28.12.2010   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 354/30


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Mutações industriais e perspectivas para o sector dos motociclos na Europa» (parecer de iniciativa)

2010/C 354/05

Relator: Virgilio RANOCCHIARI

Co-relator: Patrizio PESCI

Em 16 de Julho de 2009, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no artigo 29.o, n.o 2 do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre:

Mutações industriais e perspectivas para o sector dos motociclos na Europa.

A Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI), encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 4 de Fevereiro de 2010.

Na 461.a reunião plenária de 17 e 18 de Março de 2010 (sessão de 18 de Março), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 140 votos a favor, com 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O sector dos motociclos reveste-se de considerável importância para a economia e o emprego na UE. Os fabricantes representam realidades muito diferentes, desde os que operam à escala mundial, cobrindo todos os segmentos de mercado ou segmentos muito especializados, aos que operam à escala nacional, ou mesmo local, a um nível, por vezes, quase artesanal. A situação dos fornecedores é idêntica, destacando-se a forte presença de PME (1).

1.2

A diminuição da procura, despoletada pela crise no último trimestre de 2008, gerou uma série de efeitos negativos em todo o sector, com graves consequências em termos estruturais e a nível do emprego (a procura baixou 31 %, com a consequente diminuição em 35 % do volume de negócios e de encomendas e um impacto negativo no emprego). Os dados provisórios relativos a 2009 confirmam a evolução negativa do mercado com uma quebra de 21 % e 25 % em relação a 2008 e 2007, respectivamente.

1.3

O CESE receia que em 2010, se não forem desenvolvidas com urgência políticas de apoio ao sector, se venham a registar novas perdas substanciais de postos de trabalho.

1.4

O CESE organizou uma audição pública, no âmbito do 67.o Salão Internacional do Motociclo (Milão, 12 de Novembro de 2009), onde recolheu novos testemunhos de fabricantes, fornecedores de componentes, sindicatos, utilizadores, ONG e universidades. A audição confirmou, em substância, as convicções que já haviam emergido do grupo de trabalho.

1.5

Neste contexto, o CESE:

a)

entende que são necessárias medidas adequadas de estímulo à procura de motociclos nos Estados-Membros e insta a Comissão Europeia e os próprios Estados-Membros a encorajarem a sua aplicação ou renovação a prazo, acordando especial atenção aos veículos com baixo impacto ambiental e dispositivos de segurança avançados;

b)

deseja que a Comissão, ao preparar a iminente proposta de regulamento sobre os motociclos, proponha objectivos exequíveis pelo sector, graduais e em consonância com todo o processo de concepção, produção e comercialização. Nomeadamente, deverão ser asseguradas soluções flexíveis que a indústria esteja em condições de adoptar, com um consequente aumento controlado dos custos para o consumidor, tendo em conta a conjuntura e a grande diversidade de produtos;

c)

considera necessário, a fim de assegurar a lealdade da concorrência, exercer um controlo mais apertado ao nível da homologação e da comercialização, bem como a reciprocidade nos acordos de comércio livre entre a UE e o Sudeste Asiático;

d)

insta a Comissão a adoptar uma abordagem ao sector dos motociclos semelhante à da iniciativa CARS21 (2), visando apoiar as parcerias no sector, a competitividade e o emprego;

e)

entende que o Sétimo Programa-Quadro para a Investigação e o Desenvolvimento (7.o PQ) poderá contribuir para a realização destes objectivos e apela à criação de uma plataforma dedicada ao sector dos motociclos, apoiando as empresas que produzem na Europa e são parte integrante da cadeia de produção europeia;

f)

insta a indústria a prosseguir as reestruturações, fusões e aquisições e a desenvolver novos laços de cooperação, inclusivamente com os fornecedores de componentes, no sentido de maximizar todas as sinergias possíveis;

g)

considera necessário desenvolver o «diálogo social» para favorecer o emprego no sector, criando normas europeias para a formação permanente e a especialização dos trabalhadores e, simultaneamente, apoiar uma redução do trabalho precário;

h)

exorta a Comissão a acordar a devida importância aos motociclos no âmbito das medidas previstas no Plano de Acção para a Mobilidade Urbana, face ao contributo indiscutível que podem dar para uma mobilidade mais sustentável.

2.   O sector dos motociclos na Europa

2.1

O sector dos motociclos reveste-se de considerável importância para a economia e o emprego na UE. Pesem embora algumas semelhanças com o sector automóvel (3), o sector dos motociclos apresenta, sobretudo, uma série de especificidades em virtude da sua menor dimensão, por apresentar uma estrutura mais fragmentada e possuir uma tipologia de produção mais diversificada.

