2.2.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 34/15


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Observações finais do Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência — Uma nova estratégia para as pessoas com deficiência na União Europeia»

(parecer de iniciativa)

(2017/C 034/03)

Relator:

Ioannis VARDAKASTANIS

Consulta

Comité Económico e Social Europeu, 21.1.2016

Base jurídica

Artigo 29.o, n.o 2, do Regimento

 

Parecer de iniciativa

 

 

Competência

Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania

Adoção em secção

27.9.2016

Adoção em plenária

19.10.2016

Reunião plenária n.o

520

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

211/1/3

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

A ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD) pela União Europeia constitui um marco histórico para os direitos das pessoas com deficiência, a UE e os seus Estados-Membros. A avaliação da UE efetuada em 2015 pelo Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência encerra o primeiro período de aplicação da CNUDPD. As observações finais do Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência apontam para a necessidade de cumprimento das obrigações pelas instituições da UE, uma vez que estas devem organizar e coordenar a aplicação da CNUDPD em conformidade com as referidas observações. As observações finais voltaram a confirmar a necessidade de uma alteração profunda na atual forma de elaborar as políticas europeias em matéria de deficiência. Até ao momento, a UE ainda não levou a cabo uma verdadeira adaptação da sua forma de elaborar políticas a esta nova transformação exigida pela CNUDPD.

1.2.

O CESE exorta as instituições da UE a integrarem as observações finais na legislação e na elaboração de políticas, vigentes e futuras, da UE. Solicita igualmente à Comissão Europeia (CE) que transmita a informação à CNUDPD até ao outono de 2016.

1.3.

O CESE considera que a CNUDPD e as observações finais do comité constituem uma oportunidade única para a CE apresentar uma estratégia global da UE sobre os direitos das pessoas com deficiência. As observações finais geraram uma dinâmica que as instituições da União devem aproveitar e que deve conduzir à inclusão sistemática dos direitos das pessoas com deficiência em toda a legislação, políticas e programas da UE.

1.4.

O CESE sublinha que, para integrar esses direitos, a CE deve proceder a um levantamento transversal e abrangente de toda a sua legislação, políticas e programas, por forma a assegurar a plena harmonização com as disposições da CNUDPD e a envolver ativamente neste processo as organizações representativas das pessoas com deficiência. Tal levantamento deve ser acompanhado de uma análise que avalie as lacunas na legislação em vigor, na elaboração de políticas e na integração dos direitos das pessoas com deficiência, bem como na CNUDPD. O levantamento e a análise das lacunas devem ser explicitamente incluídos na Estratégia Europeia para a Deficiência revista.

1.5.

O CESE recorda à CE a sua obrigação de proceder imediatamente à revisão e à atualização da declaração de competência e da respetiva lista de instrumentos. Deve também assumir o compromisso de reexaminar e rever a declaração de competência pelo menos uma vez durante o seu mandato.

1.6.

O CESE tem em conta que a avaliação da UE pelo Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência foi efetuada a meio do período de programação de 2014-2020 e reconhece as dificuldades da UE em integrar a nova agenda relativa aos direitos das pessoas com deficiência, resultante das observações finais, nas revisões intercalares das estratégias, políticas, programas e instrumentos de financiamento. No entanto, recomenda que a CE envide todos os esforços para integrar e incluir essas observações nestes processos de revisão e que atribua os recursos necessários para o cumprimento das suas obrigações ao abrigo da CNUDPD.

1.7.

A CNUDPD prevê explicitamente que as organizações representativas das pessoas com deficiência devem ser consultadas e envolvidas no processo de aplicação e monitorização da convenção. O CESE insta a CE a manter um diálogo estruturado, genuíno e substancial com o Movimento Europeu das Pessoas com Deficiência (ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, e do artigo 33.o, n.o 3). Além disso, a CE deve instituir um programa de reforço das capacidades das referidas organizações, para que estas possam desempenhar as suas funções essenciais.

1.8.

O CESE considera absolutamente fundamentais a cooperação e a parceria das instituições da UE na aplicação da CNUDPD. Recomenda, por conseguinte, a criação de um mecanismo de coordenação interinstitucional que facilite a aplicação rápida e harmoniosa das observações finais e da convenção, incluindo no que diz respeito à consulta e ao envolvimento das organizações representativas das pessoas com deficiência.

1.9.

