Bruxelas, 9.11.2022

COM(2022) 583 final

COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO, AO BANCO CENTRAL EUROPEU, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES

Comunicação sobre as orientações para uma reforma do quadro de governação económica da UE


1.Introdução

Em outubro de 2021, a Comissão relançou o debate público sobre a revisão do quadro de governação económica da UE, convidando as outras instituições da UE e todas as principais partes interessadas a participarem no mesmo. No âmbito de instâncias diversas, nomeadamente em reuniões específicas para o efeito, seminários e num inquérito em linha, os cidadãos e um vasto leque de participantes, incluindo governos nacionais, parlamentos, parceiros sociais, universidades e outras instituições da UE, debateram de que modo os desafios económicos atuais e futuros exigem reformas do quadro de governação económica da UE. ( 1 ) Os debates no Conselho (ECOFIN), no Eurogrupo, no Comité Económico e Financeiro, bem como no Comité de Política Económica proporcionaram aos Estados-Membros uma oportunidade para procederem a uma reflexão sobre os principais objetivos do quadro de governação, o seu funcionamento e os novos desafios a enfrentar, bem como para manifestarem a sua posição a esse respeito.

Realizados os debates, chegou o momento de passar para a tomada de decisões. A presente comunicação delineia as orientações da Comissão para uma reforma do quadro de governação económica, abordando as principais questões económicas e políticas que irão determinar a coordenação e a supervisão das políticas económicas da UE durante a próxima década. Tendo em conta as principais preocupações suscitadas pelo quadro atual, as presentes orientações visam reforçar a sustentabilidade da dívida e promover um crescimento sustentável e inclusivo em todos os Estados-Membros (ver figura 1), ou seja, conforme referido pela presidente da Comissão, Ursula Von der Leyen, no seu discurso sobre o estado da União: «Voltemos a descobrir o espírito de Maastricht - é necessário que a estabilidade e o crescimento andem de mãos dadas.» ( 2 ) A existência de estratégias orçamentais prudentes, bem como de investimentos e reformas que reforcem o crescimento sustentável, são indispensáveis e reforçam-se mutuamente com vista a garantir a sustentabilidade orçamental e permitir a dupla transição ecológica e digital para uma economia resiliente. O quadro reformulado deverá dar resposta aos desafios atualmente defrontados e contribuir para tornar a Europa mais resiliente, apoiando o investimento estratégico ao longo dos próximos anos e reduzindo os elevados rácios da dívida pública de forma realista, progressiva e sustentada. As orientações da Comissão comportam elementos fulcrais como uma maior apropriação a nível nacional, a simplificação do quadro e o avanço em direção a uma maior ênfase no médio prazo, paralelamente a uma aplicação mais robusta e coerente do referido quadro.

O objetivo desta reforma consiste em facilitar uma supervisão económica eficaz, tendo por base um quadro comum que garanta a igualdade de tratamento e a coordenação das políticas a nível multilateral. O quadro deve pautar-se pela sua solidez perante a evolução das condições económicas e a incerteza, exigindo assim um conjunto de regras robustas e previsíveis, bem como cláusulas de derrogação para responder a circunstâncias excecionais. Deve igualmente adotar uma abordagem integrada, no âmbito da qual os instrumentos de supervisão se complementam mutuamente, como por exemplo no contexto do Semestre Europeu. A fim de prevenir e retificar de forma eficaz os desequilíbrios macroeconómicos, será necessário melhorar a capacidade de deteção dos novos riscos e manter a dinâmica das reformas, colocando simultaneamente uma maior tónica na evolução da UE e da área do euro, bem como na execução das políticas. Estas orientações contribuirão para os debates a travar no futuro, em especial no âmbito do Conselho e com o Parlamento Europeu, tendo em vista alcançar um consenso alargado sobre a futura conceção do quadro de governação económica.

A comunicação apresenta a seguinte estrutura: A secção 2 recorda a necessidade de um quadro de governação eficaz, que integre as dimensões inerentes aos aspetos orçamentais, às reformas e aos investimentos, a fim de dar resposta aos desafios atualmente defrontados, bem como a defrontar num futuro próximo. Neste contexto, a secção 3 expõe os elementos fulcrais das orientações da Comissão sobre a reforma. A secção 4 aprofunda estes elementos fulcrais, apresentando informações mais pormenorizadas sobre os aspetos práticos das reformas propostas no domínio da supervisão orçamental e macroeconómica. A secção 5 descreve as próximas etapas e apresenta as conclusões correspondentes.

Figura 1: Uma nova estrutura de governação global

2.Necessidade de um quadro de governação económica eficaz

2.1 Rumo a um quadro que oriente os Estados-Membros a dar resposta aos desafios identificados e a respeitar as prioridades políticas comuns

O quadro de governação económica da UE tem vindo a orientar os Estados-Membros na consecução dos seus objetivos de política económica e orçamental. Desde o Tratado de Maastricht de 1992, o quadro tem vindo a contribuir para fomentar a convergência macroeconómica, salvaguardar a solidez das finanças públicas e corrigir os desequilíbrios macroeconómicos. Juntamente com uma política monetária comum e uma moeda comum na área do euro, o quadro criou as condições necessárias para a estabilidade económica, o crescimento económico sustentável e níveis de emprego mais elevados para os cidadãos da UE.

O quadro de governação económica da UE tem vindo a evoluir ao longo do tempo. De modo geral, realizaram-se reformas em resposta às insuficiências denotadas pelo quadro e identificadas sobretudo em momentos de crise económica. Em especial, os denominados pacotes legislativos «six-pack» e «two-pack», basearam-se nos ensinamentos retirados da crise financeira mundial e da crise da dívida soberana na área do euro para reformular a supervisão orçamental, reforçar os quadros orçamentais nacionais e a coordenação orçamental na área do euro e alargar o âmbito da supervisão económica de modo a incluir os desequilíbrios macroeconómicos. ( 3 )

Muito embora o quadro tenha colmatado lacunas de supervisão e se tenha adaptado em maior grau à conjuntura económica, também se tornou mais complexo e nem todos os instrumentos e procedimentos resistiram à prova do tempo. Tanto a comunicação relativa à análise da governação económica, emitida em fevereiro de 2020, como o debate público lançado na sequência da sua emissão (ver anexo 1) assinalaram o êxito relativo do quadro de supervisão orçamental e a crescente heterogeneidade das situações orçamentais nos Estados‑Membros. O quadro não assegurava uma diferenciação suficiente consoante os diversos Estados-Membros, não obstante as divergências em termos de situação orçamental, riscos em matéria de sustentabilidade e outros fatores de vulnerabilidade. As políticas orçamentais nacionais mantiveram-se frequentemente pró-cíclicas, não tendo os Estados‑Membros tirado partido de conjunturas económicas favoráveis para criar reservas orçamentais. A capacidade de influenciar a orientação orçamental da área do euro foi dificultada pela falta de políticas prudentes em conjunturas favoráveis e manteve-se limitada na ausência de uma capacidade orçamental central dotada de características de estabilização. A composição das finanças públicas não se tornou mais favorável ao crescimento e os governos nacionais não atribuíram prioridade às despesas suscetíveis de fomentar o crescimento e a resiliência económica e social. As regras orçamentais da UE tornaram-se complexas, passando a dispor de indicadores múltiplos e a depender de variáveis não observáveis, o que comprometeu a transparência e prejudicou a apropriação e a previsibilidade. Não obstante as melhorias introduzidas nos quadros orçamentais nacionais, a sua eficácia diverge de forma acentuada consoante os Estados-Membros. No que diz respeito à supervisão dos desequilíbrios macroeconómicos, o quadro tinha sido coroado de êxito a nível da sensibilização quanto aos riscos mais alargados para a estabilidade macroeconómica, mas não se traduziu em respostas estratégicas num grau suficiente. O procedimento de desequilíbrio excessivo nunca foi ativado. Desde a criação do procedimento relativo aos desequilíbrios macroeconómicos (PDM), a União obteve maior sucesso na contração dos défices da balança corrente do que na redução de excedentes persistentes e elevados da balança corrente. Continua ainda por testar a supervisão no âmbito da prevenção da acumulação de novos fatores de vulnerabilidade e de risco e com vista a promover a tomada de medidas estratégicas preventivas adequadas. Nem sempre se exploraram as articulações existentes entre as várias vertentes de supervisão.

2.2 Ilações extraídas das crises que eclodiram recentemente

As ilações extraídas da resposta estratégica dada aos recentes choques económicos, nomeadamente à crise desencadeada pelo surto de COVID-19, têm implicações para a análise da governação económica. Em março de 2020, ativou-se a cláusula de derrogação de âmbito geral do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC). Tal permitiu aos Estados-Membros reagirem à crise desencadeada pelo surto de COVID-19 mediante a concessão de um avultado apoio orçamental às suas economias, desviando-se temporariamente dos requisitos orçamentais impostos pelo PEC. ( 4 ) Esta resposta anticíclica robusta, juntamente com novas medidas e instrumentos a nível da UE, bem como as redes de segurança social e os sistemas de saúde a nível nacional, revelaram-se extremamente eficazes para atenuar os danos económicos e sociais resultantes da crise. Os ensinamentos retirados deste êxito da resposta estratégica da UE à crise, incluindo a interação positiva entre as reformas e os investimentos no âmbito do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR), também foram profícuos para a análise do quadro de governação económica. Paralelamente, a crise resultou num aumento significativo dos rácios da dívida dos setores público e privado, salientando a importância de reduzir os rácios da dívida para níveis prudentes de forma progressiva, constante e favorável ao crescimento. A prudência orçamental em tempos de crescimento contínuo contribui para criar reservas orçamentais às quais os governos podem recorrer para conceder apoio orçamental anticíclico em períodos de crise, quando a política orçamental discricionária pode revelar-se particularmente eficaz. O investimento numa capacidade de preparação e na resiliência pode igualmente reduzir o impacto económico adverso das crises. Além disso, a experiência adquirida antes e durante a crise confirmou as dificuldades associadas à formulação de recomendações políticas com base em indicadores não observáveis objeto de revisão frequente (como o «hiato do produto» e o «saldo estrutural»).