2.2

Ao longo das últimas décadas, este sector sofreu uma evolução importante, face à concorrência crescente do Japão a que as marcas históricas europeias têm estado sujeitas. Os fabricantes japoneses, que actualmente se contam entre os líderes do sector, desenvolveram actividades de produção directamente na UE. Com o tempo, o sector na Europa reorganizou-se através de reestruturações, fusões e aquisições, assim como com a constituição de grupos industriais de dimensão média-grande que operam em paralelo com produtores no sector dos nichos de mercado e com um importante número de PME.

Actualmente, os fabricantes «tradicionais» europeus, japoneses e americanos detêm uma posição de liderança no mercado europeu, mas desde os anos noventa que têm de enfrentar a concorrência crescente das economias emergentes. Em termos do número de veículos produzidos, o peso da UE é apenas relativo (1, 4 milhões), particularmente em relação à China (mais de 20 milhões), à Índia (mais de 8 milhões) e a Taiwan (1,5 milhões). Todavia, a sua produção é superior em termos de valor acrescentado e no plano da inovação, qualidade e segurança.

2.3

Nas estatísticas do Eurostat, o código NACE correspondente ao sector dos motociclos é o 35.41. Os dados mais actualizados ao nível do sector dos motociclos na UE27, relativos a 2006, dão conta de uma realidade constituída por 870 empresas, 80 % das quais estão localizadas em seis Estados-Membros (Itália, Reino Unido, Alemanha, França, Espanha e Áustria). O volume de negócios médio de 8 milhões de euros reflecte o número importante de PME, estimado em 650, ou seja, aproximadamente 75 % do total.

2.4

90 % da produção europeia provém de cerca de uma centena de fabricantes de dimensão média-grande e média-pequena, que operam em diferentes países da UE (para além dos já citados, na República Checa, Países Baixos, Portugal, Eslovénia e Suécia), bem como na Noruega e na Suíça. Os restantes 10 % da produção europeia repartem-se por fabricantes de dimensões pequenas ou muito pequenas.

2.5

Os fabricantes representam realidades muito diferentes, desde os que operam à escala mundial, cobrindo todos os segmentos de mercado (motociclos destinados a vários fins e de diferentes cilindradas, motoretas (scooters) de diferentes cilindradas, ciclomotores, triciclos e quadriciclos) ou segmentos muito especializados, aos que operam à escala nacional, ou mesmo local, a um nível, por vezes, quase artesanal em termos de dimensão e de processo de produção.

2.6

A regulamentação técnica (homologação europeia) define várias categorias de motociclos, com diferentes características (cilindrada, utilização prevista). Por seu turno, a directiva europeia relativa à carta de condução estabelece diferentes requisitos necessários para a condução de motociclos (ciclomotores de categoria AM, motociclos de categoria A1 e motociclos de categoria A). Esta complexidade favorece a fragmentação da produção e reduz as economias de escala.

2.7

A fragmentação na indústria dos motociclos tem em parte razões históricas, mas é sobretudo um resultado da própria natureza do mercado. Se os segmentos mais directamente ligados à mobilidade utilitária (urbana, em particular), tais como o das motoretas permitem maiores sinergias no plano da produção, sobretudo ao nível dos motores, os segmentos ligados aos motociclos não se prestam tanto a sinergias, como a utilização de motores e de componentes comuns em modelos de marcas diferentes. Antes de mais, as suas características dinâmicas variam muito consoante a dimensão dos veículos, a que acrescem diferenças decorrentes dos fins específicos a que se destinam e, por fim, as expectativas dos utilizadores. Em muitos casos, há uma forte identificação das diferentes marcas com determinadas configurações do motor (por exemplo, o motor boxer da BMW, a distribuição desmodrómica da Ducati, o motor V-twin da Moto Guzzi ou o motor tricilíndrico da Triumph) ou do modelo de motociclo, de acordo com a procura de um mercado composto, em larga medida, por aficionados, tanto a nível europeu como dos mercados de exportação.

2.8

Os veículos são produzidos em séries reduzidas e em número limitado, pelo que a rentabilidade do capital investido é menor do que no sector automóvel, o que também se reflecte, em parte, nos sectores do fornecimento de componentes e da distribuição.

