companhias portuárias não exercem uma actividade de interesse económico geral, não cumprem qualquer missão específica e estão plenamente obrigadas ao respeito do disposto nos artigos 85.°, 86.° e 90.° do Tratado.

2.

A Siderurgica, recorrida na causa principal, observa, a título preliminar, que incumbe ao Tribunal de Justiça tirar das questões formuladas pelo órgão jurisdicional nacional os elementos referentes à interpretação do Tratado úteis para a solução do litígio. Analisando o processo pendente no órgão jurisdicional nacional, a situação de facto no porto de Génova e a legislação italiana, a Siderurgica observa, especificamente, que a Merci, cujo capital é inteiramente controlado pelo CAP, é titular do direito exclusivo de efectuar as operações portuárias referentes às mercadorias convencionais. Para realizar essas operações, a Merci deve obrigatoriamente recorrer ao pessoal da companhia e as tarifas correspondentes a essas prestações são impostas e homologadas por meio de actos administrativos do CAP. Portanto, a Merci pode ser considerada como um instrumento criado pela administração pública para a salvaguarda dos privilégios de uma minoria coorporativa.

a)

O sistema tarifário praticado no porto de Génova é muito complexo, a sua composição particularmente confusa e o custo final impossível de determinar previamente. A aplicação dessas tarifas conduz à aplicação de preços desproporcionados em relação às prestações e discriminatórios segundo os utilizadores. A título de práticas abusivas, contrárias às alíneas a) e c) do artigo 86.° do Tratado, a Siderurgica cita igualmente os exemplos postos em evidência pela Merci. Acrescenta, a título de práticas contrárias à alínea b) do artigo 86.°, a deliberada não utilização de meios mecânicos mais aperfeiçoados. Todas essas práticas causam, dada a preponderância do tráfego internacional e intracomunitário no porto de Génova, um dano grave ao comércio entre os Estados-membros. Esse porto constitui, tanto pelo volume de tráfego como em razão das suas características, uma parte substancial do mercado comum. As tarifas praticadas, aprovadas e tornadas executórias pelo CAP, tradüzem-se, para o porto de Genova, nos custos mais elevados, em relação aos serviços- oferecidos, em toda a Comunidade. Esses custos exercem uma incidência negativa no preço das mercadorias que transitam no porto e determinam importantes perdas de tráfego.

b)

No que se refere à primeira questão prejudicial, a Siderurgica refere que o n.° 1 do artigo 90.° atribui aos particulares direitos que os Estados-membros são obrigados a respeitar sempre que seja invocado em conjunção com outras normas jurídicas às quais tenha sido reconhecido efeito directo.,

O artigo 7° do Tratado tem indubitavelmente esse efeito directo e a exigência referente à nacionalidade que é imposta aos trabalhadores que efectuam operações portuárias viola esse texto. A mesma conclusão se chega se tivermos em consideração o disposto no artigo 48.°, relativo à livre circulação dos trabalhadores, e no artigo 59.° sobre a livre prestação dos serviços, no Regulamento (CEE) n.° 4055/86 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, que aplica o princípio da livre prestação dos serviços aos transportes marítimos entre Estados-membros e entre Estados-membros e países terceiros (TO L 378, p. 1), nos artigos 52.° e 58.°, referentes ao direito de estabelecimento das sociedades, e no artigo 221.° sobre a proibição de discriminações no que se refere à participação financeira dos nacionais dos outros Estados-membros no capital das sociedades.

O regime italiano conduz a uma repartição do mercado nacional dos serviços portuários que, tendo fundamento na lei e não num acordo entre empresas, não é por isso menos contrário ao artigo 85.° do Tratado.

É jurisprudência constante (ver o acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, 155/73, Recueil, p. 409) que, mesmo no ambito do artigo 90.°, as proibições do artigo 86.° têm efeito directo. É ainda da jurisprudência que um monopólio garantido por lei constitui um caso de posição dominante (ver, especificamente, o acórdão de 3 de Outubro de 1985, CBEM/CLT e IPB, 311/84, Recueil, p. 3261). Os serviços prestados no porto de Genova são suficientemente importantes para que esse porto possa ser qualificado de parte substancial do mercado comum, na acepção do artigo 86.° De resto, as prestações de serviços, e não apenas as mercadorias, também fazem parte do comércio a que esse texto se refere (ver o acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, supracitado). A exploração abusiva de uma posição dominante concretiza-se, segundo o Tribunal de Justiça, sempre que se verifique um abuso em relação aos consumidores, utilizadores e concorrentes, actuais ou potenciais, e ainda nos casos em que se realizem práticas que, ainda que não se prendam directamente com o comportamento da empresa, sendo apenas operações internas, causem igualmente um prejuízo ao consumidor, ao modificar as estruturas da oferta (acórdão de 30 de Janeiro de 1974, BRT, 127/73, Recueil, p. 51; acórdão de 6 de Março de 1974, Istituto chemioterapico italiano, 6/73 e 7/73, Recueil, p. 223; acórdão de 13 de Novembro de 1975, General Motors, 26/75, Recueil, p. 1367). Ora, os documentos dos autos na causa principal evidenciam que aos utilizadores são impostas condições injustas e exorbitantes, que a tecnicidade, a natureza discriminatória e a fraca transparência das tarifas permitem a aplicação de condições desiguais para prestações equivalentes e que os preços praticados no porto de Gênova não são equitativos e, em comparação com os dos outros portos, são os mais exorbitantes.

