COMISSÃO EUROPEIA
Bruxelas, 26.6.2017
COM(2017) 340 final
RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU E AO CONSELHO
sobre a avaliação dos riscos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo relacionados com atividades transnacionais a que está exposto o mercado interno
{SWD(2017) 241 final}
1.Introdução
O branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo são desafios importantes e em constante evolução que é necessário combater ao nível da União Europeia (UE). Os recentes ataques terroristas e os escândalos financeiros recorrentes exigem medidas mais vigorosas neste domínio.
No contexto do mercado interno, os fluxos financeiros são integrados e transnacionais por natureza, e o dinheiro pode circular rapidamente, quando não instantaneamente, de um Estado-Membro para outro, permitindo que os criminosos e os terroristas movimentem fundos de país em país sem serem detetados pelas autoridades.
Para fazer face a estes fenómenos transnacionais, o quadro da UE em matéria de antibranqueamento de capitais e combate ao financiamento do terrorismo (ABC/CFT) definiu regras comuns relativas aos controlos e às obrigações de prestação de informações que incumbem às instituições financeiras e a outros agentes económicos, e estabeleceu um enquadramento sólido para as unidades de informação financeira (UIF) da UE analisarem as operações suspeitas e cooperarem entre si. Não obstante os progressos significativos e constantes realizados neste domínio, há ainda que redobrar esforços e adotar medidas adicionais para colmatar eventuais lacunas e combater eficazmente o branqueamento de capitais (BC) e o financiamento do terrorismo (FT).
O presente relatório sobre a avaliação supranacional dos riscos (ASR) de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo relacionados com atividades transnacionais a que está exposto o mercado interno é o primeiro relatório elaborado a nível supranacional na União Europeia. Nele se analisam os riscos de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo que a UE pode ter de enfrentar, propondo-se uma abordagem global para lhes dar resposta.
Nos termos do artigo 6.º da Diretiva (UE) 2015/849 relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo (4.ª Diretiva Antibranqueamento de Capitais, ou 4AMLD, do inglês 4th Anti-Money Laundering Directive)
a Comissão devia elaborar, até 26 de junho de 2017, um relatório sobre a identificação, análise e avaliação dos riscos de BC e FT a nível da União. A publicação da presente avaliação supranacional é também resultado da Agenda Europeia para a Segurança
e do Plano de Ação para reforçar a luta contra o financiamento do terrorismo
.
É indispensável dispor de uma compreensão e uma análise claras dos riscos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo para poder formular uma resposta política eficiente e adequada. A avaliação dos riscos é particularmente importante para o mercado interno, uma vez que os fluxos financeiros são integrados e transnacionais por natureza.
A avaliação supranacional dos riscos (ASR) utiliza uma metodologia definida
para proceder à análise sistemática dos riscos de BC ou de FT associados aos modi operandi utilizados pelos criminosos. O objetivo não é julgar um setor no seu conjunto, mas sim identificar as circunstâncias em que os serviços e produtos que presta ou fornece podem ser abusivamente utilizados para fins de financiamento do terrorismo ou de branqueamento de capitais. A presente ASR baseia-se na Diretiva 2005/60/CE (3ª Diretiva Antibranqueamento de Capitais, ou 3AMLD, do inglês 3rd Anti-Money Laundering Directive), que era a legislação em vigor na altura em que a análise foi efetuada. Descreve, assim, os domínios em que o quadro jurídico da UE não estava tão harmonizado ou completo como ficaria quando as revisões subsequentes da 3AMLD produzissem efeito.
A ASR centra-se nas vulnerabilidades identificadas a nível da UE, tanto em termos de quadro jurídico como de aplicação efetiva, mas tal não prejudica as medidas de mitigação que alguns Estados-Membros estão a aplicar ou podem decidir aplicar em resposta aos seus próprios riscos de BC/FT a nível nacional. Por conseguinte, é possível que já estejam a aplicar algumas das recomendações abaixo formuladas, ou que tenham adotado regras mais estritas do que as regras mínimas definidas a nível da UE. A avaliação das medidas de mitigação das vulnerabilidades identificadas no presente relatório pode ser, portanto, considerada como uma base de referência adaptável em função das medidas nacionais que já estejam em vigor.
Nos termos do artigo 6.º da 4AMLD, caso os Estados-Membros decidam não aplicar qualquer uma das recomendações nos respetivos regimes nacionais ABC/CFT, devem notificar a Comissão desse facto e apresentar uma justificação para tal decisão («cumprir ou explicar»).
O presente relatório apresenta os principais riscos para o mercado interno numa vasta gama de setores e as vulnerabilidades horizontais que os podem afetar. Nesta base, o relatório descreve as medidas de mitigação que devem ser aplicadas a nível da UE e a nível nacional para enfrentar esses riscos, formulando uma série de recomendações dirigidas aos diversos intervenientes na luta contra o BC e o FT.
Embora a Comissão reconheça os riscos colocados por alguns países terceiros de risco elevado, esta primeira avaliação supranacional não inclui uma tal análise de risco geográfico. Esta opção decorre do facto de a análise dos riscos apresentados por essas jurisdições estar atualmente a ser efetuada no contexto de um processo separado, nomeadamente no âmbito dos atos delegados da Comissão que identificam as jurisdições de países terceiros que apresentam deficiências estratégicas que constituem uma ameaça significativa para o sistema financeiro da UE no que diz respeito ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo.
2.Resultados da ASR
A Comissão identificou 40 produtos e serviços que considera potencialmente vulneráveis aos riscos de BC/FT a que está exposto o mercado interno. Estão contemplados 11 setores profissionais, incluindo todos os setores definidos pela 4AMLD e alguns que não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação da diretiva, mas são considerados pertinentes para a avaliação supranacional dos riscos
. A Comissão pôde, assim, identificar os domínios do mercado interno em que existe um risco mais elevado e que constituem os meios mais generalizados utilizados pelos criminosos. A ASR examina, em primeiro lugar, os riscos associados a cada setor relevante. Simultaneamente, ao avaliar as medidas recomendadas para lhes fazer face, a Comissão examinou os meios mais generalizados utilizados pelos criminosos.
2.1.Principais riscos para o mercado interno nos setores abrangidos pela ASR
2.1.1.Setor financeiro
O setor financeiro está abrangido pelo quadro ABC/CFT da UE desde 1991 e parece conhecer perfeitamente os riscos com que está confrontado. Embora os terroristas e os criminosos continuem a tentar utilizá-lo em prol das suas atividades, a avaliação revela que o nível dos riscos de BC/FT para o setor financeiro é moderadamente significativo devido às medidas de mitigação já adotadas.
Todavia, o risco de branqueamento de capitais permanece significativo em determinados segmentos do setor financeiro, tais como a banca privada e o investimento institucional (nomeadamente através de corretores). Esta situação deve-se à exposição globalmente mais elevada a riscos relacionados com os produtos e os clientes, às pressões da concorrência no setor e a uma compreensão limitada por parte das autoridades de supervisão dos seus riscos operacionais em matéria de ABC/CFT. Os serviços de guarda de valores também figuram entre os que estão significativamente expostos a riscos de branqueamento de capitais devido a limitações das capacidades de controlo das entidades obrigadas – e à existência de locais de depósito não regulamentados (p.ex. zonas francas).
Os serviços de moeda eletrónica ou de transferência de valores em dinheiro (ou seja, envios de fundos) são considerados significativamente ou mesmo muito significativamente expostos a riscos de BC/FT – os primeiros pelo anonimato que os caracterizam no quadro da 3AMLD e os segundos devido às desiguais capacidades de controlo das diversas entidades obrigadas. Em relação às agências de câmbio e envios de fundos, a aplicação das regras ABC/CFT unicamente a transações ocasionais superiores a 15 000 EUR afigura-se problemática, uma vez que os criminosos podem efetuar transferências de menor valor ao longo do tempo. Esta questão é particularmente problemática devido à inexistência de uma definição comum do que são operações relacionadas entre si ou efetivamente duradouras.