As observações finais apontam para a necessidade de a Estratégia Europeia para a Deficiência ser profundamente reexaminada e revista. Por conseguinte, o CESE exorta a CE a fazer um balanço da evolução em matéria de direitos das pessoas com deficiência e a alargar o âmbito dessa estratégia mediante a introdução de novos domínios de ação e da sua interligação com o reexame e a revisão das políticas, programas e instrumentos de financiamento (p. ex., Estratégia Europa 2020, Estratégia para a Igualdade entre Homens e Mulheres, estratégia sobre os direitos da criança, compromissos da UE em matéria de ação externa), com um prazo de execução claramente definido, orçamento, índices de referência e indicadores específicos e precisos.

1.10.

A UE comprometeu-se a aplicar integralmente os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos na Agenda 2030 das Nações Unidas e deve assegurar que tem plenamente em conta as observações finais e as disposições da CNUDPD, tanto a nível interno como a nível externo. Por conseguinte, o CESE recomenda vivamente que a CE inclua a aplicação da Agenda 2030 na Estratégia Europeia para a Deficiência revista através do estabelecimento de objetivos e ações a nível europeu, a fim de alcançar todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável na UE, também no que se refere às pessoas com deficiência.

1.11.

O CESE está fortemente convicto de que a UE deve evitar que o financiamento europeu seja utilizado quer para a criação quer para a manutenção do funcionamento das estruturas de institucionalização. O CESE apoia plenamente a utilização dos fundos europeus para criar serviços a nível local para pessoas com deficiência, a fim de lhes permitir viver de forma independente nas suas comunidades. A institucionalização das pessoas com deficiência constitui uma violação dos seus direitos, e o CESE insta a CE a promover a desinstitucionalização de uma forma mais sistemática e eficaz através de políticas, programas e instrumentos de financiamento específicos.

1.12.

O CESE exorta a CE a proceder sem demora à ratificação do Protocolo Opcional à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, do Tratado de Marraquexe e da Convenção de Istambul do Conselho da Europa.

1.13.

O CESE propõe firmemente à CE que crie pontos focais em todas as suas direções-gerais, agências e órgãos, incluindo e envolvendo plenamente as organizações representativas das pessoas com deficiência no processo de elaboração de políticas, a fim de criar estruturas horizontais e verticais que promovam a plena inclusão e integração dos direitos dessas pessoas na legislação, nas políticas e nos programas da UE.

1.14.

O CESE considera que a CE deve iniciar o processo, em cooperação com outras instituições, agências e órgãos da UE, para elaborar e desenvolver cuidadosamente a nova Agenda Global dos Direitos das Pessoas com Deficiência 2020-2030, que deve ser plenamente inserida e integrada nas estratégias globais sociais e macroeconómicas (por exemplo, a Estratégia Europa 2020 e os seus mecanismos de execução), e recomenda que seja criado um grupo de trabalho com a participação de todas as partes interessadas e das organizações representativas das pessoas com deficiência para realizar e aplicar esta iniciativa. O CESE propõe que a CE inicie a aplicação da Agenda Global 2020-2030 por ocasião do Ano Europeu dos Direitos das Pessoas com Deficiência em 2021.

1.15.

O CESE reconhece as iniciativas positivas tomadas pela CE no domínio da acessibilidade, nomeadamente o acordo tripartido sobre a Diretiva relativa à acessibilidade dos sítios web dos organismos do setor público e a proposta da CE sobre a Lei Europeia da Acessibilidade, e insta as instituições da UE a concluírem as negociações. Contudo, manifesta preocupação relativamente à diretiva horizontal sobre a igualdade de tratamento e apela para que as negociações sejam desbloqueadas, bem como para que as observações finais e a CNUDPD sejam tidas em conta nesta nova fase.

1.16.

O CESE insta todas as instituições da UE a assegurarem que as medidas de austeridade não afetam a capacidade de as pessoas com deficiência exercerem os seus direitos, consagrados na convenção, e solicita, por conseguinte, à CE que crie o nível mínimo de proteção social necessário para atingir este objetivo e para respeitar igualmente os direitos destas pessoas a um nível de vida e de proteção social adequados.

1.17.

O CESE solicita à CE e ao Eurostat que desenvolvam ferramentas estatísticas para medir o impacto da aplicação da CNUDPD nas pessoas com deficiência, a nível europeu e nacional. Considera igualmente que a recolha de dados baseada numa abordagem da deficiência centrada nos direitos humanos e desagregada por deficiência, idade e género terá uma influência positiva no desenvolvimento e na aplicação da legislação, das políticas e dos programas da UE.

