18.8.2010   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 223/1


PARECER DO BANCO CENTRAL EUROPEU

de 6 de Agosto de 2010

sobre uma proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 2006/48/CE e 2006/49/CE no que diz respeito aos requisitos de fundos próprios para a carteira de negociação e as retitularizações, bem como à análise das políticas de remuneração pelas autoridades de supervisão

(CON/2010/65)

2010/C 223/01

Introdução e base jurídica

Em 12 de Novembro de 2009 o Banco Central Europeu (BCE) emitiu o parecer CON/2009/94 (1) sobre uma proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 2006/48/CE e 2006/49/CE no que diz respeito aos requisitos de fundos próprios para a carteira de negociação e as retitularizações, bem como à análise das políticas de remuneração pelas autoridades de supervisão (a seguir «directiva proposta»). Em 7 de Julho de 2010 o Parlamento Europeu aprovou a directiva proposta (2), a qual está agora pendente de adopção formal pelo Conselho da União Europeia. O presente parecer baseia-se na versão da directiva proposta aprovada pelo Parlamento Europeu.

A competência do BCE para emitir parecer baseia-se no último parágrafo do n.o 4 do artigo 127.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, ao abrigo do qual o BCE pode apresentar pareceres sobre questões do âmbito das suas atribuições, designadamente às competentes instituições comunitárias. Ora, a directiva proposta contém disposições com implicações nas atribuições do Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC) quanto à definição e execução da política monetária na União, conforme previsto no n.o 2 do artigo 127.o do Tratado, assim como para a contribuição do SEBC para a boa condução das políticas respeitantes à estabilidade do sistema financeiro, de acordo com o n.o 5 do artigo 127.o do Tratado. O presente parecer foi aprovado pelo Conselho do BCE nos termos do artigo 17.o-5, primeiro período, do regulamento interno do BCE.

1.   Observações genéricas

1.1.

O BCE vê com preocupação a prorrogação, prevista no parágrafo 2, alínea c), subalínea ii), do anexo I da directiva proposta, da isenção das posições em risco sob forma de obrigações cobertas (3) colateralizadas por empréstimos garantidos por imóveis destinados a habitação ou ao comércio. O prolongamento do prazo de isenção de 31 de Dezembro 2010 para 31 de Dezembro de 2013 permite a inclusão ilimitada, na garantia global (cover pool) de obrigações cobertas, de unidades de participação privilegiada emitidas por entidades de titularização que titularizem posições em risco sobre imóveis destinados a habitação ou a fins comerciais. Além disso, o texto aprovado omite a referência à categoria de crédito mais favorável exigida para as referidas unidades (4).

1.2.

Assim sendo, a directiva proposta tem implicações para as obrigações cobertas conformes com a Directiva OICVM e para os instrumentos de dívida titularizados (asset backed securities/ABS) elegíveis para as operações de crédito do Eurosistema, conforme o estabelecido na Orientação BCE/2000/7, de 31 de Agosto de 2000, relativa aos instrumentos e procedimentos de política monetária do Eurosistema (5). Relativamente a este aspecto, do ponto de vista da gestão de riscos o regime de garantias do Eurosistema impõe um tratamento mais estrito em relação aos instrumentos de dívida titularizados do que às obrigações cobertas conformes com a Directiva OICVM, ou seja, margens de avaliação adicionais (haircuts) e notações de crédito mais elevados. A directiva proposta poderia ter por consequência proporcionar um forte incentivo às contrapartes das operações de política monetária para incluir na garantia global das obrigações cobertas os seus instrumentos de dívida titularizados, obtendo desse modo um tratamento mais favorável dos mesmos, em detrimento da exposição ao risco do Eurosistema.

1.3.

Concomitantemente, e não obstante o facto de acolher com agrado medidas regulamentares que diminuam a necessidade de a legislação se referir a notações de crédito externas, o BCE vê com alguma inquietação a remoção da referência à categoria de crédito mais favorável exigida para estas unidades, o que pode minar ainda mais a credibilidade e transparência dos mercados de obrigações cobertas e, em última instância, vir a afectar a estabilidade financeira.

