13.10.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 345/102


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — O papel da produção de energia a partir de resíduos na economia circular»

[COM(2017) 34 final]

(2017/C 345/17)

Relator:

Cillian LOHAN

Correlator:

Antonello PEZZINI

Consulta

Comissão Europeia, 17.2.2017

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

 

 

Competência

Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

15.6.2017

Adoção em plenária

5.7.2017

Reunião plenária n.o

527

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

140/0/2

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia o facto de se respeitar a hierarquia dos resíduos aquando da tomada de decisões em matéria de gestão dos resíduos (1), nomeadamente as opções em matéria de produção de energia a partir de resíduos.

1.2.

Cabe adotar uma estratégia coordenada para difundir a mensagem do primeiro passo na hierarquia dos resíduos, ou seja, evitar, antes de mais, a produção de resíduos.

1.3.

O CESE advoga o princípio da aferição da sustentabilidade dos fundos públicos da UE à luz dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (2). Defende igualmente que todo o financiamento público deve melhorar o bem-estar dos cidadãos da Europa e respeitar o princípio de não apoiar nenhuma atividade prejudicial para os cidadãos.

1.4.

As lacunas das diretivas em vigor relativas ao tratamento de resíduos devem ser sanadas em toda a legislação futura, a fim de assegurar que a transição para um modelo económico circular é justa, coerente e sistémica.

1.5.

Importa não criar barreiras infraestruturais à obtenção de taxas de reciclagem mais elevadas mediante investimentos em processos obsoletos de produção de energia a partir de resíduos.

1.6.

Embora a recolha seletiva de resíduos seja uma prioridade, em especial nos Estados-Membros que dependem excessivamente da deposição em aterros, esta deve igualmente corresponder ao aumento das taxas de reciclagem de modo que a realização da transição para uma melhor circularidade produza valor.

1.7.

O facto de, atualmente, haver Estados-Membros com um elevado número de incineradoras não é compatível com a consecução das metas de reciclagem ambiciosas propostas no plano de ação para a economia circular (3). O desafio é conseguir que tais Estados-Membros abandonem a incineração e adotem uma vasta gama de soluções de gestão dos resíduos através de medidas políticas de incentivo e desincentivo como as seguintes:

criação de impostos;

supressão progressiva dos regimes de apoio;

introdução de uma moratória sobre instalações novas e a desativação das mais antigas.

1.8.

A transição para uma economia circular na UE foi prejudicada pela falta de sinais de preço corretos. Esta situação é agravada pela persistência injustificável de subvenções a sistemas de produção insustentáveis, nomeadamente ao setor dos combustíveis fósseis (4). O CESE congratula-se com o vínculo estabelecido de forma explícita entre o acesso aos fundos no âmbito da política de coesão, por um lado, e os planos nacionais de gestão dos resíduos e o plano de ação da UE para a economia circular, por outro. Poder-se-ia reforçar o vínculo com o Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos.

1.9.

O biogás oferece oportunidades em muitos domínios a nível da UE, entre os quais a criação de emprego, a redução das emissões e o aumento da segurança dos combustíveis. O quadro legislativo e de política que melhor apoia a otimização das oportunidades conexas deve ser desenvolvido utilizando os exemplos de boas práticas dos Estados-Membros e para além deles.

1.9.1.

A biodigestão para a produção de biometano para veículos está em consonância com o Acordo de Paris. Segundo uma avaliação recente da Comissão, (5) até 2030 os níveis de produção de biogás na UE poderiam, pelo menos, duplicar ou mesmo triplicar.

1.10.

São necessárias mudanças comportamentais e culturais, que podem ser realizadas através da educação a todos os níveis da sociedade.

2.   Contexto

2.1.

Em 2 de dezembro de 2015, a Comissão adotou um plano de ação da UE para a economia circular que prevê uma agenda transformadora com um número considerável de novos empregos bem como um potencial de crescimento significativo, e que visa fomentar padrões de produção e consumo sustentáveis, em consonância com os compromissos assumidos pela UE ao abrigo da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. A comunicação em apreço centra-se na valorização energética dos resíduos e no lugar que esta ocupa na economia circular. A produção de energia a partir de resíduos é um conceito muito vasto que vai muito além da incineração de resíduos.

2.2.

