COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 20.12.2017
COM(2017) 835 final
2017/0360(NLE)
PROPOSTA FUNDAMENTADA AO ABRIGO DO ARTIGO 7.º, N.º 1, DO TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA RELATIVA AO ESTADO DE DIREITO NA POLÓNIA
Proposta de
DECISÃO DO CONSELHO
relativa à verificação da existência de um risco manifesto de violação grave, pela República da Polónia, do Estado de direito
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
1.Introdução
(1)A União Europeia está alicerçada num conjunto de valores comuns consagrados no artigo 2.º do Tratado da União Europeia («TUE»), que incluem o respeito do Estado de direito. A Comissão, para além da sua missão de garantir o respeito do direito da União, também é responsável, juntamente com o Parlamento Europeu, os Estados-Membros e o Conselho, por garantir os valores comuns da União.
(2)A jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, bem como os documentos elaborados no âmbito do Conselho da Europa, com base nomeadamente na experiência da Comissão Europeia para a Democracia através do Direito («Comissão de Veneza»), estabelece uma lista não exaustiva destes princípios e, por conseguinte, define o significado fundamental do Estado de direito. Estes princípios incluem a legalidade, o que pressupõe um processo legislativo transparente, responsável, democrático e pluralista; a segurança jurídica; a separação de poderes; a proibição da arbitrariedade dos poderes executivos; tribunais independentes e imparciais; uma fiscalização jurisdicional efetiva, incluindo o respeito dos direitos fundamentais, e a igualdade perante a lei. Para além da defesa destes princípios e valores, as instituições do Estado têm também o dever de cooperação leal.
(3)Nos termos do artigo 7.º, n.º 1, do TUE, o Conselho, sob proposta fundamentada de um terço dos Estados-Membros, do Parlamento Europeu ou da Comissão Europeia, deliberando por maioria de quatro quintos dos seus membros e após a aprovação do Parlamento Europeu, pode verificar a existência de um risco manifesto de violação grave dos valores referidos no artigo 2.º por parte de um Estado-Membro. Antes de proceder a essa verificação, o Conselho deve ouvir o Estado-Membro em questão e pode dirigir-lhe recomendações, deliberando segundo o mesmo processo.
(4)A presente proposta fundamentada exprime, de acordo com o artigo 7.º, n.º 1, do TUE, as preocupações da Comissão relativamente ao Estado de direito na Polónia. Convida o Conselho a verificar, com base na mesma disposição, que existe um risco manifesto de violação grave, por parte da República da Polónia, do Estado de direito, que constitui um dos valores consagrados no artigo 2.º do TUE.
(5)Estas preocupações da Comissão dizem respeito às seguintes questões:
(1)Ausência de fiscalização constitucional independente e legítima;
(2)Adoção por parte do Parlamento polaco de nova legislação relativa ao poder judicial na Polónia que suscita sérias preocupações quanto à independência do poder judicial e aumenta consideravelmente a ameaça sistémica ao Estado de direito na Polónia:
(a)Lei do Supremo Tribunal, aprovada pelo Senado em 15 de dezembro de 2017;
(b)Lei que altera a Lei de Organização dos Tribunais Comuns («Lei de Organização dos Tribunais Comuns»), publicada no Jornal Oficial Polaco de 28 de julho de 2017 e que entrou em vigor em 12 de agosto de 2017;
(c)Lei que altera a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e determinadas outras leis («Lei do Conselho Nacional da Magistratura»), aprovada pelo Senado em 15 de dezembro de 2017;
(d)Lei que altera a Lei da Escola Nacional de Magistratura e do Ministério Público, Lei de Organização dos Tribunais Comuns e determinadas outras leis («Lei da Escola Nacional de Magistratura»), publicada no Jornal Oficial Polaco de 13 de junho de 2017 e que entrou em vigor em 20 de junho de 2017.
2. Antecedentes factuais e processuais
(6)Desde novembro de 2015, a Comissão tem seguido atentamente a evolução da situação relativa ao Estado de direito na Polónia e tomou medidas sobre essa matéria. Nas Recomendações (UE) 2016/1374, (UE) 2017/146 e (UE) 2017/1520 da Comissão é apresentada uma descrição pormenorizada da evolução da situação relativa ao Estado de direito na Polónia e ao diálogo da Comissão com o Governo Polaco no âmbito do Quadro do Estado de Direito. É a seguir apresentada uma panorâmica dos principais desenvolvimentos.
(7)O Quadro do Estado de Direito estabelece orientações para o diálogo entre a Comissão e o Estado-Membro em causa a fim de prevenir a escalada de ameaças sistémicas ao Estado de direito. O objetivo desse diálogo é permitir à Comissão encontrar uma solução com o Estado-Membro em causa com vista a evitar a ocorrência de uma ameaça sistémica ao Estado de direito suscetível de se tornar um «risco manifesto de violação grave» que possa desencadear o recurso ao «procedimento do artigo 7.º do TUE». O Quadro deve ser ativado em situações em que as autoridades de um Estado-Membro tomam medidas ou toleram situações suscetíveis de afetar negativamente e de forma sistemática a integridade, a estabilidade e o bom funcionamento das instituições e dos mecanismos de salvaguarda estabelecidos a nível nacional para garantir o Estado de direito («salvaguardas nacionais do Estado de direito»). O Quadro do Estado de Direito é composto por três fases. Numa primeira fase («Avaliação da Comissão»), a Comissão recolhe e analisa todas as informações relevantes e avalia se existem indícios claros de uma ameaça sistémica ao Estado de direito. Se, na sequência desta avaliação preliminar, considerar que existe uma ameaça sistémica ao Estado de direito, a Comissão procede à abertura de um diálogo com o Estado-Membro em causa enviando-lhe um «Parecer sobre o Estado de Direito», fundamentando as suas preocupações e dando ao Estado-Membro em causa a possibilidade de responder. Numa segunda fase («Recomendação relativa ao Estado de Direito»), caso a questão não tenha sido resolvida satisfatoriamente, a Comissão pode emitir uma «Recomendação sobre o Estado de direito», dirigida ao Estado-Membro. Nesse caso, a Comissão indica os motivos das suas preocupações e recomenda que o Estado-Membro resolva os problemas identificados num determinado prazo e informe a Comissão das medidas tomadas para esse efeito. Numa terceira fase («Seguimento da Recomendação relativa ao Estado de direito»), a Comissão acompanha o seguimento dado pelo Estado-Membro à recomendação. Todo o processo assenta num diálogo contínuo entre a Comissão e o Estado-Membro em causa.
(8)Nos últimos dois anos, a Comissão utilizou amplamente as possibilidades proporcionadas pelo Quadro do Estado de Direito para a realização de um diálogo construtivo com as autoridades polacas. Durante este processo, a Comissão tem sempre fundamentado as suas preocupações de uma forma objetiva e exaustiva. A Comissão emitiu um Parecer sobre o Estado de Direito e três Recomendações relativas ao Estado de Direito. A Comissão trocou mais de 25 cartas com as autoridades polacas sobre esta matéria. Realizaram-se também várias reuniões e contactos entre a Comissão e as autoridades polacas, tanto em Varsóvia como em Bruxelas, principalmente antes da publicação da primeira Recomendação relativa ao Estado de Direito. A Comissão tornou sempre claro que estava disposta a prosseguir um diálogo construtivo e convidou repetidamente as autoridades polacas para outras reuniões com esse fim em vista.
2.1.Lançamento do processo no âmbito do Quadro do Estado de Direito
(9)Na perspetiva das eleições legislativas para o Sejm de 25 de outubro de 2015, a legislatura cessante designou, em 8 de outubro de 2015, cinco pessoas para serem «nomeadas» juízes do Tribunal Constitucional pelo Presidente da República. Três juízes ocupariam lugares deixados vagos durante o mandato da legislatura cessante, enquanto os outros dois ocupariam lugares deixados vagos durante a nova legislatura, que teve início em 12 de novembro de 2015. Na sequência das eleições legislativas realizadas em 19 de novembro de 2015, o Sejm, através de um procedimento acelerado, alterou a Lei do Tribunal Constitucional, introduzindo a possibilidade de anulação das nomeações judiciais efetuadas pela anterior legislatura e de nomeação de cinco novos juízes. Em 25 de novembro de 2015, o Sejm votou uma moção que anulou as cinco nomeações da anterior legislatura e, em 2 de dezembro, nomeou cinco novos juízes.
(10)O Tribunal Constitucional foi chamado a pronunciar-se sobre as decisões da anterior legislatura e da nova legislatura. Em consequência, o Tribunal proferiu dois acórdãos, em 3 e em 9 de dezembro de 2015. No acórdão proferido em 3 de dezembro de 2015, o Tribunal Constitucional referiu, nomeadamente, que a anterior legislatura do Sejm tinha sido habilitada a nomear três juízes para substituir os juízes cujo mandato terminara em 6 de novembro de 2015. Ao mesmo tempo, o Tribunal esclareceu que o Sejm não tinha sido habilitado a eleger os dois juízes para substituição dos juízes cujo mandato terminara em dezembro. O acórdão referiu também, especificamente, a obrigação de o Presidente da República empossar de imediato um juiz eleito pelo Sejm. Em 9 de dezembro de 2015, o Tribunal Constitucional invalidou, designadamente, a base jurídica das nomeações pela nova legislatura do Sejm dos três juízes para as vagas abertas em 6 de novembro de 2015, para as quais a anterior legislatura tinha já legalmente nomeado juízes.
(11)Em 22 de dezembro de 2015, o Sejm adotou uma lei que altera a Lei do Tribunal Constitucional respeitante ao funcionamento do Tribunal, bem como à independência dos seus juízes.
(12)Em 23 de dezembro de 2015, a Comissão solicitou, por escrito, ao Governo polaco informações sobre as medidas previstas no que diz respeito aos dois acórdãos do Tribunal Constitucional supramencionados. A Comissão declarou que esperava que a lei adotada em 22 de dezembro de 2015 não entrasse em vigor enquanto não tivessem sido avaliadas de forma aprofundada e adequada todas as questões relativas ao seu impacto na independência e no funcionamento do Tribunal. A Comissão recomendou que as autoridades polacas trabalhassem em estreita cooperação com a Comissão de Veneza. Em 11 de janeiro, a Comissão recebeu uma resposta do Governo polaco que não dissipou as referidas preocupações.
(13)Em 23 de dezembro de 2015, o Governo polaco solicitou um parecer à Comissão de Veneza sobre a lei adotada em 22 de dezembro de 2015. No entanto, o Parlamento polaco não aguardou esse parecer antes de tomar novas medidas, e a lei foi publicada no Jornal Oficial, tendo entrado em vigor em 28 de dezembro de 2015.
(14)Em dezembro de 2015 e janeiro de 2016, o Sejm aprovou uma série de novos atos legislativos particularmente sensíveis, alguns dos quais através de procedimentos legislativos acelerados, tais como, em especial, uma Lei da Comunicação Social, uma nova Lei da Função Pública, uma lei que altera a Lei dos Serviços de Polícia e determinadas outras leis, bem como uma Lei do Ministério Público.
(15)Em 13 de janeiro de 2016, a Comissão realizou um primeiro debate de orientação a fim de avaliar a situação na Polónia. A Comissão decidiu examinar a situação no âmbito do Quadro do Estado de Direito e incumbiu o Primeiro Vice-Presidente Frans Timmermans de encetar um diálogo com as instituições da República da Polónia a fim de esclarecer as questões em causa e identificar possíveis soluções. No mesmo dia, a Comissão informou o Governo polaco em conformidade.
(16)Em 19 de janeiro de 2016, a Comissão enviou uma comunicação escrita ao Governo polaco oferecendo-se para contribuir com a sua experiência e para debater questões relacionadas com a nova Lei da Comunicação Social. Em 19 de janeiro de 2016, o Governo polaco escreveu à Comissão expondo os seus pontos de vista sobre o diferendo relativo à nomeação de juízes, invocando, nomeadamente, um costume constitucional relacionado com a nomeação de juízes.
(17)Em 9 de março de 2016, o Tribunal Constitucional declarou que a lei adotada em 22 de dezembro de 2015 era inconstitucional. Este acórdão ainda não foi publicado pelo Governo no Jornal Oficial, pelo que não produz efeitos jurídicos. O Governo justifica oficialmente a sua decisão alegando que o Tribunal deveria ter proferido o acórdão com o quórum legalmente previsto, conforme estabelecido na lei que foi declarada inconstitucional. No entanto, o Tribunal Constitucional tinha apenas 12 juízes legalmente nomeados, e os restantes três juízes nomeados pelo Sejm em outubro de 2015 aguardavam ainda que o Presidente da República os empossasse.
(18)Em 11 de março de 2016, a Comissão de Veneza emitiu o seu parecer «relativo a alterações à Lei do Tribunal Constitucional de 25 de junho de 2015». No que diz respeito à nomeação dos juízes, o parecer instou o Parlamento polaco a encontrar uma solução consentânea com o Estado de direito, respeitando os acórdãos do Tribunal. Além disso, considerou designadamente que o quórum elevado, o requisito de maioria de dois terços para a adoção de acórdãos e a regra rígida que torna impossível tratar casos urgentes, em especial no seu efeito combinado, teriam tornado o Tribunal ineficaz. Por último, a Comissão considerou que a recusa de publicar o acórdão de 9 de março de 2016 agravaria ainda mais a crise constitucional na Polónia.
(19)Na sequência do acórdão de 9 de março de 2016, o Tribunal Constitucional retomou o julgamento de processos. O Governo polaco não participou nesses procedimentos. Além disso, o Governo polaco recusou-se a publicar acórdãos proferidos ulteriormente pelo Tribunal Constitucional.
(20)Em 13 de abril de 2016, o Parlamento Europeu adotou uma resolução sobre a situação na Polónia, instando o Governo polaco a respeitar, publicar e aplicar, plenamente e sem demora, o acórdão do Tribunal Constitucional de 9 de março de 2016 e a executar os acórdãos de 3 e 9 de dezembro de 2015, e exortou o Governo polaco a aplicar plenamente as recomendações da Comissão de Veneza.
(21)Em 26 de abril de 2016, a Assembleia Geral do Supremo Tribunal da Polónia adotou uma resolução que atesta que os acórdãos do Tribunal Constitucional são válidos, mesmo que o Governo polaco se recuse a publicá-los no Jornal Oficial.
2.2.Parecer sobre o Estado de direito
(22)Entre fevereiro de 2016 e julho de 2016, a Comissão e o Governo polaco trocaram várias cartas e reuniram-se em diversas ocasiões.
(23)Não obstante a natureza construtiva e detalhada das trocas de informações entre a Comissão e o Governo polaco, estas não permitiram dissipar as preocupações da Comissão. Em 1 de junho de 2016, a Comissão adotou um parecer relativo ao Estado de direito na Polónia. Na sequência do diálogo que estava em curso com as autoridades polacas desde 13 de janeiro de 2016, a Comissão considerou necessário formalizar no parecer a sua avaliação da situação atual. O parecer expôs as preocupações da Comissão e serviu para focar a atenção do diálogo em curso com as autoridades polacas no sentido de encontrar uma solução.