A dupla transição ecológica e digital, paralelamente à necessidade de garantir a segurança energética, bem como a resiliência social e económica ( 5 ), e de reforçar as capacidades de defesa irão exigir elevados níveis de investimento sustentados ao longo dos próximos anos. A crise desencadeada pelo surto de COVID-19 e a invasão da Ucrânia pela Rússia também tornaram estas prioridades comuns mais patentes e prementes. Serão necessários elevados níveis de investimento para alcançar uma dupla transição (ecológica e digital) justa, reforçar a resiliência social e económica (nomeadamente por meio da melhoria de competências e da requalificação), aumentar a coesão territorial, reduzir a dependência energética e reforçar as capacidades de defesa, tanto a nível nacional como no intuito de apoiar as prioridades comuns da Europa. O orçamento da UE tem vindo a apoiar os esforços desenvolvidos neste sentido, não obstante a sua capacidade limitada para o efeito, porquanto a dupla transição, a resiliência, a segurança energética e a defesa são objetivos comuns a todos os Estados-Membros, tendo vindo a tornar-se ainda mais prementes devido à crise atual. Estes objetivos exigem um investimento por parte das empresas e das famílias, bem como um maior investimento público, tendo por base uma boa composição e qualidade das finanças públicas. Estas políticas fomentam o potencial de crescimento, reforçam a resiliência e ajudam a combater os choques adversos que advieram da guerra. Por último, refletem as prioridades estratégicas da UE e são apoiadas por programas comuns financiados pela UE, tal como o financiamento do MRR a conceder até 2026 e o financiamento da política de coesão.

Uma coordenação eficaz das políticas é fundamental para dar resposta às crises. As respostas estratégicas à crise desencadeada pelo surto de COVID-19, à invasão da Ucrânia pela Rússia e à crise energética sai decorrente realçaram a importância de uma sólida coordenação das políticas, nomeadamente entre os diferentes instrumentos estratégicos e de financiamento, bem como entre a nível europeu e nacional. A ativação da cláusula de derrogação de âmbito geral facilitou a resposta por parte dos orçamentos nacionais. A interação entre a política orçamental e a política monetária foi, e continua a ser, essencial para assegurar uma resposta macroeconómica eficaz à crise. A política monetária permitiu adotar as políticas orçamentais nacionais necessárias o que, por seu turno, contribuiu para atenuar os efeitos da crise no crescimento económico e na coesão social. Algumas condições de base, como a regulamentação prudencial do mercado financeiro e o enquadramento da UE aplicável aos auxílios estatais, foram temporariamente adaptadas, tendo sido tirado pleno proveito de todas as possibilidades de flexibilidade possíveis, nomeadamente as previstas no âmbito do orçamento da UE. Os novos instrumentos a nível da UE também contribuíram para a resposta dada neste contexto, designadamente o apoio temporário para atenuar os riscos de desemprego numa situação de emergência (SURE), as iniciativas de investimento de resposta ao coronavírus (CRII) ao abrigo da política de coesão e o NextGenerationEU, incluindo a assistência à recuperação para a coesão e os territórios da Europa (REACT-EU) e o MRR. A execução eficaz das reformas e dos investimentos no âmbito dos planos de recuperação e resiliência (PRR) constitui uma oportunidade única para os Estados-Membros assegurarem uma trajetória de maior crescimento, dirimirem os fatores de vulnerabilidade em termos económicos e sociais, melhorarem a sustentabilidade da dívida pública e privada, reforçarem a resiliência e acelerarem a dupla transição ecológica e digital, concretizando simultaneamente os objetivos visados pela União. Mais recentemente, em resposta às perturbações do mercado da energia provocadas pela invasão da Ucrânia pela Rússia e pela instrumentalização da energia por parte deste último país, a Comissão apresentou uma série de medidas destinadas a combater os elevados preços da energia e a garantir a segurança do aprovisionamento. A Comissão lançou igualmente iniciativas diversas, nomeadamente o plano REPowerEU, com vista a pôr termo à dependência face aos combustíveis fósseis russos mediante a diversificação do aprovisionamento energético, a poupança de energia e a aceleração da transição ecológica. ( 6 )

O quadro reformulado deverá igualmente ajudar os Estados-Membros a enfrentar os desafios a longo prazo com que a UE se depara. A evolução estrutural a longo prazo suscita um desafio de grande envergadura para a sustentabilidade das finanças públicas e para o crescimento sustentável nos Estados-Membros da UE. Esta evolução integra os desafios demográficos e a crise climática, tornando-se esta última cada vez mais evidente com a maior gravidade e frequência de fenómenos meteorológicos extremos. A fim de ser possível responder a estes desafios, será necessário que os Estados-Membros tomem novas medidas, incluindo investimentos públicos destinados a facilitar a dupla transição ecológica e digital e políticas que coloquem a ênfase em garantir a solidez das finanças públicas, nomeadamente através da reforma dos sistemas de pensões.

3.Rumo a um quadro mais simples e mais eficaz que se paute por uma maior apropriação

A presente secção apresenta as linhas principais das orientações emitidas pela Comissão para proceder a uma reforma do quadro de governação económica (ver figura 2). As questões específicas relacionadas com a configuração e aplicação do quadro reformado proposto são analisadas mais pormenorizadamente na secção 4, sendo igualmente examinado o quadro aplicável aos Estados-Membros da área do euro cuja estabilidade financeira defronta ou corre o risco de defrontar dificuldades.

3.1 Uma estrutura de governação revista com maior ênfase no médio prazo

As orientações da Comissão pretendem definir uma estrutura mais simples e integrada para a supervisão macro-orçamental, a fim de assegurar a sustentabilidade da dívida e promover o crescimento sustentável e inclusivo. Para que o quadro seja coerente a nível de todas as suas componentes e proporcione uma supervisão económica eficaz, impõe-se clarificar os objetivos de cada vertente de supervisão, integrar melhor as políticas macroeconómicas e orçamentais e incorporar instrumentos para acompanhar os progressos realizados e atingir novos objetivos. Por conseguinte, para além da revisão do quadro orçamental da UE e do PDM, nomeadamente mediante a integração dos objetivos orçamentais, bem como em matéria de reformas e de investimentos num único plano global de médio prazo, as orientações da Comissão apelam para a criação de um novo instrumento da UE de controlo da aplicação da legislação no domínio das reformas e dos investimentos. Este instrumento asseguraria o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-Membros em termos de reformas e de investimentos, que apoiariam um ajustamento orçamental mais progressivo (ver secção 4.1).

Os valores de referência consignados no Tratado, ou seja, um défice orçamental equivalente a 3 % do PIB e um rácio dívida/PIB de 60 % permanecem inalterados. Estes valores figuram num Protocolo do Tratado, sendo o objetivo fulcral da revisão garantir que esses valores sejam respeitados de forma mais eficaz, nomeadamente colocando a tónica numa trajetória adequada e credível de redução da dívida até alcançar 60 % do PIB, assegurando simultaneamente que o quadro de governação económica seja conducente a um crescimento sustentável e inclusivo.

Figura 2: Proposta de revisão do quadro orçamental

3.2 Planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo no âmago da nova estrutura de governação

Os planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo que reúnam os compromissos a nível orçamental, bem como no domínio das reformas e dos investimentos necessários, assumidos por cada Estado-Membro, no âmbito de um quadro comum da UE, constituirão a pedra angular da proposta de quadro revisto. ( 7 ) Tal assegurará a coerência e simplificará os processos e os objetivos, para além de reconhecer em paralelo que as reformas e os investimentos podem ter um impacto positivo na sustentabilidade orçamental. O quadro orçamental revisto da UE definirá os requisitos necessários para assegurar que o rácio da dívida respeite uma trajetória decrescente ou permaneça a níveis prudentes e que o défice orçamental se mantenha abaixo do valor de referência de 3 % do PIB a médio prazo. Os Estados-Membros apresentarão planos de médio prazo para definir trajetórias orçamentais específicas por país, bem como compromissos prioritários em termos de reformas e investimentos públicos que assegurem, no seu conjunto, uma redução contínua e progressiva da dívida e um crescimento sustentável e inclusivo. Todos os Estados-Membros devem dar resposta às prioridades identificadas nas recomendações específicas por país (REP) formuladas no contexto do Semestre Europeu. Os planos de médio prazo deverão igualmente apresentar propostas de iniciativas consentâneas com as prioridades estratégicas da UE, conforme decorrentes diretamente das orientações e metas acordadas a nível da UE que exijam a tomada de medidas estratégicas por parte dos Estados-Membros. Por conseguinte, os planos devem também coadunar-se com os planos nacionais em matéria de energia e clima (que devem estar harmonizados com as metas fixadas pela Lei Europeia em matéria de Clima). Durante a vigência do MRR, serão necessárias referências cruzadas aos PRR de modo a garantir a coerência das políticas.

Esta abordagem a médio prazo permitirá uma diferenciação consoante os Estados‑Membros, no âmbito de um quadro comum revisto da UE cuja base comum será o crescimento sustentável e os riscos defrontados para a sustentabilidade da dívida. Esse quadro comum da UE será fundamental para garantir, de forma transparente, a igualdade de tratamento entre os Estados-Membros. Uma vez que o objetivo da sustentabilidade da dívida constitui o ponto de partida para a supervisão orçamental da UE, é tido em conta o objetivo fundamental das regras orçamentais da União Económica e Monetária, consagrado no Tratado, que consiste em evitar os denominados «desvios importantes» na condução da política orçamental, uma vez que estes podem ter repercussões negativas indiretas noutros Estados-Membros, bem como na união monetária, no seu conjunto. O atual quadro da UE exige que todos os Estados-Membros envidem esforços de ajustamento semelhantes, nomeadamente a nível da vertente preventiva, independentemente dos respetivos riscos orçamentais e situação da dívida. Não obstante, os rácios dívida/PIB e a evolução da dívida divergem profundamente consoante os Estados-Membros. Alguns países apresentam uma dívida muito elevada, superior a 90 % do PIB (sendo superior a 150 % do PIB em dois casos), enquanto outros têm uma dívida inferior a 60 % do PIB. Por último, muitos encontram-se numa situação intermédia, com uma dívida que oscila entre 60 % e 90 % do PIB.

Um quadro de supervisão baseado no risco permitirá adaptar o atual parâmetro de referência para a redução da dívida ao rácio da dívida específica por país, preservando simultaneamente o requisito de manter os défices orçamentais abaixo de 3 % do PIB de forma credível. O atual parâmetro de referência para a redução da dívida (a denominada regra 1/20) implica, nas circunstâncias atuais de elevados rácios da dívida na sequência do surto de COVID-19, um excessivo esforço orçamental demasiado concentrado na fase inicial suscetível de comprometer o crescimento, sendo pró-cíclico. ( 8 ) É necessário reconhecer que os Estados-Membros com uma dívida elevada não se encontram em condições de respeitar o atual parâmetro de referência para a redução da dívida de 1/20, uma vez que a redução dos seus rácios da dívida a esse ritmo teria um impacto muito negativo no crescimento e, por conseguinte, na própria sustentabilidade da dívida. Por conseguinte, propõe-se avançar para um quadro de supervisão mais assente no risco, que atribua prioridade à sustentabilidade da dívida e estabeleça uma maior diferenciação entre os países consoante os problemas que enfrentam em termos de dívida pública, respeitando paralelamente um quadro transparente e comum da UE que se coadune com os valores de referência de 3 % do PIB e de 60 % do PIB previstos no Tratado.