A principal finalidade da comunicação é assegurar que a valorização energética dos resíduos na UE apoia os objetivos do plano de ação para a economia circular e é firmemente norteada pela hierarquia dos resíduos da UE. A comunicação também analisa a forma de otimizar o papel dos processos de produção de energia a partir de resíduos no sentido de contribuir para a consecução dos objetivos estabelecidos na Estratégia para a União da Energia e no Acordo de Paris. Ao mesmo tempo, ao destacar as tecnologias comprovadamente eficientes do ponto de vista energético, a abordagem definida para a produção de energia a partir de resíduos pretende tanto incentivar a inovação, como ajudar a criar empregos permanentes de elevada qualidade.

2.3.

O presente parecer apresenta a posição do CESE sobre cada uma das três secções da comunicação, a saber:

posicionar os processos de produção de energia a partir de resíduos na hierarquia dos resíduos e o papel do apoio financeiro público;

processos de produção de energia a partir de resíduos para tratar resíduos finais: encontrar o equilíbrio certo;

otimizar o contributo dos processos de produção de energia a partir de resíduos para os objetivos climáticos e energéticos da UE na economia circular.

Além disso, formula considerações adicionais no intuito de assegurar a inclusão da perspetiva da sociedade civil, com base nas posições já adotadas pelo CESE.

2.4.

O CESE salienta a necessidade de abordar as necessidades imediatas da UE em matéria de gestão dos seus resíduos no contexto da legislação em vigor e das infraestruturas de gestão dos resíduos existentes. Embora subsistam algumas práticas subótimas, a tendência geral a longo prazo é evoluir no sentido de um modelo de produção com reduzidas quantidades de resíduos, no qual a prevenção, reutilização, refabricação e reciclagem de resíduos dominam a fase posterior à utilização dos fluxos de materiais. O desafio consiste em incentivar uma transição justa, rápida e constante para atingir os objetivos a longo prazo.

2.5.

A quantidade depositada em aterros, com uma média de produção de resíduos urbanos que, em 2015, era de cerca de 480 kg por habitante em toda a UE, pode variar de país para país, entre 3 kg de resíduos depositados em aterros no país mais exemplar e mais de 150 kg nos países com pior desempenho neste domínio.

3.   Posicionar a produção de energia a partir de resíduos na hierarquia dos resíduos e o papel do apoio financeiro público

3.1.

O CESE apoia o facto de se respeitar a hierarquia dos resíduos aquando da tomada de decisões em matéria de gestão dos resíduos (6), nomeadamente as opções em matéria de produção de energia a partir de resíduos.

3.2.

É importante notar que a produção de energia a partir de resíduos nem sempre é uma opção compatível com os objetivos ou princípios da economia circular. Por exemplo, a incineração de resíduos que poderiam ter sido preparados para reutilização ou reciclados não é a escolha ideal em termos de eficiência de recursos ou de utilização parcimoniosa das matérias-primas. De igual modo, o transporte de resíduos percorrendo longas distâncias e dispendendo muita energia para obter resultados energéticos comparativamente menores através de um processo de produção de energia a partir de resíduos conduziria a um custo energético líquido e teria impacto no clima. Mas há mais exemplos.

3.3.

O diagrama apresenta a relação entre os processos de produção de energia a partir de resíduos abordados na comunicação e a hierarquia dos resíduos.

Image

3.4.

A hierarquia dos resíduos não é, por si só, suficiente para determinar a adequação ou desadequação dos processos de produção de energia a partir de resíduos. O CESE advoga o princípio da aferição da sustentabilidade dos fundos públicos da UE à luz dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Defende também que todo o financiamento público deve melhorar o bem-estar dos cidadãos da Europa e respeitar o princípio de não apoiar nenhuma atividade prejudicial para os cidadãos.

3.5.

É importante que as lacunas da Diretiva-Quadro Resíduos não extravasem para as iniciativas da economia circular, por exemplo, a possibilidade de um Estado-Membro ser excluído das obrigações de recolha seletiva por não dispor de capacidade técnica ou financeira. Há que colocar a tónica na utilização de fundos públicos para superar as dificuldades técnicas ou de instrumentos de política económica para suprimir as restrições financeiras à aplicação da opção que se tiver revelado mais eficiente. Para os materiais que contêm substâncias tóxicas, há razões fundamentadas para recorrer preferencialmente à eliminação ou valorização energética em detrimento da reutilização ou reciclagem.

3.6.

