11.9.2009 |
PT |
Jornal Oficial da União Europeia |
C 218/101 |
Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Enfrentar o desafio da subida dos preços do petróleo
COM(2008) 384 final
2009/C 218/20
Em 13 de Junho de 2008, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 93.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a
«Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Enfrentar o desafio da subida dos preços do petróleo»
Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 2 de Fevereiro de 2009, sendo relator Carmelo CEDRONE.
Na 451.a reunião plenária de 25 e 26 de Fevereiro de 2009 (sessão de 25 de Fevereiro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 162 votos a favor, 6 votos contra e 12 abstenções, o seguinte parecer:
1. Conclusões e recomendações
1.1 |
O Comité Económico e Social Europeu subscreve a preocupação da Comissão em relação aos efeitos inflacionistas imediatos e preocupantes das cotações do petróleo para alguns sectores e para as camadas mais desfavorecidas da população. Com efeito, a subida do preço do petróleo tem um impacto directo nos custos com o aquecimento e os transportes e indirecto no custo da alimentação, sectores que constituem precisamente o grosso da despesa das famílias mais pobres. |
1.2 |
O problema requer uma acção forte e urgente, mas levanta também uma questão de ordem geral delicada. O apoio às famílias pobres deve passar necessariamente por subsídios directos ao rendimento e não por medidas, por exemplo, de carácter fiscal (como uma redução dos impostos sobre os produtos petrolíferos) que actuem sobre os preços do mercado, no sentido de atenuar os efeitos da subida do preço do petróleo. |
1.3 |
O CESE considera extremamente importante que sejam dadas condições ao mercado para desenvolver a sua função que é registar a subida do preço do petróleo e determinar a resposta adequada a esta situação. |
1.4 |
Os aumentos de preço devem incitar os operadores a realizar economias nos sectores que se tornaram mais caros, substituindo os bens que sofreram um aumento de preço por bens menos onerosos e realizando combinações de produção e de consumo que permitam fazer poupanças, desde que tecnicamente possível. Como referido, há que proteger as famílias mais pobres apenas com acções de subsídio directo, sem distorcer os sinais enviados ao mercado, que deve permanecer livre para realizar a sua função natural de reequilíbrio. |
1.5 |
Como preconizado pela Comissão, há que aplicar estratégias análogas também em benefício dos sectores de produção mais afectados pela subida do preço do petróleo, começando pelo sector da pesca, mas estendendo-se, em geral, a todos os sectores destinados à satisfação das necessidades alimentares da população, incluindo o sector dos transportes. |
1.6 |
Do mesmo modo, nestes casos as medidas necessárias para evitar repercussões demasiado devastadoras para a economia produtiva devem ser aplicadas sob a forma de ajudas directas e não através de medidas fiscais (redução de impostos) que diminuiriam artificialmente os preços, que devem, pelo contrário, reflectir a escassez crescente dos recursos petrolíferos. |
1.7 |
Em contrapartida, no atinente ao impacto macroeconómico nos países em desenvolvimento, há que elaborar planos de acção bem estruturados, sobretudo para as economias mais frágeis, que foquem essencialmente intervenções financeiras destinadas à realização de políticas de poupança energética. Mais uma vez, são necessárias medidas de apoio ambiciosas, mas que não desvirtuem os sinais que os mercados devem, de qualquer dos modos, seguir. |
1.8 |
O Comité considera que são necessárias respostas políticas fortes pela União Europeia. |
1.9 |
Em primeiro lugar, neste como em outros casos, a presença unida de uma organização como a União Europeia, que representa um quinto da produção mundial, pode ter um peso e um papel de extrema importância. A apresentação de propostas concretas, formuladas em conjunto por uma entidade de tão grande relevância a nível mundial, faz com que estas não possam ser facilmente ignoradas. A situação é bem distinta quando as iniciativas europeias são tomadas de forma solta, podendo mesmo parecer estarem em contradição entre si. |
1.10 |
Numa situação difícil como a actual, em que há a possibilidade de um forte aumento do preço de uma matéria-prima fundamental, a apresentação de uma proposta de consulta e de diálogo a nível mundial entre todos os grandes protagonistas afigura-se uma premissa indispensável para qualquer iniciativa. É possível realizar uma conferência mundial entre os países produtores e os consumidores. |
