20.8.2013 |
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Jornal Oficial da União Europeia |
CE 239/18 |
Quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
Transferência transfronteiriça das sedes sociais
P7_TA(2012)0019
Resolução do Parlamento Europeu, de 2 de fevereiro de 2012, com recomendações à Comissão sobre uma 14.a diretiva relativa ao direito das sociedades sobre a transferência transfronteiriça das sedes sociais (2011/2046(INI))
2013/C 239 E/03
O Parlamento Europeu,
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Tendo em conta o artigo 225.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, |
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Tendo em conta os artigos 50.o e 54.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, |
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Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 21 de maio de 2003, intitulada "Modernizar o direito das sociedades e reforçar o governo das sociedades na União Europeia – Uma estratégia para o futuro" (COM(2003)0284), |
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Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 3 de março de 2010, intitulada "Europa 2020 – Estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo" (COM(2010)2020), |
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Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 27 de outubro de 2010, intitulada "Um Ato para o Mercado Único – Para uma economia social de mercado altamente competitiva – 50 propostas para, juntos, melhor trabalhar, empreender e fazer comércio", COM(2010)0608, |
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Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 13 de abril de 2011, intitulada "Ato para o Mercado Único – Doze alavancas para estimular o crescimento e reforçar a confiança mútua – Juntos para um novo crescimento" (COM(2011)0206), |
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Tendo em conta o Regulamento (CE) n.o 2157/2001 do Conselho, de 8 de outubro de 2001, relativo ao estatuto da sociedade europeia (SE) (1), |
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Tendo em conta a Diretiva 2001/86/CE do Conselho, de 8 de outubro de 2001, que completa o estatuto da sociedade europeia no que respeita ao envolvimento dos trabalhadores (2), |
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Tendo em conta a Diretiva 2005/56/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2005, relativa às fusões transfronteiriças das sociedades de responsabilidade limitada (3), |
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Tendo em conta os acórdãos do Tribunal de Justiça nos processos Daily Mail (4), Centros (5), Überseering (6), Inspire Art (7), SEVIC Systems (8), Cadbury Schweppes (9) e Cartesio (10), |
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Tendo em conta a sua Resolução, de 4 de julho de 2006, sobre desenvolvimentos recentes e perspetivas do direito das sociedades (11), |
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Tendo em conta a sua Resolução, de 25 de outubro de 2007, sobre a Sociedade Privada Europeia e a Décima Quarta Diretiva relativa ao direito das sociedades sobre a transferência da sede social (12), |
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Tendo em conta a sua Resolução, de 19 de fevereiro de 2009, sobre a aplicação da Diretiva 2002/14/CE, que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia (13), |
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Tendo em conta a sua Resolução, de 10 de março de 2009, que contém recomendações à Comissão sobre a transferência transfronteiriça de sedes de empresas (14), |
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Tendo em conta a sua Resolução, de 23 de novembro de 2010, sobre os aspetos do Direito Civil, do Direito Comercial, do Direito da Família e do Direito Internacional Privado do Plano de Ação de aplicação do Programa de Estocolmo (15), |
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Tendo em conta os artigos 42.o e 48.o do seu Regimento, |
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Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Jurídicos e o parecer da Comissão do Emprego e dos Assuntos Sociais (A7-0008/2012), |
A. |