1.18.

O CESE reconhece que a UE tem competências para acompanhar as medidas nacionais a fim de garantir que todos os cidadãos da UE são iguais perante a lei, que não são privados da sua capacidade jurídica e dos seus direitos e que podem participar nas eleições europeias e em todas as eleições realizadas na UE em igualdade de condições com as demais pessoas. Por conseguinte, apela à CE e, em especial, à DG Justiça, para que adotem um programa baseado no método aberto de coordenação para facilitar a convergência dos Estados-Membros no que respeita ao princípio de reconhecimento do direito à igualdade perante a lei.

1.19.

O CESE compromete-se a dar o exemplo no que diz respeito ao cumprimento das obrigações específicas, realçadas pelo Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência, a serem cumpridas pela UE enquanto administração pública, garantindo que os seus recursos humanos, os direitos dos membros do CESE e os meios de comunicação estão em conformidade com a CNUDPD.

2.   Introdução

2.1.

O CESE congratula-se com as observações finais do Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência (1), na medida em que traçam um programa global para que a UE altere as suas políticas adotando uma abordagem da deficiência baseada nas pessoas e nos direitos humanos.

2.2.

O CESE recorda que a CE apresentou o projeto de proposta de diretiva relativa à igualdade de tratamento antes da conclusão da CNUDPD. Além disso, as negociações entre o Parlamento Europeu e o Conselho da UE foram introduzindo progressivamente alterações que não estão conformes com as obrigações previstas na convenção. Por conseguinte, o CESE solicita à CE que introduza, nas negociações interinstitucionais em curso, uma proposta de adaptação do projeto de diretiva proposta, por forma a estar em conformidade com a CNUDPD e, naturalmente, com as observações finais em matéria de deficiência, e que inclua a proibição da discriminação múltipla e intersetorial, bem como da discriminação por associação.

2.3.

O CESE sublinha que as medidas de austeridade tiveram um impacto negativo nas condições de vida das pessoas com deficiência e das suas famílias. Os níveis de pobreza, exclusão, discriminação e desigualdade têm vindo a aumentar em resultado da crise económica, que se tornou em muitos Estados-Membros uma crise de direitos humanos, deixando um grande número de pessoas com deficiência e as suas famílias completamente desprotegidas. Por conseguinte, o CESE exorta a CE a estabelecer níveis mínimos de proteção social, a fim de proteger os direitos das pessoas com deficiência, assegurando uma qualidade de vida e proteção social adequadas. Esse mecanismo deve ser incluído no processo do Semestre Europeu.

2.4.

Além disso, o Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência recomendou que a UE criasse uma estratégia abrangente de aplicação da CNUDPD para todas as instituições da UE e com dotações orçamentais específicas integradas no quadro financeiro plurianual. O CESE considera, por conseguinte, que se deve realizar uma reunião de alto nível dos responsáveis das instituições e órgãos da UE para dar início ao processo de elaboração e adoção de uma agenda interinstitucional relativa à CNUDPD, com objetivos específicos a alcançar e metas a cumprir. A estratégia global deve identificar as responsabilidades de cada instituição da UE com vista à aplicação da CNUDPD.

2.5.

É necessário que a UE encete um diálogo estruturado, genuíno e substancial com as organizações europeias representativas das pessoas com deficiência, garantindo tanto a sua capacidade de participar de forma eficaz e significativa na elaboração de políticas e legislação da UE, como de levar a cabo de forma proativa as suas campanhas de defesa da CNUDPD. Além disso, a UE deve assegurar que as organizações representativas das pessoas com deficiência dispõem de capacidade financeira para apoiar o seu trabalho. Por conseguinte, é necessário estabelecer especificamente uma rubrica orçamental destinada ao reforço das capacidades das organizações representativas das pessoas com deficiência.

2.6.

A integração e aplicação abrangentes e transversais das disposições da CNUDPD pela UE e o desenvolvimento de uma nova agenda da UE relativa à convenção exigem a criação de um quadro de parceria e governação participativa, através do qual todos os principais intervenientes e partes interessadas, bem como as instituições da UE, possam participar plenamente no processo de elaboração de políticas de uma forma inclusiva.

2.7.