(24)Em 24 de junho de 2016, o Governo polaco escreveu à Comissão a confirmar a receção do Parecer da Comissão de 1 de junho de 2016 sobre o Estado de Direito. A carta informava a Comissão sobre a situação dos trabalhos parlamentares na Polónia, incluindo uma nova Lei do Tribunal Constitucional, e manifestava a convicção de que o trabalho realizado no Parlamento sobre essa nova lei era a forma mais adequada para alcançar uma solução construtiva.
(25)Em 22 de julho de 2016, o Sejm adotou uma nova Lei do Tribunal Constitucional, que foi publicada no Jornal Oficial em 1 de agosto de 2016. Em várias fases do processo legislativo, a Comissão apresentou observações e debateu o conteúdo do projeto de lei com as autoridades polacas.
2.3Recomendação relativa ao Estado de direito (UE) 2016/1374 (1.ª Recomendação)
(26)Em 27 de julho de 2016, a Comissão adotou uma Recomendação relativa ao Estado de direito na Polónia. Na sua Recomendação, a Comissão explicou as circunstâncias em que decidiu, a 13 de janeiro de 2016, examinar a situação no âmbito do Quadro do Estado de Direito e em que adotou, a 1 de junho de 2016, um parecer relativo ao Estado de direito na Polónia. A recomendação explicava também que as trocas de informações entre a Comissão e o Governo polaco não tinham permitido atenuar as preocupações da Comissão. Na mesma recomendação, a Comissão considerou que existia uma ameaça sistémica ao Estado de direito na Polónia e recomendou que as autoridades polacas tomassem urgentemente as medidas adequadas para fazer face a essa ameaça sistémica ao Estado de direito. Em particular, a Comissão recomendou às autoridades polacas que: a) executassem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 3 e 9 de dezembro de 2015 que exigem que os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela 7.ª legislatura do Sejm possam assumir as suas funções judiciais no Tribunal Constitucional e que os três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm para cargos já ocupados sem uma base jurídica válida não assumam as suas funções judiciais; b) publicassem e executassem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 9 de março de 2016 e garantissem que a publicação de futuros acórdãos seja automática e não dependa de qualquer decisão dos poderes executivo ou legislativo; c) garantissem que qualquer reforma da Lei do Tribunal Constitucional respeite os acórdãos do Tribunal Constitucional, incluindo os acórdãos de 3 e 9 de dezembro de 2015 e o acórdão de 9 de março de 2016, e tenha devidamente em conta o parecer da Comissão de Veneza, bem como velassem por que a eficácia do Tribunal Constitucional enquanto garante da Constituição não fosse prejudicada por requisitos incompatíveis com o Estado de direito; d) garantissem que o Tribunal Constitucional possa examinar a compatibilidade da nova Lei do Tribunal Constitucional adotada em 22 de julho de 2016 antes da sua entrada em vigor e publicassem e executassem plenamente o acórdão do Tribunal Constitucional sobre essa matéria; e) se abstivessem de ações e declarações públicas que pudessem prejudicar a legitimidade e eficiência do Tribunal Constitucional.
(27)A Comissão convidou o Governo polaco a resolver os problemas identificados na recomendação no prazo de três meses e a informá-la das medidas tomadas para esse efeito. A Comissão observou que continuava disposta a prosseguir um diálogo construtivo com o Governo polaco. O Governo polaco, na sua resposta de 27 de outubro de 2016, manifestou o seu desacordo em relação a todos os pontos da posição expressa na recomendação e não anunciou quaisquer novas medidas para atenuar as preocupações relativas ao Estado de direito expressas pela Comissão.
(28)Em 30 de julho de 2016, o Presidente da República assinou a Lei de 22 de julho de 2016, que foi publicada no Jornal Oficial em 1 de agosto de 2016.
(29)Em 11 de agosto de 2016, o Tribunal Constitucional proferiu um acórdão sobre a Lei de 22 de julho de 2016. O acórdão declarou inconstitucionais determinadas disposições da referida lei — que, na sua Recomendação de 27 de julho de 2016, a Comissão considerou constituírem motivo de preocupação . No entanto, o Governo polaco não reconheceu a validade do acórdão e não o publicou no Jornal Oficial.
(30)Em 16 de agosto de 2016, o Governo polaco publicou 21 acórdãos do Tribunal proferidos no período compreendido entre 6 de abril e 19 de julho de 2016. No entanto, os acórdãos de 9 de março de 2016 e de 11 de agosto de 2016 não foram publicados pelo Governo.
(31)Em 14 de setembro de 2016, o Parlamento Europeu adotou uma resolução sobre a situação na Polónia, instando nomeadamente o Governo polaco a cooperar com a Comissão no respeito do princípio de cooperação leal consagrado no Tratado.
(32)Em 14 de outubro de 2016, a Comissão de Veneza emitiu o seu parecer relativo à Lei do Tribunal Constitucional de 22 de julho de 2016. Apesar das melhorias introduzidas em comparação com a lei de alteração de 22 de dezembro de 2015, o parecer salientou que a nova Lei do Tribunal Constitucional, conforme aprovada, atrasaria e obstruiria consideravelmente os seus trabalhos, possivelmente tornando-os ineficazes, e poria em risco a sua independência ao exercer um controlo legislativo e executivo excessivo sobre o seu funcionamento. O parecer criticou também o sistema de apresentação ao Presidente da República de propostas de candidatos para o cargo de Presidente do Tribunal, o que poderia conduzir a uma situação em que seja nomeado um candidato que não beneficia do apoio de um número substancial de juízes. O parecer também salientou que o problema da nomeação de juízes não tinha sido resolvido como recomendado e que a aplicação da disposição da Lei de 22 de julho de 2016 que estabelece que o Presidente do Tribunal deve atribuir processos aos três juízes nomeados em dezembro seria contrária aos acórdãos do Tribunal. No parecer concluiu-se que, ao adotar a lei, o Parlamento polaco assumiu competências em matéria de revisão constitucional que não dispunha no âmbito do processo legislativo ordinário. Segundo o parecer, o Parlamento e o Governo polacos continuaram a pôr em causa a posição do Tribunal de árbitro em última instância em questões constitucionais, atribuindo essa competência a si mesmos: criaram novos obstáculos ao bom funcionamento do Tribunal e agiram de forma a comprometer ainda mais a sua independência. De acordo com o parecer, ao prolongar a crise constitucional, obstruíram a ação do Tribunal Constitucional, que não pode assim desempenhar o seu papel constitucional de guardião da democracia, do Estado de direito e dos direitos humanos. O Governo polaco decidiu não participar na sessão da Comissão de Veneza de 14 de outubro de 2016, tendo considerado que o parecer desta Comissão fora unilateral e não tivera em conta a posição do Governo.
(33)Em 31 de outubro de 2016, a Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas manifestou a sua preocupação sobre o impacto negativo das reformas legislativas, nomeadamente das alterações à Lei do Tribunal Constitucional de novembro e dezembro de 2015 e de julho de 2016, o incumprimento dos acórdãos do Tribunal Constitucional, o funcionamento e a independência do Tribunal e a execução do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. A Comissão Instou ainda a Polónia a publicar de forma imediata e oficial todos os acórdãos do Tribunal, a abster-se de introduzir medidas que possam obstruir o seu bom funcionamento e a assegurar um processo transparente e imparcial para a nomeação dos seus membros, garantindo a segurança do seu mandato, que cumpra todos os requisitos em matéria de legalidade nos termos do direito nacional e do direito internacional.
(34)Em 7 de novembro de 2016, o Tribunal Constitucional proferiu um acórdão sobre a constitucionalidade das disposições da Lei de 22 de julho de 2016 relativas à escolha do Presidente e do Vice-Presidente do Tribunal, declarando que a Constituição deve ser interpretada no sentido de o Presidente do Tribunal ser nomeado pelo Presidente da República de entre os candidatos que tenham obtido a maioria de votos na Assembleia Geral do Tribunal.
(35)Em 1 e 2 de dezembro de 2016, o Senado aprovou a Lei de 30 de novembro de 2016 sobre o estatuto jurídico dos juízes do Tribunal Constitucional («Lei do Estatuto dos Juízes») e a Lei de 30 de novembro de 2016 sobre a organização e o processo do Tribunal Constitucional («Lei de Organização e Processo»).
(36)Em 14 de dezembro de 2016, o Parlamento Europeu realizou um debate sobre a situação do Estado de direito na Polónia. Durante o debate, a Comissão instou urgentemente as autoridades polacas a não porem em vigor as novas leis antes de o Tribunal Constitucional ter oportunidade para examinar a sua constitucionalidade.
(37)Em 15 de dezembro de 2016, o Senado aprovou a Lei de 13 de dezembro de 2016 de execução da Lei de Organização e Processo e da Lei do Estatuto dos Juízes («Lei de Execução»).
(38)Em 19 de dezembro de 2016, o Presidente da República assinou as três novas leis que regem o funcionamento do Tribunal Constitucional, as quais foram publicadas no Jornal Oficial. Nesse mesmo dia, o Presidente da República nomeou a juíza Julia Przylębska, eleita pelo novo Sejm, para o cargo de Presidente em exercício do Tribunal Constitucional.
(39)Em 20 de dezembro de 2016, a juíza Julia Przylębska autorizou os três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm sem base jurídica válida a assumirem as suas funções no Tribunal e convocou uma reunião da Assembleia Geral para o mesmo dia. Tendo em conta a pouca antecedência com que foi feita a convocação, um juiz não podia participar e solicitou o adiamento da reunião para o dia seguinte, o que a juíza Julia Przyłębska recusou. Dos 14 juízes presentes na reunião, votaram apenas três que haviam sido ilegalmente nomeados e três que haviam sido nomeados pela atual maioria governamental. Foram eleitos dois candidatos — Julia Przyłębska e Mariusz Muszyński — que foram apresentados como candidatos ao Presidente da República. Em 21 de dezembro de 2016, o Presidente da República nomeou a juíza Julia Przyłębska para o cargo de Presidente do Tribunal Constitucional.
2.4.Recomendação relativa ao Estado de direito (UE) 2016/146 (2.ª Recomendação)
(40)Em 21 de dezembro de 2016, a Comissão adotou uma segunda recomendação relativa ao Estado de direito na Polónia. A Comissão considerou que, embora tivesse sido dada resposta a algumas das questões colocadas na sua primeira recomendação, continuavam por resolver algumas questões importantes, tendo entretanto surgido novos motivos de preocupação. A Comissão considerou ainda que o processo que conduziu à nomeação de um novo Presidente do Tribunal Constitucional suscitou sérias preocupações quanto ao respeito do Estado de direito. A Comissão concluiu que continuava a existir uma ameaça sistémica ao Estado de direito na Polónia e convidou o Governo polaco a resolver com urgência os problemas identificados, no prazo de dois meses. A Comissão observou que continuava disposta a prosseguir um diálogo construtivo com o Governo polaco com base na recomendação.
(41)Em 20 de fevereiro de 2017, o Governo polaco respondeu à recomendação supramencionada. Na resposta, discordou de todas as posições apresentadas na recomendação e não anunciou quaisquer novas medidas destinadas a dissipar as preocupações expressas pela Comissão. A resposta salientou que a nomeação do novo Presidente do Tribunal em 21 de dezembro de 2016 bem como a entrada em vigor das três novas leis relativas ao funcionamento do Tribunal Constitucional criaram as condições adequadas para o funcionamento do Tribunal após um período de paralisia causado por conflitos políticos de membros da oposição, nas quais o anterior Presidente do Tribunal também participou.
(42)Em 10 de janeiro de 2017, o Vice-Presidente do Tribunal Constitucional foi obrigado pelo recém-nomeado Presidente do Tribunal a gozar o resto das suas férias. Em 24 de março de 2017, as férias obrigatórias foram prolongadas até ao fim de junho de 2017, apesar do pedido do Vice-Presidente para retomar as suas funções de juiz do Tribunal a partir de 1 de abril de 2017. Em 12 de janeiro de 2017, o Ministro da Justiça iniciou um processo junto do Tribunal Constitucional para fiscalizar a constitucionalidade da eleição, em 2010, de três juízes do Tribunal. Na sequência deste processo, deixaram de ser atribuídos processos a esses três juízes. Em 16 de janeiro de 2017, o Presidente da Comissão de Veneza emitiu uma declaração em que manifestava a sua preocupação com o agravamento da situação no Tribunal.
(43)Em 20 de janeiro de 2017, o Governo polaco anunciou uma reforma global do sistema judicial composta por um conjunto de leis, incluindo projetos de lei sobre o Conselho Nacional da Magistratura e sobre a Organização dos Tribunais Ordinários, a apresentar no decurso de 2017.
(44)Em 1 de março de 2017, um grupo de 50 membros do Sejm solicitou ao Tribunal Constitucional que declarasse a inconstitucionalidade das disposições da Lei do Supremo Tribunal com base na qual fora eleito o Primeiro Presidente do Supremo Tribunal.
(45)Em 11 de maio de 2017, o Sejm adotou a Lei da Escola Nacional de Magistratura, que foi publicada em 13 de junho de 2017.
(46)Em 16 de maio de 2017, a Comissão informou o Conselho sobre a situação do Estado de direito na Polónia. Verificou-se um amplo consenso no Conselho quanto ao facto de o Estado de direito se revestir de um interesse comum e constituir uma responsabilidade comum das instituições e dos Estados-Membros da UE. A grande maioria dos Estados-Membros apoiou o papel e os esforços da Comissão para resolver esta questão. Os Estados-Membros instaram o Governo polaco a retomar o diálogo com a Comissão com vista a resolver as questões pendentes e manifestaram o desejo de serem mantidos informados da evolução da situação no âmbito do Conselho «Assuntos Gerais».
(47)Em 23 de junho de 2017, o Conselho Europeu subscreveu, de um modo geral, as recomendações específicas por país dirigidas aos Estados-Membros no contexto do Semestre Europeu de 2017. As recomendações dirigidas à Polónia incluem um considerando que sublinha que «a segurança jurídica e a confiança na qualidade e na previsibilidade das políticas e instituições regulamentares, fiscais e outras são fatores importantes suscetíveis de permitir um aumento da taxa de investimento. O Estado de direito e um sistema judicial independente são igualmente essenciais neste contexto. Dar resposta a sérias preocupações relacionadas com o Estado de direito contribuirá para aumentar a segurança jurídica». Em 11 de julho de 2017, o Conselho adotou as recomendações específicas por país.
(48)Em 5 de julho de 2017, na sequência do termo do mandato do anterior Vice-Presidente do Tribunal Constitucional, o Presidente da República nomeou um novo Vice-Presidente do Tribunal, Mariusz Muszyński, apesar de este ser um dos três juízes do Tribunal nomeados ilegalmente.
(49)Em 12 de julho de 2017, um grupo de membros do Sejm apresentou um projeto de Lei do Supremo Tribunal que previa, entre outros aspetos, a destituição e reforma compulsiva de todos os juízes do Supremo Tribunal, com exceção dos indicados pelo Ministro da Justiça.
