ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

13 de Dezembro de 1990 ( *1 )

No processo T-20/89,

Heinz-Jörg Moritz, funcionário da Comissão das Comunidades Europeias, residente em Bridei (Luxemburgo), representado por Victor Biel, assistido por Aloyse May, advogados no foro do Luxemburgo, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do primeiro advogado, 18 A, rue des Glacis,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Christine Berardis-Kayser, membro do Serviço Jurídico e, em seguida, por Henri Étienne, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, assistido por Barbara Rapp-Jung, advogada em Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Guido Berardis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto, por um lado, a anulação da decisão da Comissão, de 2 de Julho de 1986, relativa à nomeação de um funcionário para um lugar de grau A 2 e, por outro, o ressarcimento dos danos materiais e morais alegados pelo recorrente,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção),

constituído pelos Srs. H. Kirschner, presidente, C. P. Briët e J. Biancarelli, juízes,

secretário: B. Pastor, administradora

vistos os autos e após a realização da audiência de 8 de Maio de 1990,

profere o presente

Acórdão

Matéria de facto

1

Até ao fim do mês de Janeiro de 1990, data da sua aposentação, o recorrente era funcionário do grau A 3 na Comissão das Comunidades Europeias, onde ocupava um lugar de chefe de divisão na Direcção-Geral XVIII (Crédito e Investimentos). O recorrente candidatou-se a um lugar, de grau A 2, director dos investimentos e empréstimos na referida direcção-geral (aviso de abertura de vaga COM/24/86).

2

No seu parecer 17/86, de 22 de Abril de 1986, o Comité Consultivo das Nomeações para os graus A 2 e A 3 da Comissão (a seguir «comité consultivo»), ao qual foram submetidas as candidaturas do recorrente e de outro funcionário da Comissão, entendeu que nenhum dos candidatos possuía a totalidade das qualificações exigidas.

3

Na sua reunião de 30 de Abril de 1986, a recorrida examinou, nos termos do artigo 29.°, n.° 1, alínea a), do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto») — relativo ao preenchimento do referido lugar vago por promoção ou mutação no seio da instituição —, as duas candidaturas em presença e decidiu não prover o lugar vago.

4

A recorrida decidiu então aplicar o n.° 2 do artigo 29.° do Estatuto, segundo o qual a Autoridade Investida do Poder de Nomeação (a seguir «AIPN») pode adoptar um processo de recrutamento diferente do previsto no n.° 1 no que respeita ao recrutamento dos funcionários dos graus A 1 e A 2.

5

Na sua reunião de 27 de Junho de 1986, o comité consultivo entendeu que a candidatura apresentada por Dieter Engel, que não tinha, nessa altura, a qualidade de funcionário das Comunidades Europeias, nos termos do n.° 2 do artigo 29.°, do Estatuto, deveria ser tomada em consideração. Em 2 de Julho de 1986, a recorrida nomeou D. Engel que tinha então a nacionalidade canadiana, para o lugar em questão, após ter procedido a uma análise comparativa das três candidaturas em presença. Em 14 de Julho de 1986, o Sr. Matutes, membro da Comissão, responsável pelas nomeações na DG XVIII, informou o recorrente da referida decisão.

6

Por nota de 13 de Outubro de 1986, o recorrente apresentou uma reclamação na qual pedia a anulação da decisão que nomeava D. Engel para o lugar em questão. A reclamação foi indeferida por decisão da recorrida de 7 de Maio de 1987.

Tramitação processual

7

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça m 12 de Agosto de 1987, o recorrente interpôs o presente recurso contra a recorrida, no qual solicitava, por um lado, a anulação da decisão da Comissão, de 2 de Julho de 1986, que nomeia D. Engel, e da decisão que indefere a sua reclamação contra essa nomeação, bem como, por outro lado, o ressarcimento dos danos materiais e morais que entende ter sofrido.

8

A fase escrita do processo decorreu inteiramente perante o Tribunal de Justiça. Este último, por despacho de 15 de Novembro de 1989, remeteu o processo ao Tribunal de Primeira Instância, em aplicação do artigo 14.° da decisão do Conselho de 24 de Outubro de 1988 que institui o Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias.