A Comissão Europeia deve proceder, imediata e urgentemente, a um levantamento e uma análise das lacunas de todos os programas e políticas internas e externas da UE, garantindo que estejam em conformidade com as disposições da CNUDPD. Além disso, todas as estratégias e políticas globais da UE devem respeitar as observações finais, incluindo a Estratégia Europa 2020 e o Semestre Europeu, o pilar europeu dos direitos sociais, a Agenda 2030 das Nações Unidas e os instrumentos de financiamento, como os FEEI.

2.8.

É da maior importância que a aplicação das observações finais pela UE seja abordada ao mais alto nível político. Mais especificamente, a CE deve incluir no seu programa de trabalho para 2017 uma iniciativa política dedicada especificamente a esta finalidade. A integração e inserção plenas das observações finais nas políticas e programas da UE requerem a elaboração pela CE de uma estratégia global de aplicação da convenção. O CESE insta a Comissão Europeia a iniciar, com caráter de urgência, o processo com vista a definir a referida estratégia, mediante a plena consulta e participação das organizações representativas das pessoas com deficiência.

2.9.

Em 2021 celebrar-se-á o 10.o aniversário da ratificação da CNUDPD pela União Europeia. O CESE considera que será adequado celebrar nesse ano o segundo Ano Europeu das Pessoas com Deficiência. O CESE observa que o primeiro Ano Europeu das Pessoas com Deficiência foi organizado pela CE em 2003, e propõe, por conseguinte, que as instituições da UE deem imediatamente início aos preparativos e tomem as medidas necessárias para declarar 2021 o segundo Ano Europeu dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

3.   Observações finais — uma oportunidade para uma UE mais inclusiva para as pessoas com deficiência

3.1.    Princípios e obrigações gerais (artigos 1.o a 4.o)

3.1.1.

Embora a UE tenha ratificado a CNUDPD, ainda não levou a cabo uma análise transversal e abrangente da legislação, políticas e programas da UE. O CESE exorta a CE a efetuar essa análise com urgência. Além disso, a CE deve designar um ponto focal para a CNUDPD em cada direção-geral, responsável pela realização dessa tarefa.

3.1.2.

É de lamentar que a UE ainda não tenha ratificado o Protocolo Opcional à Convenção. Consequentemente, o CESE exorta a UE a proceder à ratificação desse protocolo sem demora, criando condições para as pessoas com deficiência apresentarem queixa ao Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência em caso de violação dos seus direitos consagrados na convenção.

3.1.3.

A abordagem da deficiência baseada nos direitos humanos deve ser plenamente adotada e integrada na legislação e políticas europeias. O CESE insta, assim, os serviços jurídicos das instituições da UE a realizarem um estudo exaustivo sobre as implicações da ratificação da CNUDPD para o sistema jurídico da UE, a fim de lhe conferir o enquadramento adequado no plano jurídico e de elaboração de políticas. Os serviços jurídicos da UE não estão a levar em devida consideração as obrigações da UE no âmbito da CNUDPD.

3.1.4.

O CESE solicita ao secretário-geral da Comissão que examine as orientações para a avaliação de impacto e as altere de modo a incluir uma lista mais vasta de temas e questões, a fim de avaliar melhor a conformidade com a convenção.

3.1.5.

O Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência instou a UE a apresentar uma análise da declaração de competência e da sua lista de instrumentos até ao outono de 2016, tendo em conta a perspetiva abrangente adotada na observação final n.o 17. A revisão da declaração supramencionada deve ter lugar pelo menos uma vez por mandato.

3.2.    Direitos específicos (artigos 5.o a 30.o)

3.2.1.

A CE não adotou uma estratégia da UE em matéria de não discriminação e igualdade para as pessoas com deficiência em conformidade com as disposições da CNUDPD e as observações finais e, por conseguinte, o CESE solicita à Comissão que tome medidas imediatas em relação à diretiva horizontal relativa à igualdade de tratamento (ver ponto 2.2) e que proceda à revisão da Diretiva 2000/78/CE do Conselho que estabelece um quadro geral de igualdade de tratamento no emprego.

3.2.2.

A CE deve incluir a perspetiva das mulheres e raparigas com deficiência na sua política de igualdade de género, nomeadamente nos esforços de recolha de dados pelo Instituto Europeu para a Igualdade de Género. Além disso, o Compromisso Estratégico para a Igualdade de Género 2016-2019 da Comissão e o seu trabalho político e legislativo relativo ao equilíbrio entre vida profissional e pessoal deve integrar plenamente os direitos das mulheres e raparigas com deficiência. O CESE exorta a UE a proceder rapidamente à ratificação da Convenção de Istambul do Conselho da Europa.