Considerando que os artigos 49.o e 54.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia garantem a liberdade de estabelecimento a todas as sociedades; considerando que a migração transfronteiras de empresas é um dos elementos fundamentais na realização do mercado interno; considerando a falta de uniformidade da legislação em matéria de transferência e de modalidades de transferência de sede, estatutária ou real, de uma sociedade de direito nacional existente, de um Estado-Membro para outro, no âmbito do mercado único, bem como o risco ligado ao emprego, as dificuldades administrativas, os custos gerados, as implicações sociais e a ausência de segurança jurídica; |
B. |
Considerando que a maioria dos participantes na consulta pública encerrada em 15 de abril de 2004 se manifestaram a favor da adoção de uma diretiva relativa ao Direito das sociedades no que toca à transferência transfronteiriça das sedes das sociedades; |
C. |
Considerando que, dadas as disparidades entre as exigências impostas pelos Estados-Membros para a transferência das sociedades, o acórdão do Tribunal de Justiça no processo Cartesio confirma a necessidade de um regime harmonizado para reger a transferência transfronteiriça das sedes das sociedades; |
D. |
Considerando que o Tribunal de Justiça, no acórdão proferido no âmbito do processo Cartesio, não esclareceu suficientemente a matéria relativa à transferência da sede de uma empresa, ao contrário das expectativas da Comissão expressas na sua avaliação de impacto de 2007 (16); |
E. |
Considerando que compete aos legisladores e não ao Tribunal de Justiça estabelecer, com base no Tratado, as medidas relevantes para a concretização da liberdade de transferência de sede por parte de uma empresa; |
F. |
Considerando que, em consequência da posição da Comissão, expressa na sua avaliação de impacto de 2007, segundo a qual "a opção 'não agir' parece mais proporcional, já que não é necessária qualquer outra ação da UE" (17), a mobilidade das empresas continua a deparar-se com elevados encargos administrativos e com custos sociais e fiscais; |
G. |
Considerando que a avaliação de impacto efetuada em 2007 pela Comissão não abrange as consequências para as políticas sociais e de emprego, à exceção da participação dos trabalhadores; |
H. |
Considerando a necessidade de proibir a utilização abusiva de sociedades que apenas dispõem de um endereço postal ou de sociedades de fachada com vista a escapar às obrigações jurídicas, sociais e fiscais que lhes incumbem; |
I. |
Considerando que a transferência transfronteiriça da sede deverá ocorrer em condições de neutralidade fiscal; |
J. |
Considerando que, em caso de transferência da sede, deve ser mantida inalterada a personalidade jurídica da empresa em causa, tendo em vista o seu bom funcionamento; |
K. |
Considerando que a transferência não deverá afetar os direitos das partes interessadas (acionistas minoritários, trabalhadores e credores) existentes antes da transferência; |
L. |
Considerando que o processo de transferência deve ser regido por normas rigorosas em matéria de transparência e de informação às partes interessadas antes da realização da transferência; |
M. |
Considerando a extrema importância do direito dos trabalhadores a serem ouvidos aquando da transferência da sede de uma empresa; |
N. |
Considerando a necessidade de garantir a coerência entre as diferentes disposições legislativas em matéria de procedimentos de envolvimento dos trabalhadores constantes das diretivas em matéria de Direito das sociedades; |
1. |
Solicita à Comissão que apresente rapidamente, com base no artigo 50.o, n.o 1 e n.o 2, alínea g), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, uma proposta de diretiva relativa à transferência transfronteiriça das sedes das sociedades, tendo em conta as recomendações circunstanciadas constantes do anexo; |
2. |
Confirma que estas recomendações respeitam o princípio da subsidiariedade e os direitos fundamentais dos cidadãos; |
3. |
Entende que a proposta requerida não tem incidências financeiras; |
4. |
Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução e as recomendações circunstanciadas constantes do anexo à Comissão, ao Conselho e aos Parlamentos e Governos dos Estados-Membros. |
(1) JO L 294 de 10.11.2001, p. 1.
(2) JO L 294 de 10.11.2001, p. 22.
(3) JO L 310 de 25.11.2005, p. 1.
(4) Processo 81/87 Daily Mail [1988] Col. 5483.
(5) Processo C 212/97 Centros [1999] Col. I-1459.
(6) Processo C 208/00 Überseering [2002] Col. I-9919.
(7) Processo C-167/01 Inspire Art [2003] Col. I-10155.
(8) Processo C- 411/03 SEVIC Systems [2005] Col. I-10805.
(9) Processo C- 196/04 Cadbury Schweppes [2006] Col. I-7995.
(10) Processo C- 210/06 Cartesio [2008] Col. I-9641.
(11) JO C 303 E de 13.12.2006, p. 114.
(12) JO C 263 E de 16.10.2008, p. 671.
(13) JO C 76 E de 25.3.2010, p. 11.
(14) JO C 87 E de 1.4.2010, p. 5.
(15) Textos Aprovados, P7_TA(2010)0426.