Os planos nacionais de médio prazo devem assegurar uma trajetória sustentável de redução da dívida por meio de uma consolidação progressiva, bem como através da realização de reformas e investimentos. Os Estados-Membros deverão apresentar planos orçamentais e estruturais de médio prazo que assegurem que a dívida se mantenha numa trajetória sustentável ou seja colocada nessa trajetória até ao final do período de ajustamento, bem como a assunção de compromissos quanto a reformas e investimento públicos cuja importância seja prioritária. O quadro reflete o facto de não existir qualquer correlação entre as reformas e investimento, por um lado, e o ajustamento orçamental, por outro. A melhoria da qualidade das finanças públicas e a proteção do investimento público devem constituir vetores fulcrais dos planos orçamentais e estruturais de médio prazo, atendendo ao papel essencial que o investimento público e as reformas desempenham no reforço do potencial de crescimento e na resposta dada aos principais desafios sistémicos, como a dupla transição ecológica e digital.

Além disso, os Estados-Membros poderão comprometer-se a realizar uma série de reformas e investimentos que ajudem a colocar a dívida numa trajetória sustentável, contribuindo assim para apoiar um período de ajustamento mais alargado e uma trajetória de ajustamento mais progressiva. A trajetória de ajustamento, as reformas e os investimentos serão objeto de discussões com a Comissão e, uma vez avaliados de forma positiva, serão aprovados pelo Conselho. Será necessário que os planos sejam tomados em consideração nos orçamentos nacionais durante todo o período de ajustamento, devendo os Estados-Membros dispor da possibilidade de os reexaminar somente decorrido um período mínimo de quatro anos. Se os Estados-Membros assim o desejarem, este período mínimo de ajustamento poderá ser alargado de modo a fazê-lo coincidir com o período correspondente à legislatura nacional. O plano poderia ser revisto antes se viessem a ocorrer circunstâncias objetivas que inviabilizassem a execução do plano, mas teria de ser submetido ao mesmo processo de validação. Quaisquer revisões frequentes comprometeriam a credibilidade dos planos a título de pilares para a condução de políticas prudentes.

Um único indicador operacional assente na sustentabilidade da dívida servirá de base para definir a trajetória de ajustamento orçamental e assegurar a supervisão orçamental anual, o que simplificará portanto numa medida significativa o quadro orçamental e melhorará a transparência. A utilização da despesa primária líquida financiada a nível nacional, ou seja, despesas líquidas de medidas discricionárias em matéria de receitas e excluindo a despesa com juros, bem como as despesas cíclicas relacionadas com o desemprego, a título de único indicador operacional para a supervisão, permitirá o funcionamento dos estabilizadores automáticos, incluindo oscilações das receitas e das despesas que escapam ao controlo direto das administrações centrais. Tal garantirá um maior grau de estabilização macroeconómica. Muito embora os Estados-Membros possam utilizar outros indicadores para fins orçamentais a nível nacional (por exemplo, o saldo estrutural), a supervisão orçamental anual a nível da UE seria apenas realizada com base neste único indicador operacional, tomando assim em consideração a trajetória da despesa. Este único indicador operacional deve ser definido de molde a garantir a sustentabilidade da dívida. A trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada deve garantir que a dívida seja colocada ou mantenha uma trajetória decrescente até ao final do período de ajustamento, o mais tardar, ou permaneça a níveis prudentes, assegurando simultaneamente que o défice orçamental se mantenha a níveis inferiores a 3 % do PIB a médio prazo. ( 9 )

3.3 Acordo relativo aos planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo

Os planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo ocuparão um lugar de destaque no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento reformulado e serão propostos pelos Estados-Membros com base num quadro comum da UE. Este quadro orçamental comum revisto da UE estabelecerá os requisitos aplicáveis com vista a assegurar que a dívida seja colocada numa trajetória decrescente, ou se mantenha a níveis prudentes, e que o défice orçamental se mantenha a níveis inferiores a 3 % do PIB. O quadro comum da UE definirá igualmente os critérios de avaliação das reformas e dos investimentos subjacentes a uma eventual prorrogação da trajetória de ajustamento. Os planos de médio prazo dos Estados-Membros deverão cumprir o disposto no quadro comum revisto da UE.

Com base numa avaliação positiva da Comissão, o Conselho aprovará os planos orçamentais e estruturais de médio prazo, incluindo a respetiva trajetória orçamental. A Comissão avaliará todos os planos à luz do quadro comum revisto da UE e só poderá emitir uma avaliação positiva a respeito dos planos orçamentais e estruturais se a dívida for colocada numa trajetória decrescente ou mantida a níveis prudentes e o défice público permaneça abaixo do valor de referência de 3 % do PIB a médio prazo. Os debates multilaterais no âmbito dos comités competentes do Conselho assegurarão a transparência e a prestação de contas, cabendo ao Conselho subscrever a idoneidade dos planos. Este modelo melhorará a apropriação nacional e, graças a uma melhor integração dos requisitos do quadro comum revisto da UE nos debates sobre as políticas nacionais, reforçará a supervisão orçamental multilateral.

3.4 Execução dos planos nacionais de médio prazo e acompanhamento anual

A fim de garantir a transparência e facilitar o acompanhamento eficaz da execução dos planos orçamentais e estruturais de médio prazo, os Estados-Membros apresentarão relatórios anuais sobre os progressos realizados. Para além de apresentarem informações orçamentais, os referidos relatórios descreverão de forma pormenorizada a execução das reformas e dos investimentos previstos pelos planos de médio prazo. ( 10 ) Estes relatórios servirão de base para proceder a uma supervisão anual por parte da Comissão e do Conselho, incluindo a adoção de eventuais decisões de execução.

Não obstante a maior margem de manobra conferida aos Estados-Membros na conceção das suas trajetórias orçamentais, uma aplicação mais estrita neste contexto a nível da UE apoiará a supervisão multilateral. Será assegurada uma maior conformidade comparativamente ao quadro atual. O procedimento relativo aos défices excessivos (PDE) manter-se-á inalterado em caso de incumprimento do valor de referência do défice equivalente a 3 % do PIB (o denominado «PDE baseado no défice»). Trata-se de uma vertente consagrada da supervisão orçamental da UE que tem demonstrado a sua eficácia para orientar o comportamento orçamental, sendo bem compreendido pelos decisores políticos e pelo público em geral, graças à sua simplicidade. O PDE por incumprimento do critério da dívida (o denominado «PDE baseado na dívida») será reforçado, tanto a nível da sua ativação como da sua derrogação. Atribuirá particular importância a quaisquer desvios face à trajetória orçamental acordada, que o Estado-Membro se comprometeu a respeitar após a sua aprovação pelo Conselho. Para os Estados-Membros que enfrentem uma avultada dívida pública que seja problemática, quaisquer desvios em relação à trajetória acordada conduzirão, a título supletivo, ao lançamento de um PDE. No caso dos Estados-Membros com problemas moderados no domínio da dívida pública, os desvios poderão conduzir ao lançamento de um PDE, caso se considere que estes suscitam «erros graves». Alargar-se-á o leque de sanções, por exemplo, acrescentando sanções que afetem a reputação (ver secção 4.2).

Criar-se-á um novo instrumento destinado a assegurar o cumprimento dos compromissos assumidos a respeito das reformas e dos investimentos. No âmbito da reforma proposta, os Estados-Membros poderão solicitar uma trajetória de ajustamento mais progressiva mediante a apresentação de um conjunto específico de reformas e investimentos a realizar de forma prioritária e que promovam o crescimento sustentável a longo prazo, contribuindo deste modo para melhorar a evolução da dívida (ver secção 4.1). Na eventualidade de esses compromissos não serem cumpridos, um novo instrumento de execução conduzirá a uma revisão da trajetória de ajustamento no sentido de um rumo mais estrito. ( 11 ) Em virtude do risco específico de repercussões adversas indiretas no âmbito de uma união monetária, será possível aplicar sanções financeiras aos países da área do euro em caso de incumprimento destes compromissos.

Os quadros e processos nacionais contribuirão para alcançar os objetivos dos planos estruturais e orçamentais de médio prazo. As instituições orçamentais independentes desempenharão um papel importante em todos os Estados-Membros na avaliação dos pressupostos subjacentes aos planos, dado que apreciarão a adequação desses planos no que diz respeito à sustentabilidade da dívida e aos objetivos de médio prazo específicos a cada país e controlarão a aplicação do referido plano. Isto significa que se impõe melhorar a criação e o desempenho dessas instituições orçamentais independentes. Tal desencadeará um maior debate a nível nacional e, por conseguinte, um maior grau de adesão e apropriação em termos políticos dos planos de médio prazo. A Comissão reexaminará o mandato e o papel do Conselho Orçamental Europeu neste contexto.

3.5 Um quadro mais eficaz para detetar e corrigir desequilíbrios macroeconómicos

A pedra angular das orientações da Comissão sobre o PDM consistirá num diálogo reforçado com os Estados-Membros, a fim de assegurar uma melhor execução através da respetiva apropriação e empenhamento por parte do país em causa. Uma maior apropriação por parte dos Estados-Membros será assegurada com base num entendimento comum entre os Estados-Membros e a Comissão quanto aos problemas detetados no âmbito do PDM e às estratégias necessárias para os resolver. Tal pressuporá travar um diálogo que conduza à assunção de compromissos por parte dos Estados-Membros no sentido de integrar nos seus planos orçamentais e estruturais de médio prazo as reformas e os investimentos que se revelam necessários para prevenir ou corrigir desequilíbrios macroeconómicos.

Além disso, cabe reforçar a função preventiva do PDM num contexto macroeconómico caracterizado por novos riscos. Tanto a deteção inicial dos desequilíbrios no Relatório sobre o Mecanismo de Alerta (RMA), como a avaliação da existência desses desequilíbrios nas análises aprofundadas (AA) passarão a assumir uma natureza mais prospetiva, com vista a identificar e a resolver numa fase precoce os desequilíbrios que possam vir a surgir. Tal poderá implicar a realização de um maior número de análises aprofundadas quando as variáveis relacionadas com os fluxos revelarem uma evolução adversa, apontando para a existência de um elevado risco de acumulação de desequilíbrios. Poderá igualmente levar a que essas análises aprofundadas se saldem com maior frequência por uma conclusão quanto à inexistência de quaisquer desequilíbrios.

A reforma reduzirá a inércia que tem vindo a caracterizar o PDM, fazendo basear em maior grau a avaliação dos desequilíbrios na evolução dos riscos e na execução das políticas. Tal implica atribuir uma maior importância à evolução das tendências suscetíveis de serem duradouras e às políticas levadas a cabo para corrigir os desequilíbrios macroeconómicos, a fim de determinar se os desequilíbrios foram corrigidos. Esta abordagem levará a que os Estados-Membros deixem de ser objeto de uma supervisão no âmbito do PDM quando prosseguirem políticas destinadas a corrigir os desequilíbrios e os desequilíbrios em termos de volume da dívida forem continuamente retificados.