A imposição de tarifas injustas e desproporcionadas, e isso principalmente em relação ao tráfego internacional, que representa 75 % do volume do porto de Gênova, pode igualmente ser considerada uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas, na acepção do artigo 30.° do Tratado.

O regime portuário italiano infringe ainda o artigo 37.° do Tratado, na medida em que se pode considerar que as poucas empresas que controlam o mercado dos serviços em causa e que não estão em concorrência entre si dispõem de um monopólio colectivo com possíveis efeitos discriminatórios sobre as mercadorias importadas em relação às mercadorias nacionais.

c)

No que se refere à segunda questão prejudicial, a Siderurgica observa que não estamos em presença de uma empresa encarregada da gestão de serviços de interesse econômico geral, na acepção do n.° 2 do artigo 90.° do Tratado. A Siderurgica remete a este respeito para uma decisão do tribunal administrativo regional que exclui categoricamente estarem as companhias portuárias encarregadas de prestar um serviço de interesse econômico geral. Essa orientação é unanimemente partilhada pela doutrina italiana e serviu igualmente de base a um projecto de lei que visa a supressão do último parágrafo do artigo 110.° do Código da Navegação.

Ainda que eventualmente se viesse a considerar que a empresa e/ou a companhia prestam um serviço de interesse económico geral, não se demonstrou que as práticas vedadas pelo artigo 86.° sejam necessárias ao exercício das respectivas missões.

Portanto, a Siderurgica propõe que se responda da seguinte forma às questões submetidas: ;

«1)

As disposições do artigo 90.° do Tratado que institui a CEE e as proibições enunciadas dos artigos 7°, 30.°, 85.° e 86.° desse Tratado atribuem aos sujeitos do ordenamento jurídico comunitário direitos que os Estados-membros são obrigados a respeitar.

2)

Os artigos 48.°, 52.° e 59.° do Tratado não são compatíveis com uma norma nacional... que impõe às empresas autorizadas a exercer actividades nos portos a proibição de utilizar, para a sua actividade empresarial, pessoal dependente directamente dessa empresa, com a correspondente obrigação de recorrer exclusivamente ao pessoal constituído em companhias ou em grupos de trabalho nos termos da legislação italiana.

3)

As disposições do artigo 90.° do Tratado, em conjugação com a liberdade garantida pelos artigos 48.°, 52.°; e 59.° do mesmo Tratado, não são compatíveis com uma regulamentação nacional que, na hipótese da importação por via marítima, para ò território de um Es-tado-membro da CEE, de mercadorias provenientes de outro Estado-membro, reserva exclusivamente a determinadas empresas e/ou companhias portuárias a execução das operações de carga e de descarga das mercadorias nos portos nacionais, mesmo quando seja possível efectuar essas operações com os meios e o pessoal de bordo.

4)

O artigo 90.°, n.° 1, do Tratado obsta à manutenção de uma regulamentação nacional que :

a)

atribui a companhias portuárias ou à grupos de trabalhadores o direito exclusivo de exercer a actividade laboral num porto;

b)

proíbe às empresas autorizadas a trabalhar nos portos a utilização, para a sua actividade empresarial, do pessoal dependente dessa mesma empresa;

c)

impõe a essas empresas, penalizando um comportamento diferente, a obrigação de utilizar, para a sua actividade e a custos impostos, exclusivamente o pessoal constituído em companhias ou em grupos de trabalho nos termos da legislação italiana, que, além disso, apenas pode ser de nacionalidade italiana.

5)

O n.° 1 do artigo 90.° do Tratado obsta à manutenção de uma regulamentação nacional que, ao atribuir às companhias portuárias locais (ou aos grupos de trabalhadores residentes no porto) o direito exclusivo de trabalhar nesse porto, proíbe, sancionando a não observância dessa proibição:

a)

o exercício dessas actividades, a título de prestação de serviços, aos navios de outros Estados-membros, através dos meios e do pessoal de bordo;

b)

o exercício dessas mesmas actividades, a título da liberdade de estabelecimento, às empresas dos outros Estados-membros, através de uma organização estável de pessoal e de meios no âmbito desse porto.

6)

O artigo 7.° do Tratado não é compatível com uma regulamentação nacional que exclui a possibilidade dos nacionais dos Estados-membros e das empresas constituídas nos termos da legislação desses Estados de efectuarem, ocasionalmente e/ou permanentemente, no âmbito dos portos nacionais, prestações de serviços e/ou actividades empresariais relacionadas com as operações de carga e descarga das mercadorias importadas e exportadas de ou para outros Estados-membros.

7)

Uma disposição nacional que autoriza a aplicação de tarifas injustas e não proporcionais para a execução das operações de descarga de mercadorias num porto nacional é de natureza a entravar o comércio entre os Estados-membros e, como tal, é proibida pelos artigos 9.° e 30.° do Tratado, quando, devido à prevalência quantitativa das mercadorias provenientes do estrangeiro em relação às que provêm de outros portos nacionais, tais imposições exerçam uma incidência proporcionalmente mais importante sobre as mercadorias estrangeiras, tornando assim mais difíceis e onerosas as importações.

8)

O artigo 85.° do Tratado é incompatível com uma regulamentação nacional que reparte territorialmente o mercado nacional dos serviços portuários em benefício das companhias que são constituídas, em conformidade com o direito interno, no quadro geográfico dos diferentes portos.

