6.12.2018   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 440/85


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2009/103/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade»

[COM(2018) 336 final — 2018/0168 (COD)]

(2018/C 440/13)

Relator:

Christophe LEFÈVRE

Consulta

Conselho, 6.6.2018

Parlamento Europeu, 11.6.2018

Base jurídica

Artigo 114.o, n.o 1, do TFUE

Competência

Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo

Adoção em secção

4.9.2018

Adoção em plenária

19.9.2018

Reunião plenária n.o

537

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

191/0/6

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente as propostas da Comissão que alteram a diretiva relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade. Contudo, lamenta que a Comissão não tenha aproveitado a ocasião para antecipar as evoluções relacionadas com os veículos autónomos, apesar das observações incluídas no estudo de impacto (1) que acompanha a proposta.

1.2.

No que diz respeito à melhoria da proteção das vítimas de acidentes de viação em caso de insolvência da seguradora, o Comité considera pertinente a proposta de indemnização das vítimas pelo organismo do Estado-Membro de residência da vítima. No entanto, a Comissão exclui o recurso a este organismo se a vítima tiver recorrido diretamente à seguradora ou tiver intentado uma ação judicial. Assim, o Comité recomenda que esta exclusão não se aplique caso, entretanto, a seguradora entre em situação de incapacidade económica (falência, liquidação) ou caso a vítima autorize o organismo a ficar sub-rogado no benefício das ações de recurso, a fim de ser indemnizada mais rapidamente. O Comité recomenda que os níveis de reparação (tipos de prejuízo) praticados sejam os mais favoráveis para a vítima, entre os níveis do país onde ocorreu o acidente e os níveis do país da sua residência.

1.3.

No que respeita à melhoria do reconhecimento das declarações de historial de sinistros, o Comité recomenda a especificação do nome do condutor em causa e do seu grau de responsabilidade na ocorrência do acidente (total, parcial ou nula). O Comité tem reservas quanto ao conteúdo do certificado no contexto de uma legislação nacional que preveja a obtenção de cobertura de seguro para um veículo independentemente do condutor, em oposição a uma legislação que preveja a obtenção de cobertura de seguro para um veículo com um condutor declarado e sujeito a um prémio fixado em função do perfil individual de risco e de sinistralidade, ou ainda para o titular da carta de condução, independentemente do veículo utilizado. O Comité solicita à Comissão que imponha a emissão de certificados de seguro e de declarações de historial de sinistros em suportes protegidos e que autorize, para efeitos de verificação da sua validade, a utilização de uma base de dados interligada consultável pelas forças de segurança.

1.4.

No que diz respeito à fiscalização do seguro para combater a circulação de veículos não segurados, o Comité acolhe favoravelmente a proposta de utilizar as tecnologias de reconhecimento das placas de matrícula para, no âmbito de um dispositivo nacional, fiscalizar os veículos sem exigir a sua paragem. Em caso de ausência de contrato de seguro, o Comité recomenda a imobilização do veículo até à apresentação de um certificado de seguro válido.

1.5.

Relativamente à harmonização dos montantes mínimos de cobertura, o Comité recomenda à Comissão que fixe uma data final para a aplicação integral dos limites mínimos das indemnizações.

1.6.

No que diz respeito ao âmbito de aplicação da diretiva, o Comité acolhe favoravelmente a clarificação relativa ao conceito de meio de transporte em terreno público ou privado, estacionado ou em movimento, excluindo a utilização para fins exclusivamente agrícolas de veículos identificados. Importa, todavia, garantir que os veículos agrícolas que circulam na via pública estejam sujeitos à diretiva.

1.7.

Por último, no que respeita à coerência com as disposições vigentes no mesmo domínio setorial, o Comité considera igualmente que as propostas da Comissão são coerentes com a livre circulação de pessoas e bens e com os princípios do mercado interno, que garantem a livre prestação de serviços e a liberdade de estabelecimento das seguradoras.

2.   Contexto e introdução

2.1.

A Comissão propõe uma alteração da Diretiva 2009/103/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (2) relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade.

2.2.