9

Com base no relatório preliminar do juiz relator, o Tribunal de Primeira Instância decidiu realizar a audiência sem instrução prévia.

10

A audiência teve lugar em 8 de Maio de 1990. Foram ouvidas as alegações orais dos representantes das partes e as suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal.

11

O recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

ordenar imediatamente a apresentação de determinados documentos;

julgar o recurso admissível;

julgar o recurso procedente;

anular a decisão proferida sobre a reclamação;

anular a nomeação de D. Engel por ilegalidade;

condenar a recorrida nas despesas;

condenar a recorrida a indemnizar o recorrente pelos danos materiais e morais sofridos.

12

A recorrida conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar o recorrente nas despesas.

Quanto ao pedido de anulação

13

O recurso, interposto com base nos artigos 90.° e 91.° do Estatuto, dirige-se principalmente contra a decisão da recorrida, de 2 de Julho de 1986, que nomeia uma pessoa diferente do recorrente para um lugar de grau A 2 e contra a decisão da recorrida, de 7 de Maio de 1987, que indefere a reclamação do recorrente de 13 de Outubro de 1986.

14

Na audiência de 8 de Maio de 1990 a recorrida assinalou que, após a fase escrita do processo, o recorrente se tinha aposentado. Apoiando-se na jurisprudência do Tribunal de Justiça, a recorrida alega que, ao aposentar-se, o recorrente deixou de ter um interesse jurídico em pedir a anulação da nomeação de outro candidato.

15

Efectivamente, é jurisprudência assente que, para que um funcionário ou antigo funcionário possa interpor um recurso, ao abrigo dos artigos 90.° e 91.° do Estatuto, destinado a pedir a anulação de uma decisão da AIPN que procede a uma nomeação, tem que haver da sua parte um interesse pessoal na anulação do acto impugnado (ver acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Outubro de 1975, Marelico e outros/Comissão, 81 a 88/74, Recueil, p. 1247, de 30 de Maio de 1984, Picciolo/Parlamento, 11/83, Recueil, p. 2323, e de 10 de Março de 1989, Del Plato/Comissão, 126/87, Cole., p. 643).

16

O recorrente reconheceu na audiência ter-se aposentado recentemente, após ter atingido o limite de idade de 65 anos, o que resulta igualmente do seu processo individual, enviado ao Tribunal de Primeira Instância em conformidade com o artigo 26.°, último parágrafo, do Estatuto. Por conseguinte, näo pode ter pretensões no que respeita ao lugar em causa, uma vez que deixou de pertencer à instituição na qual estava vago o lugar preenchido através do acto impugnado. Daqui decorre que o recorrente deixou de ter interesse legítimo em ver anulada a nomeação do candidato nomeado para esse lugar.

17

Consequentemente, o pedido de anulação apresentado pelo recorrente deve ser julgado inadmissível.

Quanto aos pedidos de indemnização pelos danos materiais pretensamente sofridos

18

Embora o recorrente se tenha aposentado numa altura em que o processo estava pendente no Tribunal de Primeira Instância, não podendo, consequentemente, ter pretensões ao lugar em causa e não tendo, assim, qualquer interesse legítimo em obter a anulação da nomeação de D. Engel, conserva, porém, interesse em pedir que seja proferida uma decisão sobre essa nomeação no âmbito de um pedido destinado a obter o ressarcimento dos danos materiais e morais que entende ter sofrido devido ao comportamento da recorrida.

19

Para que o recorrente possa ter direito à indemnização do prejuízo pretensamente sofrido, tem que provar uma falta de serviço cometida pela instituição, a existência de um prejuízo certo e avaliável e o nexo de causalidade entre a falta e o prejuízo invocado. Por conseguinte, impõe-se examinar, em primeiro lugar, se a AIPN cometeu uma falta de serviço ao proceder à nomeação de D. Engel e, em seguida, apreciar os fundamentos apresentados pelo recorrente no sentido de demonstrar a ilegalidade dessa nomeação.

Quanto à falta de serviço eventualmente resultante de um erro de apreciação ou de desvio de poder

20

O recorrente afirma que o aviso de abertura de vaga correspondia «perfeitamente» ao seu perfil profissional e à sua área de actividade. Por conseguinte, parece-lhe incompreensível que o comité consultivo tenha considerado que ele não possuía a «totalidade das qualificações exigidas».