9)

O artigo 86.° do Tratado deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade nacional concessionária de serviços portuários que ocupa uma posição dominante numa parte substancial do mercado comum:

a)

impõe transacções não equitativas quando as compensações que aplica aos utilizadores sejam sensivelmente mais elevadas que as praticadas nos outros portos em relação a prestações equivalentes;

b)

aplica nas relações comerciais com outros contratantes condições diferentes para prestações equivalentes, se a tarifa aplicável às compensações, em razão do tecnicismo que permite a sua aplicação discricionária, criar uma discriminação entre os utilizadores.

10)

O artigo 90.°, n.° 2, do Tratado que institui a CEE deve ser interpretado no sentido de que:

a)

o movimento das mercadorias em trânsito nos portos nacionais não constitui uma actividade empresarial de interesse económico geral;

b)

as empresas encarregadas de efectuar as operações portuárias são obrigadas ao respeito das normas do Tratado, e em especial das normas da concorrência, não fazendo a aplicação dessas normas obstáculo à execução das operações de carga e de descarga nos portos nacionais de mercadorias destinadas a ou provenientes de outros Estados-membros da Comunidade;

c)

as trocas intracomunitárias seriam comprometidas, contrariamente aos princípios nos quais se funda a Comunidade, por um regime de derrogação ao respeito das normas do Tratado, sendo esse regime aplicado às empresas encarregadas da prestação de serviços no âmbito dos portos.»

3.

A Comissão considera que ás duas questões do tribunal de Génova devem ser interpretadas da seguinte forma:

«1)

No estado actual do direito comunitário, é possível reservar para os nacionais a execução das operações portuárias nos portos italianos...; caso essa ‘reserva’ não seja autorizada pelo direito comunitário, atribui este directamente às pessoas sujeitas a tal ordenamento jurídico direitos que os Estados-membros são obrigados a respeitar?

2)

Se, no estado actual do direito comunitário, a execução das operações portuárias pode ser reservada em regime de monopólio... às companhias portuárias ou aos grupos sujeitos à autoridade portuária pública e com base em normas e tarifas fixadas e aprovadas pela autoridade pública e, por conseguinte, determinadas de modo obrigatório, quando se trate de operações de carga e de descarga susceptíveis de serem efectuadas com os meios e o pessoal de bordo; caso essa ‘reserva’ não seja autorizada pelo direito comunitário, atribui este directamente às pessoas sujeitas a tal ordenamento jurídico direitos que os Estados-membros são obrigados a respeitar?»

a)

Segundo a Comissão, os artigos 30.° e 37.° do Tratado não relevam para os presentes autos. Não será evidente, à primeira vista, que as normas nacionais em causa sejam susceptíveis de pôr entraves à colocação no mercado italiano dos produtos importados, considerados em relação aos produtos nacionais. O artigo 37.° do Tratado visa, nos termos do acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, supracitado, as trocas de mercadorias e não se aplica a um monopólio de prestação de serviços. No acórdão de 28 de Junho de 1983, Amélioration de l'élevage (271/80, Recueil, p. 2057), o Tribunal de Justiça precisou que o artigo 37.° não pode ter por objecto um monopólio de prestação de serviços quando esse monopólio não viole o princípio da livre circulação das mercadorias, discriminando os produtos importados em benefício dos produtos de origem nacional.

b)

No que se refere à primeira questão, tal como foi reformulada, a Comissão considera que, sem ser necessário decidir da questão de saber se a actividade do pessoal das empresas e/ou das companhias portuárias deve ser considerada como um trabalho remunerado ou como uma actividade autónoma e/ou empresarial, se deve reconhecer que a regulamentação italiana viola a proibição das discriminações em razão da nacionalidade, consagrada nos artigos 7.°, 48.° e 52.° do Tratado, que são normas, segundo uma jurisprudência constante, directamente aplicáveis. A Comissão exprime, todavia, dúvidas quanto à pertinência da primeira questão para a solução do litígio a decidir pelo juiz nacional; com efeito, a impossibilidade de desembarcar directamente a mercadoria é menos devida às condições de nacionalidade impostas pela legislação italiana que à reserva das operações portuárias em benefício das companhias. Caso o juiz nacional considere que os artigos 7.° e 48.° ou 7.° e 52.° são relevantes, deverá reconhecer a incompatibilidade da regulamentação nacional com essas disposições e aplicá-las directamente, afastando a aplicação do direito nacional.

Independentemente da eventual aplicação do artigo 59.° à luz do artigo 90.°, a Comissão considera que a regulamentação italiana, que proíbe a realização de operações portuárias aos prestadores de serviços estabelecidos noutros Estados-membros, é contrária ao artigo 59.° do Tratado. As operações portuárias inserem-se nos serviços que são regulamentados pelo artigo 60.° do Tratado, em relação aos quais o artigo 59.° exige a supressão das restrições à livre prestação. Essa liberdade apenas pode ser limitada por razões atinentes à salvaguarda da ordem, segurança ou saúde públicas, ou por necessidades objectivas e inerentes à natureza das prestações, condições que, concretamente, não estão preenchidas. De igual modo, não se pode admitir, por referência às disposições conjugadas dos artigos 66.° e 55.° do Tratado, que os serviços em causa representem um exercício da autoridade pública.

c)

No âmbito da segunda questão, a Comissão analisa sucessivamente o artigo 90.°, n.os 1 e 2, no estado actual do direito comunitário e da jurisprudência, a competência do juiz nacional para a aplicação dessas normas e a aplicabilidade do artigo 90.°, n.os 1 e 2, às empresas e/ou companhias que operam no porto de Génova.