(50)Em 13 de julho de 2017, a Comissão escreveu ao Governo polaco manifestando as suas preocupações sobre as recentes propostas legislativas relativas ao sistema judicial e ao Supremo Tribunal, sublinhando a importância de se abster de adotar essas propostas a fim de permitir um diálogo profícuo e convidou o Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Ministro da Justiça polacos para uma reunião sobre essa matéria logo que possível. Em 14 de julho de 2017, o Governo polaco escreveu à Comissão reiterando os seus esclarecimentos anteriores sobre a situação do Tribunal Constitucional.
(51)Em 15 de julho de 2017, o Senado aprovou a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e a Lei de Organização dos Tribunais Comuns.
(52)Em 19 de julho de 2017, o Governo polaco respondeu à carta da Comissão de 13 de julho de 2017, remetendo para as reformas legislativas em curso do poder judicial polaco e solicitando à Comissão que apresentasse as suas preocupações concretas relacionadas com as novas leis, a fim de prosseguir o debate. A Comissão respondeu às cartas do Governo polaco de 14 e 19 de julho de 2017 por carta de 28 de julho de 2017.
(53)Em 22 de julho de 2017, o Senado aprovou a Lei do Supremo Tribunal, que foi enviada ao Presidente da República para promulgação juntamente com a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e a Lei de Organização dos Tribunais Comuns.
(54)Em 24 de julho de 2017, o Presidente da República apresentou uma declaração sobre a sua decisão de devolver ao Sejm a Lei do Supremo Tribunal e a Lei do Conselho Nacional da Magistratura.
(55)Em 25 de julho de 2017, o Presidente da República assinou a Lei de Organização dos Tribunais Comuns.
2.5.
Recomendação relativa ao Estado de direito (UE) 2017/1520 (3.ª Recomendação)
(56)Em 26 de julho de 2017, a Comissão adotou uma terceira recomendação relativa ao Estado de direito na Polónia, complementando as suas Recomendações de 27 de julho e de 21 de dezembro de 2016. Nesta recomendação, a Comissão teve em conta os últimos desenvolvimentos verificados na Polónia desde a adoção da Recomendação da Comissão de 21 de dezembro de 2016. As preocupações da Comissão estavam relacionadas com as seguintes questões:
(1)Ausência de fiscalização constitucional independente e legítima;
(2)Adoção por parte do Parlamento polaco de nova legislação relativa ao poder judicial na Polónia que suscita sérias preocupações quanto à independência do poder judicial e aumenta consideravelmente a ameaça sistémica ao Estado de direito na Polónia:
(a)Lei que altera a Lei de Organização dos Tribunais Comuns («Lei de Organização dos Tribunais Comuns»), publicada no Jornal Oficial Polaco de 28 de julho de 2017 e que entrou em vigor em 12 de agosto de 2017;
(b)Lei que altera a Lei da Escola Nacional de Magistratura e do Ministério Público, Lei de Organização dos Tribunais Comuns e determinadas outras leis («Lei da Escola Nacional de Magistratura»), publicada no Jornal Oficial Polaco de 13 de junho de 2017 e que entrou em vigor em 20 de junho de 2017;
(c)Lei que altera a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e determinadas outras leis («Lei do Conselho Nacional da Magistratura»), aprovada pelo Senado em 15 de julho de 2017; esta lei foi devolvida ao Sejm em 24 de julho de 2017 e não entrou em vigor;
(d)Lei do Supremo Tribunal, aprovada pelo Senado em 22 de julho de 2017; esta lei foi devolvida ao Sejm em 24 de julho de 2017 e não entrou em vigor.
(57)Na sua terceira recomendação, a Comissão considerou que a situação de ameaça sistémica ao Estado de direito na Polónia, conforme apresentada nas suas Recomendações de 27 de julho de 2016 e de 21 de dezembro de 2016, se deteriorara gravemente e em especial que:
(1)A nomeação ilegal do Presidente do Tribunal Constitucional, a admissão dos três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm sem base jurídica válida, o facto de um desses juízes ter sido nomeado Vice-Presidente do Tribunal, o facto de os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela anterior legislatura não terem podido assumir funções no Tribunal, bem como os desenvolvimentos subsequentes no Tribunal descritos supra, conduziram efetivamente à remodelação total do Tribunal à margem do processo constitucionalmente previsto para a nomeação de juízes. Por este motivo, a Comissão considerou que a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional se encontram seriamente comprometidas e, consequentemente, a constitucionalidade das leis polacas deixa de poder ser efetivamente garantida. Deixou de ser possível considerar que os acórdãos proferidos pelo Tribunal nestas circunstâncias garantem uma fiscalização constitucional eficaz.
(2)A Lei da Escola Nacional de Magistratura já em vigor e, se entrarem em vigor, a Lei do Conselho Nacional da Magistratura, a Lei de Organização dos Tribunais Comuns e a Lei do Supremo Tribunal comprometem estruturalmente a independência do sistema judicial polaco e teriam efeitos imediatos e concretos no funcionamento independente de todo o poder judicial. Dado que a independência do poder judicial é uma componente essencial do Estado de direito, estas novas leis aumentam consideravelmente a ameaça sistémica ao Estado de direito já assinalada nas recomendações anteriores.
(3)Em especial, a destituição de juízes do Supremo Tribunal, a sua possível renomeação e outras medidas previstas na Lei do Supremo Tribunal agravariam muito seriamente a ameaça sistémica ao Estado de direito.
(4)As novas leis suscitam sérias preocupações no que diz respeito à compatibilidade com a Constituição polaca, conforme sublinhado em várias declarações, nomeadamente do Supremo Tribunal, do Conselho Nacional da Magistratura, do Provedor de Justiça Polaco, da Ordem de Advogados e de associações de juízes e advogados, bem como de outras partes interessadas relevantes. Todavia, conforme explanado supra, já não é possível uma fiscalização constitucional eficaz dessas leis.
(5)Por último, as ações e declarações públicas contra juízes e tribunais na Polónia proferidas pelo Governo polaco e por membros do Parlamento da maioria governativa afetaram a confiança em todo o sistema judicial. A Comissão sublinhou o princípio da cooperação leal entre os órgãos do Estado que, como salientado nos pareceres da Comissão de Veneza, constitui uma condição constitucional prévia num Estado democrático regido pelo Estado de direito.
(58)A Comissão convida o Governo polaco a sanar os problemas assinalados na presente recomendação no prazo de um mês a contar da sua receção e a informar a Comissão das medidas adotadas para esse efeito. Em particular, a Comissão recomenda às autoridades polacas que:
(1)Restabeleçam a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional como garante da Constituição polaca;
(2)Publiquem e apliquem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 9 de março de 2016, de 11 de agosto de 2016 e de 7 de novembro de 2016;
(3)Assegurem que a Lei do Conselho Nacional da Magistratura, a Lei de Organização dos Tribunais Comuns e a Lei do Supremo Tribunal não entram em vigor e que a Lei da Escola Nacional de Magistratura é retirada ou alterada, a fim de assegurar a sua conformidade com a Constituição e com as normas europeias em matéria de independência do poder judicial;
(4)Se abstenham de qualquer medida que interfira com os mandatos e as funções dos juízes do Supremo Tribunal;
(5)Assegurem que qualquer reforma da justiça confirma o Estado de direito e cumpre o direito da UE e as normas europeias relativas à independência do poder judicial e é preparada em estreita cooperação com o poder judicial e com todas as partes interessadas;
(6)Se abstenham de ações e declarações públicas que possam continuar a prejudicar a legitimidade do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal, dos tribunais comuns, dos juízes, individual ou coletivamente, ou do poder judicial no seu todo.
(59)A Comissão solicitou também às autoridades polacas que não adotem medidas para destituir ou forçar a reforma dos juízes do Supremo Tribunal, dado que tais medidas agravariam muito seriamente a ameaça sistémica ao Estado de direito. A Comissão informou que, caso as autoridades polacas adotem alguma medida deste género, a Comissão está preparada para ativar imediatamente o artigo 7.º, n.º 1, do TUE.
(60)Em 31 de julho de 2017, o Sejm foi formalmente notificado da decisão do Presidente da República de vetar a lei que altera a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e a Lei do Supremo Tribunal.
(61)Em 4 e em 16 de agosto de 2017, o Governo polaco escreveu à Comissão solicitando esclarecimentos sobre a sua Recomendação de 26 de julho de 2017, tendo a Comissão respondido por cartas de, respetivamente, 8 e 21 de agosto de 2017.
(62)Em 28 de agosto de 2017, o Governo polaco respondeu à Recomendação de 26 de julho de 2017. Na resposta, discordou de todas as avaliações apresentadas na recomendação e não anunciou quaisquer novas medidas destinadas a dissipar as preocupações manifestadas pela Comissão.
(63)Em 30 de agosto de 2017, o parecer do Gabinete das Instituições Democráticas e dos Direitos Humanos (ODIHR) da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) concluiu que a Lei do Supremo Tribunal não respeita as normas internacionais em matéria de independência do poder judicial.
(64)Em 11 de setembro de 2017, o Governo polaco iniciou uma campanha designada «Tribunais Justos» com o objetivo de obter apoio da sociedade para a reforma do poder judicial em curso. O Conselho Nacional da Magistratura e os tribunais comuns publicaram várias declarações retificando alegações dirigidas contra os tribunais, os juízes e o Conselho durante a campanha.
(65)Em 11 de setembro de 2017, o Tribunal Constitucional, num coletivo de cinco juízes, declarou a inconstitucionalidade de determinadas disposições do Código de Processo Civil que permitem aos tribunais comuns e ao Supremo Tribunal apreciar a legalidade da nomeação do Presidente e do Vice-Presidente do Tribunal.
(66)Em 13 de setembro de 2017, o Ministro da Justiça começou a exercer o poder de destituição de presidentes e vice-presidentes dos tribunais ao abrigo da Lei de Organização dos Tribunais Comuns.
(67)Em 15 de setembro e em 18 de outubro de 2017, o Conselho Nacional da Magistratura criticou as decisões do Ministro da Justiça de destituir presidentes dos tribunais. O Conselho indicou que esse poder arbitrário do Ministro da Justiça viola o princípio constitucional da independência dos tribunais e é suscetível de afetar negativamente a imparcialidade dos juízes.
(68)Em 15 de setembro de 2017, o Sejm nomeou uma pessoa para um cargo já ocupado de juiz do Tribunal Constitucional, e o Presidente da República aceitou a prestação de juramento em 18 de setembro de 2017.
(69)Em 15 de setembro de 2017, o Sejm adotou a Lei do Instituto Nacional para a Liberdade - Centro para o Desenvolvimento da Sociedade Civil, que centraliza a distribuição de fundos, nomeadamente para organizações da sociedade civil.
(70)Em 22 de setembro de 2017, o Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas analisou os relatórios sobre a Polónia apresentados no âmbito da terceira revisão periódica dos quais constam recomendações sobre a independência do poder judicial e sobre o Estado de direito.
(71)Em 25 de setembro de 2017, a Comissão informou o Conselho sobre a situação do Estado de direito na Polónia. Verificou-se um amplo consenso quanto ao facto de o primado do Estado de direito constituir um interesse e uma responsabilidade comuns e quanto à necessidade de a Polónia e a Comissão estabelecerem um diálogo a fim de encontrar uma solução.
(72)Em 26 de setembro de 2017, o Presidente da República enviou ao Sejm dois novos projetos de lei relativos ao Supremo Tribunal e ao Conselho Nacional da Magistratura.
(73)Em 3 de outubro de 2017, o Sejm enviou os dois projetos de lei presidencial relativos ao Supremo Tribunal e ao Conselho Nacional de Magistratura para consulta às partes interessadas relevantes, incluindo o Provedor de Justiça, o Supremo Tribunal e o Conselho Nacional da Magistratura.
(74)Em 6 e em 25 de outubro de 2017, o Supremo Tribunal publicou pareceres sobre os dois novos projetos de Lei do Supremo Tribunal e de Lei do Conselho Nacional da Magistratura. Os pareceres consideram que o projeto de Lei do Supremo Tribunal limitaria substancialmente a sua independência e que o projeto de Lei do Conselho da Magistratura não é compatível com o conceito de um Estado democrático regido pelo Estado de direito.
(75)Em 11 de outubro de 2017, a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa adotou uma resolução sobre as novas ameaças ao Estado de direito nos Estados membros do Conselho da Europa, manifestando também preocupações sobre a evolução da situação na Polónia, que põe em risco o respeito do Estado de direito e, em particular, a independência do poder judicial e o princípio da separação de poderes.
(76)Em 13 de outubro de 2017, a Rede Europeia dos Conselhos de Justiça (RECJ) emitiu um parecer sobre o novo projeto de Lei do Conselho Nacional da Magistratura, sublinhando a sua incompatibilidade com as normas europeias sobre Conselhos da Magistratura.
(77)Em 23 de outubro de 2017, na sequência do terceiro ciclo do Exame Periódico Universal da Polónia, o Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos instou as autoridades polacas a aceitarem as recomendações das Nações Unidas sobre o respeito da independência do poder judicial.
(78)Em 24 de outubro de 2017, o Tribunal Constitucional, num coletivo que inclui dois juízes nomeados ilegalmente, declarou a inconstitucionalidade de disposições da Lei do Supremo Tribunal, com base nas quais fora, designadamente, nomeado o atual Primeiro Presidente do Supremo Tribunal.
(79)Em 24 de outubro de 2017, o Tribunal Constitucional, num coletivo que inclui dois juízes nomeados ilegalmente, declarou a constitucionalidade das disposições das três leis relativas ao Tribunal Constitucional de dezembro de 2016, incluindo as disposições com base nas quais os dois juízes nomeados ilegalmente que decidiram sobre o processo tinham sido habilitados a julgar processos no Tribunal Constitucional. A moção do Provedor de Justiça polaco sobre a recusa dos dois juízes nomeados ilegalmente com base neste processo tinha sido rejeitada pelo Tribunal Constitucional.
(80)Em 27 de outubro de 2017, o Relator Especial das Nações Unidas para a Independência dos Juízes e dos Advogados, Diego García-Sayán, apresentou as suas observações preliminares, segundo as quais os dois projetos de Lei do Supremo Tribunal e de Lei do Conselho Nacional da Magistratura suscitam uma série de preocupações no que se refere à independência do poder judicial.
(81)Em 31 de outubro de 2017, o Conselho Nacional da Magistratura emitiu um parecer sobre o projeto de Lei do Conselho Nacional da Magistratura apresentado pelo Presidente da República. O Conselho observa que o projeto de lei é fundamentalmente incompatível com a Constituição polaca ao dotar o Sejm do poder de nomeação de juízes membros do Conselho e ao pôr prematuramente termo aos mandatos protegidos constitucionalmente dos atuais juízes membros do Conselho.
(82)Em 10 de novembro de 2017, o Conselho Consultivo dos Juízes Europeus (CCJE) aprovou uma declaração que suscita preocupações quanto à independência do poder judicial na Polónia.
