5.6.2014   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 170/116


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 216/2008 no que se refere aos aeródromos, à gestão do tráfego aéreo e aos serviços de navegação aérea e a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à implementação do Céu Único Europeu (reformulação) e a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Acelerar a implementação do Céu Único Europeu

[COM(2013) 408 final — COM(2013) 409 final — 2013/0187 (COD) e COM(2013) 410 final — 2013/0186 (COD)]

2014/C 170/20

Relator: Thomas MCDONOGH

Em 1 de julho de 2013 e em 17 de julho de 2013, o Parlamento Europeu e o Conselho, respetivamente, decidiram, nos termos dos artigos 100.o e 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera o Regulamento (CE) n.o 216/2008 no que se refere aos aeródromos, à gestão do tráfego aéreo e aos serviços de navegação aérea e a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à implementação do Céu Único Europeu (reformulação) e a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Acelerar a implementação do Céu Único Europeu

COM(2013) 408 final — COM(2013) 409 final — 2013/0187 (COD) e COM(2013) 410 final — 2013/0186 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 19 de novembro de 2013.

Na 494.a reunião plenária de 10 e 11 de dezembro de 2013 (sessão de 11 de dezembro), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 180 votos a favor, 1 voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

A realização de um Céu Único Europeu (SES) continua a ser uma grande prioridade da política europeia da aviação, bem como o seu potencial ainda inexplorado de proporcionar poupanças e melhorias no domínio da qualidade, segurança, sustentabilidade ambiental e capacidade não só ao setor da aviação mas também à economia europeia no seu conjunto. O Comité Económico e Social Europeu (CESE) tem sido com frequência a voz da sociedade civil no debate sobre o SES nos últimos anos e adotou vários pareceres temáticos (1) que contaram com o contributo importante de uma vasta gama de partes interessadas do setor da aviação. O CESE apoiou energicamente o projeto de Céu Único Europeu em todos esses pareceres.

1.2

As propostas legislativas constituem uma evolução, e não uma revolução, desenvolvendo, sem as substituir, as anteriores reformas. Porém, deverão contribuir significativamente para transformar, nos próximos anos, o sistema europeu de ATM num espaço aéreo operacional mais eficiente e integrado, a partir dos resultados já obtidos desde 2004.

1.3

O CESE pede aos Estados-Membros coragem e vontade política para criarem rapidamente o SES e à Comissão Europeia que assuma plenamente a liderança no processo de implementação.

1.4

É fundamental um sistema abrangente de desempenho para impulsionar a reforma essencial, há muito necessária, do espaço aéreo europeu. Devido à consecução lacunar dos objetivos de eficácia em termos de custos, no primeiro período de referência, é especialmente importante fixar objetivos no segundo período de referência de modo a contribuírem para a criação de verdadeiros blocos funcionais de espaço aéreo, concretizarem sinergias e eliminarem os atuais domínios de duplicação entre os 37 diferentes prestadores de serviços de navegação aérea.

1.5

A realização de um verdadeiro Céu Único Europeu, não obstante os desafios iniciais, contribuirá para o crescimento permanente do tráfego aéreo europeu, criando novas oportunidades importantes para o emprego e a perspetiva de uma estrutura de carreira europeia para os controladores.

1.6

Há que concretizar sem demora um diálogo social em larga escala. Só uma parceria global em matéria de recursos humanos no setor da aviação europeia pode assegurar o empenho uniforme necessário de todas as partes em realizar um verdadeiro SES, adotando uma abordagem harmonizada, em prol do emprego em todos os elos da cadeia de valor do setor da aviação, do ambiente e, não menos importante, dos consumidores europeus.

1.7

Os blocos de espaço aéreo funcionais devem ser agrupados e consolidados, e o seu número reduzido, o mais rapidamente possível. O conceito de centro virtual oferece uma inovação técnica compatível com o SESAR, permitindo, ao mesmo tempo, uma transição contínua e socialmente aceitável. A introdução do SESAR requererá, por conseguinte, a reforma do sistema de gestão do tráfego aéreo (ATM). Há que normalizar o equipamento ATM em toda a UE.