Os produtos emergentes – tais como as plataformas de financiamento coletivo e as moedas virtuais – parecem estar significativamente expostos a riscos de BC/FT. Alguns Estados-Membros decidiram legislar sobre estes produtos financeiros a nível nacional, mas o quadro jurídico da UE estabelecido pela 3AMLD continua a ser globalmente insuficiente. A FinTech
(tecnologia financeira) visa introduzir novas soluções tecnológicas para tornar os produtos financeiros mais céleres, seguros e eficientes, mas também pode criar novas oportunidades para os criminosos. A adaptação à evolução tecnológica em curso exigirá uma análise mais aprofundada para compreender os riscos que os produtos deste setor em rápido desenvolvimento poderão colocar e explorar as possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias para melhorar os esforços em matéria de ABC/CFT.
Por último, a avaliação demonstrou que os pedidos fraudulentos de créditos ao consumo e empréstimos de baixo valor têm constituído uma prática recorrente em casos de ataques terroristas recentes. Há um baixo nível de sensibilização e divergências na aplicação dos requisitos ABC/CFT a nível nacional relativamente a tais produtos.
2.1.2.Setor do jogo
A 3AMLD não sujeitou o setor do jogo aos requisitos ABC/CFT, exceto no caso dos casinos, mas por força da 4AMLD todos os prestadores de serviços do setor do jogo passaram a ser entidades obrigadas. Todavia, os Estados-Membros podem decidir conceder isenções totais ou parciais aos prestadores de determinados serviços de jogo, com base num risco comprovadamente baixo. Os Estados-Membros devem tomar em consideração as conclusões pertinentes da presente ASR.
Nesta fase, é considerado que determinados produtos de jogo estão significativamente expostos a riscos de BC. No caso das apostas em locais físicos e do póquer, tal exposição parece dever-se, em particular, à ineficácia dos controlos, que resulta quer do facto de essas atividades envolverem, pela sua natureza, volumes significativos de transações rápidas e anónimas, muitas vezes em numerário, quer do facto de decorrerem entre pares sem uma supervisão adequada. O jogo em linha implica um risco elevado de exposição devido aos enormes volumes de transações/fluxos financeiros que ocorrem de forma não presencial. Permite a utilização de meios de pagamento anónimos, mas simultaneamente oferece um importante elemento de mitigação dos riscos ao permitir que as transações sejam rastreadas. As lotarias e as máquinas de jogo (fora dos casinos) apresentam um nível moderado de riscos de BC/FT. As lotarias desenvolveram um certo nível de controlo, em particular para combater os riscos associados aos prémios elevados. Embora os casinos apresentem uma exposição intrinsecamente elevada ao risco, a sua inclusão no quadro ABC/CFT a partir de 2005 levou à mitigação dos riscos de BC/FT. Ao bingo em locais físicos é atribuído um baixo nível de riscos de BC/FT por envolver apostas e prémios relativamente baixos.
2.1.3.
Empresas e profissões não financeiras designadas
Globalmente, a exposição do setor não financeiro aos riscos de BC/FT é considerado significativo ou mesmo muito significativo. A identificação do beneficiário efetivo do cliente parece ser a principal fragilidade neste setor, nomeadamente no caso dos prestadores de serviços a sociedades ou fundos fiduciários (trusts), consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes. A análise revelou que, por vezes, o próprio conceito de beneficiário efetivo não é adequadamente compreendido nem corretamente verificado quando se estabelecem relações de negócio.
No caso específico dos profissionais que exercem atividades abrangidas pelo princípio do sigilo profissional (consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes), a aplicação das regras ABC/CFT afigura-se difícil. O sigilo profissional é um princípio importante, reconhecido a nível da UE, que reflete o delicado equilíbrio decorrente da jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o direito a um processo equitativo, a qual reflete, por sua vez, os princípios consagrados pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (nomeadamente o seu artigo 47.º).
Nos termos do quadro ABC da UE, esses profissionais estão isentos da obrigação de prestar informações quando defendem os clientes em processos judiciais (sigilo profissional), o que aumenta o risco de utilização abusiva. Com efeito, há casos em que estes profissionais exercem, por vezes, atividades claramente abrangidas pela própria essência do sigilo profissional (como seja a determinação da situação jurídica do seu cliente ou a defesa ou representação do cliente em juízo), em paralelo com outras que não estão por este abrangidas, como a prestação de consulta jurídica no contexto da criação, exploração ou gestão de sociedades. Aparentemente, há situações em que alguns desses profissionais consideram que todas estas atividades estão abrangidas pelo princípio do sigilo profissional, o que pode levar ao incumprimento das obrigações de ABC/CFT em relação a uma parte das atividades. Importa salientar que o cumprimento das regras ABC/CFT não tem qualquer interferência no princípio do sigilo profissional. Simultaneamente, é possível melhorar a sua interpretação e aplicação pelos profissionais que exercem atividades abrangidas por tal princípio. Seria igualmente benéfico que os consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes tivessem uma melhor compreensão do mesmo, uma vez que também são considerados entidades obrigadas nos termos da 4AMLD.
Além disso, com base no quadro jurídico atual da UE, são designados organismos de autorregulação para supervisionar os consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes, bem como os agentes imobiliários. Os Estados-Membros podem decidir que estes organismos de autorregulação são competentes para receber as comunicações de operações suspeitas diretamente das entidades obrigadas, sendo depois responsáveis pela transmissão imediata dessas comunicações não filtradas à unidade de informação financeira (UIF). As consultas revelaram que as entidades obrigadas e os organismos de autorregulação deste setor não comunicam muitas operações suspeitas às UIF, sobretudo em determinados Estados-Membros. Este facto poderá indiciar quer que as operações suspeitas não são corretamente detetadas e comunicadas, quer que o organismo de autorregulação não assegura uma transmissão sistemática das comunicações de operações suspeitas.
O setor imobiliário também está exposto a riscos significativos de branqueamento de capitais, devido aos múltiplos profissionais envolvidos nas transações imobiliárias (agentes imobiliários, instituições de crédito, notários e advogados). Outro meio habitual de branqueamento do produto de atividades criminosas é a sobrefaturação no setor do comércio («branqueamento de capitais através de operações comerciais») ou a contração de empréstimos fictícios. Os criminosos utilizam estes métodos para justificar a circulação do produto das atividades criminosas através dos canais bancários, recorrendo frequentemente a documentos falsos para negociar bens e serviços. Do mesmo modo, é frequente contraírem empréstimos fictícios entre si a fim de criarem uma operação financeira fictícia para justificar transferências de fundos de origem ilegal. As autoridades de aplicação da lei consideram que este risco é significativo.
2.1.4.Ativos em numerário e equivalentes
A ASR revelou que o numerário continua a ser o meio mais recorrentemente utilizado para fins de BC/FT, visto permitir que os criminosos ocultem a sua identidade. É por esse motivo que surge em quase todas as investigações ABC/CFT. No quadro da 3AMLD, as transações em numerário não eram adequadamente controladas no mercado interno por não existirem requisitos claros de regulamentação e de controlo. Alguns Estados-Membros impuseram a obrigação de comunicar as transações em numerário ou limites para os pagamentos em numerário, mas, na ausência de requisitos comuns para todos os Estados-Membros, os criminosos podem explorar facilmente as diferenças entre legislações. Do mesmo modo, o quadro da UE em matéria de controlo dos transportadores de fundos nas fronteiras externas da UE não assegura níveis adequados de mitigação, especialmente por não abranger produtos equivalentes a numerário como os produtos de elevada liquidez, nomeadamente o ouro, os diamantes ou os cartões pré-pagos anónimos de montantes elevados.