O artigo 90.°, n.° 1, permite aos Estados a atribuição às empresas de direitos especiais ou exclusivos, desde que essas empresas exerçam as suas actividades no respeito das proibições especificamente enunciadas no Tratado. O facto de o artigo 90.°, n.° 1, se referir aos Estados-membros não impede que todas as empresas que operam no âmbito comunitário, incluindo as empresas públicas e as que operam em regime de monopólio legal, estejam plenamente sujeitas às normas do Tratado, independentemente do facto de se saber se se trata de empresas públicas ou privadas. O artigo 86.° também lhes é aplicável, com a única reserva de que a empresa não pode ser objecto de uma sanção aplicada com base nas normas do direito comunitário, quando seja incontestável mais não ter feito do que se conformar com uma medida obrigatória adoptada por um Estado-membro em violação do n.° 1 do artigo 90.°

Sem negar às autoridades nacionais o direito de impor as tarifas à empresa titular de um direito especial ou exclusivo (ver o acórdão de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed, 66/86, Colect., p. 803), o Tribunal considerou que a imposição, pela empresa ao utilizador, de tarifas não equitativas constitui um abuso, na acepção do artigo 86.°, no âmbito do artigo 90.° (acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, supracitado; acórdão de 4 de Maio de 1988, Bodson, 30/87, Colect., p. 2479).

Segundo a Comissão, uma empresa titular de direitos exclusivos e, portanto, que beneficia de uma posição dominante que aplique tarifas não equitativas infringe o artigo 86.°, segundo parágrafo, alínea a), do Tratado: se as tarifas tiverem sido impostas pelas autoridades públicas e a empresa não dispuser de qualquer margem de apreciação quanto à sua aplicação, será responsável pela infracção em conjunto com o Estado, em conformidade com o disposto no n.° 1 do artigo 90.°, ainda que tal não dê origem a que lhe sejam aplicadas sanções; se a empresa aplicar tarifas superiores às fixadas pelas autoridades públicas, maior será ainda a sua responsabilidade e incorrerá na aplicação de sanções, nos termos do artigo 86.°, e isso independentemente da responsabilidade do Estado.

No que se refere ao n.° 2 do artigo 90.° do Tratado, a Comissão expõe que essa norma visa as empresas, privadas ou públicas, que sejam encarregadas pelo Estado do desempenho de uma missão de interesse geral. Uma vez que. justifica certas derrogações ao Tratado, esse conceito terá sido sempre objecto de uma interpretação restritiva por parte da jurisprudência (acórdão de 14 de Julho de 1971, Hein, 10/71, Recueil, p. 723; acórdão de 30 de Janeiro de 1974, BRT, supracitado; acórdão de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed, supracitado).

No que se refere à competência do juiz nacional para a aplicação do artigo 90.°, a Comissão recorda ser de jurisprudencia constante que os artigos 85.° e 86.° produzem efeito directo, mesmo em relação às empresas abrangidas pelo artigo 90.° (acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, supracitado; acórdão de 9 de Junho de 1977, Van Ameyede, 90/76, Recueil, p. 1091). Em contrapartida, o Tribunal de Justiça decidiu nos acórdãos de 14 de Julho de 1971, Hein, supracitado, de 10 de Março de 1983, Inter-Huiles (172/82, Recueil, p. 555), e de 20 de Março de 1985, Itália/Comisssão (41/83, Recueil, p. 873), que o n.° 2 do artigo 90.° não é susceptível de criar direitos individuais que os juízes nacionais devam salvaguardar. Todavia, o Tribunal de Justiça afirmou nos acórdãos de 30 de Janeiro de 1974, BRT, supracitado, de 30 de Abril de 1974, Sacchi, supracitado, e de 11 de Abril de 1989, Ahmed Saeed, supracitado, que incumbe ao juiz nacional verificar se a empresa que se prevalece da derrogação do n.° 2 do artigo 90.° foi efectivamente encarregada por um Estado-membro da gestão de um serviço de interesse económico geral e se o seu comportamento é necessário para o cumprimento da sua missão de interesse geral.

Aplicando os princípios assim formulados, à situação existente no porto de Génova, a Comissão observa que a empresa e/ou a companhia portuária constituem empresas às quais o Estado.italiano concedeu direitos especiais ou exclusivos, na acepção do n.° 1 do artigo 90.°

Apenas se poderá verificar a violação do artigo 85.° do Tratado, em conjugação com o artigo 90.°, quando a empresa ou a companhia tenham celebrado um acordo no que se refere, especificamente, aos critérios de cálculo dos preços aplicáveis aos utilizadores do porto.

Verificar-se-á uma violação do artigo 59.°, em conjugação com o artigo 90.°, quando, como no presente caso, a empresa ou as empresas titulares de direitos especiais ou exclusivos impeçam a livre prestação dos serviços, concretamente, as operações de carga e de descarga de mercadorias, aos prestadores de serviços que estejam estabelecidos noutros Estados-membros.

Verificar-se-á ainda uma violação do artigo 86.°, em conjugação com o artigo 90.°, quando a empresa ou a companhia portuária abusem da sua posição dominante para obterem vantagens que não poderiam obter em condições normais de concorrência. Aplicando estes princípios ao caso concreto, a Comissão sublinha que o produto em causa é constituído pelos serviços referentes às operações portuárias, que o porto de Génova, dada a sua importância, pode ser considerado como o mercado geográfico em causa e que a empresa, concretamente a Merci, que é a concessionária exclusiva das operações portuárias referentes a uma certa categoria de mercadorias, ocupa uma posição dominante. O juiz nacional pode considerar que a empresa Merci viola o artigo 86.° caso julgue provado impor essa empresa ao utilizador prestações que este não solicitou e que não estão abrangidas na reserva legal, ou prestações que não sejam necessárias, ou que lhe aplica tarifas que excedem os limites legais, ou ainda que lhe impõe tarifas não equitativas em relação aos serviços efectivamente prestados. Verificar--se-á ainda um abuso caso as tarifas praticadas incluam despesas com pessoal que não se relacionem com as necessidades reais em mão-de-obra ou o custo real das operações.