2.9

Apoiado num mercado europeu em expansão desde 2002 (+22 % no período 2002-2007), o volume de negócios gerado pela produção na UE ascendia a 7 mil milhões de euros em 2006, para um volume de negócios total de 34 mil milhões de euros relativo ao conjunto do sector dos motociclos na União Europeia. É interessante notar que, entre 2004 e 2006, o sector registou na UE um crescimento de 12 % – superior, portanto, em termos percentuais, ao do sector da indústria transformadora em geral e ao do sector automóvel (8 % em ambos os casos) –, com um consequente impacto positivo no emprego.

3.   O papel dos fornecedores: fornecimento de componentes, distribuição e serviço de assistência pós-venda

3.1

O sector do fornecimento de componentes e da distribuição também se caracteriza por uma grande fragmentação.

3.2

Os componentes provêm, em parte, de fornecedores do sector automóvel que também operam marginalmente no sector dos motociclos (sistemas de alimentação), mas sobretudo de fornecedores específicos (rodas, tubos de escape, embraiagens, etc.), dado o grau de especialização requerida. O número de fornecedores do sector é estimado em cerca de 500. Historicamente, estes fornecedores são europeus (concentrados em Itália, Espanha, França, Reino Unido, Alemanha e Holanda), embora nos últimos anos tenha aumentado a presença de fornecedores asiáticos. Para fazer frente a tal concorrência, alguns deles deslocalizaram uma parte das suas actividades para a Ásia, embora dependam exclusivamente das encomendas dos produtores europeus.

3.3

A rede de distribuição e de serviços de assistência responde a uma exigência de proximidade que é própria dos motociclos (em particular, dos ciclomotores e das motoretas), existindo na UE cerca de 37 000 pontos de venda e de serviço de assistência pós-venda, que são amiúde geridos por empresas familiares. A Itália, a França, o Reino Unido, a Espanha, a Holanda, a Grécia e a Suécia constituem 91 % do volume de negócios do sector de distribuição e de serviços de assistência, que cresceu 5 % entre 2004 e 2006.

4.   Emprego e assuntos sociais

4.1

Entre 2002 e 2007, o emprego no sector dos motociclos aumentou continuamente, atingindo em 2007 os 150 000 postos de trabalho na UE. É interessante notar que, entre 2004 e 2006, o emprego no sector a nível europeu registou um aumento de 4 %, em comparação com uma diminuição de 3 % no sector da indústria transformadora em geral e de 5 % no sector automóvel. Esta evolução reflecte o dinamismo e a capacidade de inovação do sector, sustentado em circunstâncias difíceis por uma procura crescente de veículos destinados tanto à mobilidade urbana como ao lazer.

4.2

Do total de postos de trabalho no sector, 25 000 estão directamente ligados à produção de motociclos, que está localizada sobretudo em Itália, Espanha, Reino Unido, Alemanha, Áustria e Países Baixos. Em virtude do carácter sazonal do mercado dos motociclos (concentrado na Primavera e no Verão), registam-se picos de produção em alguns períodos do ano, durante os quais os fabricantes recorrem igualmente a trabalhadores sazonais, privilegiando-se, deste modo, uma maior flexibilidade que permita responder às exigências temporárias do mercado.

4.3

20 000 postos de trabalho estão associados ao fornecimento de componentes, cuja produção se situa, na sua maioria, em Itália, Espanha, França, Reino Unido, Alemanha, Países Baixos e Hungria.

4.4

105 000 postos de trabalho estão ligados aos serviços de venda e de assistência pós-venda, que, pelas suas características, se encontram em toda a UE, ainda que 92 % dos mesmos estejam concentrados em Itália, Alemanha, França, Reino Unido, Espanha, Holanda, Grécia, Bélgica e Suécia.

5.   O contexto económico actual e tendências internacionais

5.1

Os dados supramencionados mostram que nos últimos anos o sector dos motociclos esteve muito dinâmico, com um mercado europeu em crescimento que, em 2007, correspondia a mais de 2,7 milhões de veículos (o parque automóvel da UE está estimado em cerca de 34 milhões de veículos). Contudo, a crise do último biénio levou a uma contracção do mercado europeu de 7,4 % em 2008, em relação a 2007. A contracção registada no último trimestre de 2008 – 34 % em relação ao mesmo período em 2007 – foi particularmente significativa. Esta tendência negativa acentuou-se no primeiro trimestre de 2009, durante o qual as vendas de motociclos baixaram 37 % em relação ao mesmo período de 2008. Os dados ainda provisórios relativos a 2009 confirmam a evolução negativa do mercado com uma redução global de 21 % em relação a 2008 e de 25 % em relação a 2007.