Além disso, os riscos apresentados pelos negociantes de bens de elevado valor que aceitam pagamentos em numerário superiores a 15 000 EUR são considerados significativos devido à exposição ao risco inerente e ao nível de controlo insuficiente. O facto de esses negociantes só estarem sujeitos às regras ABC/CFT se aceitarem pagamentos em numerário de valor elevado parece levar a uma aplicação ineficaz dessas regras. O desafio ainda é maior no caso das atividades que envolvam transações em numerário de forma intensiva. Estas atividades apenas estão sujeitas às regras ABC/CFT quando se enquadram na supracitada categoria dos negociantes de bens de elevado valor, apesar de poderem ser muito úteis para branquear as receitas em numerário das atividades criminosas.
A avaliação salienta igualmente que os ativos que oferecem facilidades semelhantes ao numerário (ouro, diamantes) ou os bens «de estilo de vida» com valor elevado e facilmente comercializáveis (p.ex. artefactos culturais, automóveis, joias, relógios) constituem também um risco elevado, dado serem insuficientemente controlados. O saque e o tráfico de antiguidades e outros artefactos foram especificamente referidos como motivo de preocupação: os artefactos saqueados podem servir de fonte de financiamento do terrorismo ou constituir, alternativamente, um meio atrativo de branqueamento de capitais.
2.1.5.Organizações sem fins lucrativos
As organizações sem fins lucrativos podem estar expostas a riscos de utilização abusiva para fins de financiamento do terrorismo. A análise da vulnerabilidade do setor não lucrativo ao financiamento do terrorismo não tem sido fácil, uma vez que este setor se caracteriza por uma diversidade de estruturas e atividades com graus variáveis de exposição ao risco e de perceção dos riscos. As dificuldades encontradas devem-se principalmente a esse panorama divergente e aos diferentes quadros jurídicos e práticas nacionais aplicáveis. As «organizações sem fins lucrativos expressivas» apresentam alguma vulnerabilidade por poderem ser infiltradas por organizações criminosas ou terroristas que ocultem os beneficiários efetivos, dificultando a rastreabilidade dos fundos angariados, ao passo que alguns tipos de «organizações sem fins lucrativos de serviços» são mais diretamente vulneráveis devido à natureza intrínseca da sua atividade. Esta vulnerabilidade decorre do facto de poderem envolver financiamentos de e para zonas de conflito ou países terceiros identificados pela Comissão como tendo deficiências estratégicas nos seus regimes nacionais de ABC/CFT. No entanto, considerou-se, durante a análise, que a diversidade que caracteriza o panorama das organizações sem fins lucrativos não impede que se identifiquem as características comuns das vulnerabilidades deste setor.
Nesse contexto, a análise demonstrou que as autoridades competentes nem sempre consideram os atuais requisitos ABC/ CFT adequados para responder às necessidades específicas do setor não lucrativo e que os controlos em vigor diferem consoante o Estado-Membro em causa. É reconhecido que esses controlos funcionam mais eficazmente em relação à angariação de fundos no interior da UE, o que torna o nível de vulnerabilidades inferior ao das transferências de fundos ou das despesas realizadas fora da UE, em que subsistem deficiências mais graves.
De um modo mais geral, a avaliação do setor não lucrativo revelou que este pode ser alvo de práticas de redução dos riscos, ou seja, algumas instituições financeiras podem ter relutância em prestar-lhe serviços financeiros como a abertura de uma conta bancária. Algumas transações financeiras podem ser recusadas, dependendo do país de destino dos fundos. Além disso, as organizações mais pequenas que não consigam apresentar provas de acreditação ou de registo fiscal podem ser impedidas de abrir contas bancárias. Segundo os representantes do setor lucrativo, a exclusão da prestação de serviços financeiros aumenta a utilização de numerário, que é muito mais vulnerável a utilizações abusivas para fins de BC/FT.
A prática de redução dos riscos que leva à exclusão financeira é uma preocupação que não deve ser esquecida quando se aborda a política de ABC/CFT. Os clientes não devem ser rejeitados pelos prestadores de serviços financeiros regulamentados e serem obrigados a recorrer a sistemas bancários paralelos ou a serviços paralelos de transferência de fundos. Contudo, o ABC/CFT é apenas um dos muitos fatores que levam à adoção de medidas de redução dos riscos. A nível da UE, a adoção da Diretiva relativa às Contas de Pagamento
permitirá aumentar muito o acesso a serviços financeiros básicos, reduzindo provavelmente o recurso a canais informais.
2.1.6.Hawala
Embora os serviços de transferência de valores apresentem os seus próprios riscos, a rede Hawala
e outros serviços informais de transferência de valores semelhantes constituem uma ameaça específica, em particular no contexto do financiamento do terrorismo. Em regra, todos os prestadores dos serviços de pagamento definidos no artigo 4.º, n.º 3, da segunda diretiva relativa aos serviços de pagamento (DSP2) devem estar devidamente registados e regulamentados. Esses prestadores de serviços devem procurar obter o estatuto de instituições de pagamento autorizadas ou, sob determinadas condições, de instituições de pagamento registadas. Normalmente, a Hawala e outros serviços informais de transferência de valores semelhantes são considerados ilegais, visto não estarem, em geral, registados nem cumprirem os requisitos da DSP2. Este problema torna-se mais complexo devido à dificuldade em detetar a existência da Hawala ou de outros serviços congéneres: muitas vezes as transações são agregadas, compensadas através de importações/exportações de mercadorias e deixam um rasto de informação limitado. A prática de redução dos riscos também é relevante neste aspeto, visto que os clientes rejeitados pelos prestadores de serviços financeiros regulamentados recorrem, por vezes, a serviços ilegais deste tipo.
2.1.7.Contrafação de moeda
A contrafação de moeda é um tipo transnacional de atividade ilegal com um elevado nível de circulação transnacional, tanto dos criminosos como da moeda contrafeita, e que envolve frequentemente grupos da criminalidade organizada. Os fundos provenientes do contrabando de moeda contrafeita têm de ser branqueados para poderem ser integrados no fluxo financeiro normal. Além disso, a moeda contrafeita pode ser distribuída através de redes terroristas para financiar o treino, o recrutamento, os ataques e a propaganda, que exigem grandes quantidades de fundos. O produto da contrafação pode ser investido no reforço da infraestrutura de apoio aos terroristas.
2.2.Vulnerabilidades horizontais
A Comissão identificou várias vulnerabilidades comuns a todos os setores.
2.2.1.O anonimato nas transações financeiras (numerário e outros produtos financeiros anónimos)
As organizações criminosas ou os grupos terroristas evitam deixar qualquer rasto de informação e procuram não ser detetadas quando exercem atividades ilegais. Pela sua própria natureza, as transações em numerário permitem um anonimato total, o que as torna um método de pagamento/transferência muito atraente para os criminosos. Os setores expostos a um nível elevado deste tipo de transações são considerados particularmente em risco. Este aspeto é especialmente relevante para as atividades que envolvem transações em numerário de forma intensiva, os comerciantes de bens e serviços que aceitam pagamentos em numerário e os operadores económicos que aceitam pagamentos em notas de valor facial elevado, tais como as notas de 500 e 200 EUR.
Os produtos financeiros que oferecem um anonimato semelhante em determinadas circunstâncias (como os produtos de moeda eletrónica anónimos, as moedas virtuais ou as plataformas de financiamento coletivo) são igualmente vulneráveis ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. Os seus níveis de risco diferem dos das transações em numerário porque exigem um planeamento mais sofisticado, envolvem volumes de transações mais baixos e podem ser objeto de algum controlo. Contudo, o seu caráter anónimo limita intrinsecamente as possibilidades de identificação e controlo. A mesma análise é aplicável a outros tipos de ativos, como o ouro e os diamantes, que são facilmente comercializados e podem ser guardados de forma segura. Trata-se de ativos fáceis de transferir e que, ao mesmo tempo, garantem o anonimato.