21

Afirma, além disso, que as suas qualificações (conhecimentos técnicos e experiência profissional) eram bastante superiores às do candidato finalmente escolhido pela Comissão. A este propósito, evoca os seus oito anos como chefe da divisão «Empréstimos», bem como os seus contactos com empresas da indústria do carvão e do aço e com os serviços da Comissão responsáveis por essas áreas. Alegou que, em contrapartida, o candidato escolhido mais não era do que um simples «chefe de departamento» de um banco alemão «encarregado de operações de investimento bancário na Asia», e isto após um curto episódio como co-director de um banco fundado no Luxemburgo mas dissolvido alguns anos mais tarde. Para o recorrente, todos estes elementos contribuem para provar que o comité consultivo e a recorrida cometeram um erro de apreciação ou um abuso de poder.

22

Em seu entender, o erro de apreciação pode decorrer do facto de, apesar do carácter incompleto do seu processo individual, resultante do facto de nele não estarem contidos os relatórios de notação correspondentes aos períodos 1973-1975, 1975-1977 e 1983-1985, o comité consultivo se ter contentado em ouvir o seu director-geral e não o próprio recorrente, podendo, portanto, ter recebido falsas informações. Quanto ao desvio de poder, o recorrente coloca a questão de saber se os seus superiores hierárquicos não teriam favorecido a candidatura do seu «afortunado» concorrente e se terão sido «verdadeiramente os conhecimentos e a experiência exigidos no aviso de abertura de vaga que contaram» ou se «o que contou foi ter sido colega» de um dos seus superiores hierárquicos, «tratá-lo por tu desde a entrada em funções (portanto, já antes desse momento) e a ele dever a sua carreira».

23

O recorrente pediu ao Tribunal que lhe permitisse fazer prova das suas alegações, ordenando à recorrida a apresentação de um certo número de documentos. Tendo a recorrida já fornecido alguns desses documentos, ou seja, as actas das reuniões do comité consultivo de 22 de Abril e de 27 de Junho de 1986, nas quais se analisaram as diferentes candidaturas, bem como a acta «especial» da reunião da Comissão de 2 de Julho de 1986, o recorrente observou que eles estavam incompletos. Recordou, com efeito, que lhe era necessário saber o que o seu director-geral poderia ter dito a seu propósito perante o comité consultivo e que, deste modo, o princípio do contraditório tinha sido violado no processo seguido pelo Comité. Ora, nada se encontra a este propósito nas actas, nem a indicação do nome dos participantes, nem qualquer fundamentação das conclusões do comité. Do mesmo modo, a acta especial da reunião da Comissão limita-se a indicar que esta concordou com o parecer do comité consultivo. Nessa acta não se faz referência, designadamente, ao facto de o candidato escolhido não ser um nacional de um dos Estados-membros no momento da sua nomeação.

24

O recorrente reiterou o pedido de apresentação do processo individual e do acto de candidatura do seu concorrente, bem como de uma nota «susceptível de prejudicar a sua reputação no serviço», mencionada por um interlocutor do recorrente numa conversa, segundo a qual ele teria sido favorecido no momento do seu recrutamento por um antigo vice-presidente da Comissão e provocado a partida de um director-geral alguns anos mais tarde. Para o recorrente, a recusa em comunicar-lhe tais documentos constitui uma violação do princípio da transparência dos actos administrativos e dos deveres de lealdade e da boa fé que incumbem à Comissão.

25

A recorrida replicou que, em conformidade com jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, a AIPN dispõe, na análise comparativa dos méritos dos candidatos, de um amplo poder de apreciação e que, consequentemente, a sua decisão sobre a questão de saber se um candidato reúne as condições exigidas só pode ser posta em causa em caso de erro manifesto. Sublinhou que o recorrente se limita, afinal, a alegar que o seu concorrente tinha menos experiência prática do que ele, podendo-se responder a isto que é igualmente à AIPN que cabe determinar se, para ser nomeado para o lugar, é mais importante ter conhecimentos teóricos e ser capaz de exercer um determinado tipo de funções, por exemplo de direcção, ou dispor de uma certa experiência prática.