1.8

Os limites dos blocos funcionais de espaço aéreo devem igualmente ser revistos, a fim de garantir que têm a forma e a dimensão adequadas para o objetivo que pretendem atingir. Os fluxos de tráfego, as sinergias na prestação de serviços e eventuais melhorias do desempenho devem ser o elemento determinante da composição do bloco funcional de espaço aéreo em vez da mera proximidade geográfica ou da filiação política e cultural.

1.9

É muito bem acolhido o reforço da função de gestor da rede proposto, que dá prioridade à rede europeia sobre o interesse nacional mais limitado.

1.10

O Comité aprova a iniciativa de separar os serviços complementares de gestão do tráfego aéreo, abrindo-os dessa forma a uma maior concorrência. Insiste para que, antes disso, a Comissão avance rapidamente com a realização de uma análise de impacto independente centrada, em particular, nos aspetos sociais e laborais (2).

1.11

É importante definir objetivos para aumentar a eficiência, procurando, ao mesmo tempo, preservar a qualidade das condições de trabalho e melhorar a segurança aérea.

1.12

Os utilizadores do espaço aéreo devem participar mais na elaboração das políticas.

2.   Introdução

2.1

O setor da aviação desempenha um papel fundamental na economia europeia, que promove o comércio e o turismo e é um vetor de crescimento do emprego. O controlo do tráfego aéreo é um fator essencial na cadeia de valor do setor da aviação. O controlo do tráfego aéreo deve garantir um fluxo seguro, rápido e eficaz do tráfego aéreo, reduzindo assim o consumo de combustível, as emissões de carbono e os tempos de voo.

2.2

No entanto, historicamente os serviços de navegação aérea europeus desenvolveram-se essencialmente no interior das fronteiras nacionais, tendo cada Estado-Membro criado o seu próprio sistema de gestão do tráfego aéreo (ATM). Tal provocou uma fragmentação estrutural onerosa e ineficiente do espaço aéreo da Europa, bem como uma constante incapacidade para dar resposta às exigências dos seus clientes, ou seja, as companhias aéreas e, em última instância, os clientes pagantes.

2.3

A implementação do Céu Único Europeu (SES) e a inerente reforma do sistema europeu de gestão do tráfego aéreo devem ser aceleradas, a fim de ajudar os utilizadores do espaço aéreo a fazer face ao ambiente difícil de concorrência mundial, que inclui potências emergentes no setor da aviação como a Ucrânia e a Turquia na vizinhança imediata da UE (3), e de facilitar o crescimento económico futuro. Tendo em conta os resultados dececionantes dos pacotes legislativos SES I e SES II até à data, a Comissão apresenta uma nova proposta legislativa bem direcionada (4) para facilitar a realização rápida do Céu Único Europeu. O último pacote legislativo Céu Único Europeu II+ consiste na reformulação dos quatro regulamentos que criam o Céu Único Europeu (5), e numa proposta de alteração do Regulamento que institui a Agência Europeia para a Segurança da Aviação (6).

3.   Observações na generalidade

3.1

A iniciativa do Céu Único Europeu visa tornar a organização e a gestão do espaço aéreo europeu mais eficientes a nível global.

3.2

Com base na análise apresentada na comunicação em apreço (7) e na avaliação de impacto a ela associada (8), a Comissão propõe um pacote legislativo (Céu Único Europeu II+) (9) para consolidar e, sempre que possível, acelerar o processo de reforma da gestão do tráfego aéreo (ATM) na Europa, reforçando o nível de qualidade, eficiência, segurança e sustentabilidade ambiental na prestação de serviços de navegação aérea (ANS) e continuando na via para a consolidação do sistema europeu de ATM. Os relatórios da Unidade de Análise do Desempenho do Eurocontrol indicaram que estas insuficiências, bem como a fragmentação do sistema conduziram a mais de 4 mil milhões de euros de custos evitáveis só em 2010.