2.2.2.Identificação e acesso a informações sobre a propriedade efetiva
Os criminosos também utilizam o sistema financeiro para introduzir o produto das suas atividades ilícitas nos mercados financeiros, no setor imobiliário ou na economia legítima de uma forma mais estruturada do que com as transações em numerário ou as transações financeiras anónimas. Em primeiro lugar, todos os setores são vulneráveis ao risco de infiltração, integração ou apropriação pelas organizações da criminalidade organizada e os grupos terroristas. Em segundo lugar, uma técnica comum dos criminosos consiste em criar empresas de fachada, fundos fiduciários ou estruturas empresariais complexas para ocultar as suas identidades. Nesses casos, embora os fundos envolvidos possam ser claramente identificados, o beneficiário efetivo permanece desconhecido. Segundo as informações fornecidas pelas autoridades de aplicação da lei, nos principais casos de BC/FT foram recorrentemente utilizadas estruturas opacas para ocultar os beneficiários efetivos. Este problema generalizado não está circunscrito a determinadas jurisdições ou a determinados tipos de pessoas coletivas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica. Os criminosos utilizam o veículo mais conveniente, fácil e seguro em função da sua experiência, da sua localização e das práticas de mercado na sua jurisdição.
A 3AMLD contém regras sobre a definição dos beneficiários efetivos aquando do estabelecimento de relações de negócio. O limiar de 25 % de propriedade das ações para definir a existência de controlo é meramente indicativo e a identificação do «diretor de topo» como beneficiário efetivo constitui apenas um último recurso quando não é possível identificar nenhum outro beneficiário efetivo após uma avaliação documentada exaustiva (p.ex. participações fracionadas). Na prática, porém, as regras podem ser aplicadas de forma mecânica por determinadas entidades obrigadas e, nessas circunstâncias, é duvidoso que isso permita identificar o verdadeiro beneficiário efetivo.
2.2.3.Supervisão no mercado interno da UE
Algumas vulnerabilidades em termos de eficácia da supervisão financeira em contextos transnacionais são bem visíveis. Segundo o parecer conjunto das Autoridades Europeias de Supervisão (AES)
, a avaliação que as autoridades competentes fazem da conformidade do setor que supervisionam é muito variável. O aspeto mais difícil tem a ver com as situações em que entidades pertencentes ao mesmo grupo financeiro estão sujeitas à supervisão das autoridades competentes de vários Estados-Membros. Estas situações tornam a aplicação das regras ABC/CFT bastante complexa devido às persistentes diferenças da abordagem de supervisão ABC/CFT entre autoridades competentes e à incerteza sobre as responsabilidades de supervisão nos países de origem/acolhimento, sobretudo das instituições de pagamento e dos seus agentes estrangeiros. Gera-se, assim, o risco de as infrações ou os casos de utilização abusiva para cometer crimes financeiros não serem detetados. Além disso, afigura-se que, por vezes, as informações pertinentes não são partilhadas suficientemente ou em tempo útil entre as autoridades de supervisão competentes em matéria de ABC/CFT.
São diversas as razões para que tal aconteça:
- diferenças no estatuto das contrapartes;
- um quadro inadequado para o intercâmbio de informações ABC/CFT confidenciais;
- uma concentração excessiva na mera supervisão prudencial; e
- falta de enquadramento/mecanismos jurídicos para o intercâmbio de informações entre as autoridades de supervisão prudencial e as autoridades de supervisão financeira ABC/CFT
.
Por último, num pequeno número de casos, as autoridades de supervisão têm dificuldade em identificar as contrapartes pertinentes, uma vez que em alguns Estados-Membros a supervisão ABC/CFT está fragmentada. O parecer conjunto refere também que algumas autoridades de supervisão não identificam adequadamente os riscos de ABC/CFT associados aos setores que supervisionam e/ou não dispõem de procedimentos baseados no risco suficientes ou específicos para supervisionar tais riscos, especialmente no domínio do financiamento do terrorismo.
Quanto aos setores não financeiros, os Estados-Membros podem permitir que os organismos de autorregulação exerçam funções de supervisão em relação aos consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes e agentes imobiliários. Independentemente do modelo de supervisão seguido, esta apresenta insuficiências em termos de controlo, orientação e nível de comunicação das informações na grande maioria dos Estados-Membros.
2.2.4.Cooperação entre unidades de informação financeira
As UIF são responsáveis pela receção e a análise de informações sobre atividades financeiras suspeitas relativas ao branqueamento de capitais, ao financiamento do terrorismo e a infrações subjacentes associadas, bem como pela disseminação dos resultados da sua análise às autoridades competentes. Esta análise é essencial para as autoridades de aplicação da lei iniciarem novas investigações ou complementarem as existentes. Embora a colaboração entre as unidades de informação financeira da UE tenha aumentado significativamente ao longo da última década, ainda subsistem vulnerabilidades na cooperação das UIF.
Um relatório de inventário elaborado pela Plataforma de UIF identificou exaustivamente os obstáculos ao acesso, ao intercâmbio e à utilização das informações, bem como à cooperação operacional entre UIF. O relatório, concluído em dezembro de 2016
, descreve também os principais problemas jurídicos, práticos e operacionais. Com base neste relatório e na sua própria análise, a Comissão indicou vias possíveis para melhorar a cooperação das UIF da UE, num documento de trabalho dos serviços da Comissão publicado em separado.
2.2.5.Outras vulnerabilidades comuns a todos os setores
A ASR mostrou que todos os setores identificados estão expostos a algumas vulnerabilidades adicionais:
- a infiltração por criminosos: por vezes, os criminosos podem tornar-se proprietários de uma entidade obrigada ou procurar entidades obrigadas que estejam dispostas a ajudá-los nas suas atividades de branqueamento de capitais. Esta possibilidade torna os critérios de idoneidade pertinentes para todos os setores analisados;
- documentos falsos: a tecnologia moderna está a facilitar a criação de documentos falsos e todos os setores procuram instaurar mecanismos eficazes para a sua deteção;
- partilha insuficiente de informações entre o setor público e o setor privado: todas as entidades obrigadas salientaram a necessidade de mecanismos adequados de feedback por parte das UIF e de partilha de informações com as autoridades competentes. A comunicação de operações suspeitas por entidades obrigadas que operam em diversas jurisdições nacionais é outra dificuldade percetível;
- recursos, perceção dos riscos e know-how insuficientes para aplicar as regras ABC/CFT: enquanto certas entidades obrigadas investem em instrumentos de conformidade sofisticados, muitas delas têm uma sensibilização, instrumentos e capacidades mais limitados neste domínio; e
- novos riscos emergentes da FinTech: espera-se que a utilização de serviços em linha continue a aumentar na economia digital, impulsionando a procura de identificação em linha ao mesmo tempo que apresenta um risco acrescido devido a essas transações não presenciais. A utilização e a fiabilidade da identificação eletrónica são cruciais neste contexto.
3.Medidas de mitigação dos riscos identificados
Depois de avaliar os níveis de risco, o presente relatório descreve as medidas que, no entender da Comissão, deverão ser prosseguidas a nível da UE e dos Estados-Membros. Tais medidas resultam de uma avaliação das opções possíveis para enfrentar os riscos identificados. Neste exercício de ponderação, a Comissão teve em conta:
- o nível de riscos de BC/FT;
- a necessidade e a proporcionalidade envolvidas na adoção de medidas ou na recomendação de medidas a tomar pelos Estados-Membros;
- a necessidade e a proporcionalidade envolvidas na recomendação de medidas regulamentares e não regulamentares; e
- o impacto na privacidade e nos direitos fundamentais.
Além disso, a Comissão tomou em consideração a necessidade de evitar potenciais aplicações abusivas ou interpretações erradas das suas recomendações, que pudessem levar à exclusão de categorias inteiras de clientes e à cessação de relações com clientes, sem ter plena e devidamente em conta o nível de risco existente num determinado setor.