1.4.

De um modo geral, o objectivo dos reguladores num futuro próximo deveria consistir no levantamento da isenção e na definição de um conjunto rigoroso de critérios adicionais para a inclusão de activos na garantia global de obrigações cobertas que: i) não dependam demasiado de notações de crédito externas, e ii) sejam suficientemente sólidas para assegurar a confiança do mercado nas obrigações cobertas, conferindo simultaneamente às instituições financeiras tempo suficiente para adaptarem os seus modelos de negócio. Pode considerar-se um passo encorajador neste sentido a redução do limite do valor nominal da emissão subsistente de 20 % para 10 %, prevista no parágrafo 2, alínea c), subalíneas i) e ii) do anexo I da directiva proposta.

2.   Propostas de redacção

Nos casos em que o BCE recomenda uma alteração à directiva proposta, as sugestões de reformulação específicas constam do anexo, acompanhadas de um texto explicativo.

Feito em Frankfurt am Main, em 6 de Agosto de 2010.

O Presidente do BCE

Jean-Claude TRICHET


(1)  JO C 291 de 1.12.2009, p. 1.

(2)  P7_TA-PROV (2010) 0274.

(3)  Na acepção conferida ao termo pelo n.o 4 do artigo 22.o da Directiva 85/611/CEE, de 20 de Dezembro de 1985, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns organismos de investimento colectivo em valores mobiliários (OICVM) (JO L 375 de 31.12.1985, p. 3).

(4)  Ver. anexo VI, ponto 68, terceiro parágrafo da Directiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de Junho de 2006, relativa ao acesso à actividade das instituições de crédito e ao seu exercício (reformulação) (JO L 177 de 30.6.2006, p. 1).

(5)  JO L 310 de 11.12.2000, p. 1.


ANEXO

Propostas de redacção

Texto proposto pelo Parlamento Europeu

Alterações propostas pelo BCE (1)

Alteração

Anexo VI, ponto 68(ii)

«(ii)

O terceiro parágrafo passa a ter a seguinte redacção:

“Até 31 de Dezembro de 2013, o limite de 10 % para as unidades de participação privilegiadas emitidas pelos ‘Fonds Communs de Créances’ franceses ou por entidades de titularização equivalentes a que se referem as alíneas d) e e) não é aplicável, desde que: i) as posições em risco titularizadas sobre imóveis destinados a habitação ou ao comércio provenham de um membro do mesmo grupo consolidado do qual o emitente das obrigações cobertas seja também membro ou esteja filiado no mesmo organismo central que o emitente das obrigações cobertas (a participação no grupo ou a filiação comum deve ser determinada no momento em que as unidades de participação privilegiadas sejam dadas em garantia das obrigações cobertas), e ii) o membro do mesmo grupo consolidado do qual o emitente das obrigações cobertas seja também membro ou esteja filiado no mesmo organismo central que o emitente das obrigações cobertas conserve a totalidade da ‘tranche’ das perdas de primeiro grau que abrange essas unidades de participação privilegiadas. Antes do termo deste período mas, o mais tardar, em 31 de Dezembro de 2012, a Comissão examinará a adequação desta delegação e, se tal for relevante, a adequação de tornar este tratamento extensivo a qualquer outra forma de obrigação coberta. À luz dessa análise, a Comissão pode, se for caso disso, aprovar actos delegados, ao abrigo dos poderes referidos no artigo 151.o-A, para prolongar o referido período ou tornar a delegação permanente ou extensiva a outras formas de obrigações cobertas.”».