Por último, a reforma visará assegurar um PDM claramente centrado nas questões macroeconómicas que afetam os Estados-Membros e, simultaneamente, conferir maior visibilidade aos aspetos inerentes tanto aos desequilíbrios da UE no seu conjunto como na área do euro. Tal poderá evidenciar fatores de vulnerabilidade suscetíveis de afetar a UE e a área do euro no seu conjunto, bem como as contribuições respetivas dos diferentes Estados-Membros para o efeito, o que contribuirá para internalizar as repercussões daí decorrentes e para assegurar a sua tomada em consideração no âmbito das recomendações dirigidas à área do euro.

A fim de tirar pleno proveito das sinergias entre o PDM e o quadro orçamental, a revisão prevê diversas articulações a este nível. Em primeiro lugar, no caso dos Estados-Membros em que sejam identificados desequilíbrios, os planos orçamentais e estruturais de médio prazo também deverão prever reformas e investimentos destinados a corrigir esses desequilíbrios. Em segundo lugar, será ponderada a possibilidade de lançar o procedimento por desequilíbrio excessivo a respeito dos países que apresentem desequilíbrios excessivos, na eventualidade de não serem realizados os investimentos e as reformas relevantes para efeitos do PDM que apoiem um período de ajustamento mais alargado. Por último, no caso de ser desencadeado o procedimento por desequilíbrio excessivo, o Estado-Membro será convidado a apresentar um plano orçamental e estrutural revisto, a título do plano de medidas corretivas atualmente previsto na legislação da UE ( 12 ). 

4.Como funcionará na prática o quadro revisto de governação económica?

Tomando como ponto de partida as principais linhas de reforma delineadas na secção anterior, a presente secção aborda algumas questões específicas relacionadas com o funcionamento do quadro orçamental comum revisto da UE. Estas questões prendem-se com o seguinte: elaboração e aprovação dos planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo; avaliação da conformidade dos resultados da política orçamental com a trajetória de despesa aprovada; bem como identificação dos desequilíbrios macroeconómicos e acompanhamento da respetiva correção. A presente secção engloba igualmente o quadro que rege a assistência financeira, ou seja, o quadro aplicável aos Estados-Membros da área do euro cuja estabilidade financeira enfrenta ou corre o risco de enfrentar graves dificuldades.

4.1 Como elaborar e aprovar o plano?

Apresentação, avaliação, aprovação e revisão do plano orçamental e estrutural nacional de médio prazo

No âmbito do quadro comum, a Comissão apresentará, para os Estados-Membros cuja dívida pública atinja níveis muito ou bastante avultados e problemáticos, uma trajetória de ajustamento plurianual de referência em termos da despesa primária líquida, abrangendo um período mínimo de quatro anos. Essa trajetória de ajustamento de referência assentará na sustentabilidade da dívida, o que significa que, para os Estados-Membros que enfrentem desafios substanciais ou moderados do ponto de vista orçamental, essa trajetória deve garantir que, mesmo na falta de novas medidas orçamentais, a dívida se mantém numa trajetória decrescente credível findo o período de ajustamento orçamental e que o défice permanece abaixo do limiar de 3 % do PIB (para mais informações, ver caixa 1). Para cada Estado-Membro, a trajetória plurianual da despesa que coloca a dívida numa trajetória decrescente poderá vir a traduzir-se, portanto, no nível correspondente ao saldo primário estrutural a alcançar até ao termo do período de quatro anos. A Comissão divulgará ao público a análise da sustentabilidade da dívida ( 13 ), a trajetória de ajustamento plurianual de referência e o nível correspondente do saldo primário estrutural no final do período de ajustamento de quatro anos. Estes elementos constituirão uma referência comum para a avaliação dos planos a propor pelos Estados-Membros.

Quando propuser a trajetória de ajustamento de referência englobando um período mínimo de quatro anos, a Comissão aplicará o seguinte quadro comum:

·No caso dos Estados-Membros que enfrentem graves problemas a nível da dívida pública, a trajetória de referência da despesa líquida deve garantir que, dentro do horizonte temporal contemplado pelo plano (quatro anos), i) a trajetória da dívida ao longo de dez anos, num cenário de políticas inalteradas, continue a seguir um rumo plausível e continuamente decrescente; e ii) o défice se mantenha abaixo do valor de referência de 3 % do PIB num cenário de políticas inalteradas ao longo desse mesmo período de dez anos.

·No caso dos Estados-Membros que enfrentem problemas moderados a nível da dívida pública, a trajetória de referência para a despesa líquida deve garantir que i) decorridos três anos, no máximo, após o termo do plano, a trajetória da dívida de dez anos continue a seguir um rumo plausível e continuamente decrescente, num cenário de políticas inalteradas; e ii) à luz do horizonte temporal contemplado pelo plano, o défice permaneça abaixo do valor de referência de 3 % do PIB durante o mesmo período de dez anos.

A fim de avaliar a plausibilidade, a Comissão recorrerá a testes de esforço e a análises estocásticas, simulando choques comuns relacionados com as taxas de juro a curto e longo prazo, o crescimento do PIB nominal, o saldo orçamental primário e as taxas de câmbio nominais. Esta análise será divulgada ao público, juntamente com a trajetória de referência da despesa líquida. A Comissão divulgará igualmente a metodologia e os dados subjacentes utilizados.

Aquando da avaliação dos planos, a Comissão apreciará igualmente se a manutenção do défice a um nível inferior a 3 % do PIB durante um período de dez anos é garantida de forma credível.

No caso dos Estados-Membros com ligeiros problemas a nível da dívida pública, o défice deverá manter-se abaixo desse valor de referência, num cenário de políticas inalteradas, ao longo de um período de dez anos, no máximo três anos após o termo do plano.

Numa etapa seguinte, cada Estado-Membro apresentará um plano orçamental e estrutural de médio prazo, a ser avaliado pela Comissão e aprovado pelo Conselho. Os planos delinearão a trajetória orçamental de médio prazo e os compromissos assumidos quanto às reformas e aos investimentos necessários. A trajetória de ajustamento orçamental será definida em termos de despesa primária líquida, ou seja, despesas líquidas de medidas discricionárias em matéria de receitas e excluindo a despesa com juros, bem como as despesas cíclicas relacionadas com o desemprego. A trajetória orçamental de médio prazo traduzir-se-á nos correspondentes limiares anuais máximos de despesa. Para os Estados‑Membros em que sejam identificados desequilíbrios no âmbito do PDM, os planos incluirão igualmente reformas e investimentos destinados a corrigir esses desequilíbrios. A apresentação do plano será precedida de um diálogo técnico aprofundado com a Comissão. Esta última avaliará o plano de médio prazo de forma integrada, tendo em conta as interações entre a trajetória orçamental e as reformas e os investimentos. A avaliação basear-se-á num quadro de avaliação comum da UE e em metodologias transparentes, sendo possível solicitar informações adicionais ou um plano revisto.

O Estado-Membro pode solicitar e obter uma prorrogação do período de ajustamento com uma duração máxima de três anos, na condição do respetivo plano assentar num conjunto de reformas e investimentos que apoiem o crescimento sustentável e a sustentabilidade da dívida. Os Estados-Membros poderão propor uma trajetória de ajustamento mais progressiva, desde que esta assente num conjunto de compromissos de reforma e investimentos cuja importância seja prioritária. Estes compromissos serão apreciados recorrendo a um quadro de avaliação comum da UE (ver a subsecção seguinte). Deverão contribuir para a sustentabilidade da dívida e responder às prioridades e metas comuns da UE, para além de garantir que o plano orçamental e estrutural nacional abarque a totalidade ou uma parte significativa das recomendações específicas por país. Durante o período de vigência do MRR, tomar-se-ão devidamente em consideração as reformas e os investimentos pertinentes dos PRR.

Numa etapa ulterior, o Conselho aprovará o plano com base numa avaliação da Comissão. Uma vez examinado o plano de médio prazo pela Comissão com base num quadro de avaliação comum, o Conselho aprovará o referido plano ou recomendará que o Estado-Membro apresente um plano alterado. Na falta de um acordo entre o Estado-Membro e a Comissão, esta última e o Conselho utilizarão a trajetória de referência da despesa líquida plurianual para efeitos da supervisão orçamental e aplicação da legislação.

Como última etapa, o Estado-Membro aplicará o plano, que será objeto de um acompanhamento anual por parte da Comissão e do Conselho no âmbito do Semestre Europeu. Uma vez aprovado o plano nacional pelo Conselho, os orçamentos nacionais anuais deverão tê-lo em conta por um período mínimo de quatro anos. A trajetória orçamental acordada só poderá ser revista antes do termo deste período se ocorrerem circunstâncias objetivas que inviabilizem a execução do referido plano. Qualquer revisão proposta pelo Estado-Membro terá de ser avaliada pela Comissão e aprovada pelo Conselho, como sucede com o próprio plano.

Se for detetado que um Estado-Membro se encontra numa situação de desequilíbrio macroeconómico durante a vigência do plano de médio prazo, este último não será, regra geral, relançado para integrar a abordagem estratégica destinada a corrigir os referidos desequilíbrios. Em vez disso, será desencadeado um diálogo político com o Estado-Membro, a fim de identificar as medidas necessárias para corrigir os desequilíbrios. Estas serão comunicadas pelo Estado-Membro num ofício e acabarão por ser eventualmente integradas no plano de médio prazo aquando da sua atualização, com base no processo de avaliação e aprovação acima descrito (caixa 2).

Figura 3: Sinopse do processo

Quadro comum de avaliação do plano de médio prazo

Na fase de conceção, a Comissão avaliará se a trajetória de ajustamento orçamental plurianual proposta pelos Estados-Membros se coaduna com o objetivo de assegurar que a dívida seja colocada ou se mantenha numa trajetória decrescente, o mais tardar até ao final do período de ajustamento, ou permaneça a níveis prudentes e o défice se situe a níveis inferiores a 3 % do PIB a médio prazo. A trajetória de ajustamento de referência servirá de base comum para as discussões e a avaliação dos planos pela Comissão. A trajetória de ajustamento de referência deve igualmente assegurar que o défice se mantenha abaixo do valor de referência de 3 % do PIB a médio prazo. No caso dos Estados-Membros que já sejam objeto de um PDE aquando da apresentação do plano, a Comissão avaliará se o plano é consentâneo com as recomendações e decisões pertinentes do Conselho.