5.2

Os efeitos da crise fazem-se sentir em todo o sector. Para os fabricantes, a queda nas vendas, para além de se reflectir duramente nas receitas, levou a uma baixa da produção para fazer escoar os excedentes em armazém. Por seu turno, esta baixa da produção levou a uma redução do número de horas de trabalho, a paragens na produção e a um menor recurso ao trabalho sazonal, com a consequente revisão dos planos industriais a curto e médio prazo. Em alguns casos, foi necessário reduzir de forma permanente até 25 % o número de postos de trabalho. Algumas empresas de pequena e média dimensão foram colocadas sob administração judicial e estão à venda, enquanto outras acabaram mesmo por cessar actividade. Este cenário prefigura outras reestruturações, embora seja difícil prever o seu impacto económico e social, no caso de eventuais deslocalizações para fora da Europa.

5.3

Confrontados com a baixa da procura por parte dos fabricantes, os fornecedores de componentes também têm de diminuir a produção, com consequentes repercussões a nível do emprego. Alguns tiveram de cessar actividade, calculando-se que, actualmente, cerca de 10 % dos fornecedores estejam em risco de falência. Esta situação também gera custos adicionais para os fabricantes, que se vêem a braços com investimentos imprevistos para apoiar os fornecedores de componentes ou mudar de fornecedor, chegando a desenvolver novos moldes para peças de alumínio ou de plástico que já não estão disponíveis. Actualmente, as encomendas e o volume de negócios diminuíram em cerca de 40 %. Muitos fabricantes têm-se visto obrigados, com alguma frequência, a recorrer a fornecedores do Sudeste Asiático, para conseguirem permanecer competitivos.

5.4

O sector da distribuição e dos serviços de assistência pós-venda, em parte também devido às dimensões reduzidas das empresas (PME e empresas familiares), foi duramente atingido pela crise e pela quebra da actividade. Por exemplo, em 2008, registou-se em Espanha uma diminuição de 25 % no número de postos de venda, com o consequente despedimento de mais de 6 000 pessoas. Se esta tendência não se alterar, prevê-se que em Espanha, entre 2009 e 2010, fechem cerca de 25 % das empresas e concessionárias deste sector e 60 % dos agentes. Os efeitos da crise na rede de distribuição também geram custos adicionais para os fabricantes, que têm de apoiar a rede, de forma a poderem continuar a escoar os produtos e tirar proveito da retoma da economia, quando esta ocorrer.

5.5

O CESE receia que, se não forem desenvolvidas com urgência políticas de apoio ao sector, se venham a registar novas perdas substanciais de postos de trabalho em 2010. Além disso, para a manutenção dos postos de trabalho no sector é necessário desenvolver o «diálogo social», favorecendo a formação permanente e a especialização dos trabalhadores, incluindo a nível universitário, e simultaneamente apoiar uma redução do trabalho precário.

5.6

As medidas a prazo para estimular a procura de motociclos foram, até agora, isoladas e insuficientes. Ao contrário do sucedido no sector automóvel, na Europa apenas a Itália introduziu com rapidez um incentivo ao abate, cujos efeitos se revelaram positivos para o mercado italiano e, consequentemente, europeu, para além de favorecer a saída de circulação dos veículos mais poluentes. Em Itália, nos primeiros dois meses de 2009, passou-se de uma situação inicial de mercado em queda da ordem dos 35 %, para uma situação positiva para as motoretas de baixa cilindrada, que beneficiaram de uma contribuição de 500 euros pelo abate de veículos obsoletos, mantendo-se negativa, em contrapartida, a situação dos motociclos e dos ciclomotores, com uma queda global superior a 20 %. A Espanha, apesar de ter aprovado em Julho um incentivo ao abate dos motociclos que já vinha sendo anunciado há meses, ainda não o aplicou, encorajando os consumidores a esperar e, desta forma, atrasando ainda mais o ritmo das aquisições (entre Janeiro e Agosto de 2009 registou-se uma diminuição de 52 % para os ciclomotores e de 43 % para os motociclos, em relação ao mesmo período em 2008). Este exemplo ilustra de forma clara a importância de um quadro normativo europeu que favoreça a estabilidade dos mercados nacionais e contribua para restaurar a confiança dos consumidores.