1.11 |
Em segundo lugar, há que apontar de forma decidida para a realização do mercado único europeu da energia. A Europa foi construída com base em grandes projectos de mercado único como o carvão e o aço, a energia atómica e a agricultura. Em Janeiro de 1993, seguiu-se o mercado de bens, serviços e capitais para finalmente, a partir de 1999, ser introduzida a União Monetária. É chegado o momento de juntar uma acção específica em prol do mercado da energia. |
1.12 |
Esta acção ajudaria, igualmente, a proteger este sector fundamental dos ímpetos destrutivos da especulação, a qual, como se sabe, desempenha, dentro dos limites naturais, uma função essencial de regulação dos mercados mas, para além desses limites, introduz elementos de total desorganização e de insegurança absoluta. |
1.13 |
O mercado europeu da energia deve ser tornado transparente e ficar sob o controlo das autoridades responsáveis. Há que reduzir consideravelmente a volatilidade das cotações, o que pode também ser conseguido com uma informação adequada e uma regulação das reservas estratégicas. A regulação adequada de um mercado importante como o europeu teria indubitavelmente um enorme impacto a nível mundial. |
2. Propostas
2.1 |
A UE deve, por conseguinte, retornar ao seu espírito original (Tratado CECA e Euratom) e realizar finalmente o mercado interno da energia, uma necessidade que se tornou hoje ainda mais urgente para evitar riscos e consequências a nível económico e social, mas não só. |
2.2 |
A UE deve dotar-se dos instrumentos de decisão adequados («institucionalizar» o processo introduzido recentemente pela Presidência francesa por ocasião da crise financeira), de modo que possa dirigir, a nível interno, a política energética e falar numa só voz nas instâncias internacionais onde estas políticas são decididas, incluindo as relacionadas com o petróleo, a começar pelo preço de fornecimento, retirando-o das mãos dos especuladores. |
2.3 |
A União deve converter as reservas de petróleo actualmente existentes a nível de países individuais numa política comum e transparente, tornando deste modo mais segura a política de aprovisionamento. |
2.4 |
Deve aplicar medidas comuns como medidas fiscais harmonizadas para os produtos petrolíferos para limitar os prejuízos nos sectores económicos mais afectados e estabelecer em conjunto ajudas directas ao rendimento para os cidadãos, em particular para as camadas mais desfavorecidas, às quais poderia ser igualmente devolvida uma parte dos lucros das empresas. |
2.5 |
Deve intervir de maneira mais resoluta para regular a concorrência no sector (actualmente praticamente inexistente, na medida em que o mercado da oferta opera em regime de oligopólio) e avaliar a possibilidade de recorrer a uma política de preços fixados administrativamente, pelo menos nos períodos de maior crise, ou ainda a possibilidade de recorrer a medidas para reduzir o fosso, frequente injustificado, entre os preços na produção e os preços no consumidor, uma situação face à qual o consumidor fica impotente e indefeso. |
2.6 |
Deve utilizar um fundo comum para promover e financiar a investigação e o desenvolvimento de fontes alternativas de energia para reduzir a dependência do petróleo, em particular no sector dos transportes, começando pelo sector automóvel, através de um forte aumento dos investimentos neste domínio, por exemplo com benefícios fiscais ou simplesmente obrigando as empresas petrolíferas a devolver parte dos seus lucros para este fim! |
2.7 |
Deve evitar que a deflação resultante da descida brusca do preço do petróleo e da recessão provoque prejuízos económicos piores do que os da inflação. Por inércia (ou por uma imperfeição do mercado?) mantém-se a inflação, mesmo após a diminuição do preço do crude, o que pode ocultar o eventual aparecimento da deflação. |
3. Introdução
3.1 |
A Comissão decidiu finalmente enfrentar a questão da subida dos preços do petróleo, mais especificamente a questão da flutuação dos preços petrolíferos, à luz dos acontecimentos dos últimos meses relacionados com a especulação financeira e a queda das bolsas. Esta subida está na base do reaparecimento de pressões inflacionistas na UE, as quais foram prontamente objecto de medidas pelo BCE e pela Reserva Federal que as atenuaram, mas refrearam o crescimento económico. |