(83)Em 11 de novembro de 2017, o Provedor de Justiça enviou uma carta ao Presidente da República com uma avaliação dos dois novos projetos de Lei do Supremo Tribunal e de Lei do Conselho Nacional da Magistratura, recomendando que estes não fossem adotados uma vez que não garantiriam a manutenção da independência do poder judicial face ao poder executivo, nem garantiriam o direito constitucional de que gozam os cidadãos de acesso a um tribunal independente.
(84)Em 13 de novembro de 2017, o OSCE-ODIHR adotou um parecer sobre o novo projeto de Lei do Supremo Tribunal em que declara que as disposições revistas são incompatíveis com as normas internacionais em matéria de independência do poder judicial.
(85)Em 15 de novembro de 2017, o Parlamento Europeu adotou uma resolução sobre a situação do Estado de Direito e da democracia na Polónia, exprimindo o seu apoio às recomendações emitidas pela Comissão, bem como aos processos por infração e considerando que a atual situação na Polónia representa um risco manifesto de violação grave dos valores consagrados no artigo 2.º do TUE.
(86)Em 24 de novembro de 2017, o Conselho das Ordens de Advogados da União Europeia (CCBE) apelou a que as autoridades polacas não adotassem os dois projetos de Lei do Supremo Tribunal e de Lei do Conselho Nacional da Magistratura uma vez que estes poderiam comprometer a separação de poderes garantida pela Constituição polaca. Em 29 de novembro de 2017, a Organização de Juízes «Iustitia», a Fundação de Helsínquia para os Direitos Humanos e a Amnistia Internacional emitiram uma declaração conjunta criticando o processo legislativo relativo aos dois projetos de lei presidenciais.
(87)Em 5 de dezembro de 2017, a Rede Europeia dos Conselhos de Justiça (RECJ) adotou um novo parecer criticando o projeto de Lei do Conselho Nacional da Magistratura por não respeitar as normas da RECJ.
(88)Em 8 de dezembro de 2017, a Comissão de Veneza, a pedido da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, adotou um parecer sobre o projeto de Lei do Conselho Nacional da Magistratura, o projeto de Lei do Supremo Tribunal e a Lei de Organização dos Tribunais Comuns, bem como um parecer sobre a Lei do Ministério Público. A Comissão de Veneza examinou a Lei de Organização dos Tribunais Comuns, o projeto de Lei do Conselho Nacional da Magistratura e o projeto de Lei do Supremo Tribunal propostos pelo Presidente da República. Concluiu que a lei e os projetos de lei, sobretudo considerados em conjunto e no contexto da Lei do Ministério Público de 2016, permitem aos poderes legislativo e executivo interferir de forma profunda e grave na administração da justiça e, por conseguinte, representam uma grave ameaça à independência do poder judicial enquanto elemento fundamental do Estado de direito. Solicitou ao Presidente da República que retirasse as suas propostas e encetasse um diálogo antes da continuação do processo legislativo. Instou também o Parlamento polaco a reconsiderar as recentes alterações à Lei de Organização dos Tribunais Comuns.
(89)Em 8 de dezembro de 2017, o Comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa emitiu uma declaração lamentando a adoção pelo Sejm da Lei do Supremo Tribunal e da Lei do Conselho Nacional da Magistratura, que comprometeriam ainda mais a independência do poder judicial.
(90)Em 8 de dezembro de 2017, os dois projetos de lei foram aprovados pelo Sejm. Em 15 de dezembro de 2017, as duas leis foram aprovadas pelo Senado.
3.Ausência de uma fiscalização constitucional independente e legítima
(91)Durante o período de um ano, foram adotadas seis leis consecutivas relativas ao Tribunal Constitucional da Polónia. Estas novas leis suscitaram uma série de preocupações quanto ao respeito do Estado de direito, que são apresentadas infra e que foram descritas pormenorizadamente nas três recomendações da Comissão relativas ao Estado de direito na Polónia. Sobre essa matéria, a Comissão sublinha que, sempre que tiver sido instituído um sistema de justiça constitucional, a sua eficácia constitui uma componente essencial do Estado de direito.
3.1. Composição do Tribunal Constitucional
(92)Apesar dos acórdãos referidos no ponto 10 supra, os três juízes nomeados pela anterior legislatura não assumiram as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional e ainda não foram empossados pelo Presidente da República. Em contrapartida, os três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida foram empossados pelo Presidente da República e, em 20 de dezembro de 2016, após o termo do mandato do anterior Presidente do Tribunal, foram admitidos para assumirem as suas funções como juiz pelo Presidente em exercício do Tribunal (ver infra).
(93)Nas suas três recomendações, a Comissão recomendou que as autoridades polacas aplicassem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 3 e 9 de dezembro de 2015, que exigem que os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela anterior legislatura possam assumir as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional e que os três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida deixem de poder julgar processos até serem validamente eleitos.
(94)Na sua resposta de 27 de outubro de 2016, o Governo polaco considera que os acórdãos de 3 e 9 de dezembro de 2015 do Tribunal não especificaram os juízes que deveriam assumir as suas funções e considera legal a nomeação dos cinco juízes pela nova legislatura do Sejm em dezembro de 2015. Este raciocínio suscita sérias preocupações quanto ao respeito do Estado de direito na medida em que nega validade aos dois acórdãos de dezembro e está em contradição com o raciocínio do Tribunal, solidamente reiterado, nomeadamente no seu acórdão de 11 de agosto de 2016. Nesse acórdão, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional uma disposição da Lei do Tribunal Constitucional de 22 de julho de 2016 que permitiria aos três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida assumirem as suas funções preenchendo as vagas para as quais a anterior legislatura do Sejm tinha já legalmente nomeado três juízes. A resposta admite que, no dispositivo do acórdão de 3 de dezembro de 2015, o Tribunal Constitucional se pronunciou sobre a obrigação de o Presidente da República empossar de imediato um juiz eleito para o Tribunal pelo Sejm. Contudo, entende que esse acórdão não pode vincular outras autoridades à aplicação de disposições conforme especificadas num determinado processo. Esta interpretação limita o impacto dos acórdãos de 3 e 9 de dezembro de 2015 a uma simples obrigação do Governo de proceder à sua publicação, mas equivaleria a negar-lhes qualquer outro efeito jurídico e operacional, em particular no que respeita à obrigação de o Presidente da República dar posse aos juízes em causa. Esta interpretação contraria o princípio da leal cooperação entre órgãos do Estado que é, tal como sublinhado nos pareceres da Comissão de Veneza, um requisito constitucional prévio de um Estado democrático regido pelo Estado de direito.
(95)Além do mais, a Comissão de Veneza considera que uma solução para o atual conflito sobre a composição do Tribunal Constitucional «deve basear-se na obrigação de respeitar e aplicar plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional» e «insta, por conseguinte, todos os órgãos do Estado e, em especial, o Sejm, a respeitarem e a aplicarem plenamente os acórdãos».
(96)Para concluir, os três juízes nomeados legalmente em outubro de 2015 pela anterior legislatura ainda não puderam assumir as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional. Em contrapartida, os três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm sem base jurídica válida foram admitidos para assumirem as suas funções pelo Presidente em exercício do Tribunal. Assim, as autoridades polacas ainda não aplicaram plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 3 e de 9 de dezembro de 2015.
3.2. Publicação dos acórdãos do Tribunal Constitucional
(97)O Governo polaco recusa-se a publicar determinados acórdãos do Tribunal Constitucional, em especial o acórdão de 9 de março de 2016 que declarou inconstitucional a lei adotada em 22 de dezembro de 2015 que altera a Lei do Tribunal Constitucional.
(98)O Governo polaco contestou a legalidade deste acórdão, uma vez que o Tribunal Constitucional não aplicou o procedimento previsto na lei adotada em 22 de dezembro de 2015. No entanto, a lei de 22 de dezembro de 2015 era, em si mesma, objeto de fiscalização constitucional pelo Tribunal Constitucional. Por conseguinte, na sua Recomendação de 27 de julho de 2016, a Comissão considerou que o Tribunal Constitucional tinha razão em não aplicar o procedimento previsto na lei adotada em 22 de dezembro de 2015. Tal foi também reconhecido pela Comissão de Veneza. A Comissão considera que o acórdão de 9 de março de 2016 é vinculativo e deve ser respeitado.
(99)O Governo polaco recusou-se também a publicar outros acórdãos, em especial o acórdão de 11 de agosto de 2016 relativo à Lei do Tribunal Constitucional de 22 de julho de 2016 e o acórdão de 7 de novembro de 2016 sobre as disposições da lei de 22 de julho de 2016 relativas à seleção de candidatos para o cargo de Presidente do Tribunal. Estes dois acórdãos são de especial importância para a legitimidade e o funcionamento do Tribunal: o primeiro acórdão confirma o raciocínio que os três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida não podem assumir as suas funções de juiz, enquanto o segundo acórdão diz respeito a um requisito processual para a nomeação do Presidente do Tribunal que não foi observado na nomeação do atual Presidente.
(100)A recusa do Governo de publicar os acórdãos do Tribunal Constitucional suscita sérias preocupações em relação ao Estado de direito, dado que o cumprimento dos acórdãos definitivos constitui uma condição fundamental inerente ao Estado de direito. Em especial, se a publicação de um acórdão constitui uma condição prévia da sua produção de efeitos e se essa publicação cabe a uma autoridade pública que não o tribunal que proferiu o acórdão, o controlo ex post pela referida autoridade pública relativamente à legalidade do acórdão é incompatível com o princípio do Estado de direito. A recusa de publicação do acórdão nega o efeito jurídico e operacional automático de um acórdão vinculativo e definitivo e viola os princípios de legalidade e de separação de poderes do Estado de direito.
(101)Nas suas três recomendações, a Comissão recomendou às autoridades polacas que publicassem e aplicassem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional e garantissem que a publicação de futuros acórdãos seja automática e não dependa de uma decisão do poder executivo ou do poder legislativo. No entanto, os três acórdãos importantes supramencionados ainda não foram publicados.
3.3. Nomeação do Presidente do Tribunal e evolução subsequente
(102)Em 2016, foram adotadas três leis que alteraram significativamente o processo de nomeação do Presidente do Tribunal Constitucional. A adoção das referidas leis tinha por objetivo pôr termo ao mandato do anterior Presidente do Tribunal em dezembro de 2016. As leis estabeleciam um regime transitório específico criando uma nova função de Presidente em exercício do Tribunal, que existiria até à nomeação de um novo Presidente. O Presidente em exercício ficaria encarregado de liderar o novo processo de seleção para a nomeação do novo Presidente. O papel do Vice-Presidente (com mandato ainda vigente) foi reduzido mediante uma série de alterações legislativas.
(103)Na sequência da sua nomeação, o novo Presidente em exercício tomou imediatamente uma série de decisões importantes, permitindo, em particular, que os três juízes ilegalmente nomeados em dezembro de 2015 pela nova legislatura do Sejm assumissem funções e participassem no processo, tornando assim todo o processo de seleção inconstitucional.
(104)Conforme explicado na Recomendação de 21 de dezembro de 2016, a Comissão considera que o processo que conduziu à nomeação de um novo Presidente do Tribunal foi marcado por irregularidades graves no que diz respeito ao Estado de direito. O processo foi iniciado por um Presidente em exercício cuja nomeação suscitou sérias preocupações relativamente ao respeito dos princípios da separação de poderes e da independência do poder judicial consagrados na Constituição polaca. Além disso, o facto de o processo ter permitido aos três juízes ilegalmente nomeados em dezembro de 2015 pela nova legislatura do Sejm participarem no processo tornou inconstitucional todo o processo de seleção. De igual modo, o facto de os juízes legalmente eleitos em outubro de 2015 estarem impossibilitados de participar no processo tem igualmente um impacto nos resultados, viciando, por conseguinte, o processo. Além disso, o prazo muito curto para a convocação da Assembleia Geral e a recusa de adiamento da reunião suscitaram sérias preocupações. Por último, a eleição de candidatos por apenas seis juízes foi incompatível com o acórdão do Tribunal de 7 de novembro de 2016, segundo o qual o artigo 194.º, n.º 2, da Constituição deve ser interpretado no sentido de o Presidente do Tribunal ser nomeado pelo Presidente da República de entre os candidatos que tiverem obtido a maioria de votos na Assembleia Geral do Tribunal.
(105)A Comissão salienta igualmente que, após a nomeação do Presidente do Tribunal Constitucional, uma série de acontecimentos comprometeram ainda mais a legitimidade do Tribunal. Em especial: o Vice-Presidente do Tribunal, cuja posição é reconhecida na Constituição, foi obrigado pelo recém-nomeado Presidente do Tribunal a gozar os dias de férias que lhe restavam até ao final do seu mandato; em resultado de uma ação intentada pelo Procurador-Geral para contestar a validade da eleição, em 2010, de três juízes do Tribunal Constitucional, esses juízes foram subsequentemente excluídos das atividades judiciais do Tribunal; o novo Presidente do Tribunal alterou a composição dos coletivos de juízes de audiência de processos e os processos foram reatribuídos a painéis que eram constituídos, em parte, por juízes ilegalmente nomeados; foram rejeitados pedidos, em especial do Provedor de Justiça, para retirar os juízes ilegalmente nomeados dos painéis que decidem processos; um número considerável de acórdãos foram proferidos por coletivos que incluíam juízes ilegalmente nomeados; por último, após o termo do mandato do Vice-Presidente, um juiz ilegalmente nomeado foi nomeado como novo Vice-Presidente do Tribunal.
(106)Estas circunstâncias conduziram de facto a uma remodelação completa do Tribunal Constitucional à margem do processo constitucional normal de nomeação de juízes.
(107)A resposta das autoridades polacas à Recomendação complementar da Comissão de 21 de dezembro de 2016 não dissipou as preocupações da Comissão e não anunciou quaisquer medidas concretas para sanar as questões identificadas. A resposta ignora o acórdão de 7 de novembro de 2016 segundo o qual a Constituição exige que o Presidente do Tribunal seja nomeado de entre os candidatos que obtiverem a maioria dos votos na Assembleia Geral do Tribunal. A resposta negligencia também o facto de a Constituição reconhecer explicitamente que o cargo de Vice-Presidente está sujeito ao mesmo processo de nomeação que o de Presidente do Tribunal. Em relação à nomeação de um Presidente em exercício do Tribunal Constitucional, a resposta não apresenta uma base jurídica da Constituição e considera ter-se tratado de um mecanismo de ajustamento excecional ditado por circunstâncias extraordinárias. Além disso, a resposta das autoridades polacas à Recomendação complementar da Comissão de 26 de julho de 2017 não atenuou as preocupações da Comissão.
(108)Nas suas recomendações, a Comissão também exprimiu outras preocupações relacionadas com as três leis adotadas em dezembro de 2016. As leis estabelecem uma série de disposições que não respeitam acórdãos anteriores do Tribunal Constitucional e suscitaram novas preocupações relacionadas, em particular, com procedimentos disciplinares, a possibilidade de reforma antecipada, novos requisitos para juízes do Tribunal e alterações significativas na organização interna do Tribunal.
3.4. Efeito combinado na independência e na legitimidade do Tribunal
(109)A Comissão considera que, em consequência das leis adotadas em 2016 e da evolução na sequência da nomeação do Presidente em exercício, a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional se encontram seriamente comprometidas e que a constitucionalidade das leis polacas deixou de poder ser efetivamente garantida.