A comunicação em apreço constitui um avanço significativo em relação ao plano de ação para a economia circular, estabelecendo um patamar elevado de exigência para reforçar a eficiência dos processos de produção de energia a partir de resíduos, e confere maior ênfase à hierarquia dos resíduos na determinação da circularidade dos diferentes processos. No entanto, a legislação em que assenta a comunicação em apreço, designadamente a Diretiva-Quadro Resíduos, contém lacunas históricas que, se não forem colmatadas, continuarão a causar dificuldades e a enfraquecer a comunicação. É necessário rever a classificação dos resíduos, possivelmente com base nas oportunidades proporcionadas pelas novas tecnologias nas instalações de produção de energia a partir de resíduos (a título de exemplo, um tomate deteriorado não é comercializado, enquanto um tomate não vendido é um resíduo), incluindo eventualmente as lamas de depuração civil para os processos de biodigestão. A ambição de abordar estas questões no quadro do plano de ação para a economia circular deve refletir-se nas necessárias alterações legislativas a todos os níveis pertinentes.

3.7.

O posicionamento dos processos de produção de energia a partir de resíduos na hierarquia dos resíduos pode ser enganoso devido às limitações decorrentes do modo como os processos são tratados pela legislação. O posicionamento é definido de acordo com as definições estabelecidas na legislação e não com base na análise científica do verdadeiro impacto de tais processos de produção de energia a partir de resíduos.

3.8.

Há também aspetos técnicos da metodologia de cálculo associados às definições e aos limiares estabelecidos na Diretiva-Quadro Resíduos. São estes métodos de cálculo que determinam o posicionamento dos diferentes processos de produção de energia a partir de resíduos na hierarquia dos resíduos. Estes cálculos pormenorizados devem ser reexaminados pela Comissão, a fim de garantir que são fiáveis, em particular no contexto da economia circular, mas também dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da União da Energia e do Acordo de Paris.

3.9.

As obrigações de recolha seletiva estabelecidas na legislação europeia em matéria de resíduos (7) constituem um aspeto fundamental para melhorar a gestão dos resíduos.

3.10.

Os progressos tecnológicos continuarão a proporcionar as oportunidades mais adequadas de otimizar a eficiência dos produtos e dos fluxos de energia, conduzindo a soluções inovadoras em prol de processos mais eficientes.

3.11.

A conceção ecológica dos produtos e serviços, com um âmbito de aplicação alargado de forma a ser inclusiva, como parte de um sistema pan-europeu, resultará na maior redução possível dos resíduos à medida que a economia circular for realizada. O elemento de conceção ecológica é essencial para a obtenção de produtos limpos que sejam reparáveis, reutilizáveis, recicláveis e modulares e que acabarão por conduzir à eliminação dos resíduos na aceção atual dos mesmos.

3.12.

Os pontos acima referidos implicarão a diminuição progressiva de resíduos mistos disponíveis para alimentar as incineradoras, pelo que as subvenções atribuídas a nível nacional a este tipo de tratamento devem ser eliminadas gradualmente, não devendo ser considerados novos investimentos neste domínio, exceto quando se trata de modernizar as infraestruturas existentes e de melhorar a sua eficiência energética e de recursos.

4.   Processos de produção de energia a partir de resíduos para tratar resíduos finais: encontrar o equilíbrio certo

4.1.

Importa não criar barreiras infraestruturais à obtenção de taxas de reciclagem mais elevadas mediante investimentos em processos obsoletos e ineficientes em termos energéticos de produção de energia a partir de resíduos.

4.2.

Em 2013, 2,5 milhões de toneladas, correspondentes maioritariamente a combustíveis derivados de resíduos (CDR), foram transferidos entre os Estados-Membros para fins de valorização energética (8).

4.3.

As avaliações da produção de energia a partir de resíduos têm de ter em conta o transporte, uma vez que a inclusão deste elemento no cálculo das emissões associadas às diferentes abordagens de gestão dos resíduos permite determinar o impacto concreto do processo em termos de emissões.

4.4.

Há uma divisão geográfica da Europa no que respeita à distribuição de incineradoras. A maior parte das incineradoras em funcionamento na Europa encontra-se na Alemanha, nos Países Baixos, na Dinamarca, na Suécia e em Itália. Em geral, muitos Estados-Membros continuam a depender excessivamente da deposição em aterros. Cumpre alterar esta situação para responder aos novos desafios e objetivos estabelecidos na legislação em matéria de resíduos associada ao plano de ação para a economia circular.

4.5.