3.2 |
As estratégias de controlo monetário só recentemente foram revistas para fazer face à crise financeira mundial. Não obstante, a crise financeira provocou um clima de forte recessão que nada tem a ver com o petróleo, pelo que as pressões inflacionistas por este introduzidas foram consideravelmente reduzidas. Por conseguinte, o preço do petróleo perderá a sua tendência ascendente. |
3.3 |
A outra consequência de maior relevo é o deslocamento do poder de compra dos países consumidores para os produtores, o qual pode ser reequilibrado com um aumento das importações destes últimos provenientes dos países consumidores (entre 2002 e 2007 estas importações aumentaram, em média, 26 % ao ano, um ritmo muito superior ao ritmo geral das importações mundiais). |
3.4 |
Como se verá melhor na síntese, a questão é examinada pela Comissão à luz de diversos aspectos, mas há outros que são praticamente ignorados ou descartados (por exemplo, o impacto da especulação, a presença de formas de oligopólio neste sector que facilmente se transformam em «cartéis» com as consequências daí inerentes, etc.). |
3.5 |
O CESE tem, por isso, de efectuar uma avaliação franca e objectiva da comunicação, realçando os aspectos positivos e negativos para formular recomendações e propostas com vista a reduzir os efeitos inflacionistas sobre os preços e os custos de produção. |
3.6 |
Além disso, importa indicar igualmente as lacunas políticas da UE, a sua fragilidade ao nível internacional, a sua divisão em relação às principais causas da falta de controlo do «mercado» do petróleo e das especulações a que este está sujeito. |
3.7 |
Cabe efectuar mais uma observação. À luz da tendência do preço do petróleo, em forte recuo em relação ao mês de Julho de 2008, devia-se actualizar o título da comunicação da Comissão Europeia. De qualquer dos modos, o presente parecer tem em conta as flutuações a que o preço do petróleo tem estado sujeito e não apenas os picos. |
4. Síntese da comunicação
4.1 Causas da subida
4.1.1 |
A Comissão considera que o aumento acentuado e abrupto dos preços do petróleo nos últimos meses é apenas comparável ao registado na década de 70, que os preços no consumidor estão em linha com os do petróleo bruto e que os actuais níveis ultrapassam o máximo histórico alcançado no início da década de 80. |
4.1.2 |
A Comissão afirma ainda que a escalada actual é, em grande medida, consequência de uma mutação estrutural de vulto a nível da oferta e da procura, em razão do aumento do consumo (em particular na China e na Índia), da redução dos campos petrolíferos, da fraca reactividade das empresas estatais dos países da OPEP, da reduzida capacidade de refinação em alguns países, da desvalorização do dólar, do aumento da inflação, etc.. |
4.2 Impacto na economia da UE
4.2.1 |
O aumento da inflação e o impacto nos preços da energia devido ao efeito de arrastamento são uma das consequências mais graves que importa citar. Do mesmo modo, quando os preços das matérias-primas diminuem, o mesmo não sucede, frequentemente, com os preços no consumidor. |
4.2.2 |
As repercussões mais graves são sentidas pelas famílias, em especial pelas famílias com menores rendimentos, não obstante tal suceder de forma distinta nos vários países europeus, com o consequente aumento do desequilíbrio económico e do poder de compra dos salários e, por conseguinte, das camadas de pobreza. |
4.2.3 |
As consequências são igualmente graves para as empresas e o crescimento. A Comissão considera, em particular, que os sectores mais afectados são os da agricultura, dos transportes e da pesca e espera que esta situação leve a um maior interesse pela investigação e a um aumento da utilização de energias renováveis. |
4.3 Impacto macroeconómico nos países em desenvolvimento
4.3.1 |
Nos países em desenvolvimento importadores de petróleo, as consequências far-se-ão sentir de forma mais grave devido ao aumento da inflação quer para os cidadãos, quer para as empresas. |
4.3.2 |
Nestes países, as consequências são piores devido aos efeitos provocados nos géneros alimentícios, nas finanças públicas, etc, ao passo que nos países subdesenvolvidos, mas exportadores de petróleo, há uma acumulação de capitais que colocam desafios específicos para as políticas macroeconómicas, dada a gestão muitas vezes inadequada das receitas do petróleo. |
4.4 Respostas estratégicas da UE