Se um Estado-Membro tiver solicitado uma prorrogação do período de ajustamento por três anos, no máximo, esse pedido beneficiará de um parecer favorável se a trajetória de ajustamento mais alargada assentar em compromissos assumidos quanto a reformas e investimentos adequados a realizar dentro de determinados prazos. Os Estados‑Membros deverão facultar documentação aprofundada e transparente para o efeito, que proporcione uma análise quantitativa dos eventuais custos a curto prazo, se for caso disso, bem como do impacto a médio prazo em termos orçamentais e a nível do potencial de crescimento que advirá desses compromissos em matéria de reformas e investimentos. Quando aprecia esse pedido, a Comissão aplicará os critérios abaixo indicados para avaliar a série de compromissos em matéria de reformas e investimento apresentados pelos Estados-Membros. Estes compromissos devem:

·Fomentar o crescimento e apoiar a sustentabilidade orçamental;

·Dar resposta às prioridades comuns da UE, nomeadamente aos planos nacionais em matéria de energia e clima (em consonância com as metas da Lei Europeia em matéria de Clima), aos roteiros nacionais para a Década Digital ( 14 ) e à aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, bem como garantir que o plano orçamental e estrutural contemple a totalidade ou uma parte significativa das REP pertinentes, incluindo as recomendações formuladas no âmbito do PDM, se for caso disso,

·Ser suficientemente pormenorizados, devendo a respetiva realização estar concentrada nas fases iniciais e respeitar determinados prazos, para além de os seus resultados serem verificáveis;

·Garantir a concretização das prioridades de investimento específicas a cada país sem suscitar a contenção do investimento noutros domínios ao longo do período contemplado pelo planeamento em causa.

Com base num parecer positivo da Comissão, o Conselho adotará a trajetória de ajustamento alargada e os compromissos em matéria de reformas e investimentos que apoiam essa trajetória.

Na prática, serão importantes as seguintes especificações técnicas para a elaboração do plano de médio prazo por parte do Estado-Membro e a sua avaliação pela Comissão:

·O plano descreverá os pressupostos e as projeções da trajetória das variáveis macroorçamentais pertinentes. Tal compreenderá a trajetória macroeconómica e orçamental para o período de ajustamento abrangido pelo plano e a subsequente prorrogação das projeções para os dez anos seguintes, num cenário de políticas inalteradas. As projeções da dívida, num cenário de políticas inalteradas, a incluir no plano devem ser coerentes com as projeções comparáveis da Comissão (para mais informações, ver caixa 1).

·O plano apresentado por um Estado-Membro que solicite um período de ajustamento mais alargado deve incluir documentação aprofundada e transparente que demonstre a forma como o conjunto de compromissos em matéria de reformas e investimentos contribui para o crescimento sustentável e a sustentabilidade orçamental, bem como uma análise quantitativa do impacto a médio prazo em termos orçamentais e a nível do potencial de crescimento que advirá desse conjunto de reformas e investimentos subjacentes ao período de ajustamento mais alargado.

·O plano incluirá a projeção das despesas a financiar por subvenções do MRR, fundos da política de coesão e outras transferências da UE. Será necessário continuar a desenvolver outros requisitos em matéria de dados e informações a comunicar, tanto a respeito do próprio plano de médio prazo como no âmbito do relatório anual que faz o ponto da situação, partindo dos atuais requisitos aplicáveis no quadro dos programas de estabilidade e convergência e dos programas nacionais de reformas, embora com um horizonte temporal mais alargado.

·A trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada traduzir-se-á em limiares anuais máximos de despesa a respeitar durante o período de ajustamento em relação à despesa financiada a nível nacional, enquanto o plano incluirá uma projeção da despesa a financiar pelo MRR, fundos da política de coesão e outras transferências da UE. A trajetória será definida de molde a assegurar que uma parte significativa das necessidades de consolidação seja satisfeita durante o período de ajustamento, não devendo ser deixada ao critério dos futuros governos. A supervisão orçamental anual e durante o exercício em curso irá acompanhar a evolução da despesa, a fim de evitar que ligeiras derrapagens anuais conduzam cumulativamente a grandes desvios em relação à trajetória definida.

4.2 Como avaliar a conformidade dos resultados orçamentais e estruturais?

Princípios para a avaliação da conformidade

A execução dos planos orçamentais e estruturais de médio prazo será acompanhada a fim de comprovar se respeita a trajetória da despesa primária líquida plurianual acordada e aprovada pelo Conselho. Embora o acompanhamento e a execução continuem a basear-se no ciclo de supervisão anual e no exercício em curso, com particular destaque para os relatórios anuais, a supervisão terá por objetivo assegurar a observância do plano de médio prazo. A despesa financiada a nível nacional terá de se manter dentro dos limites determinados pela trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada. Dado que a utilização da despesa primária líquida a título de indicador operacional único para a supervisão permitirá o funcionamento de estabilizadores automáticos, não se justifica a existência de qualquer desvio em relação à trajetória devido a condições cíclicas (uma vez que tal criaria o risco de serem aplicados de forma assimétrica em períodos desfavoráveis, comprometendo assim o ajustamento e a sustentabilidade da dívida). De igual forma, embora os Estados-Membros continuem a dispor de liberdade para realizar reformas ou investimentos adicionais, essas novas iniciativas não implicarão um relançamento do processo relativo à trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada.  

São necessárias cláusulas de derrogação sólidas para fazer face a situações excecionais em que a trajetória de ajustamento aprovada não possa ser respeitada de forma realista. A rigorosa observância da trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada permitirá levar a cabo uma política orçamental anticíclica, criando reservas orçamentais em períodos favoráveis e possibilitando as respostas estratégicas necessárias em períodos desfavoráveis. ( 15 ) No entanto, no caso de importantes perturbações na área do euro ou da UE no seu conjunto, manter-se-á uma cláusula de derrogação de âmbito geral para fazer face a uma recessão económica grave que permita um desvio temporário em relação à trajetória orçamental. Além disso, uma cláusula relativa a circunstâncias excecionais permitirá desvios temporários em relação à trajetória orçamental de médio prazo em caso de circunstâncias excecionais que escapem ao controlo do governo e tenham um impacto significativo nas finanças públicas de um determinado Estado-Membro. Tal exigirá que a dimensão global do choque exceda um intervalo «normal» (por exemplo, os custos decorrentes das catástrofes naturais devem ser antecipados dentro de certos intervalos). O acionamento e a prorrogação das cláusulas gerais e específicas por país exigirão uma autorização do Conselho. 

A fim de aumentar a apropriação e a transparência a nível nacional, as instituições orçamentais independentes poderão vir a desempenhar um papel na supervisão do cumprimento dos planos orçamentais e estruturais nacionais de médio prazo em apoio dos governos nacionais. As instituições orçamentais independentes poderão facultar uma avaliação ex ante da adequação dos planos e das previsões a eles subjacentes, o que ajudará os governos nacionais na fase de conceção. Tal reforçará a apropriação dos planos a nível nacional e melhorará a transparência antes da aprovação do plano a nível da UE. Além disso, as instituições orçamentais independentes poderão reforçar a execução a nível nacional se forem incumbidas de facultar uma avaliação ex post da conformidade dos resultados da execução orçamental com a trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada e uma avaliação da validade das explicações relativas aos desvios em relação à trajetória, se for caso disso. A Comissão e o Conselho, responsáveis pela supervisão da UE, poderão ter em conta a avaliação dessas instituições orçamentais independentes, mas continuarão forçosamente a estar habilitadas a propor e a adotar a decisão final.

Supervisão do cumprimento da trajetória orçamental de médio prazo e lançamento dos PDM

A contrapartida necessária de um quadro de supervisão com base no risco que proporcione maior margem de manobra aos Estados-Membros para definirem as suas trajetórias de ajustamento será um controlo ex post mais rigoroso dessa supervisão. A avaliação da conformidade e da execução efetuar-se-ão de forma contínua, designadamente com base nos relatórios anuais sobre os progressos realizados e nas notificações de dados no âmbito do PDE. No caso dos Estados-Membros da área do euro, a Comissão também avaliará, no outono, a conformidade dos projetos de planos orçamentais com a trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada. Deixará de ser necessário formular recomendações anuais de política orçamental para os Estados-Membros que cumpram os seus planos de médio prazo. Simultaneamente, a Comissão/Conselho poderão formular recomendações que comportem alertas precoces antes de estarem reunidas as condições para lançar um PDE, ou seja, se considerar que existe um forte risco de incumprimento do limiar correspondente a 3 % do PIB ou em caso de desvios em relação à trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada que não conduzam à abertura de um PDE.

Manter-se-á o PDE baseado no défice, enquanto o PDE baseado na dívida será reforçado e tornar-se-á um instrumento fundamental para impor a conformidade de forma contínua com a trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada. As regras em vigor que regulam a abertura e o encerramento de um PDE baseado no défice não serão alteradas. O processo de abertura de um PDE baseado na dívida ao abrigo das novas regras será desencadeado quando um Estado-Membro com uma dívida superior a 60 % do PIB se desviar da trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada, definida no plano orçamental de médio prazo aprovado pelo Conselho. Nesse caso, a Comissão elaborará um «relatório nos termos do artigo 126.º, n.º 3,» que avalie os fatores pertinentes, tal como previsto no Tratado. No caso dos Estados-Membros que enfrentem graves problemas de dívida pública, qualquer desvio em relação à trajetória acordada resultará, a título supletivo, na abertura de um PDE. A trajetória a seguir no âmbito do PDE corresponderá, em princípio, àquela inicialmente aprovada pelo Conselho. Se esta trajetória inicial deixar de ser viável em virtude de circunstâncias objetivas, a Comissão poderá propor ao Conselho uma trajetória alterada no âmbito do PDE. Além disso, em caso de não-execução das reformas e dos investimentos subjacentes a uma trajetória de ajustamento mais progressiva, um novo instrumento de execução conduzirá a uma revisão da trajetória de ajustamento que passará a assumir uma natureza mais restritiva. A Comissão utilizará as contas controladas a nível nacional de cada Estado-Membro para acompanhar os desvios em relação à trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada acumulados ao longo do tempo. Tal reforçará a memória de médio prazo do sistema e evitará que os pequenos desvios acabem por resultar em grandes desvios na sequência da sua progressiva acumulação.

Reforçar-se-ão os mecanismos de execução: 

·Atenuar-se-ão as limitações impostas à utilização eficaz de sanções financeiras por meio da redução dos respetivos montantes; 

·Reforçar-se-ão as sanções em matéria de reputação. Por exemplo, poderá ser exigido aos ministros dos Estados-Membros objeto de um PDE que apresentem perante o Parlamento Europeu as medidas destinadas a dar cumprimento às recomendações formuladas no âmbito desse PDE;

·Impor-se-á a condicionalidade macroeconómica aplicável aos fundos estruturais e ao MRR num espírito semelhante. O financiamento da UE poderá igualmente ser suspenso quando os Estados-Membros não tiverem tomado medidas eficazes para corrigir o seu défice excessivo.