3.3

O primeiro problema abordado na avaliação de impacto do SES II+ é a ineficiência e a ineficácia em termos de custos da prestação de serviços de navegação aérea na Europa, que permanece ao nível dos voos e dos custos, bem como da capacidade. A extensão deste problema é evidente em comparação com os Estados Unidos, que abrangem um espaço aéreo de dimensão semelhante e que é controlado por um único prestador de serviços, contrariamente a 38 prestadores de serviços em rota na Europa. O prestador de serviços dos EUA controla quase 70% mais voos com menos 38% de pessoal. As principais causas desta diferença ao nível da eficiência e da produtividade são a relutância dos Estados-Membros da UE em estabelecer objetivos de custo-eficácia suficientemente ambiciosos no primeiro período de referência do sistema de avaliação do desempenho, a realização deficiente de objetivos já de si modestos, a ineficácia da fiscalização e do controlo da execução por parte das autoridades de supervisão e o número desproporcionalmente elevado de pessoal de apoio que trabalha para os prestadores de serviços.

3.4

Cinco fornecedores geram 60% do total das taxas de gestão do tráfego aéreo na Europa (10). A questão essencial é examinar a razão pela qual esses grandes operadores com economias de escala representam o dobro e, por vezes, o quádruplo dos custos dos seus homólogos de dimensão mais reduzida. A realidade é esta, por muito que todas as teorias económicas digam o contrário. Segundo estimativas da Unidade de Análise do Desempenho do Eurocontrol, o valor global em causa, de custos diretos e indiretos para o período de referência 2015-2019, deve ascender a mais de 70 mil milhões de euros.

Dado que o sistema de avaliação do desempenho do Céu Único Europeu fixa metas europeias para o segundo período de referência, para as quais os planos nacionais dos diferentes Estados-Membros devem contribuir proporcionadamente, é patente que a realização dos objetivos globais da UE de eficácia em termos de custos depende enormemente dos países que geram mais taxas, contribuindo com a sua quota-parte das melhorias requeridas. No primeiro período de referência estes países não o tinham feito.

3.5

O segundo grande problema a resolver é a fragmentação do sistema ATM. O sistema europeu de ATM é composto por 28 autoridades nacionais que supervisionam mais de uma centena de prestadores de serviços de navegação aérea que são individualmente fiscalizados por um regulador nacional separado. Como seria de esperar, tal conduz a disparidades em termos de sistemas, de regras e de procedimentos. Muitos custos adicionais resultam do grande número de prestadores de serviços na Europa que estabelecem individualmente os respetivos programas de investimento de capital próprio, organizam concursos de adjudicação de contratos diferentes e asseguram a manutenção separada dos respetivos sistemas, muitas vezes incompatíveis com os de outros prestadores de serviços de navegação aérea (11). A esses problemas acrescentam-se a formação separada do pessoal, a criação de diferentes procedimentos de funcionamento e a limitação da prestação de serviços a um espaço aéreo de dimensão reduzida. Os 38 principais prestadores nacionais de serviços de navegação aérea desembolsaram, no seu conjunto, cerca de mil milhões de euros, por ano, em bens de equipamento, sem qualquer coordenação ou análise da adequabilidade ou do benefício para toda a rede.

3.6

A iniciativa SES II+ visa melhorar a coordenação destes processos de tomada de decisões, atualmente separados, e promover mais benefícios e cooperação na rede.

4.   Evolução do desempenho dos serviços de navegação aérea

4.1

No final dos anos 90, a Europa registava graves atrasos e ineficiência na prestação de serviços de controlo do tráfego aéreo. Mais de uma década depois, o espaço aéreo europeu permanece muito fragmentado.