Os Estados-Membros que dependem significativamente da deposição em aterros e que pouco ou nada recorrem à incineração devem concentrar-se, em primeiro lugar, na recolha seletiva. A recolha seletiva na fonte deve ser incentivada, pois é essencial para fornecer resíduos de elevada qualidade para reciclagem.

4.6.

No entanto, há inúmeros exemplos nos Estados-Membros de taxas elevadas de recolha seletiva às quais não correspondem taxas de reciclagem proporcionais. Esta aparente contradição requer instrumentos de política assestados.

4.7.

A comunicação incentiva os governos nacionais a reorientarem os fundos de apoio e as estratégias para soluções diferentes da incineração, examinando o período de amortização, a disponibilidade de matérias-primas e a capacidade dos Estados vizinhos.

4.8.

A utilização de uma incineradora de um país vizinho pode ser a melhor opção em alguns casos, mas antes de o fazer, importa analisar o ciclo de vida completo, que passa, necessariamente, pelos custos conexos de transporte, tanto económicos como ambientais.

4.9.

Salvo em circunstâncias muito específicas e tendo em conta os progressos tecnológicos, não é provável que a opção da incineração seja a solução mais eficiente do ponto de vista dos recursos nem a melhor forma de responder aos desafios em matéria de gestão dos resíduos.

4.10.

O facto de, atualmente, haver Estados-Membros com um elevado número de incineradoras não é compatível com a consecução das metas de reciclagem ambiciosas. O desafio é conseguir que tais Estados-Membros abandonem a incineração através de medidas políticas de incentivo e desincentivo, como as seguintes:

criação de impostos;

supressão progressiva dos regimes de apoio;

introdução de uma moratória sobre instalações novas e a desativação das mais antigas.

4.11.

O CESE salienta que a decisão de aplicar um imposto geral sobre a incineração sem fornecer alternativas acessíveis a preços comportáveis para o utilizador final apenas resultará em custos mais elevados para os cidadãos. A utilização dos impostos enquanto instrumentos económicos deve ser específica e inteligente.

4.12.

É necessário estabelecer um procedimento eficiente, em cada Estado-Membro, para a apresentação de pedidos e a concessão de licenças para realizar atividades de gestão dos resíduos.

5.   Otimizar o contributo dos processos de produção de energia a partir de resíduos para os objetivos climáticos e energéticos da UE na economia circular

5.1.

O CESE concorda que a produção de energia a partir de resíduos só pode otimizar o contributo da economia circular para a descarbonização se respeitar a hierarquia dos resíduos, em consonância com a Estratégia para a União da Energia e o Acordo de Paris. A biodigestão para a produção de biometano para veículos está em consonância com o Acordo de Paris. Os veículos alimentados a biometano podem representar um instrumento eficaz para contribuir para a descarbonização dos transportes na Europa.

5.2.

A fim de otimizar o contributo dos processos de produção de energia a partir de resíduos para atingir os objetivos climáticos e energéticos da UE na economia circular, importa assegurar que são utilizadas as técnicas e tecnologias mais eficientes sempre que sejam necessários processos de produção de energia a partir de resíduos. Tal está em linha com as alterações propostas pela Comissão à Diretiva Energias Renováveis. Contudo, estes critérios devem ser incentivados para todas as novas instalações, independentemente da sua dimensão, incluindo as pequenas instalações com menos de 20MW.

5.3.

A tributação da recolha dos resíduos tem um impacto crescente nos recursos das famílias e das empresas, pelo que deve ser utilizada de forma prospetiva e tendo em conta a proteção do ambiente.

5.4.

Os setores público e privado devem ter a possibilidade de colaborar em projetos de longo prazo tendo em vista concretizar uma cultura de circularidade. A responsabilidade social das empresas também pode desempenhar um papel importante na transição para opções de gestão dos resíduos mais sustentáveis.

5.5.

A transição para uma economia circular na UE foi prejudicada pela falta de sinais de preço corretos. Esta situação é agravada pela persistência injustificável das subvenções a sistemas de produção insustentáveis, nomeadamente ao setor dos combustíveis fósseis (9). O CESE congratula-se com o vínculo estabelecido de forma explícita entre o acesso aos fundos no âmbito da política de coesão, por um lado, e os planos nacionais e regionais de gestão dos resíduos e o plano de ação da UE para a economia circular, por outro.

5.6.