3.2.3.

A UE deve incluir e incorporar no novo Programa da UE para os direitos da criança uma ampla estratégia baseada nos direitos dos rapazes e raparigas com deficiência, e integrar os direitos das crianças com deficiência em todas as políticas da UE nesse domínio. As crianças com deficiência e as suas famílias também devem ser envolvidas em todos os processos de tomada de decisão da UE, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, da CNUDPD.

3.2.4.

A UE deve igualmente reconhecer a situação específica dos jovens com deficiência e o facto de, muitas vezes, enfrentarem diversas formas de discriminação na sua vida quotidiana, nomeadamente no que se refere à igualdade de oportunidades no mercado de trabalho e à sua participação ativa na sociedade em geral. Por conseguinte, a UE deve avaliar a situação específica dos jovens com deficiência que vivem na União e propor instrumentos pertinentes (2). Além disso, a UE deve certificar-se de que esta perspetiva é incluída na próxima Estratégia da UE para a Juventude.

3.2.5.

A UE deve organizar e levar a cabo uma vasta campanha de sensibilização sobre a convenção em cooperação com os meios de comunicação social públicos (incluindo as redes sociais), a fim de lutar contra os preconceitos em relação às pessoas com deficiência. É de extrema importância que as próprias pessoas com deficiência participem nessa campanha através das organizações que as representam.

3.2.6.

A UE deve promover, facilitar e financiar a formação do pessoal do setor dos transportes e do turismo na consciencialização em matéria de deficiência e de igualdade de tratamento, e incentivar a colaboração e o intercâmbio de boas práticas entre as organizações europeias que trabalham na área da deficiência e os organismos públicos e privados responsáveis pelos transportes. Todos os materiais relacionados com o reforço das capacidades, formação, sensibilização e declarações públicas, entre outros, devem ser disponibilizados em formatos acessíveis.

3.2.7.

O CESE acolhe favoravelmente a proposta da CE sobre a Lei Europeia da Acessibilidade, que deve respeitar plenamente o artigo 9.o e as restantes disposições da CNUDPD, juntamente com mecanismos nacionais de reclamação e execução que sejam eficazes e acessíveis. Exorta as instituições da UE a tomar em consideração as conclusões e recomendações constantes do parecer (3) do CESE sobre a Lei Europeia da Acessibilidade e a assegurar, durante o processo de adoção, a participação das pessoas com deficiência através das organizações que as representam.

3.2.8.

O CESE congratula-se com o acordo interinstitucional alcançado no trílogo sobre a proposta de diretiva relativa à acessibilidade dos sítios web dos organismos do setor público, exortando as instituições a converterem este acordo numa decisão e os governos nacionais a transporem urgentemente as disposições da proposta. O CESE acolhe igualmente com agrado o facto de numerosas recomendações adotadas no seu parecer (4) terem sido incorporadas no texto final da diretiva.

3.2.9.

A UE ainda não incluiu de forma significativa medidas suficientes para as pessoas com deficiência nas estratégias de redução do risco de catástrofes. O CESE apela, por conseguinte, ao Conselho da UE para que adote um quadro de redução do risco de catástrofes para as pessoas com deficiência na Europa.

3.2.10.

A UE deve pôr em prática todas as medidas necessárias para tornar o número de emergência 112 acessível a todos. O CESE realça a necessidade de serem tomadas com urgência medidas igualmente adequadas que garantam a acessibilidade dos pontos de emergência nacionais.

3.2.11.

O CESE exorta a UE e os seus Estados-Membros a adotar, nas políticas de migração e de refugiados, uma abordagem das pessoas com deficiência baseada nos direitos humanos. Além disso, o Comité sublinha o facto de a deficiência poder muitas vezes ser motivo para perseguição e discriminação em alguns países, pelo que insta as autoridades da UE a elaborar orientações e a realizar campanhas de informação (acessíveis às pessoas com deficiência) destinadas às suas agências e aos Estados-Membros sobre deficiência, migração e asilo, bem como a integrar sistematicamente a questão da deficiência nas políticas de migração e de refugiados da UE.

3.2.12.