5.7

Se é certo que as medidas de incentivo à procura são vantajosas para os utilizadores, elas não resolvem necessariamente o problema dos fornecedores de componentes ou do sector europeu dos motociclos. Por exemplo, em Itália, a contribuição fixa de 500 euros favoreceu exponencialmente as motoretas pequenas de 125 e 150cc importadas de Taiwan e vendidas a preços que oscilavam entre os 1 500 e os 2 000 euros e, em menor medida, a produção europeia mais dispendiosa, ao passo que não conseguiu suster a procura de motas intermédias, cujo preço varia entre 6 000 e 8 000 euros. Os fornecedores de componentes europeus não beneficiaram minimamente de tal medida, uma vez que não fornecem os produtores asiáticos. A fim de assegurar benefícios para o sector no seu conjunto, afigura-se necessário adoptar medidas de incentivo à procura destinadas a garantir uma contribuição que aumente em paralelo com o aumento do preço dos veículos incentivados, particularmente os que apresentam soluções avançadas de redução do impacto ambiental e dispositivos de segurança avançados.

5.8

É urgente facilitar o acesso das empresas europeias do sector a formas de financiamento que lhes permitam suportar as despesas adicionais geradas pela crise e continuar a investir na investigação, desenvolvimento e inovação (fabricantes e fornecedores de componentes em conjunto), a fim de permanecerem competitivas, apostando na qualidade e na inovação, e de produzirem veículos cada vez mais ecológicos e seguros.

6.   Perspectivas futuras para o sector: desafios e oportunidades

6.1

Se os resultados negativos do primeiro semestre se confirmarem em relação a todo o ano de 2009, todo o sector irá sofrer em 2010 uma redução da sua própria solvabilidade. Mesmo em caso de retoma iminente, as capacidades de investimento, investigação e desenvolvimento serão reduzidas, com efeitos negativos a médio prazo que fragilizarão as empresas e poderão repercutir-se ao nível do emprego.

6.2

Na última década, desde a introdução da norma Euro 1, em 1999, às normas aplicadas no presente, o sector logrou uma redução importante das emissões de gases poluentes, da ordem dos 90 % para o monóxido de carbono (CO) e o hidróxido de carbono (HC) e superior a 50 % para o óxido de azoto (NOx). Também se obtiveram resultados muito encorajadores no respeitante à redução da poluição acústica. A indústria no seu conjunto (incluindo as associações de consumidores) continua empenhada em introduzir novas melhorias, realizáveis principalmente em estrada, através da utilização exclusiva de tubos de escape homologados e de uma condução mais ecológica. No atinente à segurança, o sector deu provas de inovação com uma série de sistemas avançados de travagem, que está a difundir progressivamente nas diversas categorias de motociclos, incluindo os veículos que apresentam novas estruturas, como os triciclos e os quadriciclos.

6.3

A Comissão está a preparar uma proposta de regulamento para os motociclos que está prevista para os primeiros meses de 2010. Embora seja necessário continuar a fazer progressos ao nível da protecção do meio ambiente e da segurança, no actual contexto económico é fundamental evitar alterações bruscas e ter em consideração as capacidades reais do sector e as dimensões dos seus actores. Relativamente às novas normas Euro, é necessário estabelecer objectivos que o sector possa cumprir, com uma aplicação gradual que respeite os prazos exigidos pela concepção, industrialização e comercialização. No novo regulamento, é desejável privilegiar uma abordagem que permita ao sector tirar partido das suas próprias capacidades de inovação, garantindo-lhe um grau de flexibilidade que leve em conta a conjuntura e a sua grande diversidade de produtos (em termos de características técnicas e de mercado), em particular no que diz respeito à difusão dos sistemas avançados de travagem. O sector já apresentou propostas à Comissão neste sentido, no domínio da protecção do meio ambiente e da segurança nas estradas.

6.4

Os construtores «tradicionais» estão cada vez mais expostos, sobretudo no contexto económico actual, a uma concorrência low cost/low quality [de baixo preço e de baixa qualidade], em larga medida oriunda do Sudeste Asiático, particularmente ao nível dos motociclos de pequena e média cilindrada, para os quais as margens são menores. Inquéritos realizados revelam que, com frequência, estes produtos importados não obedecem aos critérios de homologação europeia e apresentam riscos para a segurança do consumidor e para o ambiente. Os testes realizados a alguns motociclos chineses importados na UE revelaram incumprimentos que iam desde distâncias de travagem até 35 % superiores aos critérios de homologação europeia até emissões poluentes 20 vezes acima desses mesmos critérios. Foram também detectados, para além de problemas associados à contrafacção de veículos ou de peças de produção europeia por parte de fabricantes das economias emergentes, bem como à falsificação de certificados de conformidade por empresas comerciais importadoras de veículos não conformes na UE. Numa faixa do mercado europeu muito sensível ao preço, a fim de assegurar a lealdade da concorrência, é necessário exercer um controlo mais apertado ao nível da homologação e da comercialização, com a realização pelas autoridades competentes e ou pelos serviços de controlo técnico de inspecções periódicas de «conformidade da produção» rigorosas aos veículos postos à venda, para verificar a sua conformidade com o tipo homologado e o respeito da propriedade intelectual.