(16) Documento de trabalho dos serviços da Comissão: Avaliação de Impacto da Diretiva relativa à transferência transfronteiriça da sede, SEC (2007)1707, ponto 3.5.2, pp. 24-25.
(17) Documento de trabalho dos serviços da Comissão: Avaliação de Impacto da Diretiva relativa à transferência transfronteiriça da sede, SEC (2007)1707, ponto 6.2.4, p. 39.
Quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
ANEXO
RECOMENDAÇÕES DETALHADAS QUANTO AO CONTEÚDO DA PROPOSTA REQUERIDA
Recomendação 1 (âmbito de aplicação da diretiva a adotar)
A diretiva deve aplicar-se às sociedades de responsabilidade limitada, na aceção do artigo 2.o, n.o1, da Diretiva 2005/56/CE.
O âmbito de aplicação da diretiva deve dar uma resposta adequada à questão da separação entre a sede social e a sede administrativa de uma empresa.
Recomendação 2 (repercussões da transferência transfronteiriça)
A diretiva deverá permitir que as sociedades exerçam o seu direito de estabelecimento ao transferirem-se para um Estado-Membro de acolhimento sem perderem a sua personalidade jurídica, convertendo-se numa sociedade regulada pela lei do Estado-Membro de acolhimento sem terem de proceder à sua liquidação.
Além disso, a transferência não contornará condições legais, sociais e fiscais.
A transferência deverá produzir efeitos na data do registo no Estado-Membro de acolhimento. A partir dessa data, a sociedade deverá ser regida pela legislação daquele Estado.
A transferência não deverá afetar as relações jurídicas da sociedade com terceiros.
A transferência deverá ser neutra do ponto de vista fiscal, nos termos da Diretiva 90/434/CEE (1).
Recomendação 3 (normas em matéria de transparência e de informação antes da decisão de transferência)
O órgão de administração ou de direção de uma sociedade cuja transferência esteja prevista deve elaborar um relatório e um plano de transferência. Antes de a administração tomar uma decisão sobre o relatório e o plano de transferência, os representantes dos trabalhadores ou, se não houver representantes, os próprios trabalhadores, devem ser informados e consultados sobre a proposta de transferência, na aceção do artigo 4.o da Diretiva 2002/14/CE (2).
O relatório deve ser submetido aos acionistas e aos representantes dos trabalhadores ou, se não houver representantes, aos próprios trabalhadores.
O relatório deverá descrever e justificar os aspetos económicos, legais e sociais da transferência e explicar quais as suas consequências para os acionistas, os credores e os trabalhadores, que podem analisar o relatório durante um determinado período, não podendo este ser inferior a um mês nem superior a três meses antes da data da reunião de acionistas destinada à aprovação da transferência.
O plano de transferência deve incluir:
a) |
a forma jurídica, a designação e a sede da sociedade no Estado-Membro de origem; |
b) |
a forma jurídica, a designação e a sede da sociedade no Estado-Membro de acolhimento; |
c) |
os estatutos previstos para a sociedade no Estado-Membro de acolhimento; |
d) |
o calendário previsto para a transferência; |
e) |
a data a partir da qual as transações da sociedade que pretende transferir a sua sede serão consideradas, para efeitos contabilísticos, como tendo lugar no Estado-Membro de acolhimento; |
f) |
informações detalhadas sobre a transferência da administração central ou principal local de atividade; |
g) |
os direitos garantidos aos acionistas, trabalhadores e credores da sociedade ou as medidas relevantes propostas, bem como o endereço onde todas essas informações podem ser obtidas gratuitamente; |
h) |
se a sociedade for gerida com base num regime de participação dos trabalhadores e se a legislação nacional dos Estados-Membros de acolhimento não impuser esse tipo de regime, informações sobre os procedimentos que determinam as modalidades de participação dos trabalhadores. |
O relatório e o plano de transferência serão apresentados aos acionistas e aos representantes dos trabalhadores da sociedade para apreciação num prazo adequado antes da data da assembleia-geral de acionistas.
O plano de transferência deverá ser publicado, nos termos da Diretiva 2009/101/CE (3).