26

Alegou igualmente que as informações dadas pelo recorrente sobre eventuais relações entre o seu director-geral e o candidato escolhido não permitem concluir pela existência de um erro de apreciação equiparável a tratamento discriminatório ou considerar que a decisão da nomeação em questão é consequência das informações que, a propósito do recorrente, poderão ter sido dadas pelo seu superior hierárquico.

27

A recorrida sublinhou que o candidato nomeado «era e é particularmente apto para ocupar o lugar em questão» e que «nada permite afirmar que a AIPN usou o seu poder de modo manifestamente errado na apreciação das qualidades e das aptidões do recorrente relativamente às dos outros candidatos». Em seu entender, o recorrente não apresentou qualquer argumento que pudesse levar a concluir que, no caso presente, a AIPN cometeu um erro manifesto.

28

No que respeita à apresentação dos documentos solicitados pelo recorrente, a recorrida objectou que, por um lado, não tem o direito de comunicar os processos individuais e que, por outro, o recorrente não provou a existência de uma nota a seu propósito susceptível de prejudicar a sua reputação no serviço. Neste contexto, recordou que a AIPN não tem que fundamentar as suas decisões de nomeação. Quanto ao pedido de apresentação do processo individual e do processo de candidatura do candidato nomeado, a recorrida acrescentou que, contrariamente ao alegado pelo recorrente, tal pedido aparece pela primeira vez na réplica, pelo que deve ser indeferido por extemporaneidade.

29

O Tribunal recorda que o lugar em questão era um lugar de grau A 2 (director). Como a recorrida justamente alegou, a AIPN dispõe, na comparação dos méritos dos candidatos a um lugar de grande responsabilidade e na avaliação do interesse do serviço, de um amplo poder de apreciação. O controlo do Tribunal deve, assim, tendo em conta os elementos nos quais a administração se baseou para efectuar a sua apreciação, limitar-se à questão de saber se esta se manteve dentro de limites razoáveis, no termo de um processo isento de irregularidades e se a administração não usou o seu poder de modo manifestamente errado ou para fins diferentes daqueles para que ele lhe foi conferido (ver, designadamente, os acórdãos do Tribunal de Justiça de 4 de Fevereiro de 1987, Bouteiller/Comissão, 324/85, Colect., p. 529, e de 15 de Março de 1989, Bevan/Comissão, 140/87, Colect., p. 701).

30

O Tribunal de Primeira Instância considera que resulta dos documentos dos autos que, após a publicação do aviso de vaga, o recorrente e outro funcionário se candidataram ao lugar em questão. No âmbito do processo previsto no artigo 29.°, n.° 1, alínea a), do Estatuto, o Comité Consultivo das Nomeações para os graus A 2 e A 3 da Comissão analisou os actos de candidatura e os processos individuais dos candidatos. Após ouvir o director-geral da Direcção-Geral «Crédito e Investimentos», que lhe comunicou, com base no aviso de vaga, as qualificações exigidas parą a titularização no lugar a prover, o comité entendeu que os candidatos näo possuíam a totalidade das qualificações exigidas. A Comissão, após ter, por seu turno, analisado as candidaturas, decidiu não preencher o lugar vago e lançar mão do processo previsto no n.° 2 do artigo 29.° do Estatuto, a fim de recorrer a candidaturas externas. Após ouvir novamente o director-geral, o comité consultivo chegou à conclusão de que a candidatura de D. Engel deveria ser tomada em consideração. Após proceder a uma análise comparativa dos méritos dos três candidatos em presença, a Comissão decidiu preencher o lugar vago, nomeando D. Engel com base no n.° 2 do artigo 29.° do Estatuto.