No decurso da avaliação, a Comissão identificou também os produtos que apenas apresentam um nível de risco pouco (ou moderadamente) significativo e em relação aos quais não se considera, por enquanto, necessário adotar novas medidas de mitigação. Consequentemente, as medidas apresentadas no presente relatório dizem apenas respeito aos riscos que, no entender da Comissão, devem ser objeto de medidas de mitigação adicionais. Esta abordagem visa permitir que os Estados-Membros identifiquem melhor as ações prioritárias em conformidade com a abordagem baseada no risco. Embora as recomendação dirigidas aos Estados-Membros abranjam múltiplas áreas, estão, na sua maioria, relacionadas com a legislação da UE e visam ajudar os Estados-Membros a prestarem especial atenção aos domínios mais expostos a riscos, quando dão cumprimento às obrigações que lhes incumbem. Esta avaliação não prejudica as medidas de mitigação que alguns Estados-Membros estão a aplicar ou podem decidir aplicar em resposta aos seus próprios riscos de BC/FT a nível nacional. Por conseguinte, é possível que os Estados-Membros já estejam a aplicar algumas das recomendações abaixo formuladas ou tenham adotado regras mais estritas do que as regras mínimas definidas a nível da UE.
A ASR procura fazer um ponto da situação dos riscos de BC/FT existentes na altura da sua publicação. Este exercício começou e terminou no período em que o quadro legislativo aplicável era a Diretiva 2005/60/CE (3AMLD). Embora a 4AMLD já tivesse sido adotada, o seu prazo de transposição não tinha ainda terminado. Por este motivo, não foi possível incluir qualquer avaliação dos efeitos concretos que a sua aplicação viria a ter. Contudo, as alterações do quadro da UE de luta contra o branqueamento de capitais introduzidas pela 4AMLD e as subsequentes propostas de alteração da mesma
foram tidas em conta na definição das medidas de mitigação, dado que estes dois instrumentos reforçarão consideravelmente o quadro jurídico em matéria de prevenção, mitigando, assim, algumas das vulnerabilidades e dos riscos anteriormente descritos.
3.1.Medidas de mitigação ao abrigo da 4AMLD
Ao abrigo da 4AMLD, a partir de 26 de junho de 2017, o quadro jurídico da UE inclui novos requisitos:
·o âmbito das entidades obrigadas foi alargado de modo a abranger os prestadores de serviços de jogo, os comerciantes que aceitam pagamentos em numerário superiores a 10 000 EUR e as transações ocasionais que constituam uma transferência de fundos (incluindo envios de fundos) de montante superior a 1 000 EUR;
·a abordagem baseada no risco foi reforçada;
·são criados registos de informações relativas à propriedade efetiva para facilitar a identificação dos beneficiários efetivos de pessoas coletivas e de alguns centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica;
·o anonimato dos produtos de moeda eletrónica é reduzido;
·o novo nível das sanções aumenta o efeito dissuasivo;
·é estabelecido um novo regime de cooperação entre as UIF na UE.
Espera-se que estas novas medidas diminuam substancialmente os níveis de risco em todos os setores. A Comissão irá analisar o cumprimento das disposições da 4AMLD e publicará um relatório de avaliação da sua aplicação até junho de 2019.
3.2.Medidas de mitigação já em vigor ou em elaboração a nível da UE
A ASR confirmou ainda que é necessário continuar a envidar esforços em relação a algumas questões que exigem o lançamento de medidas legislativas ou outras iniciativas políticas a nível da UE.
3.2.1.Medidas legislativas
·Proposta de alteração da 4AMLD apresentada pela Comissão: nos termos desta proposta tanto as plataformas de câmbio de moedas virtuais como os prestadores de carteiras digitais devem passar a ser entidades obrigadas para reduzir o anonimato das transações. A possibilidade de isentar os produtos de moeda eletrónica dos requisitos ABC/CFT sofrerá novas restrições. A eficácia das UIF será reforçada e serão criados registos de contas bancárias ou sistemas de extração de dados centralizados para que os pedidos de informação possam ser mais específicos. A aplicação de regras mais estritas em matéria de cooperação entre as autoridades competentes, incluindo as autoridades de supervisão, tornará o intercâmbio de informações mais eficaz. A natureza das medidas de diligência reforçada quanto à clientela aplicáveis a países terceiros de risco elevado será especificada com mais pormenor, a fim de estabelecer uma abordagem mais harmonizada nesse aspeto. O âmbito e o acesso à informação contida nos registos dos beneficiários efetivos serão alargados. Além disso, há várias disposições que harmonizam a 4AMLD com as obrigações de diligência devida relativamente à clientela previstas na Diretiva 2014/107/UE que altera a Diretiva 2011/16/UE relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade.
·Revisão do Regulamento relativo ao controlo das somas em dinheiro líquido
: esta proposta destina-se a permitir que as autoridades tomem medidas em relação a montantes inferiores ao atual limiar de declaração de 10 000 EUR, sempre que existam suspeitas de atividade criminosa, a melhorar o intercâmbio de informações entre as autoridades e a exigir a divulgação das somas em dinheiro líquido enviadas em remessas não acompanhadas como encomendas postais ou por frete. A definição de «dinheiro líquido» será também alargada de modo a incluir produtos preciosos utilizados como reservas de valor de elevada liquidez, tais como o ouro, juntamente com os cartões de pagamento pré-pagos.
·A Comissão tenciona adotar, no verão de 2017, uma proposta destinada a combater o financiamento do terrorismo através do tráfico ilícito de bens culturais, qualquer que seja o país de origem, a fim de colmatar as atuais insuficiências no setor da arte
. Do mesmo modo, o tráfico de espécies selvagens é cada vez mais reconhecido como uma nova fonte de financiamento de atividades terroristas e afins. A Comissão continuará a executar o Plano de Ação contra o Tráfico de Animais Selvagens da UE a fim de combater os fluxos financeiros ilícitos relacionados com este tráfico
.
·A Diretiva relativa à luta contra o terrorismo
inclui uma definição do crime de financiamento do terrorismo ao nível da UE e estabelece regras mínimas relativas às sanções aplicáveis a este crime. As propostas de diretiva relativa à luta contra o branqueamento de capitais através do direito penal
e de regulamento relativo ao reconhecimento mútuo das decisões de congelamento e de confisco
também complementarão a abordagem preventiva da UE, assegurando uma resposta judicial e de aplicação da lei adequada, quando o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo forem detetados.
3.2.2.Iniciativas políticas
·A Comissão está atualmente a ponderar o lançamento de uma iniciativa para reforçar a transparência dos pagamentos em numerário. Para o efeito, realizará uma avaliação de impacto, tendo em conta os resultados de um estudo e de uma consulta pública aberta. A Comissão examinará as opções possíveis, incluindo a eventual introdução de uma restrição dos pagamentos em numerário. Esta restrição poderá contribuir para desmantelar o financiamento do terrorismo, dado que a necessidade de utilizar meios de pagamento não anónimos teria um efeito dissuasor sobre essa atividade ou facilitaria a sua deteção e investigação. Além disso, fomentaria a luta contra o branqueamento de capitais, a fraude fiscal e a criminalidade organizada. A decisão do Banco Central Europeu de pôr termo à produção e emissão de notas de 500 EUR contribuirá também para reduzir o risco dos pagamentos em numerário.
·Com base no supramencionado inventário das competências e dos obstáculos à cooperação das UIF publicado pela Plataforma de UIF da UE, em dezembro de 2016, e numa análise adicional, a Comissão descreveu possíveis vias a seguir para melhorar a cooperação das UIF da UE num documento de trabalho dos serviços da Comissão em que se enumeram:
- as questões que podem ser resolvidas através de novas orientações e de uma cooperação reforçada a nível operacional, por exemplo, através do trabalho na Plataforma de UIF da UE (por exemplo sobre a normalização das comunicações de operações suspeitas);
- as questões que deverão ficar resolvidas quando a 4AMLD e as recentes propostas de alteração à mesma tiverem sido transpostas; e
- outras questões resultantes da existência de enquadramentos jurídicos divergentes nos Estados-Membros, que poderão ter de ser resolvidas através de medidas regulamentares.
O funcionamento das UIF poderá ser consideravelmente melhorado através da adoção de medidas específicas da União para resolver questões como a cooperação entre as UIF e as autoridades de aplicação da lei a nível nacional e a nível da UE. Neste contexto, a Comissão continuará a analisar as eventuais opções em conformidade com os seus princípios de «Legislar Melhor».