No que se refere à aplicabilidade do artigo 90.°, n.° 2, a Comissão observa que a empresa ou a companhia portuária exercem, é certo, um serviço de interesse público, mas que não pode, ipso facto, ser qualificado de serviço de interesse econémico geral. De resto, os direitos exclusivos de que são beneficiárias as empresas têm por objecto o interesse do pessoal portuário. Mesmo que se aceitasse que a empresa e a companhia prestam um serviço de interesse econémico geral, o seu comportamento estaria sujeito à censura do artigo 86.°, a menos que se demonstrasse que as proibições que essa norma enuncia são incompatíveis com o exercício da sua missão.

Portanto, a Comissão propõe que se responda da seguinte forma às questões prejudiciais submetidas:

«1)

Uma regulamentação nacional que reserva para os nacionais a execução das operações portuárias nos portos nacionais, no que se refere, designadamente, à carga e à descarga das mercadorias, é contrária aos artigos 48.°, n.° 2, ou 52.° do Tratado CEE; esses artigos do Tratado CEE conferem aos particulares direitos que os juízes nacionais devem salvaguardar.

2)

Uma regulamentação nacional que reserva, sem justificação fundada no interesse geral, apenas para as companhias portuárias constituídas de acordo com o direito nacional, as operações portuárias nos portos nacionais, designadamente, a carga e a descarga das mercadorias, excluindo a possibilidade dessas mesmas operações serem efectuadas pelos navios dos outros Estados-membros, através dos meios e do pessoal de bordo, é incompatível com o artigo 59.° do Tratado CEE; esse artigo do Tratado confere aos particulares direitos que os juízes nacionais devem salvaguardar.

3)

O comportamento de uma empresa, única concessionária das actividades que se prendem com as operações portuárias em determinado porto que constitui uma parte substancial do mercado comum, que consiste em impor, a) tarifas não equitativas e não transparentes, b) o recurso ao pessoal das companhias portuárias desse porto mesmo quando as operações portuárias, designadamente, a carga e a descarga das mercadorias, possam ser efectuadas directamente pelos navios dos outros Estados-membros, através dos meios e do pessoal de bordo, constitui um abuso de posição dominante, na acepção do artigo 86.° do Tratado CEE, quando e na medida em que a empresa titular do direito especial ou exclusivo não tenha capacidade para satisfazer integralmente a procura dos utilizadores dos serviços portuários; o artigo 86.° confere aos particulares direitos que os juízes nacionais devem salvaguardar.

4)

O artigo 90.°, n.° 1, do Tratado CEE proíbe às autoridades de um Estado-membro obrigar uma empresa à qual essas mesmas autoridades já atribuíram direitos especiais ou exclusivos, tais como os referentes ao exercício das actividades portuárias num porto que constitui uma parte substancial do mercado comum, a) reservar essas actividades unicamente para os nacionais desse Estado, em violação dos artigos 48.° e 52.° do Tratado, b) impedir o exercício dessas mesmas actividades, a título de prestação de serviços, pelos navios dos outros Estados-membros, através dos meios e do pessoal de bordo, em violação do artigo 59.° do Tratado, c) praticar tarifas não equitativas e obrigar, em todas as circunstâncias, os utilizadores do porto a recorrerem ao pessoal das companhias portuárias desse porto, em violação do artigo 86.° do Tratado; o artigo 90.°, n.° 1, do Tratado, em conjugação com os artigos 48.°, 52.°, 59.° e 86.°, confere aos particulares direitos que estes podem invocar contra as autoridades públicas de um Estado-membro e que os juízes nacionais devem salvaguardar.

5)

Independentemente da qualificação de uma empresa concessionária e/ou de uma companhia portuária, que beneficiem dé uma reserva exclusiva para a execução das operações portuárias, e, designadamente, a carga e a descarga das mercadorias no porto, enquanto empresas encarregadas da gestão de um serviço de interesse econômico geral, na acepção do n.° 2 do artigo 90.° do Tratado, os direitos especiais que lhes sejam, atribuídos e as tarifas que pratiquem não se justificam por qualquer exigência relativa ao cumprimento, de missão específica que lhes foi confiada que possa obstar à aplicação das normas do Tratado, designadamente, das normas em matéria de concorrência.»

F. A. Schockweiler

Juiz-relator


( *1 ) Lingua do processo: italiano.


ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

10 de Dezembro de 1991 ( *1 )

No processo C-179/90,

que tem por objecto um pedido apresentado ao Tribunal, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, pelo Tribunale di Genova (Itália), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Merci convenzionali porto dì Genova SpA

e

Siderurgica Gabrielli SpA,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 7.°, 30.°, 85.°, 86.° e 90.° do Tratado CEE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, Sir Gordon Slynn, R. Joliét, F. A. Schockweiler, F. Grévisse e P. J. G. Kapteyn, presidentes de secção, G. F. Mancini, C. N. Kakouris, J. C. Moitinho de Almeida, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Diez de Velasco, juízes,

advogado-geral: W. Van Gerven

secretario: H. A. Rühl, administrador principal

vistas as alegações escritas apresentadas:

em representação da Merci convenzionali porto di Genova SpA, por Sergio Medina e Giuseppe Ferraris, advogados no foro de Genova,

em representação da Siderurgica Gabrielli SpA, por Giuseppe Conte e Giuseppe Michele Giacomini, advogados no foro de Genova,

em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por Enrico Traversa, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Renzo Maria Morresi, advogado no foro de Bolonha,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Merci convenzionali porto di Genova SpA, da Siderurgica Gabrielli SpA e da Comissão, na audiencia de 30 de Maio de 1991,

ouvidas as conclusões do advogado-geŕal apresentadas na audiência de 19 de Setembro de 1991,

profere o presente

Acórdão

1

Por despacho de 6 de Abril de 1990, entrado no Tribunal de Justiça em 7 de Junho seguinte, o Tribunale di Genova submeteu, nos termos do artigo 177.° do Tratado CEE, duas questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 7.°, 30.°, 85.°, 86.° e 90.° desse Tratado.

2

Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe a sociedade Merci convenzionali porto de Genova SpA (a seguir «Merci») à sociedade Siderurgica Gabrielli SpA (a seguir «Siderurgica») a propòsito da execução das operações de descarga de mercadorias no porto de Genova.

3

Resulta dos documentos apresentados ao Tribunal que em Itália as operações de carga, descarga, transbordo, armazenagem e movimento em geral das mercadorias ou de qualquer material no porto são reservadas, por. força do artigo 110.° do Código da Navegação, a companhias portuárias cujos trabalhadores, que têm igualmente a qualidade de membros dessas companhias, devem, por força dos artigos 152.° e 156.° do Regulamento da Navegação Marítima, ser de nacionalidade italiana. O não respeito dos direitos exclusivos de que estão revestidas as companhias portuárias é objecto das sanções penais previstas no artigo 1172.° do Código , da Navegação.

4

A organização das operações portuárias por conta de terceiros foi atribuída, em aplicação do artigo 111.° do Código da Navegação, a empresas portuárias. Para a execução das operações portuárias, essas empresas, constituídas, regra geral, sob a forma de sociedades de direito privado, devem recorrer exclusivamente às companhias portuárias.

5

Em aplicação da regulamentação italiana, a Siderurgica dirigiu-se à Merci, empresa a que foi atribuído o direito exclusivo referente à actividade operacional no porto de Génova para as mercadorias convencionais, para a descarga de uma partida de aço importada da República Federal da Alemanha, apesar de ter podido proceder à descarga directa através da equipagem do navio. Para efeitos das operações de descarga a Merci, por sua vez, fez apelo à companhia portuária de Génova.

6

Na sequência de um atraso na descarga das mercadorias devido, em especial, a greves dos trabalhadores da companhia portuária, nasceu um litígio entre a Siderurgica e a Merci no âmbito do qual a Siderurgica pediu a reparação do dano sofrido em virtude do atraso verificado e a repetição das quantias pagas, por ela consideradas como não equitativas face às prestações fornecidas. Devendo decidir o litígio, o Tribunale di Genova suspendeu a instância até que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre as seguintes questões prejudiciais:

«1)

No estado actual do direito comunitário, na hipótese da importação por via marítima, no território de um Estado-membro da CEE, de mercadorias provenientes de outro Estado-membro, o disposto no artigo 90.° do Tratado que institui a CEE e as proibições estabelecidas nos artigos 7.°, 30.°, 85.° e 86.° do mesmo Tratado atribuem aos cidadãos comunitários direitos que os Estados-membros devem respeitar, nos casos em que a uma empresa e/ou companhia portuária, que utiliza exclusivamente estivadores nacionais, seja reservada, em regime de exclusivo e de preços obrigatórios, à realização das operações de carga e de descarga de mercadorias nos portos nacionais, mesmo quando seja possível efectuar tais operações com os meios e o pessoal de bordo? ou

2)

uma empresa e/ou companhia portuária que utiliza exclusivamente estivadores nacionais, à qual está reservada, em regime de exclusivo e de preços obrigatórios, a realização das operações de carga e de descarga das mercadorias nos portos nacionais, constitui uma empresa encarregada da gestão de serviços de interesse económico geral, na acepção do segundo parágrafo do artigo 90.° do Tratado que institui a CEE, relativamente à qual a aplicação do disposto no primeiro parágrafo do mesmo artigo 90.° e das proibições impostas pelos artigos 7.°, 30.°, 85.° e 86.° do referido Tratado, constituem um obstáculo ao cumprimento, por parte desta, da missão particular que lhe foi confiada?»

7

Para mais ampla exposição da matéria de facto do litígio na causa principal, da tramitação processual, bem como das alegações escritas apresentadas ao Tribunal, remete-se para o relatório para audiência. Esses elementos dos autos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto à primeira questão

8

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional nacional procura, em substância, saber se o artigo 90.°, n.° 1, do Tratado, em conjugação com os artigos 7.°, 30.° e 86.° desse Tratado, se opõe a uma regulamentação de um Estado-membro que atribui a uma empresa estabelecida nesse Estado o direito exclusivo de organizar as operações portuárias e a obriga a recorrer, para a execução dessas operações, a uma companhia portuária composta exclusivamente de trabalhadores nacionais, e se essas disposições conferem aos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais devam salvaguardar.