(110)Na sua Recomendação de 26 de julho de 2017, a Comissão recomendou às autoridades polacas que tomem as seguintes medidas:
- Restabeleçam a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional enquanto garante da Constituição polaca assegurando que os seus juízes e os seus Presidente e Vice-Presidente sejam eleitos e nomeados legalmente e aplicando plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 3 e 9 de dezembro de 2015 que exigem que os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela anterior legislatura assumam as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional e que os três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida deixem de poder julgar processos até serem validamente eleitos;
- Publiquem e apliquem plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional.
(111)Não foi posta em prática nenhuma das medidas recomendadas pela Comissão:
(1)
Os três juízes nomeados legalmente em outubro de 2015 pela anterior legislatura ainda não puderam assumir as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional. Em contrapartida, os três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm sem base jurídica válida foram admitidos para assumirem funções pelo Presidente em exercício do Tribunal.
(2)Ainda não foram publicados três acórdãos importantes do Tribunal Constitucional de 9 de março de 2016, de 11 de agosto de 2016 e de 7 de novembro de 2016;
(3)Após o termo do mandato do anterior Presidente do Tribunal Constitucional, ainda não foi nomeado legalmente um novo Presidente. O antigo Presidente não foi substituído pelo Vice-Presidente do Tribunal, mas por um Presidente em exercício e, subsequentemente, pela pessoa nomeada Presidente do Tribunal em 21 de dezembro de 2016. A nomeação do novo Presidente do Tribunal Constitucional teve lugar antes de ser possível proceder a um exame efetivo da Lei do Estatuto dos Juízes, da Lei de Organização e Processo e da Lei de Execução.
(112)O facto de já não ser possível garantir efetivamente a constitucionalidade das leis polacas é uma questão particularmente preocupante em termos do respeito do Estado de direito uma vez que, conforme explicado nas Recomendações de 27 de julho e de 21 de dezembro de 2016, o Parlamento polaco adotou uma série de novos atos legislativos especialmente sensíveis, tais como uma nova Lei da Função Pública, uma lei que altera a Lei dos Serviços de Polícia e determinadas outras leis e Leis do Ministério Público, a Lei do Provedor de Justiça e que altera determinadas outras leis, a Lei do Conselho Nacional da Comunicação Social e uma Lei de Luta contra o Terrorismo.
(113)Além disso, o efeito negativo para o Estado de direito decorrente da ausência de uma fiscalização constitucional independente e legítima na Polónia foi agora seriamente agravado pelo facto de a constitucionalidade das novas leis relativas ao sistema judicial polaco, mencionadas supra no ponto 5.2 e analisadas mais pormenorizadamente no ponto 4, ter deixado de poder ser verificada ou garantida por um tribunal constitucional independente.
4.Ameaças à independência da magistratura ordinária
(114)A Lei do Supremo Tribunal, a Lei do Conselho Nacional da Magistratura, a Lei de Organização dos Tribunais Comuns e a Lei da Escola Nacional de Magistratura contêm uma série de disposições que suscitam sérias preocupações no que diz respeito aos princípios da independência do poder judicial e da separação de poderes.
4.1.Lei do Supremo Tribunal
4.1.1. Destituição e reforma compulsiva dos atuais juízes do Supremo Tribunal
(115)A Lei do Supremo Tribunal diminui a idade geral de reforma dos juízes do Supremo Tribunal de 70 para 65 anos. Esta medida é aplicável a todos os juízes atualmente em funções. Os juízes com 65 anos de idade, ou que atingirão essa idade no prazo de 3 meses a contar da data de entrada em vigor da lei, passarão à reforma.
(116)Com a diminuição da idade de reforma e a sua aplicação aos atuais juízes do Supremo Tribunal, a lei põe termo aos respetivos mandatos e passa potencialmente à reforma um número significativo dos atuais juízes do Supremo Tribunal: 31 dos 83 juízes (37 %) segundo o Supremo Tribunal. A aplicação desta diminuição da idade de reforma aos atuais juízes do Supremo Tribunal tem um impacto particularmente negativo neste Tribunal específico, que é composto por juízes que estão, por natureza, no final da carreira. A reforma compulsiva de um número significativo dos atuais juízes do Supremo Tribunal permite proceder a uma remodelação profunda e imediata do Supremo Tribunal. Essa possibilidade suscita preocupações específicas em termos da separação de poderes, em particular quando considerada em combinação com as reformas simultâneas do Conselho Nacional da Magistratura. De facto: devido à diminuição da idade de reforma, todos os novos juízes serão nomeados pelo Presidente da República sob recomendação do recém-formado Conselho Nacional da Magistratura, o qual será em larga medida dominado por nomeações políticas. A reforma compulsiva dos atuais juízes do Supremo Tribunal suscita também preocupações no que se refere ao princípio da inamovibilidade dos juízes, que constitui um elemento fundamental da independência dos juízes, conforme consagrado na jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, bem como nas normas europeias. No seu parecer sobre o projeto de Lei do Supremo Tribunal, a Comissão de Veneza salienta que a reforma antecipada dos juízes atualmente em funções compromete tanto a segurança do mandato como a independência do Tribunal em geral.
(117)Os juízes devem estar protegidos da destituição através de garantias eficazes contra a intervenção ou pressão indevidas de outros poderes do Estado. A independência do poder judicial exige garantias suficientes para proteger as pessoas incumbidas de dirimir litígios. A inamovibilidade dos juízes durante todo o seu mandato é uma consequência da sua independência e, por conseguinte, está incluída nas garantias consagradas no artigo 6.º, n.º 1, da CEDH. Consequentemente, os juízes só podem ser destituídos individualmente se tal for justificado com base num processo disciplinar relativo à sua atividade individual e que apresente todas as garantias em matéria de defesa numa sociedade democrática. Os juízes não podem ser destituídos em grupo e não podem ser destituídos por motivos gerais não relacionados com a sua conduta individual. As garantias e salvaguardas supramencionadas estão ausentes no caso em apreço e as disposições em causa constituem uma violação flagrante da independência dos juízes do Supremo Tribunal e da separação de poderes e, por conseguinte, do Estado de direito.
(118)Além disso, será posto termo prematuramente ao mandato de seis anos do atual Primeiro Presidente, estabelecido na Constituição (constitucionalmente deveria terminar em 2020). Se for posto termo ao mandato do Primeiro Presidente, a nomeação de um «Primeiro Presidente em exercício» pelo Presidente da República ocorre à margem do processo normal: segundo a Constituição, o Primeiro Presidente deve ser nomeado pelo Presidente da República de entre os candidatos propostos pela Assembleia Geral do Supremo Tribunal. Esse termo prematuro de um mandato consagrado na Constituição representa uma violação grave do princípio da inamovibilidade e da segurança do mandato. A nomeação de um Primeiro Presidente em exercício de acordo com um procedimento ad hoc sem participação do poder judicial suscita sérias preocupações no que se refere ao princípio da separação de poderes.
(119)De acordo com a exposição de motivos da lei, a remodelação do Supremo Tribunal é indispensável devido à forma como o Supremo Tribunal tratou os processos de «descomunização» após 1989 e pelo facto de ainda haver juízes no Tribunal que trabalharam para o anterior regime ou que julgaram processos sob o anterior regime. O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos sublinhou claramente que um processo de saneamento deve ser individualizado (por exemplo, deve ser feita uma distinção entre os diferentes níveis de envolvimento com o antigo regime) e considera que as medidas de saneamento tomadas muito tempo depois do fim do regime comunista podem ter menor justificação tendo em conta a diminuição dos riscos existentes em democracias recentemente criadas. Há outras medidas proporcionadas que o Estado poderia adotar relativamente a cada juiz com um passado comunista (que incluiriam procedimentos transparentes aplicados a casos individuais perante órgãos imparciais atuando com base em critérios previamente estabelecidos por lei).
(120)No seu parecer sobre o projeto de Lei do Supremo Tribunal, a Comissão de Veneza considera difícil compreender por que razão uma pessoa que tinha sido considerada apta a desempenhar funções oficiais ainda durante vários anos seria subitamente considerada inapta. A exposição de motivos da lei pode ser entendida como implicando que, em resultado da reforma, os juízes de grau superior, muitos dos quais serviram sob o anterior regime, passariam à reforma. Se esta interpretação for correta, uma tal abordagem é inaceitável: se as autoridades têm dúvidas quanto à lealdade de juízes a título individual, devem aplicar os processos disciplinares ou de saneamento existentes e não alterar a idade de reforma.
(121)A Comissão de Veneza concluiu que a reforma antecipada de um grande número de juízes do Supremo Tribunal (incluindo o Primeiro Presidente) aplicando-lhes, com efeitos imediatos, uma idade de reforma mais baixa viola os seus direitos individuais e compromete a independência do poder judicial no seu todo; esses juízes deveriam ser autorizados a exercer funções até à idade de reforma atualmente em vigor. A Comissão de Veneza salienta, em particular, que a reforma antecipada dos juízes atualmente em funções compromete tanto a segurança do seu mandato como a independência do Tribunal em geral.
(122)Por último, estas disposições suscitam preocupações em matéria de constitucionalidade. Como observou o Supremo Tribunal e o Provedor de Justiça, a destituição e a reforma compulsiva dos atuais juízes do Supremo Tribunal violam o princípio da independência do poder judicial e afetam diretamente o direito a um tribunal independente. O Provedor de Justiça salienta que a criação da figura de Primeiro Presidente em exercício do Supremo Tribunal constitui uma violação do Estado de direito ao infringir o princípio da não assunção de competências de poderes estatais, o princípio da separação e do equilíbrio de poderes e o princípio da independência do poder judicial.
4.1.2. Poder de prolongamento do mandato dos juízes do Supremo Tribunal
(123)De acordo com a lei, os juízes do Supremo Tribunal abrangidos pela redução da idade de reforma e que desejem prolongar o seu mandato ativo podem apresentar um pedido ao Presidente da República.
(124)No que diz respeito aos poderes do Presidente da República para decidir sobre o prolongamento do mandato ativo dos juízes do Supremo Tribunal, a lei não prevê critérios, um calendário para a tomada de decisão, nem uma fiscalização jurisdicional. Um juiz que tenha solicitado o prolongamento do seu mandato fica «à mercê» da decisão do Presidente da República. Além disso, o Presidente da República poderá decidir prolongar o mandato duas vezes (por um período de 3 anos de cada vez). Estes elementos afetam a segurança dos mandatos e permitirão ao Presidente da República exercer influência sobre os juízes do Supremo Tribunal em exercício. O regime é contrário à Recomendação de 2010 do Conselho da Europa que estabelece que as decisões relativas à seleção e à carreira dos juízes devem assentar em critérios objetivos previamente estabelecidos na lei e que deve haver uma autoridade independente e competente formada, em grande parte, por membros do poder judicial autorizados a formular recomendações ou a emitir pareceres que a autoridade investida do poder de nomeação competente deve respeitar na prática. Estabelece também que os juízes em causa devem ter o direito de impugnar uma decisão relativa à sua carreira.
(125)O novo regime de reforma tem um efeito negativo na independência dos juízes. As novas regras criam uma ferramenta adicional através da qual o Presidente da República pode exercer influência sobre os juízes individualmente. Em especial, a ausência de critérios para o prolongamento dos mandatos dá azo a um poder discricionário indevido, pondo em causa o princípio da inamovibilidade dos juízes. Embora reduza a idade de reforma, a lei permite o prolongamento do mandato dos juízes pelo Presidente da República por um período máximo de 6 anos. De igual modo, não existe um prazo para o Presidente da República tomar uma decisão sobre o prolongamento do mandato, o que lhe permite manter a sua influência sobre os juízes em causa durante o tempo restante do seu mandato judicial. Mesmo antes de atingida a idade de reforma, a mera perspetiva de ter de solicitar ao Presidente esse prolongamento poderia exercer uma pressão sobre os juízes em causa.
(126)No seu parecer sobre o projeto de Lei do Supremo Tribunal, a Comissão de Veneza sublinha que este poder do Presidente da República lhe confere uma influência excessiva sobre os juízes do Supremo Tribunal que se aproximam da idade da reforma. Por essa razão, a Comissão de Veneza concluiu que o Presidente da República, enquanto representante político eleito, não deveria ter poder discricionário para prolongar o mandato de um juiz do Supremo Tribunal para além da idade da reforma.
(127)As novas regras suscitam também preocupações em matéria de constitucionalidade. Segundo os pareceres do Supremo Tribunal e do Provedor de Justiça, o novo mecanismo de prolongamento dos mandatos judiciais não respeita o princípio da legalidade e da separação de poderes.
4.1.3. Recurso extraordinário
(128)A lei introduz uma nova forma de fiscalização jurisdicional das decisões e acórdãos definitivos e vinculativos, o recurso extraordinário. No prazo de três anos a contar da data da entrada em vigor da lei, o Supremo Tribunal estará habilitado a anular total ou parcialmente qualquer acórdão definitivo proferido por um tribunal polaco nos 20 anos anteriores, designadamente os acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal, sob reserva de algumas exceções. O poder de interposição de recurso é conferido, nomeadamente, ao Procurador-Geral e ao Provedor de Justiça. Os fundamentos do recurso extraordinário são vastos: um recurso extraordinário pode ser apresentado se tal for necessário para assegurar o Estado de direito e a justiça social e se o acórdão não puder ser revogado nem alterado por outras vias de recurso extraordinárias e ou: 1) viola os princípios ou os direitos e liberdades das pessoas e dos cidadãos consagrados na Constituição; ou 2) constitui uma violação flagrante da lei em razão de interpretação errónea ou de uma aplicação incorreta; ou 3) verifica-se uma contradição óbvia entre as conclusões do tribunal e as provas recolhidas.
(129)Este novo procedimento de recurso extraordinário suscita preocupações no que diz respeito ao princípio da segurança jurídica, que é uma componente fundamental do Estado de direito. Conforme salientado pelo Tribunal de Justiça, é de chamar a atenção para a importância, tanto para a ordem jurídica da UE como para os sistemas jurídicos nacionais, do princípio da res judicata (caso julgado): a fim de garantir tanto a estabilidade do direito e das relações jurídicas como uma boa administração da justiça, é necessário que as decisões judiciais que se tornaram definitivas após esgotamento das vias de recurso disponíveis ou decorridos os prazos previstos para tais recursos já não possam ser impugnadas». Como salientado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a fiscalização extraordinária não deveria constituir um «recurso disfarçado», e «a mera possibilidade de existência de dois pontos de vista sobre esta matéria não constitui um fundamento para reexame».
(130)No seu parecer sobre o projeto de Lei do Supremo Tribunal, a Comissão de Veneza salientou que o procedimento de recurso extraordinário é perigoso para a estabilidade da ordem jurídica polaca. O parecer assinala que será possível reabrir qualquer processo decidido no país nos últimos 20 anos com praticamente qualquer fundamento e que o sistema poderia conduzir a uma situação em que nenhum acórdão seria jamais definitivo.