A Comissão visa melhorar a proteção atualmente insuficiente das vítimas de acidentes de viação e reduzir as diferenças de tratamento dos tomadores de seguros na UE no que diz respeito ao sistema bónus/málus, bem como integrar os acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) proferidos após a entrada em vigor da primeira diretiva da UE em matéria de seguro automóvel, adotada em 1972.

2.3.

A diretiva é um instrumento jurídico fundamental para o bom funcionamento do mercado único, permitindo a liberdade de circulação, com base num prémio único, sem necessidade de subscrever um contrato de seguro suplementar para circular noutro Estado-Membro; visa igualmente garantir um elevado grau de convergência em termos de proteção das vítimas de acidentes de viação.

2.4.

A legislação assenta no sistema internacional da carta verde, ao qual aderiram 48 países; este sistema não é da responsabilidade da UE. Entre os elementos principais da Diretiva 2009/103/CE contam-se os seguintes:

obrigação de os veículos automóveis terem um contrato de seguro automóvel de responsabilidade civil, válido para todas as regiões da UE, com base num prémio único,

montantes de cobertura mínimos obrigatórios que esses contratos de seguro devem prever (os Estados-Membros podem exigir uma cobertura superior a nível nacional),

proibição de os Estados-Membros realizarem uma fiscalização sistemática do seguro dos veículos com estacionamento habitual noutro Estado-Membro,

obrigação de os Estados-Membros criarem fundos de garantia para a indemnização das vítimas de acidentes causados por veículos não segurados ou não identificáveis,

proteção das vítimas de acidentes de viação num Estado-Membro que não o seu Estado-Membro de residência («vítimas estrangeiras»),

direito de os tomadores de seguros obterem da respetiva seguradora uma declaração do seu historial de sinistros referente aos últimos cinco anos.

2.5.

No quadro do programa de trabalho da Comissão para 2016 e do plano de ação para os serviços financeiros de março de 2017, foi realizada em 2017 uma avaliação (3) da Diretiva 2009/103/CE, e, no mesmo ano, foram proferidas duas decisões do TJUE. Estes elementos levaram a Comissão a pronunciar-se.

2.5.1.   Melhoria da proteção das vítimas de acidentes de viação em caso de insolvência da seguradora

2.5.1.1.

A Comissão propõe que, em cada Estado-Membro, seja autorizado um organismo para indemnizar as pessoas lesadas que tenham residência habitual no seu território, pelo menos até aos limites da obrigação de seguro, pelos danos pessoais ou danos materiais causados por um veículo segurado, em caso de ausência de resposta fundamentada no prazo de três meses aos argumentos de um pedido de indemnização ou em caso de falência ou liquidação do organismo de seguros ou resseguros. Excetuam-se as situações em que a vítima já tenha apresentado um pedido de indemnização diretamente à seguradora ou tenha intentado uma ação judicial que esteja pendente.

2.5.1.2.

A Comissão prevê o direito desse organismo a exigir o reembolso junto do organismo do país do responsável pelo acidente.

2.5.2.   Melhoria do reconhecimento das declarações de historial de sinistros, nomeadamente num contexto transfronteiras

2.5.2.1.

A diretiva introduz a obrigação de emissão de uma declaração de historial de sinistros do contrato de seguro automóvel referente aos últimos cinco anos. Não existe qualquer requisito de que as seguradoras tenham em consideração essas declarações ao efetuarem o cálculo dos prémios.

2.5.2.2.

A Comissão recomenda que o conteúdo e a forma dessas declarações sejam normalizados, devendo especificar os elementos que permitam adaptar os prémios em função do historial de sinistros e assegurar a autenticidade dos certificados.

2.5.3.   Fiscalização do seguro para combater a circulação de veículos não segurados

2.5.3.1.

A Comissão recomenda a utilização de tecnologias de reconhecimento das placas de matrícula para fiscalizar os veículos sem exigir a sua imobilização, no âmbito de um sistema geral de fiscalização nacional, não interferindo este procedimento com a livre circulação de pessoas e veículos.

2.5.3.2.