Poder-se-ia reforçar o vínculo ao financiamento proveniente do Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos, a fim de garantir que estes investimentos dão prioridade às oportunidades que promovem os objetivos do plano de ação para a economia circular. Poder-se-iam explorar algumas formas de incentivo visando formar uma cadeia adequada a jusante das instalações, como a distribuição dos combustíveis e/ou das matérias-primas secundárias, ou criar outros produtos para potencial utilização.

6.   Outras oportunidades

6.1.    Biometano

6.1.1.

A possibilidade de produzir biogás por digestão anaeróbia é mencionada na comunicação. Trata-se de uma oportunidade para os diferentes Estados-Membros que importa desenvolver. Segundo uma avaliação recente da Comissão (10), até 2030 os níveis de produção de biogás na UE podem, pelo menos, duplicar ou mesmo triplicar.

6.1.2.

O biogás é um modelo que funciona eficazmente em muitos Estados-Membros, nomeadamente na Itália e na Alemanha. Enquanto exemplos do funcionamento eficaz deste modelo, estes países também podem transmitir ensinamentos valiosos sobre os aspetos práticos da sua implementação.

6.1.3.

Atualmente, o custo do biometano é superior ao custo do metano fóssil. No entanto, o uso do biometano justifica-se pelos custos indiretos produzidos por agentes mutagénicos e cancerígenos, por exemplo, NOx e fumos de óleos produzidos pelos combustíveis fósseis (11).

6.1.4.

Acima de tudo, os custos eventualmente mais elevados do biometano estão em consonância com os objetivos consignados no Acordo de Paris em matéria de redução das emissões de gases com efeito de estufa dos combustíveis tradicionais (12).

6.1.5.

É fundamental que as matérias-primas utilizadas na digestão anaeróbia tenham pouco ou nenhum impacto nas alterações indiretas do uso do solo e não afetem negativamente a produção de alimentos. A localização mais adequada para as instalações de biogás é perto do abastecimento de matérias-primas (designadamente resíduos da atividade agrícola) enquanto solução para a gestão dos resíduos e resposta às necessidades energéticas. Importa evitar a construção de digestores anaeróbios que, consequentemente, gerariam uma nova procura de matéria-prima, na forma de resíduos ou de culturas.

6.1.6.

A localização da instalação de biogás é crucial. É necessária uma utilização identificada eficiente da energia produzida, a fim de evitar que essa energia, produzida de forma eficiente, venha a ser desperdiçada. É também essencial assinalar que os digestores anaeróbios não são uma solução definitiva para todas as regiões agrícolas da UE e que a sua promoção se deve limitar às áreas em que a matéria-prima disponível constitua atualmente um resíduo problemático.

6.1.7.

No entanto, o desenvolvimento de uma infraestrutura de produção e utilização de biogás bem planeada pode constituir um modo muito eficaz de tratar os resíduos da atividade agrícola e as substâncias potencialmente nocivas para o ambiente, bem como de facilitar a sua eliminação segura. Pode ainda contribuir para satisfazer as necessidades das comunidades em matéria de aquecimento e de combustível para os transportes.

6.1.8.

A digestão anaeróbia pode ajudar a resolver questões de saúde pública, fornecer fertilizantes para terras, reduzir as emissões e constituir um exemplo prático de circularidade.

6.1.9.

A digestão anaeróbia será mais eficaz se os princípios da economia circular forem aplicados, nomeadamente o conceito de circuitos curtos segundo o qual a matéria-prima para o digestor é obtida localmente e a energia produzida também é utilizada a nível local (exceto quando o combustível é utilizado sob a forma de gás nos camiões). Os investimentos devem apoiar o objetivo de aproximar o mais possível a distância percorrida pelos resíduos de zero quilómetros.

6.1.10.

Importa analisar e realçar o impacto positivo no emprego e na economia do desenvolvimento de um elemento integrado de biogás num cabaz energético nacional ou regional, bem como considerar opções que facilitem e agilizem os procedimentos administrativos de autorização de projetos de digestão de biorresíduos.

6.1.11.

O apoio político e económico aos projetos que preencham todos os critérios fomentará a inovação e pode constituir um dos muitos instrumentos que contribuem para a transição rumo a uma economia hipocarbónica.

6.1.12.

Importa concluir a revisão do mandato M475 pelo CEN para se poder injetar, na rede de gás natural, biometano produzido a partir de fontes atualmente não autorizadas, como o gás de aterro, o gás das estações de tratamento de águas residuais, de lama e de resíduos urbanos e não urbanos não diferenciados. O biometano deste tipo já está facilmente disponível.

6.1.13.