·A Comissão criou um grupo de missão para a tecnologia financeira a nível interno para avaliar a evolução tecnológica, os serviços e modelos de negócios baseados na tecnologia, para determinar se as regras e políticas existentes são adequadas aos fins a que se destinam e identificar as opções e propostas que permitem explorar as oportunidades ou combater eventuais riscos. O trabalho neste domínio abrangerá, em especial, o financiamento coletivo, as moedas digitais (incluindo as transações entre criptomoedas e a utilização de moedas virtuais para comprar bens de valor elevado), a tecnologia de livro-razão distribuído e a autenticação/identificação. A utilização da identificação eletrónica e da inscrição digital serão igualmente analisadas. A Comissão procederá a um estudo de inventário e análise das práticas de inscrição digital no setor da banca em toda a UE e avaliará as eventuais medidas a tomar seguidamente.
3.2.3.Novas medidas de apoio para mitigar o risco a nível da UE
·Melhoria da recolha de dados estatísticos: dispor de dados quantitativos pertinentes, fiáveis e comparáveis a nível da UE contribuirá para uma melhor compreensão dos riscos. A Comissão procurará, por conseguinte, melhorar a sua recolha de dados estatísticos sobre ABC/CFT, compilando, consolidando e analisando as estatísticas fornecidas pelos Estados-Membros no âmbito das obrigações que lhes incumbem por forças do artigo 44.º da 4AMLD, e colaborando com o Eurostat no sentido de aumentar a comparabilidade dos dados.
·Fornecimento de novas orientações para as entidades obrigadas sobre o conceito de «transações ocasionais e operações aparentemente relacionadas entre si»: atualmente, ao abrigo da 3AMLD, é exigido às entidades obrigadas que apliquem medidas de diligência quanto à clientela ao estabelecerem relações de negócio ou efetuarem uma transação ocasional num montante igual ou superior a 15 000 EUR. Este conceito de «transações ocasionais» dificulta a aplicação efetiva das regras, especialmente nos serviços de envio de fundos e de câmbio, mas também no setor do jogo. O fornecimento de mais orientações por parte da Comissão (em cooperação com as autoridades nacionais competentes) ajudaria a mitigar este risco.
·Formação de profissionais que exercem atividades abrangidas pelo princípio do sigilo profissional: devem aplicar as regras ABC/CFT de forma mais eficaz, sem deixar de proteger integralmente o direito a um processo equitativo e a legitimidade do «segredo profissional». As atividades de formação devem facultar orientações operacionais e informações práticas para ajudar estes profissionais a reconhecer as operações que podem estar relacionadas com o branqueamento de capitais ou o financiamento do terrorismo e mostrar-lhes como devem proceder em tais casos. A Comissão avaliará igualmente as diferentes opções disponíveis para melhorar o cumprimento da legislação neste setor, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça
.
·Análise aprofundada dos riscos apresentados pela Hawala e pelos serviços informais de transferência de valores: a dimensão do problema e as soluções possíveis em matéria de aplicação da lei devem ser objeto de uma análise mais aprofundada. O envolvimento das autoridades de aplicação da lei, em especial da Europol e da Eurojust, juntamente com as autoridades de supervisão, é necessário para possibilitar a execução de ações dissuasivas contra os operadores que não queiram cooperar e a assistência aos que pretendam prestar serviços legítimos num ambiente em que a lei é respeitada.
·Continuação do trabalho de reforço da supervisão na UE: as entidades obrigadas devem aplicar as regras em vigor de forma eficaz. Por conseguinte, a Comissão dá grande destaque ao trabalho realizado pelas autoridades de supervisão ABC/CFT. Há desafios a enfrentar: o grande número de entidades obrigadas na UE e a sua diversidade; o volume de transações e de clientes; o panorama fragmentado das autoridades de supervisão ABC/CFT; e as limitações das autoridades de supervisão em matéria de perceção dos riscos. Serão formuladas recomendações adicionais para as AES e as autoridades nacionais competentes responsáveis pela supervisão para assegurar que as autoridades de supervisão ABC/CFT compreendem melhor o seu papel na identificação dos riscos e na tomada de decisões sobre os recursos a afetar à supervisão, bem como as ações de supervisão a que devem submeter as entidades obrigadas sob a sua responsabilidade.
4.Recomendações
4.1.Recomendações para as Autoridades Europeias de Supervisão (AES)
No setor financeiro, as AES desempenham um papel fulcral na capacitação da UE para enfrentar os desafios neste setor. A Comissão recomenda que as AES:
-aumentem a sensibilização para os riscos de BC/FT e identifiquem as medidas adequadas para reforçar a capacidade das autoridades de supervisão ABC/CFT
. Nesse contexto, devem proceder a revisões interpares da supervisão baseada no risco, na prática, e identificar as medidas adequadas para tornar a supervisão ABC/CFT mais eficaz;
-tomem novas iniciativas para melhorar a cooperação entre as autoridades de supervisão. Neste aspeto, as AES decidiram recentemente lançar um fluxo de trabalho específico para melhorar o desempenho do quadro de cooperação entre autoridades de supervisão financeira;
-procurem encontrar novas soluções de supervisão dos operadores que atuam ao abrigo do «regime de passaporte». O grupo de missão conjunto da Autoridade Bancária Europeia (EBA) sobre os serviços de pagamento e a luta contra o branqueamento de capitais já começou a examinar esta questão. O seu intuito é esclarecer em que casos os agentes e os distribuidores são verdadeiros «estabelecimentos» e analisar diversos cenários que ajudem a enfrentar os riscos;
-forneçam orientações atualizadas sobre governação interna, de modo a clarificar melhor as expetativas em relação às funções dos responsáveis pela conformidade nas instituições financeiras;
-forneçam orientações adicionais sobre a identificação dos beneficiários efetivos no caso dos fornecedores de fundos de investimento, sobretudo em situações que apresentem maior risco de BC ou FT; e
-analisem os riscos operacionais de ABC/CFT associados à atividade ou ao modelo de negócio nos setores da banca de empresas, da banca privada e do investimento institucional, por um lado, e nos serviços de transferência de valores em dinheiro e de moeda eletrónica, por outro. Esta análise deve ser efetuada no contexto do futuro parecer conjunto sobre os riscos a que está exposto o setor financeiro, nos termos do artigo 6.º, n.º 5, da 4AMLD.
4.2.Recomendações para as autoridades de supervisão não financeira
O setor não financeiro não possui qualquer organismo ou agência da UE semelhante às AES ao nível da União. O quadro de luta contra o branqueamento de capitais da UE autoriza os Estados-Membros a permitirem que os organismos de autorregulação exerçam funções de supervisão relativamente aos consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes e agentes imobiliários. Na grande maioria dos Estados-Membros, a supervisão destes setores apresenta fragilidades em termos de controlo, orientação e nível de comunicação de informações pelos membros de profissões jurídicas, em especial às UIF. Por conseguinte, os organismos de autorregulação devem esforçar-se por aumentar o número de inspeções e comunicações temáticas. Devem organizar igualmente cursos de formação para desenvolver uma melhor compreensão dos riscos e das obrigações de conformidade com os requisitos em matéria de ABC/CFT.
4.3.Recomendações para os Estados-Membros
Com base no nível dos riscos identificados nos diversos setores abrangidos pela ASR, a Comissão recomenda que os Estados-Membros tomem as medidas de mitigação a seguir recomendadas. Estas devem ser consideradas como uma base de referência adaptável em função das medidas nacionais que já estejam em vigor:
ØÂmbito das avaliações de risco nacionais
Os Estados-Membros devem tomar os riscos dos diversos produtos devidamente em conta nas suas avaliações de risco nacionais e definir medidas de mitigação adequadas em relação, nomeadamente:
- às atividades que envolvam transações em numerário de forma intensiva e pagamentos em numerário: os Estados-Membros devem definir medidas de mitigação adequadas, tais como a introdução de limites para os pagamentos em numerário, sistemas de comunicação das transações em numerário ou quaisquer outras medidas adequadas para combater o risco;
- aos artefactos culturais e antiguidades: os Estados-Membros devem analisar o risco apresentado por este setor, promover campanhas de sensibilização entre os comerciantes de arte e incentivá-los a aplicar as medidas de ABC/CFT;
- ao setor não lucrativo: os Estados-Membros devem assegurar uma cobertura adequada das organizações sem fins lucrativos nas suas avaliações de risco nacionais; e
- aos produtos de moeda eletrónica: os Estados-Membros devem ter em conta os riscos dos produtos de moeda eletrónica e assegurar que os limiares de isenção são tão baixos quanto possível, para evitar a utilização abusiva destes produtos.