31

No que respeita à regularidade do processo seguido no caso vertente pelo comité consultivo, o Tribunal de Primeira Instância sublinha que, quando há que preencher lugares de alto nível e a AIPN decidir fazê-lo seguindo o processo do artigo 29.°, n.° 2, do Estatuto, que lhe deixa uma grande margem de apreciação, a mera circunstância de o comité consultivo, na ausência do recorrente, ter procedido à audição do director-geral, Sr. Cioffi, não é susceptível, nas circunstâncias do caso em apreço, de constituir uma violação do princípio do respeito pelos direitos da defesa, sobretudo se se tiver em conta, por um lado, que resulta da acta da reunião de 22 de Abril de 1986 do comité consultivo que o Sr. Cioffi se limitou a comunicar, com base no aviso de vaga, as qualificações exigidas para o lugar em causa e que, por outro, o recorrente não forneceu qualquer elemento apto a provar a sua alegação de que o director-geral emitiu a seu propósito apreciações desfavoráveis susceptíveis de influenciar o parecer do comité consultivo.

32

No que respeita ao pretenso erro manifesto cometido pela AIPN ao proceder à nomeação de D. Engel, sublinhe-se que a recorrida informou que D. Engel fez estudos de ciências económicas e financeiras na Universidade de Montreal, fez parte dos quadros superiores de diferentes bancos canadianos e europeus e domina quatro línguas comunitárias, não tendo estas afirmações sido impugnadas pelo recorrente.

33

Além disso, não resulta dos documentos constantes dos autos e o recorrente não apresentou ao Tribunal de Primeira Instância elementos suficientes para demonstrar que a recorrida, ao nomear D. Engel para o lugar a prover, cometeu um erro manifesto de apreciação, ultrapassou os limites da sua própria competência ou ainda que utilizou as suas competências para fins diferentes daqueles para que elas lhe foram conferidas.

Quanto à falta de serviço resultante de uma violação dos artigos 27.° e 28.° do Estatuto

34

O recorrente alega que o candidato escolhido não tinha a nacionalidade de um dos Estados-membros no momento da sua nomeação, o que, em seu entender, é contrário ao disposto nos artigos 27.° e 28.° do Estatuto.

35

A recorrida lembra, a este propósito, que D. Engel, de origem alemã mas naturalizado canadiano, readquiriu a nacionalidade alemã antes de entrar em funções, como lho exigira a própria recorrida. Além disso, assinala que esta acusação não diz pessoalmente respeito ao recorrente.

36

Há que reconhecer que D. Engel, de origem alemã mas naturalizado canadiano, readquiriu a nacionalidade alemã antes de entrar em funções, como lho exigira a Comissão. Nestas condições, a nomeação de D. Engel não foi feita em violação dos artigos 27.° e 28.° do Estatuto.

Quanto à falta de serviço resultante de uma violação do dever de solicitude e de lealdade

37

O recorrente alegou, finalmente, que, ao preteri-lo em favor de uma pessoa que não trabalhava para as instituições comunitárias e bastante mais nova do que ele, a Comissão violou o dever de solicitude e de lealdade a que está obrigada em relação ao recorrente, como, de resto, em relação a todo e qualquer funcionário.

38

A Comissão assinalou que a referência ao dever de solicitude não pode conferir a um funcionário um direito à promoção, uma vez que qualquer decisão relativa a uma promoção deve, em primeiro lugar, ter em conta o interesse do serviço.

39

O Tribunal recorda, a este propósito, que o preenchimento dos lugares deve ter em conta, em primeiro lugar, o interesse do serviço (ver o acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Novembro de 1976, Küster/Parlamento, 123/75, Recueil, p. 1701). O dever de solicitude da administração em relação aos seus agentes reflecte o equilíbrio dos direitos e obrigações recíprocos que o Estatuto criou nas relações entre a autoridade pública e os agentes do serviço público. Esse dever implica que a autoridade tenha em conta não só o interesse do serviço, mas também o interesse dos funcionários em causa (ver o acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Outubro de 1986, Schwiering/Tribunal de Contas, 321/85, Colect., p. 3199). Para avaliar o interesse do serviço, bem como os interesses dos candidatos, a AIPN dispõe de um amplo poder de apreciação e o controlo do Tribunal de Primeira Instância deve limitar-se à questão de saber se aquela se manteve dentro de limites não criticáveis e se não usou o seu poder de modo manifestamente errado.