4.2

Em 2011, o total dos custos diretos e indiretos do controlo do tráfego aéreo na Europa ascendeu a cerca de 14 mil milhões de euros. Só os custos diretos (sob a forma de taxas de utilização) representam mais de 20% do total dos custos de exploração, excluindo o combustível, nas companhias aéreas mais eficazes. Ao contrário de outros modos de transporte, estes custos são cobrados na íntegra aos utilizadores, ou seja, aos consumidores.

4.3

Enquanto a produtividade (medida em horas de controlador de tráfego aéreo) aumentou cerca de 18% na última década, globalmente os custos salariais dos controladores de tráfego aéreo aumentaram mais rapidamente (cerca de 40%). Os controladores, porém, representam apenas um terço do total dos efetivos dos prestadores de serviços de navegação aérea, o que indica a existência de um número muito elevado de pessoal de apoio (cerca de 30 000 em 2011).

5.   Reforçar a eficiência do Céu Único Europeu

5.1

A experiência mostra também que os Estados-Membros, proprietários exclusivos ou maioritários dos prestadores de serviços, demonstram uma tendência acentuada para se concentrarem nos fluxos saudáveis de receitas do sistema dos serviços de controlo do tráfego aéreo financiado pelos utilizadores, pelo que podem estar relutantes em aprovar alterações fundamentais no sentido de um espaço aéreo operacional mais integrado, que poderia estabelecer restrições à imposição de rotas através do espaço aéreo nacional, de preferência por Estados/prestadores de serviços de navegação aérea, eventualmente com vista à geração de receitas.

5.2

Uma abordagem em rede mais coesa do planeamento da rota poderia reduzir a duração média dos voos através do espaço aéreo europeu em cerca de 10 minutos, reduzindo o consumo de combustível e as consequentes emissões de CO2. Embora a atual ineficiência não tenha efetivamente um impacto negativo nos prestadores de serviços de navegação aérea ou nos Estados, o encargo é suportado pelos clientes das companhias aéreas e, inevitavelmente, repercutido nos consumidores.

5.3

No âmbito do atual sistema, os Estados-Membros no Comité do Céu Único têm a última palavra sobre os objetivos, a adoção dos planos de desempenho e a aceitação de medidas corretivas caso os objetivos não sejam atingidos. Como indicado num parecer anterior do CESE (12), os utilizadores e os prestadores de serviços de navegação aérea deverão poder participar nas reuniões desse comité, se necessário, na qualidade de observadores. O Comité reconhece que a Comissão envidou alguns esforços para melhorar a consulta aos intervenientes não estatais do SES, nomeadamente estabelecendo um órgão consultivo do setor (13), separado, mas considera que a realização eficiente do SES requer um diálogo construtivo, bem como a plena participação de todos os intervenientes e Estados.

5.4

No seu novo pacote legislativo, a Comissão propõe o reforço dos mecanismos de controlo e de aplicação de sanções. Sendo a Comissão a entidade responsável, em última instância, pelo sistema de desempenho, o CESE apoia vigorosamente a proposta da Comissão no sentido de os membros do organismo de análise do desempenho serem por ela diretamente nomeados, a fim de garantir a sua independência.

6.   Observações na especialidade

6.1

A melhor regulação é a concorrência, mas esta não existe na prestação dos serviços essenciais de gestão do tráfego aéreo. Na verdade, não seria viável considerar a introdução da concorrência em todos os serviços de ATM a curto e médio prazo. A análise da Comissão indica que, no essencial, os serviços de controlo do tráfego aéreo de base são monopólios naturais, pelo menos com a tecnologia atual. Num contexto de ausência de concorrência, e em vez dela, é particularmente importante que a regulamentação económica desses monopólios seja forte e eficaz. Por conseguinte, o CESE apoia a proposta, implícita no SES II+, de que a Comissão seja o regulador económico europeu efetivo da gestão do tráfego aéreo.