(131)O novo recurso extraordinário suscita também preocupações em matéria de constitucionalidade. Segundo o Supremo Tribunal e o Provedor de Justiça, a lei afeta o princípio da estabilidade da jurisprudência, o caráter definitivo dos acórdãos e o princípio da proteção da confiança no Estado de direito, bem como o direito a que um processo seja decidido num prazo razoável.
4.1.4. Outras disposições
(132)Conforme sublinhado no parecer da Comissão de Veneza e de outros órgãos, uma série de outras disposições da Lei do Supremo Tribunal suscitam preocupações no que diz respeito aos princípios da independência do poder judicial e da separação de poderes.
(133)A nova lei estabelece um novo regime disciplinar aplicável aos juízes do Supremo Tribunal. Estão previstos dois tipos de responsáveis em matéria disciplinar: o responsável em matéria disciplinar do Supremo Tribunal, nomeado pelo Colégio do Supremo Tribunal para um mandato de quatro anos, e o responsável extraordinário em matéria disciplinar nomeado, caso a caso, pelo Presidente da República de entre juízes do Supremo Tribunal, juízes de tribunais comuns, juízes de tribunais militares e procuradores. Nos termos do direito polaco, apenas os responsáveis em matéria disciplinar podem decidir sobre a instauração de um processo disciplinar contra juízes. A nomeação de um responsável extraordinário pelo Presidente da República ocorre sem a participação do poder judicial e equivale a um pedido para instaurar um inquérito preliminar. A nomeação de um responsável extraordinário em matéria disciplinar para um processo disciplinar em curso exclui o responsável em matéria disciplinar do Supremo Tribunal desse processo. O facto de o Presidente da República (e, em alguns casos, igualmente o Ministro da Justiça) ter poder para exercer influência sobre processos disciplinares contra juízes do Supremo Tribunal mediante a nomeação de um responsável em matéria disciplinar que examinará o processo («responsável em matéria disciplinar»), que excluirá o responsável em matéria disciplinar do Supremo Tribunal de um processo em curso, suscita preocupações quanto ao respeito do princípio da separação de poderes e pode afetar a independência do poder judicial. Estas preocupações foram também expressas nos pareceres do OSCE-ODHIR e do Supremo Tribunal.
(134)A lei suprime também um conjunto de garantias processuais em processos disciplinares contra juízes dos tribunais comuns e juízes do Supremo Tribunal: as provas recolhidas em violação da lei poderiam ser utilizadas contra um juiz; em determinadas condições, as provas apresentadas pelo juiz em causa poderiam ser ignoradas; a prescrição de processos disciplinares seria suspensa durante o período do processo disciplinar, o que significa que um juiz poderia ser sujeito a um processo por tempo indeterminado; por último, o processo disciplinar poderia prosseguir mesmo que o juiz em causa estivesse ausente (incluindo quando a ausência era justificada). O novo regime disciplinar também suscita preocupações quanto à sua conformidade com os requisitos do direito a um processo equitativo estabelecidos no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH).
(135)A lei altera a estrutura interna do Supremo Tribunal, complementando-a com duas novas câmaras. Uma nova câmara de controlo extraordinário e assuntos públicos avaliará processos apresentados ao abrigo do novo procedimento de recurso extraordinário. Aparentemente esta nova câmara será composta, na sua maioria, por novos juízes e confirmará a validade das eleições legislativas e locais e examinará litígios eleitorais, incluindo litígios eleitorais nas eleições para o Parlamento Europeu. Além disso, uma nova câmara disciplinar autónoma composta unicamente por novos juízes será encarregada de examinar em primeira e segunda instância os processos disciplinares contra juízes do Supremo Tribunal. Estas duas novas câmaras, em grande medida autónomas, compostas por novos juízes suscitam preocupações no que diz respeito à separação de poderes. Tal como assinalado pela Comissão de Veneza, embora ambas as câmaras façam parte do Supremo Tribunal, na prática estão acima de todas as outras câmaras, criando o risco de todo o sistema judicial passar a ser dominado por essas câmaras que são compostas por novos juízes eleitos com uma influência determinante da maioria no poder. Além disso, a Comissão de Veneza sublinha que a lei tornará a fiscalização jurisdicional dos litígios eleitorais particularmente vulnerável a influências políticas, criando um grave risco para o funcionamento da democracia polaca.
(136)A lei introduz juízes não togados, a ser nomeados pelo Senado da República, para processos interpostos junto do Supremo Tribunal relativos a recursos extraordinários e processos disciplinares examinados pelo Supremo Tribunal. Conforme referido pela Comissão de Veneza, a introdução de juízes não togados nas duas câmaras do Supremo Tribunal põe em perigo a eficiência e a qualidade da justiça.
4.2. Lei do Conselho Nacional da Magistratura
(137)Segundo a Constituição polaca, a independência dos juízes é garantida pelo Conselho Nacional da Magistratura. A função do Conselho Nacional da Magistratura tem um impacto direto na independência dos juízes, nomeadamente no que diz respeito à sua promoção, transferência, processos disciplinares, destituição e reforma antecipada. A título de exemplo, a promoção de um juiz (por exemplo, de um tribunal de comarca para um tribunal regional) implica que o Presidente da República o volte a nomear e, por conseguinte, o processo de avaliação judicial e nomeação que envolve o Conselho Nacional da Magistratura terá de ser repetido. Além disso, os juízes-adjuntos que já estão a exercer as funções de juiz devem ser avaliados pelo Conselho Nacional da Magistratura antes da sua nomeação como juiz pelo Presidente da República.
(138)Por este motivo, nos Estados-Membros em que foi criado um Conselho da Magistratura, a sua independência é particularmente importante para evitar a influência indevida do Governo ou do Parlamento na independência dos juízes.
(139)A Lei do Conselho Nacional da Magistratura intensifica as preocupações quanto à independência geral do sistema judicial ao prever o termo prematuro do mandato de todos os juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura e ao estabelecer um regime inteiramente novo para a nomeação dos seus juízes membros que permite um elevado grau de influência política.
(140)Nos termos do artigo 6.º da Lei do Conselho Nacional da Magistratura, os mandatos de todos os atuais juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura serão terminados prematuramente. O termo dos mandatos decidido pelo poder legislativo suscita preocupações quanto à independência do Conselho e à separação de poderes. O Parlamento passará a ter uma influência decisiva na composição do Conselho em detrimento da influência dos próprios juízes. Esta remodelação do Conselho Nacional da Magistratura poderia já ocorrer um mês e meio após a publicação da lei. O termo prematuro dos mandatos suscita também preocupações em termos de constitucionalidade, conforme sublinhado nos pareceres do Conselho Nacional da Magistratura, do Supremo Tribunal e do Provedor de Justiça.
(141)Além disso, o novo regime de nomeação dos juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura suscita sérias preocupações. Em particular, normas europeias bem enraizadas e em especial a Recomendação de 2010 do Comité de Ministros do Conselho da Europa estipulam que «pelo menos metade dos membros dos [Conselhos da Magistratura] devem ser juízes escolhidos pelos seus pares de entre todos os níveis do sistema judicial, respeitando o pluralismo no interior do sistema judicial». Cabe aos Estados-Membros organizar os seus sistemas judiciais e decidir, nomeadamente, sobre a criação ou não de um Conselho da Magistratura. Todavia, nos casos em que tal Conselho tenha sido criado, como acontece na Polónia, a sua independência deve ser garantida em consonância com as normas europeias.
(142)Até à adoção da Lei do Conselho Nacional da Magistratura, o sistema polaco observava plenamente estas normas, dado que o Conselho Nacional da Magistratura era composto por uma maioria de juízes escolhidos por juízes. O artigo 1.º, n.º 1, e o artigo 7.º da lei que altera a Lei do Conselho Nacional da Magistratura mudariam radicalmente este regime ao prever que 15 juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura serão nomeados, e podem ser renomeados, pelo Sejm. Além disso, não há qualquer garantia que, ao abrigo da nova lei, o Sejm nomeará juízes membros do Conselho apoiados pelo poder judicial, uma vez que os candidatos a esses cargos podem ser apresentados não só por grupos de 25 juízes, mas também por grupos de, pelo menos, 2000 cidadãos. Além disso, a lista final de candidatos que terá de ser aprovada pelo Sejm em bloco é previamente estabelecida por um comité do Sejm. As novas regras sobre a nomeação dos juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura aumentam consideravelmente a influência do Parlamento sobre o Conselho e afetam negativamente a sua independência, contrariando as normas europeias. O facto de os juízes membros passarem a ser nomeados pelo Sejm com uma maioria de três quintos não atenua esta preocupação, uma vez que os juízes membros continuarão a não ser escolhidos pelos seus pares. Além do mais, caso não seja atingida uma maioria de três quintos, os juízes membros do Conselho serão nomeados pelo Sejm por maioria absoluta de votos.
(143)Esta situação suscita preocupações do ponto de vista da independência do sistema judicial. Por exemplo, um juiz de comarca que tenha de proferir uma sentença num processo politicamente sensível, ao mesmo tempo que é candidato a uma promoção para juiz de um tribunal regional, poderá tender a seguir a posição defendida pela maioria política a fim de não comprometer as suas hipóteses de obter a promoção. Mesmo que este risco não se materialize, o novo regime não prevê garantias suficientes para assegurar a imagem de independência que é uma questão crucial para manter a confiança que, numa sociedade democrática, os cidadãos devem depositar nos tribunais. Além disso, os juízes-adjuntos terão de ser avaliados por um Conselho Nacional da Magistratura sujeito a influências políticas antes da sua nomeação como juízes.
(144)A Comissão de Veneza concluiu que a eleição pelo Parlamento dos 15 membros judiciais do Conselho Nacional da Magistratura, em conjugação com a substituição imediata dos atuais membros em exercício, conduzirá a uma profunda politização deste órgão. A Comissão de Veneza recomenda que, em vez disso, os membros judiciais do Conselho Nacional da Magistratura deveriam ser eleitos pelos seus pares, tal como estabelecido na lei em vigor. Observou também que a lei enfraquece a independência do Conselho relativamente à maioria no Parlamento e contribui para um enfraquecimento da independência da justiça no seu conjunto.
(145)Nos seus pareceres relativos ao projeto de lei, o Supremo Tribunal, o Conselho Nacional da Magistratura e o Provedor de Justiça exprimiram uma série de preocupações relacionadas com a constitucionalidade do novo regime. Em especial, o Conselho Nacional da Magistratura observa que, nos termos da Constituição polaca, o Conselho serve de contrapeso ao Parlamento que foi constitucionalmente habilitado a decidir sobre o teor da lei. A nomeação política de juízes membros e o termo prematuro dos mandatos dos atuais juízes membros do Conselho viola, por conseguinte, os princípios da separação de poderes e da independência do poder judicial. Conforme explicado nas anteriores recomendações, não é atualmente possível uma fiscalização constitucional eficaz destas disposições.
4.3. Lei de Organização dos Tribunais Comuns
4.3.1. Idade de reforma e poder de prolongamento do mandato dos juízes
(146)O artigo 1.º, n.º 26, alíneas b) e c), e o artigo 13.º, n.º 1, da lei que altera a Lei de Organização dos Tribunais Comuns estabelecem que o regime de idade de reforma aplicável aos juízes de tribunais comuns será reduzido dos 67 para os 60 anos para as juízas e dos 67 para os 65 anos para os juízes e que o Ministro da Justiça ficará habilitado a decidir sobre o prolongamento dos mandatos judiciais (até à idade de 70 anos) com base em critérios vagos. Na pendência desta decisão, os juízes em causa mantêm-se em funções.
(147)O novo regime de reforma teria um efeito negativo na independência dos juízes. As novas regras criam uma ferramenta adicional que permite ao Ministro da Justiça exercer influência sobre os juízes individualmente. Em especial, os critérios vagos de prolongamento dos mandatos abrem a via para um poder discricionário indevido, pondo em causa o princípio da inamovibilidade dos juízes. Ao mesmo tempo que diminui a idade de reforma, a lei permite aos juízes ter o seu mandato prolongado pelo Ministro da Justiça até um período máximo de dez anos para as juízas e de cinco anos para os juízes. Além disso, não há qualquer prazo para o Ministro da Justiça tomar uma decisão sobre o prolongamento do mandato, o que lhe permite manter a sua influência sobre os juízes em causa durante o tempo restante do seu mandato judicial. Mesmo antes de atingida a idade de reforma, a mera perspetiva de ter de pedir ao Ministro da Justiça esse prolongamento poderia exercer pressão sobre os juízes em causa.
(148)Ao diminuírem a idade de reforma dos juízes ao mesmo tempo que subordinam o prolongamento do mandato judicial à decisão do Ministro da Justiça, as novas regras põem em causa o princípio da inamovibilidade dos juízes, que constitui um elemento-chave da independência dos juízes de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Entre os requisitos de um tribunal independente, o Tribunal de Justiça declarou que os juízes devem beneficiar de independência pessoal e operacional no exercício das suas funções, devendo ainda estar protegidos de destituição graças a garantias eficazes contra a intervenção ou pressão indevidas do poder executivo. As disposições em causa também não são consentâneas com as normas europeias, segundo as quais os juízes devem ter um mandato garantido até à idade obrigatória de reforma, caso exista. A Comissão de Veneza partilha as preocupações da Comissão.
(149)A Comissão observa que as novas regras também suscitam preocupações em matéria de constitucionalidade. De acordo com o parecer do Supremo Tribunal, habilitar o Ministro da Justiça a decidir sobre o prolongamento do mandato dos juízes, em combinação com a diminuição da idade de reforma dos juízes, viola o princípio da inamovibilidade dos juízes (artigo 180.º, n.º 1, da Constituição). Conforme explicado supra, a Comissão recorda que não é atualmente possível uma fiscalização constitucional eficaz destas disposições.
(150)A resposta das autoridades polacas à Recomendação da Comissão de 26 de julho de 2017 não atenua as preocupações da Comissão e não anuncia quaisquer medidas concretas para sanar as questões colocadas pela Comissão. A resposta ignora a pressão que o Ministro da Justiça pode exercer sobre os juízes individualmente antes de decidir dar o seu consentimento para os juízes em causa permanecerem em funções após terem atingido a idade da reforma.
4.3.2. Presidentes dos tribunais
(151)No sistema jurídico polaco, os presidentes dos tribunais desempenham um duplo papel: não só têm responsabilidades como gestores dos tribunais, como também desempenham funções judiciais. A Lei de Organização dos Tribunais Comuns suscita preocupações no que diz respeito à independência pessoal dos presidentes dos tribunais quando exercem a sua função judicial.
Poder de destituição
(152)O artigo 17.º, n.º 1, e o artigo 18.º, n.º 1, da Lei de Organização dos Tribunais Comuns estabelecem regras relativas à destituição dos presidentes e vice-presidentes dos tribunais. Durante um período de seis meses após a data de entrada em vigor da lei, é atribuído ao Ministro da Justiça o poder de destituir os presidentes dos tribunais sem estar sujeito ao respeito de critérios concretos, sem obrigação de fundamentação e sem que os órgãos judiciais tenham a possibilidade de bloquear essas decisões. Além disso, não está prevista qualquer fiscalização jurisdicional das decisões de destituição tomadas pelo Ministro da Justiça.