O Fundo Europeu para Investimentos Estratégicos é fundamental para a realização de processos de digestão anaeróbia em projetos que ainda não são financeiramente viáveis.

6.1.14.

Deve promover-se a concessão de incentivos à utilização de veículos alimentados a biogás, tais como os que são tradicionalmente utilizados na indústria de combustíveis fósseis. Tais incentivos devem beneficiar o utilizador final, oferecendo opções de transporte alternativas acessíveis a preços comportáveis para o consumidor.

6.2.    Mudança cultural e educação

6.2.1.

É necessário reconhecer o desafio que representam as diferenças culturais. A mudança de comportamento em relação à separação de resíduos na fonte deve ser encarada como uma necessidade de mudança cultural. Para tal, podem ser utilizados vários instrumentos, dos quais se destacam os pequenos incentivos (nudge) (13).

6.2.2.

Cabe adotar uma estratégia coordenada para difundir a mensagem do primeiro passo na hierarquia dos resíduos, ou seja, evitar, antes de mais, a produção de resíduos.

6.2.3.

Pode também lograr-se a mudança de comportamento graças à criação de programas escolares sobre estes temas. Estes devem ser implementados em todos os níveis de ensino, desde o ensino básico até ao ensino superior, bem como em formações no local de trabalho, enquanto abordagem a longo prazo, educando e informando as crianças e os cidadãos.

6.2.4.

As universidades e os organismos públicos podem contribuir para criar legitimidade para as novas tecnologias e práticas e, desse modo, servir de modelos eficazes de boas práticas e de embaixadores regionais dos processos de produção de energia a partir de resíduos (14).

Bruxelas, 5 de julho de 2017.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Parecer do CESE sobre o «Pacote de medidas relativas à economia circular», ponto 4.3 (JO C 264 de 20.7.2016, p. 98).

(2)  Parecer do CESE sobre «Desenvolvimento sustentável: Levantamento das políticas internas e externas da UE», ponto 4.3.5.5 (JO C 487 de 28.12.2016, p. 41).

(3)  Comunicação da Comissão Europeia — Fechar o ciclo — plano de ação da UE para a economia circular, COM(2015) 614 final de 2 de dezembro de 2015.

(4)  David Coady, Ian Parry, Louis Sears, Baoping Shang, «How Large Are Global Energy Subsidies?» [Qual a dimensão dos subsídios globais à energia?], documentos de trabalho do FMI, WP/15/105, maio de 2015.

(5)  Comissão Europeia, Optimal use of biogas from waste streams An assessment of the potential of biogas from digestion in the EU beyond 2020 [Utilização ótima de biogás a partir de fluxos de resíduos: uma avaliação do potencial do biogás produzido por digestão na UE após 2020], março de 2017.

(6)  Parecer do CESE sobre o «Pacote de medidas relativas à economia circular», ponto 4.3 (JO C 264 de 20.7.2016, p. 98).

(7)  A Diretiva 2008/98/CE, em especial os artigos 11.o (papel, metal, plástico, vidro e resíduos de construção e demolição) e 22.o (biorresíduos) (JO L 312 de 22.11.2008, p. 3).

(8)  Centro Temático Europeu sobre os resíduos e os materiais numa economia ecológica (CTE/WMGE), «Assessment of waste incineration capacity and waste shipments in Europe» [Avaliação da capacidade de incineração e da transferência de resíduos na Europa], janeiro de 2017.

(9)  David Coady, Ian Parry, Louis Sears, Baoping Shang, «How Large Are Global Energy Subsidies?» [Qual a dimensão dos subsídios globais à energia?], documentos de trabalho do FMI, WP/15/105, maio de 2015.

(10)  Comissão Europeia, Optimal use of biogas from waste streams An assessment of the potential of biogas from digestion in the EU beyond 2020 [Utilização ótima de biogás a partir de fluxos de resíduos: uma avaliação do potencial do biogás produzido por digestão na UE após 2020], março de 2017.

(11)  COM(2017) 011 final — 2017/04 (COD).

(12)  Segundo Maquiavel, «l’opera loda l’artefice».

(13)  Parecer do CESE sobre «Integrar o encorajamento positivo (nudge) nas políticas europeias» (JO C 75 de 10.3.2017, p. 28).

(14)  Existem exemplos em vários Estados-Membros, por exemplo na University College Cork, na Irlanda, que tem digestores anaeróbios próprios de pequena escala utilizados para a investigação.