Recomendação 4 (decisão de transferência tomada pela assembleia-geral de acionistas)
A assembleia-geral de acionistas deve aprovar a proposta de transferência em conformidade com as disposições aprovadas e pela maioria exigida para alterar os estatutos nos termos da legislação aplicável à sociedade no Estado-Membro de origem.
Se a sociedade for gerida com base no regime de participação dos trabalhadores, a assembleia de acionistas pode subordinar a conclusão da transferência à sua aprovação expressa do regime de participação dos trabalhadores.
Os Estados-Membros devem poder adotar disposições destinadas a assegurar uma proteção adequada dos sócios minoritários que se tenham pronunciado contra a transferência, por exemplo, através do direito de abandonarem a posição que detêm na empresa, nos termos da legislação aplicável no seu Estado-Membro de origem.
Recomendação 5 (verificação da legalidade da transferência)
O Estado-Membro de origem deve verificar, nos termos da sua legislação, a legalidade do procedimento de transferência.
A autoridade competente designada pelo Estado-Membro de origem deve emitir um certificado que declare que foram concluídos todos os atos e as formalidades exigidos antes da transferência.
O certificado, uma cópia dos estatutos previstos para a sociedade no Estado-Membro de acolhimento e uma cópia da proposta de transferência devem ser apresentados num prazo adequado ao organismo responsável pelo registo no Estado-Membro de acolhimento. Estes documentos devem ser de molde a permitir o registo da sociedade no Estado-Membro de acolhimento. A autoridade responsável pelo registo no Estado-Membro de acolhimento deve verificar se estão preenchidas as condições materiais e formais para a transferência, incluindo os requisitos estabelecidos no Estado-Membro de acolhimento para a constituição de tal sociedade.
A autoridade competente do Estado-Membro de acolhimento deve notificar imediatamente o registo à autoridade homóloga do Estado-Membro de origem. Na sequência dessa notificação, a autoridade do Estado-Membro de origem deve suprimir a sociedade do registo.
Tendo em vista a proteção de terceiros, cumpre publicar tanto a inscrição no registo do Estado-Membro de acolhimento como a supressão do registo no Estado-Membro de origem.
Recomendação 6 (medidas de proteção)
Uma sociedade que tenha sido sujeita a procedimentos de cessação de atividade, liquidação, insolvência ou suspensão de pagamentos ou outros procedimentos similares não será autorizada a realizar uma transferência transfronteiriça da sua sede.
Para efeitos de processos judiciais ou administrativos em curso que tenham sido iniciados antes da transferência da sede, a sociedade deve ser considerada como tendo a sua sede no Estado-Membro de origem. Os credores existentes devem ter direito a um depósito de segurança.
Recomendação 7 (direitos dos trabalhadores)
Os direitos de participação dos trabalhadores devem ser preservados no âmbito da transferência. A participação dos trabalhadores deve ser regida pela legislação do Estado-Membro de acolhimento.
No entanto, a legislação do Estado-Membro de acolhimento não é aplicável, caso:
a) |
não preveja um nível de participação pelo menos idêntico ao praticado na sociedade no Estado-Membro de origem, ou |
b) |
não dê aos trabalhadores dos estabelecimentos da sociedade situados noutros Estados-Membros a mesma possibilidade de exercer os direitos de participação de que os trabalhadores beneficiavam antes da transferência. |
Além disso, as disposições legislativas sobre os direitos dos trabalhadores deveriam estar conformes com o acervo da União.
(1) Diretiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de julho de 1990, relativa ao regime fiscal aplicável às fusões, cisões, entradas de ativos e permutas de ações entre sociedades de Estados-membros diferentes (JO L 225 de 20.8.1990, p. 1).
(2) Diretiva 2002/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2002, que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia (JO L 80 de 23.3.2002, p. 29).
(3) Diretiva 2009/101/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009, tendente a coordenar as garantias que, para proteção dos interesses dos sócios e de terceiros, são exigidas nos Estados–Membros às sociedades, na aceção do segundo parágrafo do artigo 48.o do Tratado, a fim de tornar equivalentes essas garantias em toda a Comunidade (JO L 258 de 1.10.2009, p. 11).