6.2

O primeiro pacote referente ao Céu Único Europeu de 2004 visou criar mecanismos de mercado para o fornecimento de serviços de apoio, a fim de os tornar mais eficientes. Na prática, pouco se alcançou, embora os resultados tenham sido positivos nos dois casos em que essas medidas foram adotadas, na Suécia e no Reino Unido (um dos prestadores de serviços de navegação aérea realizou poupanças estimadas em cerca de 50%, em comparação com a prestação de serviços de apoio internalizados).

6.3

Neste sentido, serviços de apoio, como os serviços de meteorologia, de informação aeronáutica ou de comunicação, navegação e vigilância constituem hipóteses mais concretas. Muitas empresas dentro e fora do setor da gestão do tráfego aéreo poderiam oferecer esses serviços, que poderiam ser distribuídos entre diversos fornecedores para maximizar a concorrência ou, como sugeriu recentemente o Eurocontrol na sua análise do conceito de «serviços centralizados», atribuídos a um único prestador ou grupo de prestadores que assistiria vários prestadores de serviços essenciais.

6.4

A Comissão considera que devem ser criados mecanismos de mercado para tornar a prestação de serviços de apoio mais eficiente. No seu pacote legislativo, propõe prosseguir a desagregação e a abertura ao mercado de alguns serviços de apoio acima referidos. A maioria dos domínios que figuram na lista inicial de serviços centralizados admissíveis, propostos pelo Eurocontrol e articulados em torno da gestão de dados, pode ser assegurada pelas empresas fora do setor da gestão do tráfego aéreo. Por conseguinte, deveria ser ponderada a possibilidade de organizar também concursos para entidades diferentes dos prestadores de serviços que já existem, a fim de introduzir um elemento de concorrência, nomeadamente mais concursos públicos.

6.5

Algumas dificuldades na implementação do SES podem ser atribuídas, em parte, às dificuldades das autoridades nacionais de supervisão: insuficiência de recursos, escassez de competências e falta de independência face aos governos e aos prestadores de serviços de navegação aérea. Se estas deficiências não forem corrigidas, a implementação do Céu Único Europeu ficará será gravemente comprometida. A multiplicidade de autoridades nacionais de supervisão na Europa contrasta com a situação nos EUA, onde existe um regulador único. Uma regulamentação da UE em matéria de ATM — porventura com base nos blocos funcionais de espaço aéreo — melhoraria a coerência e a implementação efetiva do Céu Único Europeu e ajudaria a reduzir os custos de supervisão, suportados pelos utilizadores e, em última análise, pelos consumidores.

7.   Acabar com a fragmentação do sistema europeu de gestão do tráfego aéreo

7.1

A nova conceção dos blocos funcionais de espaço aéreo visa combater a fragmentação do espaço aéreo mediante a cooperação entre os prestadores de serviços de navegação aérea, a otimização da organização e da utilização do espaço aéreo e de rotas em áreas mais vastas, obtendo assim sinergias globais através de economias de escala.

7.2

Embora os Estados-Membros e os prestadores de serviços de navegação aérea tenham envidado esforços intensos para criar os blocos funcionais de espaço aéreo, a realização de progressos significativos ficou aquém das expetativas. Foram anunciados nove blocos funcionais de espaço aéreo mas nenhum está plenamente operacional e, na sua maioria, parecem destinados a satisfazer requisitos formais, em vez de desenvolverem sinergias e economias de escala.

7.3

O desenvolvimento de blocos funcionais de espaço aéreo efetivos, e não meramente institucionais, foi frequentemente travada devido ao receio de diminuição das receitas das taxas de navegação aérea, em alguns casos em mais de 30%, mediante a criação dos blocos funcionais de espaço aéreo e da racionalização dos serviços, por exemplo, encurtando as rotas. A forte oposição do pessoal, em defesa dos níveis de efetivos atuais, é outra questão com que se confrontam os Estados-Membros. Embora este sentimento de insegurança seja compreensível, não tem fundamento. Uma gestão do tráfego aéreo mais eficiente através da criação de um verdadeiro Céu Único Europeu, a par de uma evolução rápida da tecnologia, assegurará o crescimento permanente do tráfego aéreo na Europa, salvaguardando o emprego e conferindo maiores responsabilidades aos controladores em matéria de gestão e supervisão.