A UE deve adotar uma abordagem da deficiência em situações de risco e de emergência baseada nos direitos humanos, adotando um plano de execução em conformidade com as conclusões do Conselho, de fevereiro de 2015, em matéria de deficiência — incluindo a gestão de catástrofes e o Quadro de Sendai. Adicionalmente, é necessário sensibilizar e disponibilizar informações sobre iniciativas de redução do risco de catástrofes para as pessoas com deficiência e os responsáveis pelos serviços de emergência e proteção civil.

3.2.13.

A CE deve desempenhar um papel de liderança no domínio da justiça e dos direitos humanos em relação às pessoas com deficiência. O CESE apela à DG Justiça para que realize uma conferência europeia destinada a todos os serviços da UE no domínio da justiça, que inclua uma reflexão sobre os direitos de acesso à justiça das pessoas com deficiência e a forma como esses direitos se interligam com outros direitos, tais como a capacidade jurídica e o reconhecimento do direito à igualdade perante a lei.

3.2.14.

A CE deve proporcionar o financiamento necessário para a formação dos funcionários da justiça, da UE e nacionais, no domínio da legislação da UE e da CNUDPD. Além disso, o CESE insta a União Europeia e os tribunais nacionais a aplicarem as suas regras e instruções internas de um modo que facilite o acesso à justiça das pessoas com deficiência. As Recomendações Gerais do Comité das Nações Unidas para os Direitos das Pessoas com Deficiência também devem ser tidas em conta na administração da justiça, a nível nacional e da UE. Por outro lado, o CESE recomenda que a DG Justiça utilize o método aberto de coordenação para que os Estados-Membros alcancem uma abordagem equilibrada e coordenada desta questão tão importante, abrindo assim o caminho a uma resposta europeia em matéria de reconhecimento do direito à igualdade perante a lei. A CE deve criar normas europeias e promover a avaliação comparativa no que diz respeito ao acesso à justiça.

3.2.15.

O CESE exorta as instituições da UE e os Estados-Membros a abolirem as leis discriminatórias sobre tutela, permitindo que todas as pessoas com deficiência exerçam os seus direitos políticos em condições de igualdade com os outros. Assinala ainda que é indispensável adaptar de forma razoável e tornar mais acessíveis os procedimentos e os locais eleitorais e o material de voto.

3.2.16.

Infelizmente, desconhece-se quantos europeus com deficiência são privados da sua liberdade e segurança e sujeitos a tratamentos coercivos e a detenção, incluindo a esterilização forçada. O CESE insta a CE a tomar medidas eficazes para pôr fim a esta situação insustentável, a produzir dados fiáveis através do Eurostat e a pôr em prática um mecanismo de avaliação eficiente.

3.2.17.

O CESE apela à UE para que reveja as suas orientações éticas em matéria de investigação e, em especial, que estabeleça exemplos de boas práticas, mediante o desenvolvimento de formulários de consentimento em formatos acessíveis e de fácil leitura, e que impeça que terceiros tomem decisões em nome das pessoas com deficiência.

3.2.18.

A UE deve adotar legislação tendo em vista a harmonização da proteção e o combate à violência, aos abusos e à exploração, e ratificar a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (5). A UE deve adotar medidas legislativas e políticas a nível europeu contra as atividades transfronteiras nos países da UE que envolvem o tráfico de mulheres e crianças com deficiência, e insta a UE a combater a violência contra as crianças com deficiência por meio de medidas específicas e de serviços de apoio acessíveis.

3.2.19.

A iniciativa da CE sobre o pilar europeu dos direitos sociais deve incorporar e integrar plenamente as disposições da CNUDPD e criar o nível mínimo de proteção social necessário, bem como mecanismos eficazes para prevenir e atenuar a pobreza, a vulnerabilidade e a exclusão social entre as pessoas com deficiência e as suas famílias, com especial atenção às mulheres, crianças e idosos com deficiência.

3.2.20.

Existe uma clara necessidade de desenvolvimento de um sistema de coordenação europeu das prestações de segurança social na UE, incluindo um quadro claro para a portabilidade dos direitos com um número máximo de dias para o processo de reconhecimento da deficiência.

3.2.21.

A UE deve elaborar e aplicar a estratégia europeia de desinstitucionalização (6), há muito esperada e desejada, que deve, em primeiro lugar e acima de tudo, incluir um controlo muito rigoroso da utilização dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI), de modo a assegurar que são usados exclusivamente no desenvolvimento de serviços de apoio às pessoas com deficiência para que tenham uma vida independente nas suas comunidades locais. O CESE apela igualmente para a criação de um fundo europeu autónomo para a desinstitucionalização.