A Comissão especifica que essa verificação do seguro dos veículos que entram no território nacional exige um intercâmbio de dados entre Estados-Membros.

2.5.4.   Harmonização dos montantes mínimos de cobertura

2.5.4.1.

A Comissão constata também que os níveis mínimos de indemnização variam em função dos países, nomeadamente por estes não os terem ajustado durante o período de transição. A Comissão recomenda a harmonização dos montantes mínimos de cobertura, podendo, no entanto, cada Estado-Membro impor limites mínimos superiores.

2.5.5.   Âmbito de aplicação da diretiva

2.5.5.1.

Integrando três acórdãos do TJUE (4), a Comissão especifica o âmbito de aplicação da obrigação de seguro automóvel de responsabilidade civil, excluindo os acidentes em que o veículo tenha sido utilizado exclusivamente para fins agrícolas, a saber, todas as atividades consonantes com a função habitual de um veículo como meio de transporte, na via pública ou em terreno privado, quer o veículo se encontre estacionado ou em movimento.

2.6.   Coerência com as outras políticas da União

2.6.1.

A Comissão considera que as suas propostas são coerentes com a livre circulação de pessoas e bens e com os princípios do mercado interno, que garantem a livre prestação de serviços e a liberdade de estabelecimento das seguradoras.

3.   Observações gerais

3.1.

O CESE acolhe favoravelmente as propostas da Comissão que alteram a diretiva relativa ao seguro de responsabilidade civil que resulta da circulação de veículos automóveis e à fiscalização do cumprimento da obrigação de segurar esta responsabilidade. Esta alteração é o resultado da análise da experiência adquirida, prevista no quadro legislativo, mas também de avaliações de impacto e consultas públicas e ainda da integração da jurisprudência do TJUE.

3.2.   Melhoria da proteção das vítimas de acidentes de viação em caso de insolvência da seguradora

3.2.1.

O Comité considera pertinente a proposta de indemnização das vítimas pelo organismo do Estado-Membro da sua residência, para colmatar a carência das seguradoras ou em caso de ausência de resposta fundamentada num prazo razoável, e acolhe favoravelmente o facto de o organismo no país de residência da vítima poder apresentar um pedido de reembolso junto do organismo do país terceiro do segurado responsável.

3.2.2.

Uma vez que a Comissão exclui, no entanto, a possibilidade de o organismo gestor indemnizar a vítima se esta tiver recorrido diretamente à seguradora ou se estiver em curso um processo judicial, o Comité recomenda que essa exclusão não se aplique nos seguintes casos:

se, entretanto, a seguradora entrar em situação de incapacidade (falência, liquidação),

em caso de revogação da autorização das autoridades de supervisão,

se a vítima autorizar o organismo a ficar sub-rogado no benefício das ações de recurso, a fim de ser indemnizada mais rapidamente.

O Comité recomenda que os níveis de reparação (tipos de prejuízo) praticados sejam os mais favoráveis para a vítima, entre os níveis do país onde ocorreu o acidente e os níveis do país da sua residência.

3.3.   Melhoria do reconhecimento das declarações de historial de sinistros, nomeadamente num contexto transfronteiras

3.3.1.

O Comité acolhe favoravelmente a proposta que visa a sistematização da emissão de uma declaração normalizada que certifique a existência ou a ausência de sinistros nos últimos cinco anos.

3.3.2.

O Comité recomenda que seja também especificado o nome do condutor em causa, bem como o seu grau de responsabilidade na ocorrência do acidente (total, parcial ou nula).

3.3.3.

O Comité tem reservas quanto ao conteúdo do certificado no contexto de uma legislação nacional que preveja a obtenção de cobertura de seguro para um veículo independentemente do condutor, em oposição a uma legislação que preveja a obtenção de cobertura de seguro para um veículo com um condutor declarado e sujeito a um prémio fixado em função do perfil individual de risco e de sinistralidade, ou ainda para o titular da carta de condução, independentemente do veículo utilizado.

3.3.4.