7.4

Além disso, foram invocados problemas de soberania nacional para proteger os monopólios existentes, em nome da proteção das infraestruturas, objetivos e operações militares no espaço aéreo da União Europeia. Embora as necessidades militares genuínas sejam justificadamente protegidas no âmbito do Céu Único Europeu, nem sempre é clara a fronteira entre as necessidades válidas e a proteção indevida dos interesses nacionais. Existem exemplos de espaço aéreo delegado que não suscitaram questões de soberania concretas.

No domínio da aviação, os principais aeroportos nacionais foram privatizados com êxito, passando a propriedade internacional. A gestão do tráfego aéreo (ATM) é, essencialmente, um serviço de infraestruturas, e há muitos exemplos na Europa de privatizações internacionais, concretizadas ou em fase de projeto, de serviços de infraestruturas essenciais na área da energia, incluindo o domínio sensível da produção de energia nuclear, das telecomunicações, da água, etc. Um prestador de serviços de navegação aérea europeu parcialmente privatizado é, de facto, parcialmente propriedade de interesses não nacionais.

7.5

O CESE reconhece a intenção da Comissão de continuar a instaurar processos de infração contra os Estados-Membros relativamente aos blocos funcionais de espaço aéreo, especialmente contra aqueles em que os progressos da reforma não sejam claramente demonstrados nos próximos meses. Embora considere que a solução mais apropriada é, de longe, a implementação coordenada do Céu Único Europeu por todos os Estados-Membros, sob a direção da Comissão, o processo por infração deve ser utilizado sempre como último recurso contra o incumprimento das normas. A Comissão também faz bem em continuar empenhada na adoção, por parte dos blocos funcionais de espaço aéreo, de modelos organizacionais adaptados a uma rede europeia de espaços aéreos operacionais mais integrados.

7.6

O CESE apoia a proposta da Comissão, constante do pacote legislativo, de se continuar a desenvolver o conceito de blocos funcionais de espaço aéreo, de modo a que este se torne uma ferramenta mais orientada para o desempenho e mais flexível que permitirá aos prestadores de serviços de navegação aérea, com base em parcerias setoriais, atingir os objetivos fixados pelo sistema de desempenho do Céu Único Europeu.

8.   O papel do Eurocontrol

8.1

O Eurocontrol continua a desempenhar um papel importante na implementação do Céu Único Europeu. Inicialmente criado para proporcionar um sistema de controlo do tráfego aéreo coletivo em seis Estados europeus, ao longo dos anos o Eurocontrol passou a assumir muitas outras tarefas. Com o advento de um Céu Único Europeu, o Eurocontrol deve concentrar-se na sua função principal de coordenação da prestação de serviços.

8.2

Num esforço para melhorar a coordenação das suas atividades, a UE e o Eurocontrol assinaram, em 2012, um acordo de alto nível (14) que reconhece o contributo que o Eurocontrol pode dar tendo em vista o estabelecimento de um sistema europeu de gestão do tráfego aéreo eficiente, apoiando a única entidade reguladora europeia de ATM designada pela UE, isto é, a Comissão. Neste contexto, o Eurocontrol continuará a apoiar a Comissão e a AESA na elaboração de normas e regulamentação pertinentes.