40

No caso vertente, resulta dos autos que a AIPN procedeu, de modo objectivo, a uma apreciação comparativa dos méritos e das qualificações dos candidatos ao lugar a preencher. A circunstância invocada pelo recorrente de que, por um lado, foi preterido em benefício de um candidato externo às instituições comunitárias e, por outro, esse candidato era bastante mais novo do que ele, não constitui, por si só, um incumprimento do dever de solicitude e de lealdade.

Quanto à falta de serviço resultante do atraso com que a AIPN elaborou o relatório de notação

41

A este propósito, e sem necessidade de analisar a efectiva verificação, a importância e a responsabilidade do atraso de que se queixa o recorrente, o Tribunal de Primeira Instância chama a atenção para o seguinte: não resulta de nenhum elemento dos autos e o recorrente não demonstrou que poderia ter tido uma hipótese suplementar de ser nomeado para o lugar de director dos investimentos e dos empréstimos se o seu processo individual contivesse o relatório da notação relativo ao período 1983-1985, tal como, finalmente, foi elaborado (ver os acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Fevereiro de 1988, Picciolo/Comissão, 1/87, Colect., p. 711, e de 4 de Fevereiro de 1989, Bossi/Comissão, 346/87, Colect., p. 303). Resulta da análise desse relatório final de notação, tal como foi comunicado ao Tribunal, que apenas contém alterações mínimas relativamente ao projecto inicial de relatório apresentado ao recorrente e que essas alterações, que em nada afectam a economia geral do relatório, não eram susceptíveis de ter qualquer influência sobre as hipóteses de o recorrente ser promovido para o lugar em causa.

42

Resulta de quanto precede que nenhuma das acusações apresentadas pelo recorrente destinadas a provar a existência de uma falta de serviço cometida pela Comissão pode ser acolhida. Por conseguinte, o pedido de indemnização pelo dano material sofrido deve ser indeferido.

Quanto ao pedido de indemnização pelo dano moral pretensamente sofrido

43

Como afirmou o recorrente (e, de resto, não foi desmentido) e como resulta do seu processo individual, o seu relatório de notação relativamente ao período de 1 de Julho de 1983 a 30 de Junho de 1985 — a propósito do qual solicitou, em seguida, uma notação em recurso — foi elaborado em 10 de Fevereiro de 1987. Em 31 de Julho de 1986, ou seja, após a data limite prevista no artigo 6.°, primeiro parágrafo, das disposições gerais de execução do artigo 43.° do Estatuto, no caso vertente, 30 de Novembro de 1985, o superior hierárquico directo do recorrente tinha-lhe proposto manter, para o período acima mencionado, a notação relativa ao período 1981-1983, o que o recorrente recusara formalmente em 26 de Novembro de 1986, ou seja, cerca de quatro meses depois de receber a proposta que lhe fora feita.

44

A Comissão sublinha que, para apreciar se tal atraso constitui uma falta de serviço, há que verificar, designadamente, se esse atraso não é imputável, ainda que apenas parcialmente, ao comportamento do funcionário interessado. Do mesmo modo, uma eventual falta administrativa só pode implicar uma obrigação de indemnização se o recorrente tiver provado a existência de um prejuízo por si sofrido (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Fevereiro de 1988, Picciolo/Comissão, 1/87, acima citado). Ora, no caso em apreço, essa prova não foi fornecida e o recorrente não demonstrou igualmente que o carácter incompleto do seu processo lhe causou qualquer prejuízo. Subsidiariamente, a Comissão sublinha que o cálculo efectuado. pelo recorrente, segundo o qual deveria ser colocado numa situação análoga àquela em que se encontraria se tivesse sido nomeado director, implicaria uma limitação inadmissível do poder de apreciação de que a Comissão dispõe para preencher os lugares vagos.

45

Como o Tribunal de Primeira Instância decidiu no acórdão hoje proferido no processo T-29/89 (Moritz/Comissão, Colect. 1990, p. II-787), há que ter presente que o artigo 43.° do Estatuto determina a elaboração, pelo menos de dois em dois anos, de um relatório de notação sobre a competência, o rendimento e a conduta no serviço de cada funcionário. Tal documento deve ser obrigatoriamente elaborado com vista a uma boa administração e à racionalização dos serviços da Comunidade, bem como para proteger ps interesses dos funcionários. Um dos deveres imperiosos da administração é, assim, procurar que tal relatório seja redigido periodicamente nas datas impostas pelo Estatuto (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Dezembro de 1980, Gratreau/Comissão, 156/79 e 51/80, Recueil, p. 3943). A administração dispõe, para esse efeito, de um prazo razoável e qualquer ultrapassagem desse prazo deve ser justificada pela ocorrência de circunstâncias excepcionais (acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Maio de 1983, Ditterich/Comissão, 207/81, Recueil, p. 1359).