(153)A preocupação da Comissão diz respeito aos poderes do Ministro da Justiça durante esse período de seis meses. Após esse período de seis meses, em conformidade com o artigo 1.º, n.º 7, o Ministro da Justiça continuará a poder destituir os presidentes dos tribunais, mas o Conselho Nacional da Magistratura teria de ser consultado pelo Ministro da Justiça e poderia bloquear a destituição prevista mediante resolução adotada por maioria de dois terços dos votos.
Poder de nomeação
(154)De acordo com o artigo 1.º, n.º 6, da Lei de Organização dos Tribunais Comuns, o Ministro está habilitado a nomear os presidentes dos tribunais. Os únicos critérios aplicáveis são que o presidente do tribunal deve ser nomeado de entre os juízes de tribunais de recurso ou regionais para o cargo de presidente de um tribunal de recurso; de entre os juízes dos tribunais de recurso, regionais ou de comarca para o cargo de presidente de um tribunal regional e de entre os juízes dos tribunais regionais ou de comarca para o cargo de presidente de um tribunal de comarca. O Ministro da Justiça não tem qualquer obrigação de consultar o poder judicial sobre essa decisão. É apenas após a nomeação do presidente do tribunal que o Ministro apresenta o novo presidente à Assembleia Geral dos juízes do tribunal relevante. Este poder conferido ao Ministro da Justiça de nomeação dos presidentes de tribunal mantém-se inalterado após o termo do período de seis meses.
Efeitos dos poderes de destituição e de nomeação
(155)Uma vez que os presidentes de tribunais são juízes em exercício, os poderes supramencionados de destituição arbitrária, durante o período de seis meses, e de nomeação de presidentes de tribunais permite ao Ministro da Justiça manter uma influência sobre estes que pode afetar a sua independência pessoal quando exercem as suas funções judiciais. Por exemplo, um presidente de tribunal chamado a proferir uma sentença num processo sensível contra o Estado poderá sentir a pressão do Ministro da Justiça para seguir a posição do Governo, a fim de evitar ser destituído do cargo de presidente do tribunal, em vez de julgar o processo de forma independente com base nos seus méritos. O princípio de independência do poder judicial exige que os juízes não estejam subordinados a qualquer outro órgão quando julgam processos e que estejam protegidos contra intervenções ou pressões externas suscetíveis de pôr em causa a sua independência no julgamento dos litígios que lhes são submetidos.
(156)Também no que diz respeito aos juízes candidatos a presidentes de tribunal, esse poder discricionário do Ministro da Justiça pode influenciar a forma como julgam os processos, em especial quando se trata de processos políticos sensíveis, a fim de não reduzir as suas possibilidades de serem nomeados presidentes de tribunal. Em consequência, a sua independência pessoal seria igualmente afetada quando do julgamento de processos.
(157)Além disso, é de notar que os presidentes dos tribunais, na sua qualidade de gestores de tribunais, detêm poderes importantes sobre outros juízes. O poder discricionário do Ministro da Justiça de destituição e nomeação dos presidentes dos tribunais poderia influenciar a forma como estes exercem esses poderes, enquanto gestores de tribunais, sobre outros juízes. Tal poderia conduzir a uma ingerência na independência pessoal desses juízes. Por conseguinte, os poderes conferidos ao Ministro da Justiça terão também um efeito indireto na independência dos juízes que estão sujeitos à autoridade dos presidentes dos tribunais expostos à influência do Ministro da Justiça. Por exemplo, os presidentes de tribunais têm o poder de substituir juízes na sua função de chefes de divisão ou de chefes de secção dos tribunais, o poder de emitir notificações escritas a esses chefes de divisão e de secção que poderão ser associadas a uma redução na remuneração ligada ao cargo recebida por esses chefes de divisão ou de secção em caso de deficiências e o poder de transferir juízes sem o seu consentimento dentro da estrutura do tribunal ao qual presidem (o que abrange a circunscrição judicial relevante de um determinado tribunal e pode incluir locais de trabalho em diferentes cidades).
(158)No seu parecer, a Comissão de Veneza sublinhou que a nova lei permite aos poderes executivos interferirem de forma profunda e grave na administração da justiça e coloca uma séria ameaça à independência do poder judicial como um elemento fundamental do Estado de direito. A lei não protege suficientemente os presidentes dos tribunais contra destituições arbitrárias e a decisão do Ministro da Justiça de nomeação/destituição de um presidente de tribunal deveria ser submetida à aprovação do Conselho Nacional da Magistratura ou da Assembleia Geral dos Juízes do respetivo tribunal, tomada por uma maioria simples dos votos. Além disso, de acordo com o Regulamento Interno, o Ministro da Justiça tem competência para estabelecer «regras pormenorizadas sobre a atribuição de processos» e o «método de atribuição aleatória de processos» e pode igualmente estabelecer regras especiais quando a atribuição aleatória de processos é impossível ou ineficaz. Conforme sublinhado pela Comissão de Veneza, este poder pode ser utilizado para interferir no sistema de atribuição aleatória de processos, pelo que a definição do método de distribuição de processos não deveria constituir um poder discricionário do Ministro da Justiça.
(159)Além disso, os pareceres do Supremo Tribunal, do Conselho Nacional da Magistratura e do Provedor de Justiça salientaram que as disposições em causa suscitam preocupações em matéria de constitucionalidade. Em especial, a possibilidade de o Ministro da Justiça destituir presidentes de tribunais viola os princípios da independência do poder judicial e da separação de poderes. No entanto, nas atuais circunstâncias, a constitucionalidade destas disposições já não pode ser verificada e garantida por um Tribunal Constitucional independente.
(160)O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos estabeleceu uma ligação clara entre a destituição do cargo de presidente do tribunal e a independência do poder judicial. No processo Baka, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos considerou que a retirada prematura do requerente do seu cargo de Presidente do Supremo Tribunal, apesar de o requerente se manter em funções como juiz, em lugar de servir, contrariou o objetivo de manutenção da independência do poder judicial.
(161)Segundo as informações disponíveis, até à data o Ministro da Justiça destituiu 24 e nomeou, pelo menos, 32 presidentes de tribunais (este número inclui as nomeações para cargos vagos regulares).
(162)A resposta das autoridades polacas à Recomendação da Comissão de 26 de julho de 2017 não atenua as preocupações da Comissão e não anuncia quaisquer medidas concretas para sanar as questões colocadas pela Comissão. A resposta contesta que os poderes do Ministro da Justiça interfiram com a independência dos presidentes dos tribunais como juízes que se pronunciam sobre processos e sublinha que os poderes do Ministro dizem unicamente respeito às atividades administrativas dos presidentes dos tribunais. No entanto, a resposta ignora que o poder de destituição arbitrária dos presidentes de tribunais durante o período de seis meses permite ao Ministro manter a influência sobre estes, o que poderá afetar a sua independência pessoal ao julgarem processos.
4.3.2. Outras preocupações
(163)O Ministro da Justiça pode dirigir ao presidente de um tribunal de instância inferior «observações escritas» relativas à alegada má gestão do tribunal por este último. Em consequência dessas «observações escritas», o presidente do tribunal de instância inferior pode sofrer uma redução da remuneração ligada ao cargo de até 50 % por um período máximo de seis meses. O próprio Ministro pode emitir uma «notificação escrita» dirigida ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de recurso e reduzir a remuneração ligada ao cargo em conformidade. Dado que qualquer redução dos emolumentos de um juiz em consequência do comportamento do mesmo deve ser considerada uma sanção disciplinar, o Ministro da Justiça não deveria poder decidir, por si só, sobre a referida redução, sem qualquer decisão judicial subjacente.
4.4. Outra legislação
4.4.1. Lei da Escola Nacional de Magistratura
(164)A nova legislatura adotou outros diplomas que suscitam preocupações quanto à independência do poder judicial e à separação de poderes.
(165)Nos termos do disposto no artigo 2.º, n.os 1 e 36, da lei que altera a Lei da Escola Nacional de Magistratura, aos juízes-adjuntos são confiadas funções de juiz em tribunais de comarca durante um período de quatro anos. Em especial, os juízes-adjuntos serão habilitados a atuar como juízes únicos nos tribunais de comarca.
(166)Todavia, nos termos do sistema jurídico polaco, os juízes-adjuntos não beneficiam do mesmo estatuto dos juízes. Os juízes-adjuntos são nomeados para um mandato limitado de quatro anos e decorridos 36 meses podem começar a candidatar-se a novos procedimentos para se tornarem juízes. Os juízes-adjuntos não estão abrangidos pelas garantias de proteção da independência do poder judicial aplicadas aos juízes, nomeadamente no que diz respeito à nomeação, que não está sujeita às mesmas regras. Ao contrário do que acontece com o cargo de juiz, o cargo de juiz-adjunto que desempenha funções judiciais não está previsto na Constituição. Assim, o seu estatuto e as garantias da sua independência podem ser alterados pelo direito comum e não exigem qualquer alteração da Constituição. O facto de os juízes-adjuntos estarem habilitados a atuar como juízes únicos nos tribunais de comarca faz com que a questão da sua independência seja ainda mais importante.
(167)Durante o processo legislativo de aprovação da Lei da Escola Nacional de Magistratura, o Supremo Tribunal e o Conselho Nacional da Magistratura manifestaram preocupações em relação à conformidade das garantias de independência dos juízes-adjuntos com a Constituição e à sua suficiência para satisfazer os requisitos de direito a um processo equitativo consagrados no artigo 6.º, n.º 1, da CEDH. O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos sustentou que o regime anterior relativo aos juízes-adjuntos na Polónia não satisfazia esses critérios.
(168)A resposta das autoridades polacas, recebida em 28 de agosto de 2017, à Recomendação da Comissão de 26 de julho de 2017 não atenua as preocupações da Comissão e não anuncia quaisquer medidas concretas para sanar as questões colocadas pela Comissão.
4.4.2. Outras leis
(169)As Leis do Ministério Público fundiram os gabinetes do Ministro da Justiça e do Procurador-Geral da República e aumentaram significativamente os poderes do Procurador-Geral da República na gestão do sistema de ação penal, incluindo novas competências que habilitam o Ministro da Justiça a intervir diretamente em processos individuais.
(170)Conforme salientado pela Comissão de Veneza, embora reconhecendo que a independência ou autonomia do Ministério Público não é tão categórica em natureza como a dos tribunais, a combinação da fusão do gabinete do Ministro da Justiça e do gabinete do Procurador-Geral da República, o aumento dos poderes do Procurador-Geral da República face ao sistema de ação penal, o aumento dos poderes do Ministro da Justiça em relação ao poder judicial por força da Lei de Organização dos Tribunais Comuns e a fragilidade dos contrapesos a esses poderes resultam na acumulação de demasiados poderes numa só pessoa. Este facto tem consequências negativas diretas para a independência do sistema de ação penal face à esfera política, mas também para a independência do poder judicial e, por conseguinte, para a separação de poderes e o Estado de direito na Polónia.
5.Verificação de um risco manifesto de violação grave dos valores consagrados no artigo 2.º do Tratado da União Europeia
(171)Nos termos do artigo 7.º, n.º 1, do TUE, o Conselho, sob proposta fundamentada de um terço dos Estados-Membros, do Parlamento Europeu ou da Comissão Europeia, deliberando por maioria qualificada de quatro quintos dos seus membros e após aprovação do Parlamento Europeu, pode verificar a existência de um risco manifesto de violação grave dos valores referidos no artigo 2.º do TUE por um Estado-Membro. Antes de proceder a essa verificação, o Conselho deve ouvir o Estado-Membro em questão e pode dirigir-lhe recomendações, deliberando de acordo com o mesmo procedimento.
(172)A Comissão é de opinião que a situação descrita nas secções anteriores representa um risco manifesto de violação grave, por parte da República da Polónia, do Estado de direito consagrado no artigo 2.º do TUE. A Comissão chegou a essa conclusão após ter analisado os factos supramencionados.
(173)A Comissão observa que, num período de dois anos, foram adotadas mais de 13 leis consecutivas que afetam toda a estrutura do sistema judicial na Polónia: Tribunal Constitucional, Supremo Tribunal, tribunais comuns, Conselho Nacional da Magistratura, Ministério Público e Escola Nacional de Magistratura. A característica comum de todas estas alterações legislativas reside no facto de os poderes legislativo e executivo serem sistematicamente habilitados a interferir significativamente na composição, nos poderes, na administração e no funcionamento dessas autoridades e órgãos. As alterações legislativas e os seus efeitos combinados colocam em sério risco a independência do sistema judicial e a separação de poderes na Polónia, que são elementos fundamentais do Estado de direito. A Comissão observa também que esta intensa atividade legislativa foi realizada sem uma consulta adequada de todas as partes interessadas, sem o necessário e devido espírito de cooperação leal entre autoridades estatais e sem ter em consideração os pareceres de uma vasta gama de organizações europeias e internacionais.
(174)A Comissão estabeleceu um diálogo aprofundado com as autoridades polacas desde janeiro de 2016 a fim de encontrar soluções para as questões levantadas. Durante este processo, a Comissão tem sempre fundamentado as suas preocupações de uma forma objetiva e exaustiva. De acordo com o Quadro do Estado de Direito, a Comissão emitiu um parecer seguido de três recomendações relativas ao Estado de direito na Polónia. Foram trocadas numerosas cartas e realizadas reuniões com as autoridades polacas. A Comissão tornou sempre claro que estava disposta a prosseguir um diálogo construtivo e convidou repetidamente as autoridades polacas para outras reuniões com esse fim em vista. No entanto, apesar dos esforços desenvolvidos, o diálogo não dissipou as preocupações da Comissão.
(175)Não obstante a emissão de três recomendações da Comissão, a situação tem-se vindo a deteriorar continuamente. Em especial:
(1)A nomeação ilegal do Presidente do Tribunal Constitucional, a admissão dos três juízes nomeados pela 8.ª legislatura do Sejm sem base jurídica válida, o facto de um desses juízes ter sido nomeado Vice-Presidente do Tribunal, o facto de os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela anterior legislatura não terem podido assumir as suas funções de juízes no Tribunal, bem como os desenvolvimentos subsequentes no Tribunal descritos supra, conduziram, de facto, à remodelação total do Tribunal à margem do processo constitucionalmente previsto para a nomeação de juízes. Por este motivo, a Comissão considera que a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional se encontram seriamente comprometidas e, em consequência, a constitucionalidade das leis polacas já não pode ser efetivamente garantida. Deixou de ser possível considerar que os acórdãos proferidos pelo Tribunal nestas circunstâncias constituem uma fiscalização constitucional eficaz.