Para revogar os PDE, será necessário preencher diversas condições inequívocas. A revogação exigirá que o défice se mantenha plausivelmente abaixo de 3 % do PIB (em conformidade com as disposições atuais) e, no caso dos PDE baseados na dívida, que o Estado-Membro denote um cumprimento duradouro da trajetória plurianual da despesa primária líquida acordada durante três anos, assegurando que a dívida seja colocada de forma credível numa trajetória decrescente no final do período de ajustamento.

Supervisão do cumprimento dos compromissos assumidos em matéria de reformas e investimentos

O cumprimento dos compromissos aprovados em matéria de reformas e investimentos que se encontram na base de uma trajetória orçamental mais progressiva será acompanhado anualmente no contexto do Semestre Europeu. A fim de assegurar um acompanhamento adequado, o plano nacional de médio prazo deve incluir dados suficientes, bem como um calendário para a concretização desses compromissos em matéria de reformas e investimentos. Os Estados-Membros apresentarão informações sobre os progressos realizados quanto à concretização destes compromissos nos seus relatórios anuais elaborados para o efeito, juntamente com um relatório sobre as medidas estratégicas tomadas para dar resposta às REP.

Será criado um novo instrumento no intuito de assegurar o cumprimento dos compromissos em matéria de reformas e investimentos que se encontram na base de uma trajetória de ajustamento mais progressiva. Se um Estado-Membro não cumprir os seus compromissos em matéria de reformas e investimentos, o instrumento habilitará a UE a solicitar uma revisão da trajetória plurianual da despesa primária líquida (que passará a assumir uma natureza mais restritiva, assegurando simultaneamente uma elevada qualidade das finanças públicas), e também a impor sanções financeiras (no que respeita aos Estados-Membros da área do euro).

4.3 Como identificar e avaliar melhor a evolução dos desequilíbrios macroeconómicos?

A pedra angular do PDM reformulado será a determinação conjunta de uma estratégia política para corrigir os desequilíbrios, mediante um maior diálogo e empenhamento.

·À semelhança da trajetória de ajustamento orçamental, a abordagem estratégica para prevenir e corrigir os desequilíbrios macroeconómicos assentará numa maior apropriação, na sequência de um diálogo travado com a Comissão com base nas suas apreciações aprofundadas e, se for caso disso, nas REP. Tal resultará na assunção de compromissos no âmbito do plano orçamental e estrutural de médio prazo, cuja concretização será tida em conta na análise da evolução dos desequilíbrios.

·Do mesmo modo que no âmbito da supervisão orçamental, prever-se-á um processo reforçado de acompanhamento e execução para o PDM. Por conseguinte, o procedimento de desequilíbrio excessivo continuará a ser o instrumento utilizado para impor a tomada de medidas estratégicas nos Estados-Membros com desequilíbrios macroeconómicos excessivos, incluindo desequilíbrios que coloquem ou possam colocar em risco o bom funcionamento da União Económica e Monetária, quando esses Estados-Membros não adotam as devidas medidas.

·A fim de assegurar a coerência global com os compromissos assumidos no âmbito do plano orçamental e estrutural de médio prazo, o início de um procedimento de desequilíbrio excessivo levará ao relançamento do plano orçamental e estrutural com base num plano revisto apresentado pelo Estado-Membro, que servirá de plano de medidas corretivas no âmbito do procedimento de desequilíbrio excessivo. Esse plano único permitirá um processo de acompanhamento macro-orçamental mais coerente e integrado.

·A fim de reforçar a ênfase macroeconómica e a dimensão da UE/área do euro, o painel de avaliação do PDM será complementado pela inclusão de valores referentes à UE e à área do euro no que diz respeito a todos os indicadores. Os desafios sistémicos, nomeadamente os relacionados com as alterações climáticas, o ambiente e a transição energética, serão abordados no contexto do Semestre Europeu e referidos no Relatório sobre o Mecanismo de Alerta (RMA) e na apreciação aprofundada quando existir uma ligação clara com os desequilíbrios macroeconómicos.

·A fim de permitir uma deteção de riscos mais prospetiva e precoce, é necessário que o PDM reformulado preste maior atenção às variáveis relacionadas com os fluxos, durante as principais fases de supervisão do PDM. O RMA colocará maior ênfase na questão de saber se a evolução em causa deverá persistir, bem como o seu impacto esperado nos Estados-Membros que sejam objeto de uma apreciação aprofundada, o que permitirá realizar apreciações aprofundadas mais frequentes quando se observa uma evolução desfavorável, mesmo se esta não vier a traduzir-se plenamente em desequilíbrios quanto ao volume da dívida. A avaliação da existência de desequilíbrios continuará a basear-se nos três critérios da respetiva gravidade, evolução e resposta estratégica. No entanto, os critérios quanto à evolução e resposta estratégica por parte do Estado-Membro em causa assumirão maior peso no âmbito dessa avaliação, o que poderá contribuir para reduzir a alegada inércia em torno da classificação dos desequilíbrios.

·A fim de melhorar a dinâmica do PDM, a menor supervisão dos Estados-Membros no âmbito do PDM basear-se-á em critérios claros. Esses critérios podem incluir, por exemplo, a condição de os desequilíbrios terem diminuído durante, pelo menos, dois anos e de os fluxos fundamentarem as expectativas quanto a uma redução adicional e suficiente; as previsões devem revelar melhorias contínuas e os compromissos estratégicos, nomeadamente aqueles especificados no plano orçamental e estrutural nacional, devem ter sido concretizados. Poderão elaborar-se apreciações aprofundadas mais sucintas quando os desequilíbrios estiverem a ser corrigidos, prevendo-se simultaneamente relatórios completos, regra geral, cada três anos, a menos que a Comissão considere necessário realizá-los antes.

4.4 Uma supervisão pós-programa orientada e simplificada

A análise da governação económica incluiu igualmente uma avaliação da supervisão pós-programa. Na comunicação de fevereiro de 2020, considerou-se que o quadro de supervisão dos Estados-Membros cuja estabilidade financeira enfrenta ou corre o risco de enfrentar graves dificuldades havia conduzido a uma série de melhorias e que tinha funcionado, de modo geral, de forma harmoniosa. Não obstante, foi destacada a importância de preservar um nível adequado de apropriação nacional dos programas, bem como a persistência de problemas em matéria de transparência e responsabilização ( 16 ). 

Dever-se-á preservar a flexibilidade da supervisão reforçada enquanto instrumento de resolução de crises. A supervisão reforçada demonstrou ser um instrumento flexível, tendo sido utilizada com êxito no final de um programa de ajustamento macroeconómico para a Grécia, no período de 2018 a 2022. Permitiu um acompanhamento eficaz dos compromissos assumidos em matéria de reforma, possibilitando uma transição subsequente para a supervisão pós-programa. No entanto, o valor da supervisão reforçada a título de medida de intervenção precoce continua a ser igualmente importante para evitar que uma situação num Estado-Membro da área do euro se deteriore ao ponto de vir a ser necessário aplicar um programa de ajustamento macroeconómico.

A supervisão pós-programa deve visar objetivos claros, devendo o grau de intensidade dessa supervisão estar associada a esses objetivos. A supervisão pós-programa colocará a ênfase em: i) analisar a capacidade de reembolso tendo em conta a situação económica, orçamental e financeira; ii) acompanhar a execução das reformas ainda não concluídas que haviam sido iniciadas no âmbito do programa de ajustamento; e iii) avaliar se são necessárias medidas corretivas no caso de existirem preocupações relacionadas com a capacidade de reembolso ou o acesso contínuo ao mercado. A intensidade da supervisão pós-programa evoluirá ao longo do tempo, juntamente com a ênfase colocada nos riscos e na sua avaliação. Embora os primeiros anos sejam mais intensos, uma vez que também é assegurado o acompanhamento da execução de reformas ainda não concluídas que foram iniciadas no âmbito do programa de ajustamento, esta intensidade diminuirá ao longo do tempo à medida que as reformas são executadas. Como tal, em períodos «normais», a supervisão pós-programa centrar-se-á na avaliação da capacidade de reembolso, tomando em consideração a situação económica, orçamental e financeira e poderá ser simplificada quando se considerar que os riscos em matéria de não reembolso são diminutos, nomeadamente mediante uma melhor integração com outros instrumentos de supervisão. Em caso de deterioração da situação económica, orçamental ou financeira, essa abordagem permitirá reforçar a intensidade da supervisão pós-programa que deverá, nesse contexto, apreciar a necessidade de medidas corretivas.

5.Conclusões

A presente comunicação descreve as principais características do quadro de governação económica reformulado. Os principais elementos delineados na presente comunicação respondem à necessidade de dispor de um quadro reformulado em condições de responder aos desafios da década atual. O financiamento necessário para uma transição justa em direção a uma economia digital e ecológica, com impacto neutro no clima, e os rácios dívida/PIB mais elevados exigem regras orçamentais que permitam realizar investimentos estratégicos e salvaguardem simultaneamente a sustentabilidade orçamental.

A obtenção de um rápido acordo quanto à revisão das regras orçamentais da UE e outros elementos do quadro de governação económica constitui uma prioridade premente na atual conjuntura crítica para a economia europeia. Os Estados-Membros e a Comissão deverão chegar a um consenso sobre a reforma do quadro de governação económica antes dos procedimentos orçamentais dos Estados-Membros para 2024. Tendo em conta os crescentes problemas com que a UE se depara, impõe-se uma sólida coordenação das políticas orçamentais e estruturais, bem como uma supervisão económica e orçamental eficaz. A importância de finanças públicas em condições de responder de forma coordenada aos problemas existentes e que contribuam para a concretização das prioridades comuns da UE tem vindo a aumentar à luz das crises recentes e em curso. A sua existência tranquilizará igualmente os mercados financeiros no que diz respeito à solidez institucional da área do euro, que se baseia em finanças públicas sustentáveis e na prevenção e correção dos desequilíbrios macroeconómicos em todos os Estados-Membros. A aplicação de regras orçamentais credíveis e a supervisão dos riscos para a estabilidade macrofinanceira também ajudarão o BCE a alcançar os seus objetivos, em especial quando se depara com a necessidade de cumprir o seu mandato de manter a estabilidade dos preços, evitando simultaneamente a fragmentação financeira na área do euro.

Uma reforma aprofundada do quadro de governação económica da UE exigirá alterações legislativas. A alteração da legislação de base permitirá clarificar e simplificar o quadro. Proporcionará um elevado grau de segurança jurídica quanto ao funcionamento de um quadro reformulado, que contará com a devida participação do Conselho e do Parlamento Europeu. Para alcançar um acordo sobre as alterações legislativas necessárias seguir-se-á o processo legislativo ordinário, envolvendo, no que diz respeito à maior parte dos aspetos, o Conselho e o Parlamento Europeu em pé de igualdade.

Os objetivos da proposta de reforma do PDM poderão ser alcançados, na sua grande maioria, ao abrigo das disposições jurídicas em vigor. Em especial, a adoção de uma abordagem mais prospetiva para avaliar melhor os riscos e ajustar os critérios seguidos para decidir sobre a existência de desequilíbrios, a sua classificação e respetiva correção poderá ser assegurada no âmbito do quadro jurídico em vigor.