46

Por outro lado, de uma maneira geral, e designadamente no âmbito do processo de elaboração do relatório de notação, todos os funcionários têm um dever de lealdade e de cooperação para com a autoridade sob a alçada da qual trabalham (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 1966, Alfieri/Parlamento, 3/66, Recueil, p. 633). Assim, um funcionário não pode queixar-se do atraso na elaboração do seu relatório de notação quando esse atraso lhe é imputável, pelo menos parcialmente, ou quando para ele contribuiu de forma decisiva.

47

Finalmente, o Tribunal sublinha que, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, o atraso na elaboração dos relatórios de notação é, por si próprio, susceptível de prejudicar um funcionário pelo simples facto de a progressão da sua carreira poder ser afectada pela falta de tal relatório no momento em que decisões a ele relativas devem ser tomadas (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Fevereiro de 1986, Castille/Comissão, 173/82, 157/83 e 186/84, Colect., p. 497).

48

No citado acórdão do Tribunal de Primeira Instância hoje mesmo proferido, declarou-se que o atraso no processo de notação relativamente ao período de 1983-1985 se deveu não só à data tardia — 31 de Julho de 1986 — em que o superior hierárquico do recorrente lhe propôs manter, relativamente ao período de 1983-1985, o relatório de notação para o período 1981-1983, mas igualmente à negligência de que fez prova o recorrente, que esperou até 26 de Novembro de 1986 para responder a essa proposta. Deste modo, o recorrente contribuiu de forma decisiva para o atraso de que se diz vítima.

49

Ora, como o Tribunal de Primeira Instância também decidiu, resulta do dever fundamental de lealdade e de cooperação acima mencionado que o recorrente devia ter reagido, num prazo razoável, à proposta do seu superior hierárquico directo de manter o relatório de notação e que violou esse dever ao adiar a resposta a essa proposta durante quatro meses. Nestas condições, o atraso alegado não pode, nas circunstâncias do caso vertente, constituir um dano moral, embora o atraso de oito meses com que o superior hierárquico do recorrente lhe propôs a manutenção do relatório de notação esteja no limite do prazo razoável admissível.

50

Quanto à falta dos relatórios de notação para os períodos de 1973-1975 e 1975-1977, o Tribunal de Primeira Instância assinala que o recorrente apenas o invocou pela primeira vez em apoio do presente pedido de indemnização, ou seja, mais de nove anos após o último período de notação mencionado. Resulta manifestamente dos documentos dos autos que a falta desses relatórios de notação relativos a períodos antigos não causou ao recorrente qualquer dano moral possível de ser utilmente invocado no âmbito do presente recurso.

51

Nestas condições, o pedido de indemnização por danos morais deve ser indeferido.

52

Resulta do conjunto das considerações que precedem que deve ser negado provimento ao recurso na sua totalidade.

Quanto às despesas

53

Por força do n.° 2 do artigo 69.° do Regulamento Processual do Tribunal de Justiça, aplicável mutatis mutandis ao Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 11.°, terceiro parágrafo, da decisão do Conselho de 24 de Outubro de 1988, acima citada, a parte vencida é condenada nas despesas se assim tiver sido requerido. Todavia, segundo o artigo 70.° do mesmo regulamento, as despesas efectuadas pelas instituições nos recursos dos agentes das Comunidades ficam a cargo destas. Por conseguinte, há que condenar cada uma das partes a suportar as suas respectivas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTANCIA (Quinta Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

Cada urna das partes suportará as suas respectivas despesas.

 

Kirschner

Briët

Biancarelli

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 13 de Dezembro de 1990.

O secretário

H. Jung

O presidente

C. P. Briët


( *1 ) Lingua do processo: alemão.