O Comité interroga-se, contudo, sobre a situação gerada pelos veículos motorizados sem condutor ou, eventualmente, sobre o conceito de «condutor» responsável quando o veículo motorizado é conduzido à distância.

3.3.5.

O Comité constata que a Comissão não prevê legislar sobre a fraude documental relacionada com as declarações de historial de sinistros ou os certificados de seguro.

3.3.6.

O Comité solicita à Comissão que imponha a emissão de certificados de seguro e de declarações de historial de sinistros em suportes protegidos e que autorize, para efeitos de verificação da sua validade, a utilização de uma base de dados interligada consultável pelas forças de segurança.

3.3.7.

O Comité salienta que a Comissão não refere a possibilidade de financiar a constituição de tais sistemas de interconexão transfronteiras.

3.4.   Fiscalização do seguro para combater a circulação de veículos não segurados

3.4.1.

O Comité acolhe favoravelmente a proposta de utilizar as tecnologias de reconhecimento das placas de matrícula para fiscalizar os veículos sem que tenham de parar, desde que os controlos efetuados façam parte de um sistema geral de fiscalização nacional, não sejam discriminatórios e não exijam a imobilização do veículo.

3.4.2.

Por outro lado, a Comissão é omissa quanto às medidas a tomar em relação aos veículos assim identificados que não estejam protegidos por um contrato de seguro. O Comité recomenda a imobilização do veículo até à apresentação de um certificado de seguro válido ou de um certificado de seguro cujo período de validade tenha caducado há menos de um mês.

3.4.3.

A Comissão especifica que essa verificação do seguro dos veículos que entram no território nacional exige um intercâmbio de dados entre Estados-Membros e que é necessário proteger os direitos, as liberdades e os interesses legítimos dos titulares desses dados ao abrigo do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD).

3.4.4.

No entanto, a Comissão é omissa quanto à entidade gestora, bem como quanto ao financiamento dos custos de criação e gestão de uma base de dados interconectada de contratos de seguro válidos e inválidos.

3.5.   Harmonização dos montantes mínimos de cobertura

3.5.1.

O Comité concorda com a análise da Comissão relativa aos limites mínimos díspares e, acima de tudo, não conformes, já que são inferiores aos limites previstos pela diretiva em quase metade dos Estados-Membros da UE.

3.5.2.

Para além da simples recomendação de harmonização dos limites (5), o Comité recomenda à Comissão que fixe uma data final para a aplicação integral dos limites mínimos das indemnizações, agora que o prazo já expirou, que poderá ser o final de 2019.

3.5.3.

O Comité recomenda que os níveis de reparação (tipos de prejuízo) praticados sejam os mais favoráveis para a vítima, entre os níveis do país onde ocorreu o acidente e os níveis do país da sua residência.

3.6.   Âmbito de aplicação da diretiva

3.6.1.

O Comité acolhe favoravelmente a clarificação relativa ao conceito de meio de transporte em terreno público ou privado, estacionado ou em movimento, excluindo a utilização para fins exclusivamente agrícolas. Importa, todavia, garantir que os veículos agrícolas que circulam na via pública estejam sujeitos à diretiva.

3.7.   Coerência com as disposições vigentes no mesmo domínio setorial

3.7.1.

O Comité considera igualmente que as propostas da Comissão são coerentes com a livre circulação de pessoas e bens e estão em conformidade com os princípios do mercado interno, que garantem a livre prestação de serviços e a liberdade de estabelecimento das seguradoras.

Bruxelas, 19 de setembro de 2018.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Luca JAHIER


(1)  https://ec.europa.eu/transparency/regdoc/rep/10102/2018/EN/SWD-2018-247-F1-EN-MAIN-PART-1.PDF.

(2)  JO L 263 de 7.10.2009, p. 11.

(3)  https://ec.europa.eu/info/law/better-regulation/initiatives/ares-2017-3714481_pt

(4)  Acórdão Vnuk (C-162/13, 2014), acórdão Rodrigues de Andrade (C-514/16, 2017) e acórdão Torreiro (C-334/16, 2017).

(5)  Diretiva 84/5/CEE, alterada pela Diretiva 2005/14/CE.