3.2.22.

O CESE lamenta que a CE ainda não tenha elaborado uma análise do impacto dos FEEI nas pessoas com deficiência, em consonância com a obrigação estabelecida pelo regulamento do Fundo Social Europeu no que respeita à elaboração de relatórios anuais sobre as medidas tomadas no domínio da deficiência. Essa análise deve incluir o reforço da monitorização pela CE da utilização dos FEEI em conformidade com a CNUDPD e em consulta com as organizações representativas das pessoas com deficiência, bem como os procedimentos por infração (suspensão, retirada, recuperação) lançados pela UE por incumprimento das condicionalidades ex ante.

3.2.23.

São necessários órgãos nacionais de execução mais eficazes: os seus poderes devem ser harmonizados e reforçados para facilitar o controlo da aplicação dos direitos dos passageiros em todos os modos de transporte e, além disso, o procedimento de reclamação deve ser simplificado. O CESE insta ainda a Comissão a garantir que os prestadores de cuidados podem viajar gratuitamente em todos os modos de transporte, incluindo o transporte aéreo, como já acontece ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 1371/2007 (7) e do Regulamento (UE) n.o 1177/2010 (8).

3.2.24.

A Comissão deve conferir reconhecimento oficial pleno e imediato à linguagem gestual e ao alfabeto Braille, bem como efetuar uma avaliação dos seus canais de comunicação e processos internos, a fim de elaborar e apresentar as informações de forma acessível às pessoas com deficiência. Isto deve implicar a utilização de diversos formatos acessíveis, como a linguagem gestual, o alfabeto Braille, a comunicação aumentativa e alternativa, incluindo o formato de fácil leitura. A UE deve assegurar que todas as pessoas com deficiência, independentemente da sua capacidade financeira, tenham acesso a uma educação inclusiva.

3.2.25.

A UE deve adotar um quadro inclusivo obrigatório de intercâmbio em matéria de educação, de qualidade elevada, que estabeleça critérios mínimos de acessibilidade para garantir a mobilidade na União de todos os estudantes com deficiência, especialmente os jovens, no ensino secundário e superior e na formação profissional. Todas as universidades parceiras no programa de intercâmbio de estudantes Erasmus devem assegurar a acessibilidade aos programas de ensino e às instalações, garantindo a plena participação de todos os estudantes com deficiência, especialmente os jovens.

3.2.26.

A UE deve ratificar o Tratado de Marraquexe da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), bem como facilitar e promover a sua ratificação a nível nacional pelos Estados-Membros, permitindo assim a livre circulação de versões acessíveis de material impresso para pessoas com deficiência visual ou com incapacidade de leitura de textos impressos.

3.2.27.

O CESE insta a CE a elaborar e a executar uma iniciativa específica sobre a aplicação da Agenda 2030 e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para pessoas com deficiência, no interior da UE e nas suas políticas externas, incluindo a cooperação para o desenvolvimento e o comércio internacional.

3.3.    Obrigações específicas (artigos 31.o a 33.o)

3.3.1.

O CESE exorta o Eurostat a organizar uma conferência com o intuito de estabelecer um mecanismo unificado para os serviços de estatística de todos os Estados-Membros da UE, a fim de dar seguimento à observação final n.o 71. Importa criar um mecanismo estatístico europeu no domínio da deficiência, baseado nos direitos humanos e desagregado por deficiência, género e idade, para recolher informações operacionais destinadas às políticas europeias e nacionais relativas às pessoas com deficiência.

3.3.2.

A CE deve integrar sistematicamente os direitos das pessoas com deficiência em todas as políticas e programas de cooperação internacional da UE. O CESE acolhe com agrado o projeto-piloto da UE «Colmatar as lacunas» e apela para a adoção de um programa de financiamento em matéria de deficiência destinado aos direitos das pessoas com deficiência. Este programa de financiamento deve ser aplicado, como é o caso em alguns países europeus, em estreita cooperação com as organizações europeias representativas das pessoas com deficiência, enquanto organismos intermediários, sendo responsáveis por dirigir, gerir e definir as prioridades a nível político e de financiamento. Importa assegurar que não é concedido financiamento europeu a projetos que não respeitam as disposições da convenção.

3.3.3.