8.3

Já foram tomadas medidas significativas e a parte final do processo de reforma do Eurocontrol começou em 2013. Continua a ser uma organização intergovernamental e o seu estatuto e órgãos de decisão (como o Conselho Provisório) ainda não refletem os resultados da reforma recente. A Comissão apoia a reforma do Eurocontrol em curso que se centrará na gestão e no funcionamento da rede europeia de gestão do tráfego aéreo. A UE já reconheceu a importância específica deste papel através do mandato conferido ao Eurocontrol para exercer as funções de gestor da rede estabelecidas na legislação relativa ao Céu Único Europeu. Esta evolução deve ser promovida em plena consonância com o quadro jurídico do Céu Único Europeu e com a implantação do SESAR. Além disso, não pode concretizar-se sem uma mudança na gestão desta organização em prol de um ambiente mais orientado para o setor.

8.4

O sistema de desempenho é crucial para a realização do Céu Único Europeu. Por isso a responsabilidade pela análise das previsões do tráfego e das taxas unitárias dos Estados-Membros da UE assumida pela Comissão Alargada do Eurocontrol deve ser transferida para o organismo de análise do desempenho, que as deverá examinar em nome da Comissão. Dado que a Comissão Alargada responde perante o Conselho Provisório do Eurocontrol e, por conseguinte, os Estados-Membros da UE, a proposta de transferência da análise das previsões do tráfego e das taxas unitárias dos Estados-Membros da UE para o organismo de análise do desempenho teria mais lógica no contexto do sistema de desempenho e em consonância com o papel de regulador económico europeu da gestão de tráfego aéreo proposto para a Comissão. A análise das previsões de tráfego e da taxa unitária dos países terceiros membros do Eurocontrol, igualmente efetuada através do sistema de desempenho do Céu Único Europeu, deve continuar a ser realizada pela Comissão Alargada do Eurocontrol.

8.5

O Eurocontrol foi designado pela Comissão como gestor da rede, sob a direção do Conselho de Gestores da Rede, função que já está a demonstrar a sua utilidade.

8.6

O conceito de uma parceria setorial para melhorar a prestação de serviços deve ser considerado como um objetivo que também se enquadra na reforma do Eurocontrol. Para este fim, os prestadores de serviços de navegação aérea e os utilizadores do espaço aéreo participariam na função de gestor da rede de acordo com o modelo de empresa comum. Este modelo garante a separação em relação às entidades reguladoras, afastando a função de gestor da rede de um papel de organização intergovernamental que controla uma manta de retalhos de blocos de espaço aéreo nacional, conferindo-lhe em vez disso, um papel de coordenação de serviços de navegação aérea mais racional, centrado na criação de uma rede do espaço aéreo europeu mais eficiente e rentável, que faça jus ao nome — Céu Único Europeu.

8.7

O CESE saúda a proposta da Comissão, no referido pacote legislativo, de reforçar o papel do gestor da rede, numa ótica de racionalização da governação que conferirá um papel mais relevante às empresas do setor (prestadores de serviços de navegação aérea, utilizadores do espaço aéreo e aeroportos).

9.   O papel da Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA) na gestão do tráfego aéreo (ATM)

9.1

A AESA foi crucial para a política de aviação da UE desde 2002, tendo como objetivo alcançar um nível de segurança elevado e uniforme, enquanto promovia os objetivos tradicionais da UE: condições de concorrência equitativa, livre circulação, proteção do ambiente, ausência de dupla regulamentação, promoção das normas da OACI (15), etc.

9.2

A legislação convida a Comissão a propor alterações para eliminar a duplicação, quando forem estabelecidas as normas de execução da AESA correspondentes.

9.3

A nível da gestão do tráfego aéreo, a situação era diferente dada a distinção entre «regras de segurança» e «regras não relacionadas com a segurança» atendendo ao papel simbólico importante do Eurocontrol quanto às segundas.

9.4

Estando agora iminente a implantação do projeto SESAR, o problema do alinhamento das diferentes normas técnicas pode agravar-se na medida em que todas as tecnologias e conceitos conexos devem ser facilitados ou tornados obrigatórios pelo sistema regulamentar. Temos de avançar para uma estratégia regulamentar única, com a estrutura normativa e o processo de consultas sob a égide da AESA.