ØBeneficiários efetivos
Os Estados-Membros devem assegurar que as informações relativas aos beneficiários efetivos de pessoas coletivas e centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica são suficientes, exatas e atuais.
(1) Os Estados-Membros devem desenvolver instrumentos adequados para assegurar que a identificação do beneficiário efetivo é devidamente realizada aquando da aplicação das medidas de diligência quanto à clientela. No caso das pessoas coletivas, quando as entidades obrigadas só tiverem identificado o diretor de topo como beneficiário efetivo, este facto deve ser realçado pela entidade obrigada (por exemplo, através de um registo específico dessa informação). Seria aconselhável manter registos de eventuais dúvidas de que a pessoa identificada seja o beneficiário efetivo. Deve prestar-se especial atenção às estruturas complexas em que o fundador, o administrador legal, o curador, os beneficiários ou qualquer outra pessoa singular que detenha o controlo final do fundo fiduciário (trust) envolva uma ou mais pessoas coletivas.
(2) As regras da 4AMLD em matéria de transparência das informações sobre os beneficiários efetivos também devem ser aplicadas rapidamente, com a introdução de registos dos beneficiários efetivos em relação a todos os tipos de pessoas coletivas e centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica. As informações contidas nos registos devem ser periodicamente verificadas, por exemplo por uma autoridade designada, de modo a evitar discrepâncias em relação às informações recolhidas pelas entidades obrigadas no âmbito dos seus procedimentos de diligência quanto à clientela.
(3) Os Estados-Membros devem assegurar que os setores mais expostos aos riscos decorrentes dos regimes opacos de propriedade efetiva são eficazmente acompanhados e supervisionados. É o caso, nomeadamente, de intermediários como os consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes, bem como dos prestadores de serviços de consultoria em matéria de fusão e aquisição de empresas
. Em relação a estes últimos, apesar de estarem abrangidos pelo quadro de ABC/CFT da UE, a ASR mostra que há uma aplicação ineficaz das regras a essa categoria específica de empresa.
ØRecursos suficientes para as autoridades de supervisão e as UIF
A 4AMLD obriga os Estados-Membros a afetarem recursos «suficientes» às suas autoridades competentes
. Contudo, a partir dos dados recolhidos nesta fase, não é possível apontar uma correlação sistémica entre os recursos afetados e a dimensão do setor, o número de entidades obrigadas e o nível de comunicação de informações. Os Estados-Membros devem demonstrar que são afetados recursos suficientes às autoridades de supervisão e às UIF para que possam desempenhar as suas funções.
ØAumento das inspeções no local pelas autoridades de supervisão
No setor financeiro, as autoridades de supervisão têm de adotar um modelo de supervisão baseada no risco consentâneo com as orientações conjuntas das ASE relativas à supervisão baseada no risco, publicadas em novembro de 2016. Nessas orientações refere-se que as autoridades de supervisão devem proceder a revisões, periódicas e extraordinárias, do seu modelo de supervisão ABC/CFT baseada no risco, a fim de se certificarem de que este produz os resultados pretendidos e, nomeadamente, se o nível de recursos de supervisão permanece consentâneo com os riscos de BC/FT identificados. Neste contexto, é importante que as entidades de supervisão realizem inspeções no local em número suficiente e consentâneo com os riscos de BC/FT identificados.
Os Estados-Membros devem assegurar que estas inspeções no local incidem nos riscos operacionais específicos em matéria de ABC/CFT consoante as vulnerabilidades específicas inerentes a um produto ou um serviço. Este cuidado é particularmente aplicável ao investimento institucional (nomeadamente através de corretores); à banca privada em que as autoridades de supervisão devem avaliar a aplicação das regras relativas à identificação dos beneficiários efetivos; às agências de câmbio e aos serviços de transferência de valores em dinheiro em que as inspeções de supervisão devem incluir uma revisão da formação recebida pelos agentes.
No setor não financeiro, os Estados-Membros devem assegurar que as suas autoridades competentes efetuam um número suficiente de controlos no local, sem aviso prévio, de comerciantes de bens de valor elevado, principalmente no setor do ouro e dos diamantes, para identificar eventuais lacunas no cumprimento dos requisitos de diligência quanto à clientela. Do mesmo modo, o número de inspeções no local no setor dos profissionais que exercem atividades abrangidas pelos princípios de sigilo profissional deve ser proporcional aos riscos.
ØAs autoridades de supervisão devem realizar inspeções temáticas
As autoridades de supervisão devem desenvolver uma melhor compreensão dos riscos de AML/CFT a que cada segmento específico do negócio está exposto. Esta recomendação é aplicável ao investimento institucional (nomeadamente através de corretores) e à banca privada; aos prestadores de serviços a sociedades e a fundos fiduciários (trusts); aos consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes; aos prestadores de serviços relacionados com a consultoria às empresas em matéria de estruturas de capital, de estratégia setorial e de questões conexas, bem como serviços em matéria de fusão e aquisição de empresas. Nestes setores, as autoridades de supervisão devem avaliar a aplicação das regras relativas à identificação dos beneficiários efetivos. A recomendação é igualmente aplicável aos serviços de transferência de valores em dinheiro, devendo os Estados-Membros assegurar, nesses casos, que as autoridades de supervisão realizam inspeções temáticas no prazo de dois anos após a publicação do relatório da ASR, salvo se tais inspeções tiverem sido recentemente realizadas.
ØConsiderações sobre o alargamento da lista de entidades obrigadas
Atualmente há serviços/produtos que não estão abrangidos pelo quadro da UE em matéria de ABC/CFT. Nos termos do artigo 4.º da 4AMLD, os Estados-Membros devem alargar o âmbito de aplicação do regime ABC/CFT aos profissionais que estão particularmente expostos a riscos. Ao aplicarem esta disposição, os Estados-Membros devem ponderar a possibilidade de sujeitarem ao seu regime ABC/CFT, pelo menos, o financiamento coletivo, as plataformas de câmbio de moeda virtual e os prestadores de carteiras digitais
, as leiloeiras, os negociantes de arte e antiquários e comerciantes específicos de bens de elevado valor, uma vez que foram identificados pela ASR como estando expostos a riscos.
ØNível adequado de diligência quanto à clientela para as transações ocasionais
Com base no quadro jurídico atual da UE, é possível isentar alguns serviços/produtos do dever de diligência quanto à clientela em transações ocasionais de montante inferior a um limiar específico (15 000 EUR). Em alguns casos, porém, essas isenções baseadas em limiares podem ser consideradas injustificadas e o limiar de 15 000 EUR suscita preocupações. Nesse contexto, os Estados-Membros devem definir um limiar mais baixo para a diligência quanto à clientela aplicável às transações ocasionais, de modo a garantir que este é consentâneo com o risco de ABC/CFT identificado a nível nacional. Os Estados-Membros devem comunicar à Comissão o seu limiar nacional para as transações ocasionais. Pode considerar-se que um limiar semelhante ao das transações ocasionais de transferências de fundos (ou seja, 1 000 EUR) é consentâneo com o risco. Além disso, os Estados-Membros devem fornecer orientações sobre a definição de transações ocasionais, estabelecendo critérios para impedir que as regras de diligência quanto à clientela aplicáveis às relações empresariais sejam contornadas no caso das agências de câmbio e, enquanto não são aplicados os novos requisitos da 4AMLD, no dos envios de fundos.