Com base nas presentes orientações e nos debates ulteriores, a Comissão ponderará a possibilidade de apresentar propostas legislativas. No primeiro trimestre de 2023, a Comissão emitirá, de novo, orientações relativas à política orçamental para o futuro próximo. Estas orientações facilitarão a coordenação das políticas orçamentais e a elaboração dos programas de estabilidade e convergência dos Estados-Membros para 2024 e anos posteriores. Estas orientações terão em conta a situação económica, a situação específica a cada Estado-Membro e as orientações estabelecidas na presente comunicação, contanto que se alcance um grau suficiente de convergência entre os Estados-Membros até essa data. Na primavera de 2023, as orientações serão definidas através das REP.



Caixa 1: Critério de sustentabilidade da dívida

Para determinar a trajetória de ajustamento de referência que garanta a convergência da dívida para níveis prudentes, a Comissão utilizará uma metodologia consagrada e transparente, baseada no seu quadro de análise da sustentabilidade da dívida, já acordada com os Estados-Membros. No caso dos Estados-Membros com graves problemas de dívida pública, a Comissão apresentará uma trajetória de ajustamento de referência destinada a assegurar que, em cada Estado-Membro, após a plena aplicação do plano, a dívida continuará a seguir uma trajetória plausivelmente decrescente após o período de ajustamento, com base numa trajetória de dez anos e num cenário de políticas inalteradas findo o período de ajustamento. Esta trajetória de ajustamento de referência está vinculada a um nível do saldo primário estrutural no termo do período de ajustamento que garanta uma trajetória plausivelmente decrescente por parte da dívida. No caso dos Estados-Membros com problemas moderados de dívida, a trajetória de referência será menos exigente.

O quadro de análise de sustentabilidade da dívida aplicado pela Comissão constitui um conjunto consagrado de instrumentos analíticos de avaliação dos riscos em matéria de sustentabilidade da dívida. Inclui uma projeção de referência para a trajetória da dívida durante dez anos, juntamente com outras projeções da dívida baseadas em pressupostos alternativos para as variáveis orçamentais, macroeconómicas e financeiras, bem como uma análise estocástica que reflete a incerteza macroeconómica geral. O cenário de referência da análise de sustentabilidade da dívida assenta num pressuposto de políticas orçamentais inalteradas, em que não são incorporadas medidas orçamentais adicionais após o horizonte temporal contemplado pelo plano e a despesa primária só é afetada por variações nos custos relacionados com o envelhecimento demográfico, conforme previsto no último relatório comum da Comissão e do Conselho sobre o envelhecimento demográfico. O crescimento do PIB real é consentâneo com as últimas projeções a médio prazo da Comissão, recorrendo à metodologia comum da UE e tendo em conta o impacto dos investimentos efetuados ao abrigo do pacote NextGenerationEU. As taxas de inflação e de juro convergem no sentido das expectativas do mercado. Quanto às projeções determinísticas, a avaliação dos riscos baseia-se no nível projetado da dívida, na trajetória da dívida e na plausibilidade da situação orçamental visada (bem como da margem assegurada para adotar medidas corretivas, caso necessário). Quanto às projeções estocásticas, a avaliação dos riscos baseia-se na probabilidade de a dívida não estabilizar durante cinco anos e no grau de incerteza macroeconómica. () Nesta base, a referida análise classifica os países de acordo com três categorias gerais de risco: baixo, médio e elevado. A categoria de risco elevado indica a existência de problemas graves de dívida pública (sustentabilidade) que é necessário resolver por meio de políticas orçamentais e macroeconómicas.

Uma trajetória de ajustamento compatível com a convergência da dívida para níveis prudentes deve assegurar que, no caso de um Estado-Membro com problemas graves ou moderados de dívida pública, a dívida segue uma trajetória plausivelmente decrescente com base numa trajetória de dez anos para além do horizonte temporal contemplado pelo plano. Para os Estados-Membros com graves problemas de dívida pública, tal sucederá se a trajetória da dívida de dez anos para além do horizonte temporal contemplado pelo plano seguir um rumo plausível e continuamente decrescente. Para os Estados-Membros com problemas moderados de dívida pública, tal sucederá se, o mais tardar, três anos para além do horizonte temporal contemplado pelo plano, a trajetória da dívida de dez anos seguir um rumo plausível e continuamente decrescente. Estas condições devem ser cumpridas num cenário de políticas inalteradas após a execução do plano de médio prazo, ou seja, na ausência de novas medidas de política orçamental findo o período de ajustamento e, no intuito de ter em conta os riscos de forma realista, no âmbito de um conjunto normalizado de cenários adversos, como aqueles considerados no quadro da análise da sustentabilidade da dívida da Comissão. Por último, deverá prevalecer uma probabilidade suficientemente reduzida de a dívida vir a aumentar nos cinco anos seguintes ao horizonte temporal contemplado pelo plano.

Os pressupostos e as projeções da trajetória das variáveis macro-orçamentais pertinentes serão estabelecidos no plano para um período de dez anos após o termo do período abrangido pelo plano. Tal abrangerá a trajetória macroeconómica e orçamental do período abrangido pelo plano e a subsequente prorrogação das projeções para os dez anos seguintes num cenário de políticas inalteradas (ver quadro 1).

Quadro 1: Horizonte temporal das projeções e do critério de avaliação

Nota: O período de ajustamento de quatro anos pode ser excecionalmente prorrogado até sete anos, a fim de facilitar grandes investimentos e reformas.

(1) Para mais informações pormenorizadas sobre a metodologia, consultar o relatório intitulado 2021 Fiscal Sustainability Report (não traduzido para português).

Caixa 2: Resposta estratégica aos novos desequilíbrios no âmbito do PDM

Acordo sobre o plano nacional de médio prazo e o PDM

Imediatamente após a identificação de desequilíbrios no âmbito de uma apreciação aprofundada (e eventual publicação de REP específicas para o PDM a título de orientação), o PDM reformulado contemplará travar um diálogo com o Estado-Membro. Este diálogo terá lugar durante o verão e o outono, tendo como objetivo chegar a um entendimento comum dos desafios enfrentados e identificar reformas e investimentos que conduzam à correção dos desequilíbrios (figura 1).

Com base neste diálogo, a Comissão e o Estado-Membro acordarão em conjunto uma abordagem estratégica para corrigir os desequilíbrios, em consonância com a abordagem do PRR. O conjunto acordado de reformas e investimentos será incorporado no plano nacional de médio prazo logo que o plano seja objeto de consenso. O plano nacional de médio prazo poderá também incluir referências cruzadas a medidas já incluídas no PRR, bem como a investimentos pertinentes financiados pelos programas da política de coesão, a fim de proporcionar uma panorâmica geral dos compromissos estratégicos assumidos pelos Estados-Membros.

Figura 1: Calendário da resposta estratégica à identificação de um desequilíbrio decorrente do novo plano nacional de médio prazo 

É identificada uma nova fonte de desequilíbrio durante o período de execução do plano nacional de médio prazo

Se for identificada uma nova fonte de desequilíbrios aquando da vigência do plano nacional de médio prazo, após a identificação destes fatores de vulnerabilidade numa apreciação aprofundada durante o ciclo do Semestre Europeu, o plano de médio prazo vigente não será, em princípio, relançado, mas será desencadeado um diálogo político com os Estados-Membros para alcançar um entendimento comum dos desequilíbrios e das medidas necessárias para os corrigir. A abordagem política acordada para corrigir os desequilíbrios, incluindo as reformas e os investimentos a realizar, será comunicada, por carta, pelo Estado-Membro à Comissão e ao Conselho e debatida no âmbito dos comités correspondentes. Subsequentemente, as políticas acordadas poderão incluir: i) um novo plano nacional de médio prazo (caso o desequilíbrio não seja resolvido durante o período de vigência do plano inicial); OU ii) um plano de médio prazo alterado (se o plano anterior deixar de ser viável). Se os desequilíbrios forem excessivos e exigirem uma alteração imediata da política orçamental e novas reformas cruciais, será iniciado um procedimento de desequilíbrio excessivo e relançado o plano, que funcionará a título de plano com medidas corretivas.

Anexo 1: Calendário da supervisão da UE

Nota: Os calendários para a apresentação de novos planos (após o início do PEC revisto) podem variar em função dos ciclos políticos dos Estados-Membros.

* No outono do ano T, haverá uma avaliação ex ante do projeto de plano orçamental (PPO) para o ano T+1.

** Na primavera do ano T, ainda não pode haver uma avaliação ex post completa dos resultados orçamentais, uma vez que o ano T marca o início da execução do plano.



Anexo 2 — Resultados do debate público ( 17 )

Na sequência do relançamento da análise da governação económica em outubro de 2021 ( 18 ), as partes interessadas contribuíram para o debate por meio de um inquérito público em linha. As partes interessadas responderam a onze perguntas de resposta aberta sobre diferentes aspetos da governação económica da UE. O inquérito recebeu 225 contributos válidos por parte de inquiridos oriundos de 25 países. A Comissão resumiu as principais conclusões num relatório publicado em março de 2022. ( 19 ) As características dos participantes no inquérito não correspondiam às da população da UE, pelo que não se pode considerar que as respostas sejam representativas da opinião predominante de todos os cidadãos e partes interessadas da UE. No entanto, dada a sua variedade e profundidade, as observações apresentadas constituem um contributo valioso. Muitos inquiridos manifestaram a opinião de que o quadro de governação deve tornar-se mais favorável ao crescimento, mais consciente das questões sociais e apoiar as prioridades estratégicas da dupla transição ecológica e digital. A maior parte dos inquiridos reconheceu a necessidade de o quadro orçamental contribuir para a resiliência das economias da UE perante os choques eventuais e que a sustentabilidade da dívida deve continuar a ser um objetivo central das regras orçamentais da UE, ao passo que a trajetória de ajustamento no sentido da redução da dívida pública deve ser realista e progressiva. Muitos inquiridos salientaram a necessidade de incentivar o investimento como elemento fundamental do quadro de governação económica. Considerou-se que o investimento ecológico merecia especial atenção devido aos desafios globais em matéria de clima e ambiente, ao passo que alguns inquiridos alertaram para a necessidade de aplicar um tratamento preferencial às despesas de investimento no âmbito da supervisão orçamental. Os participantes apelaram igualmente a uma maior simplificação, transparência e apropriação nacional. Muitos inquiridos consideraram o MRR uma boa fonte de inspiração para o quadro de governação, no que diz respeito ao fomento da apropriação nacional e da promoção de reformas por meio de incentivos positivos. Vários inquiridos apoiavam um maior cumprimento e uma aplicação mais rigorosa do quadro de supervisão. Diversos inquiridos solicitaram a criação de maiores sinergias entre o PEC e o PDM, uma vez que estas poderiam contribuir para tornar as finanças públicas mais favoráveis ao crescimento e melhorar a consecução de vários objetivos estratégicos de forma paralela.  