«(ii)

O terceiro parágrafo passa a ter a seguinte redacção:

“Até 31 de Dezembro de 2013, o limite de 10 % para as unidades de participação privilegiadas emitidas pelos ‘Fonds Communs de Créances’ franceses ou por entidades de titularização equivalentes a que se referem as alíneas d) e e) não é aplicável, desde que: i) as referidas unidades de participação privilegiadas tenham uma avaliação de crédito atribuída por uma ECAI designada que represente a categoria de crédito mais favorável conferida por essa ECAI a obrigações cobertas; ii) as posições em risco titularizadas sobre imóveis destinados a habitação ou ao comércio provenham de um membro do mesmo grupo consolidado do qual o emitente das obrigações cobertas seja também membro ou esteja filiado no mesmo organismo central que o emitente das obrigações cobertas (a participação no grupo ou a filiação comum deve ser determinada no momento em que as unidades de participação privilegiadas sejam dadas em garantia das obrigações cobertas), e iii) o membro do mesmo grupo consolidado do qual o emitente das obrigações cobertas seja também membro ou esteja filiado no mesmo organismo central que o emitente das obrigações cobertas conserve a totalidade da ‘tranche’ das perdas de primeiro grau que abrange essas unidades de participação privilegiadas. .”».

Explicação

Pelas razões expostas no presente parecer, o BCE manifesta algumas preocupações quanto à remoção da exigência da categoria de crédito mais favorável para as unidades de participação privilegiadas conferida na avaliação efectuada por uma instituição externa de avaliação da qualidade de crédito (IEAC/ECAI), uma vez que isso pode prejudicar ainda mais a credibilidade e a transparência do mercado das obrigações cobertas. Por esse motivo, o BCE aconselha a reintrodução da referida exigência. Contudo, o objectivo dos reguladores num futuro próximo deveria ser o levantamento da isenção e a definição de um conjunto rigoroso de critérios adicionais para a inclusão de activos na garantia global de obrigações cobertas que: i) não dependam de notações de crédito externas e que ii) sejam suficientemente sólidos para garantir a confiança dos mercados nas obrigações garantidas. Assim sendo, deveria omitir-se toda e qualquer referência a uma potencial prorrogação da isenção (eventualmente por um prazo indefinido).

O BCE reconhece que o ponto 68(i) do anexo VI requer que as unidades de participação a utilizar como colateral satisfaçam o grau 1 de qualidade de crédito. Não obstante, isso não é suficiente para não se inquietar com a remoção do requisito da obtenção da avaliação de crédito mais favorável atribuída por uma IEAC designada. Tal deve-se ao facto de que o requisito da obtenção do grau 1 de qualidade de crédito apenas se aplicar ao limite de 10 % do valor nominal da emissão subsistente aplicável sempre que a isenção não seja invocada. Quanto a este aspecto, observa-se que os graus de qualidade de crédito 1-6 devem ser determinados pelas autoridades competentes de acordo com o disposto no artigo 82.o da Directiva 2006/48/CE, o que implica uma certa discricionariedade em termos de qualidade de crédito. No entanto, o BCE entende que o conceito de «categoria de crédito mais favorável» se define em termos mais restritos.

Na versão da directiva proposta aprovada pelo Parlamento Europeu, a isenção pode ser aplicada sujeita às duas condições seguintes: a primeira é a de que as posições em risco titularizadas sobre imóveis destinados a habitação ou ao comércio não tenham tido origem fora do grupo consolidado do qual o emitente das obrigações cobertas seja também membro. O BCE considera que, na prática, pode ser difícil verificar o cumprimento deste requisito. A segunda condição é que o membro do mesmo grupo consolidado conserve a totalidade da «tranche» das perdas de primeiro grau que abrange essas unidades de participação privilegiadas. Na opinião do BCE, mesmo que a primeira «tranche» das perdas de primeiro grau se mantenha dentro do grupo, as entidades podem contornar esta exigência mediante a utilização de estratégias de cobertura de risco («hedging»). Por estes motivos, o BCE entende que estes requisitos, por si só, não constituem uma salvaguarda suficiente para justificar a inclusão deste tipo de activos na garantia global das obrigações cobertas. No entanto, o BCE reconhece que os mesmos garantem aos obrigacionistas um certo grau de protecção, especialmente se associados à reinserção da referência à categoria de crédito mais favorável exigida para as unidades de participação privilegiadas.


(1)  O texto a aditar por proposta do BCE figura em negrito no corpo do artigo. As palavras riscadas no corpo dos artigos indicam o texto a suprimir por proposta do BCE.