9.5

No referido pacote legislativo, a Comissão propõe eliminar a sobreposição das regulamentações do Céu Único Europeu e da AESA, e partilhar nesta conformidade o trabalho entre as diferentes instituições. Por conseguinte, a Comissão deve dedicar-se às principais questões de regulamentação económica, enquanto a AESA assegura a elaboração e supervisão coordenadas de todas as regras técnicas, beneficiando dos conhecimentos especializados do Eurocontrol.

10.   Diálogo social

10.1

É urgente abordar a questão do diálogo social, com todos os intervenientes na cadeia de valor do setor da aviação, tal como referido no recente parecer exploratório do CESE sobre o «Céu Único Europeu II+» (16) pois é extremamente importante para a implementação do Céu Único Europeu.

10.2

Neste sentido, há que estabelecer normas a nível da UE para garantir o emprego e a qualidade no setor da aviação. Assim, o 5.o Pilar do Céu Único Europeu é crucial para ter em devida conta os desafios em domínios como o emprego, a mobilidade dos trabalhadores, as mudanças na gestão de pessoal e a formação contínua. Cabe reforçar o diálogo social e não restringi-lo apenas ao setor da gestão do tráfego aéreo, abrindo-o aos outros parceiros sociais, fora dos serviços de navegação aérea, a fim de debater o impacto social nos trabalhadores dos serviços de navegação aérea, nas transportadoras aéreas e nos aeroportos, bem como debater formas de garantir os postos de trabalho no setor da aviação em geral.

Bruxelas, 11 de dezembro de 2013

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Henri MALOSSE


(1)  JO C 182 de 4.8.2009, pp. 50-55; JO C 376 de 22.12.2011, pp. 38-43; JO C 198 de 10.7.2013, pp. 9-13.

(2)  Ver JO C 198 de 10.7.2013, pp. 9-13 (ponto 4.7)

(3)  JO C 198 de 10.7.2013, pp. 51-55.

(4)  Idem.

(5)  COM(2013) 410 final.

(6)  COM(2013) 409 final.

(7)  COM(2013) 408 final.

(8)  SWD(2013) 206 final.

(9)  COM(2013) 409 e 410 final.

(10)  Ver como referência o quadro «Calculation of 2014 Unit Rates — Adjustments and revenues», in documento informativo «Initial Estimates of the Route Charges Cost-Bases and Unit Rates», publicado pela Comissão Alargada do Eurocontrol para as taxas de rota, em 16 de julho de 2013 (p. 6); http://www.eurocontrol.int/sites/default/files/content/documents/route-charges/operation-reports/cer-99-2013-3452-fin_item_2-en.pdf.

(11)  Ver relatório do Eurocontrol «U.S./Europe Comparison of ATM-Related Operational Performance», 2010 [Comparação entre os EUA e a Europa ao nível dos resultados operacionais do sistema ATM].

(12)  JO C 198 de 10.7.2013, p. 9.

(13)  O órgão consultivo do setor reuniu-se pela primeira vez em 2004. Segundo o sítio Web da Comissão, proporciona a todas as partes interessadas do setor a oportunidade de comunicar à Comissão Europeia as suas expetativas em relação ao Céu Único Europeu e de partilhar as suas opiniões no que respeita às várias opções e calendários. A Comissão pretende utilizar as recomendações do órgão consultivo do setor para prestar orientação, não só no contexto das iniciativas legislativas, mas também da normalização, da investigação e dos investimentos em infraestruturas por ela efetuados. (http://ec.europa.eu/transport/modes/air/single_european_sky/consultation_body_en.htm)

(14)  http://register.consilium.europa.eu/pdf/en/12/st13/st13792.en12.pdf.

(15)  Organização de Aviação Civil Internacional.

(16)  JO C 198 de 10.7.2013, p. 9.