6.5

Em contrapartida, os fabricantes «tradicionais» obtêm a preferência dos consumidores pelo design e a qualidade dos seus produtos e o seu grau de inovação e de segurança. Isto verifica-se nos veículos de topo de gama de baixa e média cilindrada e, em particular, nos de alta cilindrada, que possuem grande valor acrescentado, distinguindo-se pelas soluções técnicas e pelo prestígio associado à marca. Estes produtos são os que estão a ser mais castigados no contexto económico actual. A maior difusão de veículos tecnologicamente avançados, como por exemplo os veículos híbridos e eléctricos que começam a surgir no mercado, dependerá em larga medida do apoio do sector público e, portanto, da capacidade geral de superação da crise.

6.6

Deve ser dada uma atenção especial aos acordos de comércio livre, no sentido de assegurar que a liberalização dos direitos aduaneiros entre a UE e os países do Sudeste Asiático seja vantajosa para ambas as partes, eliminando as barreiras não pautais (por exemplo, a proibição de circulação de motas de cilindrada superior a 250cc na China), que constituem problemas graves para os exportadores europeus.

6.7

Para enfrentar os actuais desafios, como já ocorreu no passado, os construtores europeus têm de continuar a proceder a reestruturações, fusões e aquisições, desenvolvendo novas formas de cooperação que permitam uma maximização das sinergias possíveis.

6.8

A sobrevivência dos fornecedores europeus de componentes é essencial para a manutenção da especificidade das produções distintamente europeias, reconhecidas pelos utilizadores como exclusivas. Por outras palavras, é necessário evitar uma repetição do ocorrido no sector dos velocípedes, por exemplo, onde se assistiu ao desaparecimento dos fornecedores de componentes importantes, como os chassis, fazendo com que, hoje em dia, a Europa dependa da China para a montagem de bicicletas.

6.9

Os fornecedores europeus de componentes não estão em condições de competir em termos de preço, pelo que têm de apostar forçosamente na inovação, no desenvolvimento de projectos em conjunto com os fabricantes, para realizarem economias de escala – quando possível –, e em verdadeiras parcerias que garantam o fluxo de encomendas entre fabricantes e fornecedores ao nível de produtos de topo de gama.

6.10

Seria desejável uma abordagem semelhante à CARS21, mas concebida especificamente para o sector dos motociclos no seu conjunto, no sentido de permitir enfrentar melhor estes desafios, estimular a competitividade do sector e o emprego.

6.11

Os fundos de investigação do 7.o PQ podem contribuir para a realização destes objectivos, privilegiando as empresas que produzem na Europa e são parte integrante da cadeia de produção europeia. Uma plataforma de investigação dedicada ao sector dos motociclos poderia constituir um contributo fundamental para este fim – em particular, para as PME –, através da participação em consórcios para estabelecer prioridades de investigação, como é o caso no sector automóvel.

6.12

A Comissão apresentou recentemente um Plano de Acção para a Mobilidade Urbana, em que um dos objectivos é melhorar o fluxo de tráfego, o que constitui uma característica intrínseca dos motociclos. O sector dos motociclos ficou vulnerável em resultado da crise, mas beneficiará a longo prazo das necessidades crescentes de veículos alternativos de baixas emissões que favoreçam uma mobilidade mais sustentável, particularmente nas cidades, desde que as actuais dificuldades económicas possam ser superadas a médio prazo sem causar danos irreparáveis.

Bruxelas, 18 de Março de 2010

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu,

Mario SEPI


(1)  Lista dos fabricantes e outras informações sobre o sector dos motociclos disponíveis no sítio Internet da CCMI (http://www.eesc.europa.eu/sections/ccmi/opinions_reports/total_list/index_en.asp#PTW).

(2)  Um quadro regulador concorrencial para o sector automóvel no século XXI (grupo de alto nível CARS21, em 2007).

(3)  Vide o relatório de informação da CCMI sobre o tema O sector automóvel na Europa – Situação actual e perspectivas, adoptado pela CCMI em 13 de Novembro de 2007.