A CE tem de respeitar plenamente a observação final n.o 75 mediante a criação e o estabelecimento de pontos focais em todas as direções-gerais, agências e órgãos. Todos os pontos focais devem realizar pelo menos três reuniões por ano, nas quais as organizações representativas das pessoas com deficiência devem estar presentes e participar plenamente. No dia 3 de dezembro de cada ano, a Comissão deve emitir o seu relatório anual sobre a aplicação da CNUDPD pela UE e os seus Estados-Membros.

3.3.4.

O CESE acolhe com agrado a decisão da CE de se retirar do quadro de monitorização independente, abrindo caminho à criação de um mecanismo verdadeiramente independente sob a supervisão de um órgão de direção constituído pelos membros do quadro independente. No entanto, para que o quadro da UE possa realizar as suas tarefas de forma eficaz, devem ser atribuídos urgentemente recursos financeiros e humanos.

3.4.    Cumprimento da convenção pelas instituições da UE (enquanto administrações públicas)

3.4.1.

Existe uma clara necessidade de as instituições da UE reverem as suas políticas de recursos humanos e de as alinharem com as disposições da CNUDPD, a fim de garantir que as pessoas com deficiência e os trabalhadores que têm familiares com deficiência usufruam de uma flexibilidade e um apoio razoáveis, de modo a conseguirem encontrar um equilíbrio adequado entre as obrigações profissionais e familiares. O CESE exorta a UE a rever o seu regime comum de seguro de doença, o sistema de pensões e as medidas em matéria de segurança social e proteção social relacionados com a deficiência, a fim de garantir a não discriminação e a igualdade de oportunidades para todas as pessoas com deficiência, nomeadamente reconhecendo que as necessidades em termos de saúde resultantes da deficiência são distintas das resultantes de uma doença, e promovendo uma vida e um trabalho independentes mediante a concessão do reembolso integral dos custos adicionais dos equipamentos ou serviços necessários.

3.4.2.

É crucial que todas as instituições da UE adotem proativamente iniciativas com vista ao cumprimento das disposições da Diretiva relativa à acessibilidade dos sítios web dos organismos do setor público, com um prazo concreto, dando um bom exemplo neste domínio fundamental dos direitos das pessoas com deficiência.

3.4.3.

O CESE exorta a CE e o Conselho Superior das Escolas Europeias a adotarem um plano e a afetarem os recursos financeiros e humanos necessários ao desenvolvimento e à aplicação de um sistema educativo inclusivo de qualidade a todos os níveis nas escolas europeias, assegurando uma flexibilidade razoável, apoio e uma política de não rejeição para todos os estudantes com deficiência do ensino primário e secundário.

3.4.4.

Uma vez que a taxa de emprego de pessoas com deficiência na UE é baixa, o CESE convida as instituições da UE a pôr em prática um programa de ação positiva em matéria de emprego (incluindo concursos específicos) para aumentar o número de pessoas com deficiência que trabalham nos seus serviços, oferecendo-lhes uma flexibilidade e um apoio razoáveis. A aplicação desta política deve ser revista de dois em dois anos para avaliar se são necessárias medidas corretivas.

3.4.5.

O CESE solicita às instituições, agências e órgãos da UE que garantam que os regulamentos existentes no que respeita ao pessoal são efetiva e integralmente aplicados em conformidade com a CNUDPD e que as regras internas e as disposições de execução são desenvolvidas em total conformidade com as disposições da convenção.

3.4.6.

O CESE compromete-se a desenvolver uma estrutura para aplicar as observações finais a nível interno, no que diz respeito à política de recursos humanos, aos meios de comunicação com os cidadãos e com os membros do CESE, bem como à plena inclusão e igualdade dos membros do CESE portadores de deficiência. Assegurará igualmente que esta questão é promovida nas suas relações com a comunidade empresarial, os sindicatos e a sociedade civil. Esta nova política será desenvolvida em estreita cooperação com o seu Grupo de Estudo Permanente para os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Bruxelas, 19 de outubro de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CNUDPD).

(2)  JO C 181 de 21.6.2012, p. 2.

(3)  Parecer do CESE sobre «Lei Europeia da Acessibilidade», JO C 303 de 19.8.2016, p. 103.

(4)  JO C 271 de 19.9.2013, p. 116.

(5)  Convenções do Conselho da Europa.

(6)  JO C 332 de 8.10.2015, p. 1.

(7)  JO L 315 de 3.12.2007, p. 14.

(8)  JO L 334 de 17.12.2010, p. 1