Vários participantes no debate público lançaram um apelo no sentido de uma capacidade orçamental central permanente. ( 20 ) Este instrumento poderá dar resposta aos desafios a longo prazo proporcionando bens públicos comuns que impulsionarão o crescimento sustentável e ajudarão a conter a inflação e/ou a melhorar a estabilização macroeconómica. O Relatório dos Cinco Presidentes, de 2015, identificou princípios de orientação sólidos para a sua conceção, nomeadamente que essa capacidade não deve conduzir a transferências permanentes entre países, deve preservar os incentivos a favor de uma política orçamental sólida a nível nacional e cabe ser desenvolvida no âmbito da União Europeia. Tal como aventado no debate público, a capacidade orçamental central para a UE ou a área do euro poderá ter em conta os êxitos alcançados nos últimos anos (ou seja, o Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos, o instrumento SURE e o MRR).

O debate incluiu igualmente uma série de discussões temáticas com os Estados-Membros no âmbito do Comité Económico e Financeiro e do Comité de Política Económica. Estes debates colocaram a ênfase na sustentabilidade da dívida pública, na necessidade de promover o investimento, na natureza pró-cíclica da política orçamental, na aplicação e governação das regras orçamentais da UE, na interação entre os quadros orçamentais nacionais e da UE, na pertinência e eficácia do PDM e na necessidade de manter este último centrado nos desafios macroeconómicos, bem como nos ensinamentos a retirar do MRR. Foram igualmente debatidas as potenciais ramificações a longo prazo da invasão russa da Ucrânia para a resiliência e a segurança. O Grupo de Trabalho do Eurogrupo discutiu a dimensão da área do euro no âmbito da governação económica e, em especial, o PDM.

Os debates centraram-se na identificação das questões essenciais a abordar num quadro de governação económica reformulado. Alcançou-se um consenso no que diz respeito a alguns elementos, em especial nos debates travados com os Estados-Membros. Alguns destes elementos, nomeadamente os relativos ao quadro orçamental, já foram descritos na Comunicação da Comissão, de 2 de março de 2022. ( 21 ) Trata-se dos seguintes elementos:

Assegurar a sustentabilidade da dívida pública e promover o crescimento sustentável por meio do investimento e das reformas constituem duas faces da mesma moeda e são imprescindíveis para o êxito do quadro orçamental da UE.

Atribuir maior ênfase à supervisão orçamental da UE a médio prazo parece constituir uma via promissora.

É possível extrair ilações da conceção, governação e funcionamento do MRR.

A simplificação, uma maior apropriação nacional e uma melhor execução constituem objetivos fulcrais.

Os debates salientaram igualmente eventuais questões fundamentais a abordar num quadro de governação económica reformulado no que diz respeito ao PDM:

Reforçar a eficácia do PDM deve ser uma prioridade fundamental. Tal pode ser alcançado atribuindo maior ênfase ao seu objetivo principal, ou seja, evitar que os riscos para a estabilidade macrofinanceira se transformem em desequilíbrios e promover a tomada de medidas estratégicas, tendo em conta o funcionamento da UE e da área do euro no seu conjunto. Uma ênfase mais clara facilitará a comunicação relativa à identificação dos desequilíbrios macroeconómicos e a resposta estratégica necessária e aumentará a visibilidade do procedimento.

As recentes crises e o maior nível de incerteza realçam a necessidade de reforçar a capacidade do PDM para identificar novos riscos, o que poderá ser alcançado mediante a adoção de uma abordagem mais prospetiva, suscetível de desencadear uma resposta estratégica numa fase precoce.

Garantir a apropriação é crucial para reforçar o peso do PDM. Tal exige um diálogo reforçado com os Estados-Membros, que pode basear-se na experiência adquirida no âmbito do MRR. Assegurar uma maior operacionalidade do procedimento de desequilíbrio excessivo também contribuiria para reforçar o seu peso.

Paralelamente, a Conferência sobre o Futuro da Europa também refletiu sobre a forma de criar uma economia mais robusta na UE, garantir a justiça social e criar emprego. ( 22 ) Propôs que a UE reforce a sua competitividade e resiliência e promova investimentos prospetivos, centrados na dupla transição ecológica e digital, com uma forte dimensão social e de género, tendo em conta os exemplos do instrumento NextGenerationEU e do instrumento SURE. De acordo com a Conferência, a UE deve ter em conta as repercussões sociais e económicas da guerra contra a Ucrânia e a articulação entre a governação económica da UE e o novo contexto geopolítico.

(1)

() Em março de 2022, a Comissão publicou um relatório de síntese sobre as respostas ao inquérito em linha. Comissão Europeia (2022), « Online public consultation on the review of the EU economic governance framework: summary of responses » (Consulta pública em linha sobre a revisão do quadro de governação económica da UE: sinopse das respostas), SWD(2022) 104 final de 28 de março de 2022.

(2)

() Discurso sobre o estado da União proferido pela Presidente da Comissão Europeia, em 14 de setembro de 2022.

(3)

() Para uma descrição completa das reformas empreendidas no âmbito do «six-pack» e «two-pack», consultar a caixa 1 constante do documento da Comissão Europeia (2020) intitulado « Análise da governação económica » [COM(2020) 55 final], de 5 de fevereiro de 2020. A lista completa do direito derivado subjacente pode ser consultada na nota de rodapé 1 (página 1) do documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a referida comunicação [Comissão Europeia (2020), « Análise da governação económica » [SWD (2020) 210 final], de 5 de fevereiro de 2020].

(4)

() Para uma análise mais aprofundada da resposta dada à crise desencadeada pelo surto de COVID-19, bem como das ramificações desta crise no âmbito da análise da governação económica, consultar o documento da Comissão Europeia (2021) intitulado « A economia da UE após o surto de COVID-19: quais as implicações para a governação económica? » [COM(2021) 662 final], de 19 de outubro de 2021.

(5)

() As orientações dirigidas aos Estados-Membros sobre a melhor forma de realizar avaliações do impacto distributivo das novas políticas, que são importantes para evitar um agravamento das desigualdades existentes, podem ser consultadas no documento da Comissão Europeia (2022) intitulado « Melhor avaliação do impacto distributivo das políticas dos Estados-Membros » [COM(2022) 494 final], de 23 de setembro de 2022.

(6)

()    Comissão Europeia (2022), « REPowerEU: ação conjunta europeia para uma energia mais segura e mais sustentável a preços mais acessíveis » [COM(2022) 108 final], de 8 de março de 2022.

(7)

() Os planos orçamentais e estruturais procederão a uma fusão dos atuais programas de estabilidade e de convergência com os programas nacionais de reformas. 

(8)

() No que respeita a este parâmetro de referência, ver o artigo 2.º, n.º 1-A, do Regulamento (CE) n.º 1467/97 do Conselho, de 7 de julho de 1997, relativo à aceleração e clarificação da aplicação do procedimento relativo aos défices excessivos (JO L 209 de 2.8.1997, p. 6).

(9)

() A Comissão recorrerá ao seu quadro de análise da sustentabilidade da dívida, dado constituir um conjunto de instrumentos analíticos consagrados para avaliar os riscos inerentes à sustentabilidade da dívida (ver caixa 1).

(10)

() Durante o período de vigência do MRR, serão tidas em conta as devidas interações com os PRR.

(11)

() Será necessário desenvolver as modalidades e as bases jurídicas precisas deste instrumento.

(12)

() Para mais informações sobre o plano de medidas corretivas, ver o artigo 8.º do Regulamento (UE) n.º 1176/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, sobre prevenção e correção dos desequilíbrios macroeconómicos (JO L 306 de 23.11.2011, p. 25).

(13)

() A análise da sustentabilidade da dívida só desempenhará um papel a título de instrumento de avaliação dos riscos no âmbito da conceção dos planos e não no quadro da sua execução.

(14)

() Apresentados, nos termos do artigo 7.º da Decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece o programa para 2030 intitulado «Guião para a Década Digital», nove meses após a data da entrada em vigor da decisão (prevista para janeiro de 2023).

(15)

() A complementaridade entre a observância das políticas orçamentais assentes em normas e a necessidade de coordenação a fim de fazer face a situações excecionais foi reconhecida nos critérios de elegibilidade para a ativação do Instrumento de Proteção da Transmissão (IPT) do BCE, uma vez que o cumprimento por parte dos Estados-Membros do quadro orçamental da UE é um dos critérios a ter em conta pelo Conselho do BCE quando decide sobre a ativação do IPT.

(16)

() Desde então, o Tribunal de Contas Europeu concluiu que, muito embora a supervisão pós-programa seja um instrumento adequado, a sua eficiência foi comprometida pelo falta de clareza dos objetivos e pela insuficiente simplificação e concentração na execução, tendo formulado diversas recomendações dirigidas à Comissão no sentido de esta ponderar a possibilidade de colmatar estas lacunas no contexto da análise da governação económica.

(17)

() Outras instituições da UE apresentaram uma série de contribuições úteis a favor do debate público sobre o quadro de governação económica. Por exemplo, em resposta a um pedido específico do antigo presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, o Conselho Orçamental Europeu publicou, em setembro de 2019, o documento intitulado Assessment of the EU fiscal rules with a focus on the six- and two-pack legislation (não traduzido para português). Em 8 de julho de 2021, o Parlamento Europeu (com a deputada Margarida Marques na qualidade de relatora) adotou uma Resolução sobre a revisão do quadro legislativo macroeconómico tendo em vista um maior impacto na economia real da Europa e maior transparência na tomada de decisões e responsabilização democrática . Tanto o Comité Económico e Social Europeu como o Comité das Regiões Europeu publicaram pareceres sobre a análise da governação económica, respetivamente em dezembro de 2020 e fevereiro de 2021.

(18)

() Comissão Europeia (2021), A economia da UE após o surto de COVID-19: quais as implicações para a governação económica [COM(2021) 662 final], de 19 de outubro de 2021.

(19)

() Comissão Europeia (2022), « Economic Governance Review — Summary report of the public consultation » (não traduzido para português) [SWD(2022) 104 final], de 28 de março de 2022.

(20)

() Conselho Orçamental Europeu 2020; documento de trabalho pontual do BCE n.º 273, setembro de 2021; OECD Economic surveys: Euro area (não traduzido para português), setembro de 2021; Documento de trabalho do FMI n.º 2022/014, setembro de 2022.

(21)

() Comissão Europeia (2022), « Orientações em matéria de política orçamental para 2023 » [COM(2022) 85 final], de 2 de março de 2022.

(22)

() Comissão Europeia (2022), « Conferência sobre o Futuro da Europa » [COM(2022) 404 final], de 17 de junho de 2022.