(2)A Lei do Conselho Nacional da Magistratura e a Lei do Supremo Tribunal, também em combinação com a Lei da Escola Nacional da Magistratura, bem como a Lei de Organização dos Tribunais Comuns aumentam significativamente a ameaça sistémica ao Estado de direito identificada nas recomendações anteriores. Resumem-se em seguida as principais preocupações:
(a)No que diz respeito ao Supremo Tribunal:
–A reforma compulsiva de um número significativo dos atuais juízes do Supremo Tribunal, em combinação com a possibilidade de prolongamento do seu mandato judicial ativo, bem como o novo regime disciplinar aplicável aos juízes do Supremo Tribunal, comprometem de forma estrutural a independência dos juízes do Supremo Tribunal, apesar de a independência do poder judicial constituir uma componente fundamental do Estado de direito;
–A reforma compulsiva de um número significativo dos atuais juízes do Supremo Tribunal permite também uma remodelação profunda e imediata do Supremo Tribunal. Essa possibilidade suscita preocupações no que diz respeito à separação de poderes, em especial quando considerada em combinação com as reformas simultâneas do Conselho Nacional da Magistratura. De facto, todos os novos juízes do Supremo Tribunal serão nomeados pelo Presidente da República sob recomendação do recém-formado Conselho Nacional da Magistratura, que será em larga medida dominado por nomeações políticas. Em consequência, a atual maioria parlamentar poderá determinar, pelo menos indiretamente, a futura composição do Supremo Tribunal em muito maior medida do que seria possível num sistema em que as regras em vigor em matéria de duração dos mandatos judiciais fossem aplicadas normalmente — qualquer que seja essa duração e o órgão do Estado com poder para decidir sobre as nomeações de juízes;
–O novo procedimento de recurso extraordinário suscita preocupações quanto à segurança jurídica e, quando considerado em combinação com a possibilidade de uma ampla e imediata remodelação do Supremo Tribunal, quanto ao respeito do princípio da separação de poderes.
(b)No que diz respeito aos tribunais comuns:
–Ao diminuírem a idade de reforma dos juízes ao mesmo tempo que subordinam o prolongamento do mandato judicial à decisão discricionária do Ministro da Justiça, as novas regras comprometem o princípio da inamovibilidade dos juízes, que constitui um elemento fundamental para a independência dos juízes;
–O poder discricionário do Ministro da Justiça de nomeação e destituição dos presidentes dos tribunais sem estar sujeito ao respeito de critérios concretos, sem obrigação de fundamentação, sem que os órgãos judiciais tenham a possibilidade de bloquear essas decisões e sem fiscalização jurisdicional disponível, pode afetar a independência pessoal dos presidentes dos tribunais e de outros juízes.
(c)No que diz respeito à Lei do Conselho Nacional da Magistratura:
–As preocupações quanto à independência geral do sistema judicial são intensificadas com o termo do mandato de todos os juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura e com a renomeação dos seus juízes membros segundo um processo que permite um elevado grau de influência política.
(176)As novas leis suscitam sérias preocupações no que diz respeito à sua compatibilidade com a Constituição polaca conforme sublinhado em vários pareceres, nomeadamente do Supremo Tribunal, do Conselho Nacional da Magistratura e do Provedor de Justiça. No entanto, conforme explicado na Recomendação relativa ao Estado de Direito de 26 de julho de 2017, já não é possível proceder a uma fiscalização constitucional efetiva destas leis.
(177)As ações e declarações públicas do Governo polaco e de membros do Parlamento da maioria governativa contra juízes e tribunais na Polónia minaram a confiança em todo o sistema judicial. A Comissão sublinha o princípio da cooperação leal entre os órgãos do Estado que, como salientado nos pareceres da Comissão de Veneza, constitui uma condição constitucional prévia num Estado democrático regido pelo Estado de direito.
(178)Dado que a independência do poder judicial é uma componente essencial do Estado de direito, estas novas leis, e nomeadamente o seu efeito combinado, aumentam consideravelmente a ameaça sistémica ao Estado de direito já assinalada nas recomendações anteriores. A este respeito, a Comissão de Veneza sublinhou que a combinação das alterações propostas amplia o efeito negativo de cada uma delas na medida em que põe em sério risco a independência de todas as partes do sistema judicial na Polónia.
(179)O facto de as autoridades polacas, na sequência da suspensão da Lei do Supremo Tribunal e da Lei do Conselho Nacional da Magistratura adotadas em julho de 2017, não terem aproveitado esta ocasião para ter em conta as preocupações expressas pela Comissão na sua terceira recomendação, bem como por outras entidades, nomeadamente a Comissão de Veneza, revela claramente a falta de interesse das autoridades polacas em responder a estas preocupações.
(180)As consequências desta situação são particularmente graves:
(1)Uma vez que a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional se encontram seriamente comprometidas, a constitucionalidade das leis polacas deixa de poder ser efetivamente garantida. Esta situação é particularmente preocupante no que diz respeito ao cumprimento do Estado de direito uma vez que, conforme explicado nas recomendações da Comissão, o Parlamento polaco adotou uma série de novos atos legislativos especialmente sensíveis, como a nova Lei da Função Pública, uma lei que altera a Lei dos Serviços de Polícia e determinadas outras leis, as leis do Ministério Público, uma Lei do Provedor de Justiça e que altera determinadas outras leis, a Lei do Conselho Nacional da Comunicação Social e uma Lei de Luta contra o Terrorismo.
(2)O respeito do Estado de direito não é só uma condição prévia para a proteção de todos os valores fundamentais referidos no artigo 2.º do TUE. Constitui também uma condição prévia para a defesa de todos os direitos e obrigações decorrentes dos Tratados, bem como para a criação de um clima de confiança mútua entre os cidadãos, as empresas e as autoridades nacionais nos sistemas jurídicos de todos os outros Estados-Membros.
(3)A Comissão sublinha que o bom funcionamento do Estado de direito é também essencial, em particular, para o funcionamento continuado do mercado interno e para um ambiente propício ao investimento, porquanto os operadores económicos necessitam de ter a certeza que serão tratados em condições de igualdade ao abrigo da lei. O respeito do Estado de direito é também essencial para um clima de confiança mútua nos domínios da justiça e dos assuntos internos, em particular para uma cooperação judicial eficaz em matéria civil e penal baseada no reconhecimento mútuo. Tal não pode ser assegurado sem um poder judicial independente em todos os Estados-Membros.
(181)A Comissão recorda que, sempre que tenha sido instituído um sistema de justiça constitucional, a sua eficácia constitui uma componente essencial do Estado de direito.
(182)A Comissão também sublinha que qualquer que seja o sistema de justiça escolhido, a independência do poder judicial tem de ser salvaguardada em consonância com o direito da UE. Cabe aos Estados-Membros organizar os respetivos sistemas judiciais, nomeadamente decidir sobre a criação ou não de um Conselho da Magistratura cuja função é garantir a independência do poder judicial. Contudo, nos casos em que tal Conselho tenha sido criado por um Estado-Membro, como é o caso na Polónia em que a Constituição polaca confiou explicitamente ao Conselho Nacional da Magistratura a missão de salvaguardar a independência do poder judicial, a independência desse Conselho deve ser garantida em consonância com as normas europeias.
(183)A Comissão salienta também que muitos intervenientes a nível europeu e internacional manifestaram a sua profunda preocupação quanto à situação do Estado de direito na Polónia e que o Parlamento Europeu declarou que a situação atual na Polónia representa um risco manifesto de violação grave dos valores consagrados no artigo 2.º do TUE.
(184)Após dois anos de diálogo com as autoridades polacas que não produziu resultados e não permitiu evitar uma maior deterioração da situação, é necessário e proporcionado iniciar uma nova fase de diálogo que associe formalmente o Parlamento Europeu e o Conselho.
(185)Tendo em conta o exposto, e de acordo com o artigo 7.º, n.º 1, do TUE, a Comissão apresenta a presente proposta fundamentada ao Conselho, convidando-o a verificar que existe um risco manifesto de violação grave, pela República da Polónia, do Estado de direito, que constitui um dos valores consagrados no artigo 2.º do TUE, e a dirigir recomendações adequadas à Polónia sobre esta matéria. Em anexo à presente proposta fundamentada é apresentada uma proposta de decisão do Conselho sobre a matéria.
(186)A presente proposta fundamentada ao abrigo do artigo 7.º, n.º 1, do TUE, é emitida em simultâneo com a Recomendação da Comissão de 20 de dezembro de 2017 relativa ao Estado de direito na Polónia. A Comissão está disposta, em estreita consulta com o Parlamento Europeu e o Conselho, a reconsiderar a presente proposta fundamentada caso as autoridades polacas ponham em prática as ações recomendadas estabelecidas na referida recomendação no prazo nela fixado.
2017/0360 (NLE)
Proposta de
DECISÃO DO CONSELHO
relativa à verificação da existência de um risco manifesto de violação grave, pela República da Polónia, do Estado de direito
O CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA,
Tendo em conta o Tratado da União Europeia, nomeadamente o artigo 7.º, n.º 1,
Tendo em conta a proposta fundamentada da Comissão Europeia,
Tendo em conta a aprovação do Parlamento Europeu,
Considerando o seguinte:
1)A União Europeia está alicerçada nos valores consagrados no artigo 2.º do Tratado da União Europeia («TUE»), que são comuns aos Estados-Membros e entre os quais figura o respeito do Estado de direito.
2)Na sua proposta fundamentada, a Comissão apresenta as suas preocupações com a inexistência de uma fiscalização constitucional independente e legítima e com a adoção pelo Parlamento da Polónia da Lei do Supremo Tribunal, da Lei de Organização dos Tribunais Comuns, da Lei do Conselho Nacional da Magistratura e da Lei da Escola Nacional de Magistratura, que contêm disposições que suscitam sérias preocupações quanto à independência do poder judicial, à separação de poderes e à segurança jurídica. Em particular, as principais preocupações dizem respeito aos novos regimes de reforma dos juízes do Supremo Tribunal e dos tribunais comuns, a um novo procedimento de recurso extraordinário no Supremo Tribunal, à destituição e nomeação dos presidentes dos tribunais comuns, à cessação dos mandatos e ao procedimento de nomeação dos juízes membros do Conselho Nacional da Magistratura.
3)A Comissão salientou também que as autoridades polacas não tomaram as medidas recomendadas na sua Recomendação de 27 de julho de 2016 e nas Recomendações complementares de 21 de dezembro de 2016 e de 26 de julho de 2017, a fim de fazer face à ameaça sistémica ao Estado de direito identificada nas referidas recomendações.
4)Em 20 de dezembro de 2017, em paralelo à sua proposta fundamentada ao abrigo do artigo 7.º, n.º 1, do TUE, a Comissão adotou uma nova recomendação relativa ao Estado de direito na Polónia. No entanto, a Polónia não tomou as medidas recomendadas no prazo estabelecido na referida recomendação.
5)O diálogo entre a Comissão e as autoridades polacas no âmbito do Quadro do Estado de Direito que tem sido mantido desde 13 de janeiro de 2016 não permitiu pois atenuar as preocupações supramencionadas.
6)Em 15 de novembro de 2017, o Parlamento Europeu adotou uma resolução em que declara que a situação atual na Polónia constitui um risco manifesto de violação grave dos valores referidos no artigo 2.º do TUE.
7)Um vasto leque de intervenientes a nível europeu e internacional manifestou a sua profunda preocupação com a situação do Estado de direito na Polónia, nomeadamente a Comissão de Veneza, o Comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, o Conselho Consultivo dos Juízes Europeus, a Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas, o Relator Especial das Nações Unidas para a Independência dos Juízes e dos Advogados, a Rede dos Presidentes dos Supremos Tribunais da União Europeia, a Rede Europeia dos Conselhos de Justiça, o Conselho das Ordens de Advogados da União Europeia, bem como inúmeras organizações da sociedade civil.
8)Em [...] de 2018, o Conselho ouviu a República da Polónia, em conformidade com o artigo 7.º, n.º 1, segunda frase, do TUE.
9)Independentemente do modelo do sistema de justiça escolhido num Estado-Membro, o Estado de direito consagrado no artigo 2.º do TUE estabelece requisitos relativos à independência do sistema judicial, à separação de poderes e à segurança jurídica.
10)É motivo de grande preocupação que, em consequência das leis supramencionadas recentemente adotadas, o regime jurídico na Polónia tenha deixado de respeitar estes requisitos.
11)O respeito do Estado de direito não é só uma condição prévia para a proteção de todos os valores fundamentais referidos no artigo 2.º do TUE. Constitui também uma condição prévia para a defesa de todos os direitos e obrigações decorrentes dos Tratados, bem como para a criação de um clima de confiança mútua entre os cidadãos, as empresas e as autoridades nacionais nos sistemas jurídicos de todos os outros Estados-Membros.
12)O bom funcionamento do Estado de direito é também essencial para o funcionamento eficaz do mercado interno, porquanto os operadores económicos têm necessidade de ter a certeza que serão tratados em condições de igualdade perante a lei.
13)O respeito do Estado de direito é essencial para um clima de confiança mútua nos domínios da justiça e dos assuntos internos, em particular para uma cooperação judicial eficaz em matéria civil e penal baseada no reconhecimento mútuo.
14)O princípio da cooperação leal entre os órgãos do Estado constitui uma condição constitucional prévia num Estado democrático regido pelo Estado de direito.
15)Por estas razões, deve concluir-se que, nos termos do artigo 7.º, n.º 1, do TUE, existe um risco manifesto de violação grave, pela República da Polónia, do Estado de direito, que constitui um dos valores consagrados no artigo 2.º do TUE.
ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:
Artigo 1.º
Verifica-se a existência de um risco manifesto de violação grave, pela República da Polónia, do Estado de direito.
Artigo 2.º
O Conselho recomenda à República da Polónia que tome as seguintes medidas no prazo de três meses a contar da notificação da presente decisão no sentido de:
(a)Restabelecer a independência e a legitimidade do Tribunal Constitucional enquanto garante da Constituição polaca, assegurando que os seus juízes, o seu Presidente e o seu Vice-Presidente sejam legalmente eleitos e nomeados, aplicando plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 3 e 9 de dezembro de 2015, que exigem que os três juízes legalmente nomeados em outubro de 2015 pela anterior legislatura possam assumir as suas funções de juiz no Tribunal Constitucional e assegure que os três juízes nomeados pela nova legislatura sem base jurídica válida deixem de poder julgar processos até serem validamente eleitos;
(b)Publicar e aplicar plenamente os acórdãos do Tribunal Constitucional de 9 de março de 2016, de 11 de agosto de 2016 e de 7 de novembro de 2016;
(c)Velar por que a Lei do Supremo Tribunal, a Lei de Organização dos Tribunais Comuns, a Lei do Conselho Nacional da Magistratura e a Lei da Escola Nacional da Magistratura sejam alteradas com vista a assegurar a sua conformidade com os requisitos relativos à independência do sistema judicial, à separação de poderes e à segurança jurídica;
(d)Assegurar que qualquer reforma da justiça seja preparada em estreita cooperação com o poder judicial e com todas a partes interessadas, incluindo a Comissão de Veneza;
(e)Abster-se de ações e declarações públicas que possam prejudicar a legitimidade do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal, dos tribunais comuns, dos juízes, individual ou coletivamente, ou do poder judicial no seu todo.
A destinatária da presente decisão é a República da Polónia.
Feito em Bruxelas, em
Pelo Conselho
O Presidente