4.4.1 |
As respostas da UE partem do pressuposto de que os preços manter-se-ão elevados a médio e longo prazo, pelo que são necessárias respostas adequadas como as indicadas na iniciativa relativa às alterações climáticas e às energias renováveis e as previstas para a realização de um verdadeiro mercado único da energia. |
4.4.2 |
No imediato, há que envidar esforços para atenuar os efeitos para os consumidores, em particular para as famílias mais pobres. Propõem-se medidas que vão desde uma revisão do regime de tributação dos produtos petrolíferos até à proposta de organização de uma cimeira entre países produtores e consumidores, passando pela disponibilização de recursos adicionais aos países importadores de petróleo. |
4.4.3 |
Como respostas estruturais a médio prazo, sugere-se reforçar o diálogo com os principais países produtores, acompanhar a «concorrência» vigente no sector, avaliar a transparência sobre as existências, rever a legislação comunitária em vigor em matéria de reservas petrolíferas, examinar as medidas fiscais a favor das fontes com emissões reduzidas de carbono, utilizar os lucros da indústria de extracção para realizar investimentos, eventualmente tributar estes lucros e promover o diálogo entre a UE e os países em desenvolvimento. |
4.4.4 |
Como respostas estruturais a mais longo prazo sugere-se, em contrapartida, concluir o acordo entre os países da UE sobre as alterações climáticas e as energias renováveis, melhorar a eficiência energética, introduzir mudanças estruturais nos sectores dos transportes e da pesca a fim de os tornar mais eficientes, conceder incentivos fiscais directos ou subvenções para incentivar as economias de energia a nível das famílias e diversificar mais o aprovisionamento energético da UE. |
5. Considerações e observações
5.1 |
A comunicação da Comissão foi redigida no momento em que se atingiu um «pico» preocupante do preço do petróleo no início do Verão passado. No entanto, há que recordar que a economia moderna já está habituada a imprevistos e a alterações importantes de perspectivas, incluindo em curtos intervalos de tempo. |
5.2 |
Com efeito, a economia mundial, ao contrário do que acontecia há alguns meses, está a ser dominada por uma inquietante perspectiva de recessão que, segundo estimativas preliminares do Fundo Monetário Internacional (FMI), deverá presumivelmente afectar também o conjunto dos países emergentes, os quais, nos últimos tempos (ou pelo menos nos últimos trinta anos, após o fim do que é conhecido como a «época dourada» [golden age] do capitalismo moderno), começaram a crescer de forma claramente mais rápida e estável do que os países avançados. |
5.3 |
Neste contexto, a diminuição do preço do petróleo, a partir dos picos alcançados em Julho passado (que representavam, em valores nominais ou em termos reais, recordes absolutos), até aos valores mais baixos de Novembro de 2008, que, líquidos de inflação, tocaram os níveis de vinte e cinco anos atrás, pode não ser pontual. O receio que prevalece actualmente na opinião dos economistas é que se desencadeie uma deflação, a qual não pouparia obviamente o mercado petrolífero. |
5.4 |
Por outro lado, seria bom evitar previsões a longo prazo sobre o possível esgotamento das reservas disponíveis no subsolo. Este é um receio recorrente, existente já há décadas, mas que pode ser infundado. Numa recente edição da conceituada revista The Economist (de 21 de Junho de 2008) referia-se que as reservas conhecidas de petróleo deveriam durar, mantendo-se os actuais ritmos de produção, 42 anos (o que está longe de ser pouco, na medida em que ninguém sabe o que pode acontecer, especialmente a nível de inovações científicas e tecnológicas, nos próximos 42 anos). Contudo, observava-se também que as reservas atribuídas aos países do Médio Oriente são as mesmas desde há muitos anos, donde se conclui, sempre segundo a revista, que as novas reservas detectadas tendem a compensar o petróleo produzido e consumido, ou que as estimativas em relação às existências não são muito exactas. De salientar, porém, que o cálculo se baseia nos actuais níveis de produção. O problema, contudo, não é tanto o do esgotamento das reservas a longo prazo, quanto o das perspectivas de crise, que dependem dos desequilíbrios entre a procura e a oferta no curto prazo; em especial na sequência de eventuais interrupções da produção nas zonas estratégicas. |
5.5 |