9

Para responder a esta questão, nos termos em que foi reformulada, deve referir-se, a título preliminar, que tanto uma empresa portuaria que beneficia do exclusivo da organização das operações portuárias por conta de terceiros como uma companhia portuaria que beneficia do exclusivo da execução das operações portuárias devem ser consideradas como empresas às quais o Estado concedeu direitos exclusivos, na acepção do n.° 1 do artigo 90.° do Tratado.

10

Essa disposição prevê, para essas empresas, que os Estados-membros não tomarão nem manterão qualquer medida contrária às normas do Tratado, designadamente as previstas no artigo 7.° e as referentes às normas em matéria de concorrência.

11

No que se refere, em primeiro lugar, à condição de nacionalidade imposta ao pessoal da companhia portuária, deve recordar-se desde logo que, em conformidade com a jurisprudência, o artigo 7.° do Tratado, que consagra o princípio geral da não discriminação em razão da nacionalidade, apenas tem vocação para se aplicar de modo autônomo às situações regidas pelo direito comunitário para as quais o Tratado não preveja normas específicas de não discriminação (ver, por exemplo, o acórdão de 30 de Maio de 1989, Comissão/Grécia, n.os 12 e 13, 305/87, Colect., p. 1461; acórdão de 7 de Março de 1991, Masgio, n.° 12, C-10/90, Colect., p. I-1119).

12

Ora, no que se refere.aos trabalhadores assalariados, esse princípio foi aplicado e concretizado pelo artigo 48.° do Tratado.

13

A este respeito, deve recordar-se que o artigo 48.° do Tratado se opõe, a título principal, a uma regulamentação de um Estado-membro que reserve para os seus nacionais o direito de trabalhar no seio de uma empresa desse Estado, tal como ocorre com a companhia do porto de Génova, em causa perante o órgão jurisdicional de reenvio. Como o Tribunal de Justiça já decidiu (ver, por exemplo, o acórdão de 3 de Julho de 1986, Lawrie-Blum, n.° 17, 66/85, Colect., p. 2121), o conceito de trabalhador, na acepção do artigo 48.° do Tratado, pressupõe que uma pessoa cumpra, durante um certo período de tempo, a favor de outra e sob a sua direcção, prestações em contrapartida das quais recebe uma remuneração. Ora, essa qualificação não é afectada pelo facto de o trabalhador, continuando abrangido pelo nexo de subordinação em relação à empresa, estar ligado aos outros trabalhadores da empresa por relações de associação.

14

Em segundo lugar, no que se refere à existência dos direitos exclusivos, deve referir-se, antes de mais, que, no que se refere à interpretação do artigo 86.° do Tratado, é de jurisprudência constante que uma empresa que beneficie de um monopólio legal numa parte substancial do mercado comum pode ser considerada como ocupando uma posição dominante, na acepção do artigo 86.° do Tratado (ver o acórdão de 23 de Abril de 1991, Höfner, n.° 28, C-41/90, Colect:, p. I-1979; acórdão de 18 de Junho de 1991, ERT, n.° 31, C-260/89, Colect., p. I-2925).

15

Quanto à delimitação do mercado em causa, resulta da decisão de reenvio que esse mercado é o da organização, por conta de terceiros, das operações portuárias referentes ao frete comum no porto de Genova e à execução dessas operações. Tendo designadamente em conta o volume de tráfego no porto em questão e a importância que reveste este último em relação ao conjunto das actividades de importação e exportação por via marítima no Estado-membro em questão, esse mercado pode ser considerado como constituindo uma parte substancial do mercado comum.

16

Há seguidamente que precisar que o simples facto de se criar uma posição dominante por via da concessão de direitos exclusivos, na acepção do n.° 1 do artigo 90.° do Tratado, não é, enquanto tal, incompatível com o artigo 86.°

17

Todavia, o Tribunal já teve oportunidade de afirmar, a este respeito, que o Estado-membro viola as proibições contidas nessas duas disposições quando a empresa em causa seja levada, pelo simples exercício dos direitos exclusivos que lhe foram atribuídos, a explorar a sua posição dominante de modo abusivo (ver o acórdão de 23 de Abril de 1991, Höfner, já citado, n.° 29), ou quando esses direitos possam criar uma situação perante a qual essa empresa seja levada a cometer esses abusos (ver o acórdão de 18 de Junho de 1991, ERT, já citado, n.° 37).

18

Nos termos das alíneas a), b) e c) do segundo parágrafo do artigo 86.° do Tratado, essas práticas podem consistir, designadamente, no facto de se impor a quem procure os serviços em causa preços de compra ou outras condições de transacção não equitativas, na limitação do desenvolvimento técnico em prejuízo dos consumidores e na aplicação, aos parceiros comerciais, de condições desiguais para prestações equivalentes.

19

A este respeito, resulta das circunstâncias descritas pelo órgão jurisdicional nacional e discutidas perante o Tribunal de Justiça que as empresas a quem foi concedido, segundo as modalidades definidas na regulamentação nacional em causa, o direito exclusivo são, por esse facto, levadas tanto a exigir o pagamento de serviços não solicitados, como a facturar preços desproporcionados, ou a evitar o recurso à tecnologia moderna, o que implica um aumento dos custos das operações e a dilação dos seus prazos de execução, ou a conceder descontos a determinados utilizadores com uma correspondente compensação através do aumento dos preços facturados aos outros utilizadores.

20

Nestas condições, há que dar por assente que um Estado-membro cria uma situação contrária ao artigo 86.° do Tratado quando adopta uma regulamentação do tipo da em questão no órgão jurisdicional de reenvio, regulamentação que pode afectar o comércio entre os Estados-membros, como ocorre no litígio na causa principal vistos os elementos mencionados no n.° 15 do presente acórdão, referentes à importância do tráfego no porto de Génova.