ØNível adequado de diligência quanto à clientela no caso dos serviços de guarda de valores e similares
Devem instituir-se as salvaguardas devidas para controlar adequadamente os serviços de guarda de valores. Esta recomendação aplica-se aos setores seguintes:
- serviços de guarda de valores prestados por instituições financeiras: os Estados-Membros devem assegurar que estes serviços são exclusivamente prestados a titulares de uma conta bancária na mesma entidade obrigada e tomar as devidas providências contra os riscos colocados pelo acesso de terceiros às caixas de segurança. Devem ser emitidas orientações dirigidas às instituições de crédito e financeiras sobre a melhor forma de controlarem o conteúdo das caixas de segurança no âmbito dos seus requisitos em matéria de diligência quanto à clientela e de controlo; e
- serviços de depósito similares fornecidos por prestadores não financeiros: os Estados-Membros devem definir medidas consentâneas com os riscos decorrentes da prestação destes serviços, incluindo em portos francos, em função das circunstâncias nacionais.
ØCooperação regular entre as autoridades competentes e as entidades obrigadas
Esta cooperação reforçada deve procurar simplificar a deteção de operações suspeitas e aumentar o número e a qualidade das comunicações a estas referentes. As autoridades de supervisão devem fornecer orientações claras sobre os riscos em matéria de ABC/CFT, o dever de diligência quanto à clientela, os requisitos de comunicação de operações suspeitas e o modo de identificar os indicadores mais relevantes para detetar os riscos de BC/FT. Os Estados-Membros devem assegurar que as UIF transmitem um feedback adequado às entidades obrigadas. Esta recomendação deve aplicar-se, em particular, aos setores seguintes:
- setor do jogo: no caso das máquinas de jogo, as autoridades de supervisão devem fornecer orientações mais claras sobre o risco emergente associado às lotarias vídeo. No caso do jogo em linha, as autoridades competentes responsáveis pelo setor devem criar também programas para sensibilizar os operadores de jogos em linha para os fatores de risco emergentes que podem aumentar a vulnerabilidade do setor. Entre estes figuram a utilização de moeda eletrónica ou virtual anónima e o surgimento de operadores de jogos em linha não autorizados. Recomenda-se que as UIF aumentem o feedback sobre a qualidade das comunicações de operações suspeitas, as formas de melhorar a comunicação de informações e a utilização dada às informações fornecidas. Também se devem ter em conta as especificidades do setor do jogo quando se proceder à normalização dos modelos de comunicação de operações suspeitas a nível da UE.
- consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes: os Estados-Membros devem fornecer orientações sobre os fatores de risco decorrentes de transações que envolvam consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes. Devem também emitir orientações sobre a aplicação do sigilo profissional e o modo de distinguir os serviços jurídicos sujeitos à própria essência do sigilo profissional de outros serviços que não estão por este abrangidos, quando prestados ao mesmo cliente; e
- serviços de transferência de valores em dinheiro: as autoridades competentes devem procurar aumentar a sensibilização do setor dos serviços de transferência de valores em dinheiro para os riscos e facultar-lhe indicadores relativos ao risco de financiamento do terrorismo.
ØFormação especial e contínua das entidades obrigadas
As sessões de formação organizadas pelas autoridades competentes devem focar o risco de infiltração ou apropriação por grupos da criminalidade organizada. Esta recomendação aplica-se aos setores seguintes:
- setor do jogo: no caso das apostas, para além do pessoal e dos responsáveis pela conformidade, os Estados-Membros devem prever a realização de sessões de formação obrigatórias destinadas aos corretores de apostas, sobre a correta avaliação dos riscos dos seus produtos e do seu modelo de negócio;
- prestadores de serviços a sociedades e a fundos fiduciários, consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes, prestadores de serviços relacionados com a consultoria às empresas em matéria de estruturas de capital, de estratégia setorial e de questões conexas, bem como serviços em matéria de fusão e aquisição de empresas: as sessões de formação e as orientações relativas aos fatores de risco devem centrar-se nas relações não presenciais, nos intermediários profissionais, clientes ou jurisdições off-shore e nas estruturas complexas ou de fachada;
- setor imobiliário: as ações de formação específicas devem incluir os sinais de alerta para os casos em que há vários profissionais envolvidos na transação imobiliária (agente imobiliário, membro de profissão jurídica e instituição financeira); e
- serviços de transferência de valores em dinheiro: as entidades obrigadas devem ministrar cursos de formação obrigatórios aos agentes, a fim de os sensibilizar para as suas obrigações em matéria de ABC/CFT e mostrar-lhes como se detetam as operações suspeitas.
ØRelatórios anuais das autoridades competentes/organismos de autorregulação sobre as atividades de ABC/CFT das entidades obrigadas sob a sua responsabilidade
Esta obrigação de elaboração de relatórios ajudará as autoridades nacionais a executarem as suas avaliações de risco nacionais e permitirá lançar ações mais proativas com vista à resolução de insuficiências ou incumprimentos dos requisitos em matéria de ABC/CFT nos setores seguintes:
- setor imobiliário: o relatório deve incluir o número de notificações recebidas pelo organismo de autorregulação e o número de notificações transmitidas às UIF quando esses profissionais fazem as notificações através de um organismo de autorregulação; e
- consultores fiscais, auditores, técnicos de contas externos, notários e outros membros de profissões jurídicas independentes: o relatório deve incluir o número de inspeções no local efetuadas por organismos de autorregulação para verificar o cumprimento dos requisitos em matéria de ABC/CFT, o número de notificações recebidas pelo organismo de autorregulação e o número de notificações transmitidas às UIF quando esses profissionais fazem as notificações através de um organismo de autorregulação.
5.Conclusões
A avaliação supranacional dos riscos mostra que o mercado interno da UE permanece vulnerável aos riscos de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. Os terroristas utilizam uma vasta gama de métodos para angariar e movimentar fundos, enquanto os criminosos empregam sistemas mais complexos e tiram partido das novas oportunidades de branqueamento de capitais oferecidas pelo surgimento de novos serviços e produtos. A prevenção da utilização abusiva do sistema financeiro é fundamental para limitar a capacidade operacional dos terroristas e criminosos, bem como para privar a criminalidade organizada dos benefícios económicos que constituem o objetivo último das suas atividades ilegais.
A sólida avaliação levada a cabo nos últimos dois anos realçou a necessidade de aperfeiçoar certos elementos do quadro legislativo e de reforçar as capacidades dos intervenientes públicos e privados para cumprirem as suas obrigações de conformidade.
Algumas medidas já estão a ser executadas e a Comissão aplicará as novas medidas descritas no presente relatório para mitigar os riscos adequadamente. A Comissão convida os Estados-Membros a aplicarem sem demora as recomendações formuladas no presente relatório. Nos termos do artigo 6.º da 4AMLD, os Estados-Membros que decidam não aplicar qualquer uma das recomendações nos respetivos regimes nacionais ABC/CFT, devem notificar a Comissão da sua decisão e apresentar uma justificação para a mesma («cumprir ou explicar»). Na ausência de tais notificações, espera-se que os Estados-Membros apliquem as recomendações.
Para serem eficazes, as políticas em matéria de ABC/CFT devem adaptar-se ao desenvolvimento dos serviços financeiros, à evolução das ameaças e ao surgimento de novos riscos. Por este motivo, a Comissão acompanhará as medidas tomadas pelos Estados-Membros com base nos resultados da ASR e apresentará um relatório com as respetivas conclusões até junho de 2019, o mais tardar. Essa análise avaliará também o impacto que as medidas aplicadas aos níveis da UE e nacional produzem no nível dos riscos. Confrontados com um desafio em constante mudança, que tira partido de qualquer nova lacuna que surja, todos os intervenientes se devem manter vigilantes e intensificar os seus esforços e a sua cooperação: é mais necessário do que nunca promover uma ação concertada para combater o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, reforçando, assim, a estabilidade do mercado interno e melhorando a segurança dos cidadãos da UE e da sociedade no seu conjunto.