A prospecção de novas reservas e de novas fontes é – e deve continuar a ser – um processo contínuo. A alternância entre os choques petrolíferos dos anos 70, que se contam entre os mais importantes do século passado e especialmente pertinentes neste contexto, é particularmente sintomática. Estes choques deveram-se a restrições na oferta impostas pelos países produtores, em vez de serem fenómenos espontâneos do mercado, como parecem ser os actuais desequilíbrios. De qualquer modo, o aumento brutal das cotações então registado conduziu à procura de novas fontes, utilizando métodos de produção altamente inovadores. |
5.6 |
Há que acompanhar atentamente as evoluções nos mercados, para determinar se não decorrem de um fenómeno de desequilíbrio entre a oferta e a procura. |
5.7 |
Na sequência das políticas monetárias drásticas adoptadas a partir do início dos anos 80, sobretudo pelos governos de Ronald Reagan, na América, e de Margaret Thatcher, no Reino Unido, com base nas ideias da escola monetarista de Chicago de Milton Friedman, as taxas de juro subiram fortemente, levando os detentores de reservas a modificar as suas próprias prioridades e a considerar altamente penalizante a conservação no subsolo dos recursos petrolíferos disponíveis, em virtude da forte perda de lucros correspondente. A subida das taxas de juro foi uma das principais causas do colapso do cartel petrolífero em meados dos anos 80. |
5.8 |
Uma análise minuciosa deve ter em conta não só as informações decorrentes do conhecimento geológico ou tecnológico em geral, mas também do que pode ser deduzido da análise económica. Nesta base, se a escassez dos recursos e o excesso da procura em relação à oferta determinam a subida dos preços, estes últimos repercutem-se na disponibilidade dos próprios recursos, contribuindo, não raras vezes, para atenuar os desequilíbrios. Nestes casos, não se pode perder de vista que a prospecção de novos poços de petróleo pode afectar zonas e locais particularmente sensíveis do ponto de vista ambiental (p.ex. o Pólo Norte), uma situação que pode ser evitada através da procura de fontes alternativas. |
5.9 |
Antes de se averiguarem as causas da recente subida dos preços, há que fazer mais uma observação de ordem metodológica. O pré-requisito essencial de qualquer estratégia de intervenção é, sem dúvida, o conhecimento o mais exacto possível da situação a enfrentar. Luigi Einaudi, um grande economista italiano, já advertia que «para se decidir é preciso saber». |
5.10 |
O CESE considera que é extremamente importante ter um conhecimento mais pormenorizado do funcionamento do mercado petrolífero. Os receios decorrentes das fortes flutuações dos preços do petróleo baseiam-se em dados estatísticos fundados essencialmente no acompanhamento dos preços registados diariamente nos mercados. Por exemplo, uma das mais conhecidas metodologias é a adoptada pelo FMI quando calcula o denominado APSP (average petroleum spot price, que é uma média não ponderada das cotações do Brent, do Dubai e do West Texas Intermediate – WTI, petróleo de referência dos EUA). |
5.11 |
Poderia ser útil indicar os valores médios de importação do crude que podem ser extraídos das estatísticas de comércio externo, pelo menos, dos principais países importadores. É muito provável que o conhecimento das condições de fornecimento do petróleo bruto seja bem mais fidedigno do que os dados elaborados com base nas cotações diárias do mercado. |
5.12 |
O CESE considera que é correcto advogar que uma análise cuidadosa das causas da recente escalada dos preços do petróleo, e da sua mais recente queda drástica, deve começar por uma análise das tendências reais de fundo da economia mundial. |
5.13 |
Nota, contudo, que a comunicação não faz qualquer referência ao peso que tiveram seguramente as fortes tendências especulativas no aumento descontrolado dos preços do petróleo, sem as quais muito dificilmente se poderia assistir a uma cotação de 147 dólares o barril de petróleo, em Julho, e a uma cotação de cerca de 60 dólares, em Outubro de 2008. |
5.14 |
Tendo, no entanto, em conta os movimentos dos dados estruturais de fundo, pode-se verificar que o consumo mundial de energia ultrapassou de forma estável os 10 mil milhões de toneladas de equivalentes de petróleo e que este crescimento foi impulsionado por um aumento do PIB mundial que, em termos de volume absoluto mas também de intensidade relativa, não tem precedentes históricos. |