21

No que diz respeito à interpretação do artigo 30.° do Tratado solicitada pelo órgão jurisdicional nacional, basta recordar que uma regulamentação nacional que tenha por efeito facilitar a exploração abusiva de uma posição dominante e que seja susceptível de afectar o comércio entre os Estados-membros é normalmente incompatível com este artigo, que proíbe as restrições quantitativas à importação, bem como qualquer medida de efeito equivalente (ver o acórdão de 16 de Novembro de 1977, Inno, n.° 35, 13/77, Recueil, p. 2115), na medida em que essa regulamentação tenha por efeito tornar mais onerosas e, por conseguinte, entravar as importações das mercadorias provenientes de outros Estados-membros.

22

Nos autos na causa principal, resulta da matéria dada por assente pelo órgão jurisdicional nacional que a descarga das mercadorias teria podido ser efectuada a menores custos pela equipagem do navio, de modo que o recurso obrigatório aos serviços das duas empresas às quais foram concedidos os direitos exclusivos originou custos suplementares e pôde, portanto, pelo seu efeito no preço das mercadorias, ter influído no nível das importações.

23

Em terceiro lugar, há que sublinhar que, mesmo no âmbito do artigo 90.°, as disposições dos artigos 30.°, 48.° e 86.° do Tratado têm efeito directo e conferem aos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar (ver, designadamente, para o artigo 86.° do Tratado, o acórdão de 30 de Abril de 1974, Sacchi, n.° 18, 155/73, Recueil, p. 409).

24

Portanto, há que responder à primeira questão, tal como foi reformulada, que:

— o artigo 90.°, n.° 1, do Tratado CEE, conjugado com os artigos 30.°, 48.° e 86.° do mesmo Tratado, opõe-se a uma regulamentação de um Estado-membro que confere a uma empresa estabelecida nesse Estado o direito exclusivo de organizar as operações portuárias e a obriga a recorrer, para a realização dessas operações, a uma companhia portuária que utiliza exclusivamente trabalhadores nacionais;

— os artigos 30.°, 48.° e 86.° do Tratado, conjugados com o artigo 90.°, conferem aos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar.

Quanto à segunda questão

25

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional nacional visa, em substância, saber se o artigo 90.°, n.° 2, do Tratado deve ser interpretado no sentido de que uma empresa e/ou uma companhia portuária que se encontrem na situação descrita na primeira questão devem ser consideradas como estando- encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, na acepção dessa disposição.

26

Para se responder a esta questão deve recordar-se que, para que a derrogação à aplicação das normas do Tratado prevista no seu artigo 90.°, n.° 2, possa ser aplicada, não basta apenas que a empresa em causa tenha sido encarregada pelos poderes públicos da gestão de um serviço económico de interesse geral, mas que é ainda necessário que a aplicação das normas do Tratado ponham em causa o cumprimento da missão específica confiada a essa empresa e o interesse da Comunidade não seja afectado (ver o acórdão de 3 de Outubro de 1985, CBEM, n.° 17, 311/84, Colect., p. 3261; e o acórdão de 23 de Abril de 1991, Höfner, já citado, n.° 24).

27

A este respeito, há que dar por assente que nem dos documentos trazidos ao processo pelo tribunal nacional nem das observações apresentadas ao Tribunal de Justiça resulta que as operações portuárias têm um interesse económico geral com características específicas face a outras actividades da vida económica e que também não resulta dos mesmos dados que, mesmo que aquelas operações tenham características específicas, a aplicação das normas do Tratado, em especial em matéria de concorrência e livre circulação, é de molde a pôr em causa aquela missão específica.

28

Portanto, há que responder à segunda questão que o artigo 90.°, n.° 2, do Tratado deve ser interpretado no sentido de que uma empresa e/ou uma companhia portuária que se encontrem na situação descrita na primeira questão não podem ser consideradas, com base apenas nos elementos constantes dessa descrição, como empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, na acepção dessa disposição.

Quanto às despesas

29

As despesas efectuadas pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentou observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões que lhe foram submetidas pelo Tribunale di Genova, por decisão de 6 de Abril de 1990, declara:

 

1)

O artigo 90.°, n.° 1, do Tratado CEE, conjugado com os artigos 30.°, 48.° e 86.° do mesmo Tratado, opõe-se a uma regulamentação de um Estado-membro que confere a uma empresa estabelecida nesse Estado o direito exclusivo de organizar as operações portuárias e a obriga a recorrer, para a realização dessas operações, a uma companhia portuária que utiliza exclusivamente trabalhadores nacionais.

 

2)

Os artigos 30.°, 48.° e 86.° do Tratado, conjugados com o artigo 90.°, conferem aos particulares direitos que os órgãos jurisdicionais nacionais devem salvaguardar.

 

3)

O artigo 90.°, n.° 2, do Tratado deve ser interpretado no sentido de que uma empresa e/ou uma companhia portuária que se encontrem na situação descrita na primeira questão não podem ser consideradas, com base apenas nos elementos constantes dessa descrição, como empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral, na acepção dessa disposição.

 

Due

Slynn

Joliet

Schockweiler

Grévisse

Kapteyn

Mancini

Kakouris

Moitinho de Almeida

Rodríguez Iglesias

Díez de Velasco

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Dezembro de 1991.

O secretário

J.-G. Giraud

O presidente

O. Due


( *1 ) Língua do processo: italiano.