5.15 |
Há, no entanto, que avaliar a importância das perspectivas de recessão derivadas das consequências da crise dos mercados financeiros mundiais. De qualquer dos modos, não se pode negligenciar a circunstância de que durante quatro anos, de 2004 a 2007, a produção mundial aumentou 5 % ao ano, impulsionada sobretudo pelas economias emergentes, com a China e a Índia à cabeça, mas não só, pois o continente africano redinamizou-se e passou a crescer a um ritmo de 6 a 7 % ao ano. Também a Rússia está a tornar-se no gigante mundial do passado, tendo a realidade mudado no palco internacional. |
5.16 |
O PIB mundial, calculado em termos reais com base nos preços de 2007, passou de 53 triliões de dólares em 2003 (dólares calculados, como julgamos ser correcto, em termos de paridades de poder de compra, ou PPP [Purchasing Power Parities], bem como com base nas taxas de câmbio do mercado) para 65 triliões em 2007, um aumento de mais de 12 triliões de dólares. É como se, em quatro anos, tivesse sido adicionada à economia mundial uma economia da dimensão dos Estados Unidos. |
5.17 |
Um aumento de 5 % ao ano significa que, mantendo-se este ritmo de crescimento (o que não é necessariamente impossível), a produção mundial aumentaria para o dobro no espaço de catorze anos e quadruplicaria em 28, o espaço de uma geração. É uma perspectiva incrível, mas reveladora da entrada numa fase absolutamente nova da história económica. |
5.18 |
A comunicação recorda justamente que, tal como sucedeu em todas as épocas históricas, a energia é o ingrediente fundamental do crescimento económico. Por esta razão, o forte desenvolvimento económico a que estamos a assistir exerce, como principal consequência, uma pressão enorme nas fontes de energia. |
5.19 |
Há que salientar, como referido, as consequências derivadas da especulação que se faz sentir fortemente no mercado do petróleo e que amplia movimentos que radicam, certamente, em elementos de ordem estrutural. |
5.20 |
Para se compreender o fenómeno da flutuação dos preços, há que ter em conta que um terço da energia consumida provém do petróleo! |
5.21 |
Se atentarmos mais minuciosamente aos dados disponíveis sobre os preços do mercado do petróleo, chega-se a resultados surpreendentes que não coincidem com o que vem advogado na comunicação (fonte: inflationdata.com/inflation/inflation_Rate/Historical_Oil_Prices_Table.asp do Financial Trend Forecaster). |
5.22 |
O exame dos dados permite indicar que, no período entre o fim dos anos 40 até meados dos anos 70, o preço do petróleo, medido em termos reais, ou seja corrigido em relação à inflação geral relativa à evolução global dos preços, manteve-se substancialmente inalterado, sendo, em média, pouco superior aos 20 dólares o barril! Esta informação provém de todas as fontes pertinentes consultadas na matéria. |
5.23 |
Durante quase trinta anos (o período que viu passar a chamada época dourada do capitalismo moderno, a propósito da qual o grande historiador Eric Hobsbawn disse ser a mais intensa fase de desenvolvimento económico até hoje vivida pela humanidade numa escala de grandes dimensões), o colossal desenvolvimento da economia mundial não foi travado pela escassez dos recursos energéticos, o que significa que a oferta conseguiu evidentemente afrontar um aumento extraordinário da procura. |
5.24 |
Em contrapartida, como se sabe, os choques petrolíferos dos anos 70, o primeiro tendo coincidido com a guerra do Yom Kippur em Outubro de 1973, e o segundo com a revolução iraniana liderada pelo Ayatollah Khomeini, levaram a uma escalada enorme dos preços, atribuída, segunda a Comissão, a uma acção bem-sucedida de controlo da produção posta em prática pelo cartel da OPEP. |
5.25 |
No entanto, no entender do CESE, há outros factores que estão na base daquela crise e do aumento repentino das cotações do petróleo, sobretudo a fase de grande desordem monetária que culminou na declaração de inconvertibilidade do dólar em Agosto de 1971. Esta desordem teve a sua origem nos défices excessivos da balança de pagamentos americana, que tornaram impossível a manutenção do regime monetário com os câmbios estáveis de Bretton Woods. A crise do dólar manifestou-se com fortes pressões inflacionistas que acabaram por se alastrar, em grande medida, ao mercado petrolífero. Por fim, há que recordar que, no início dos anos 70, a conjuntura económica mundial se caracterizava por um ímpeto produtivo enorme, que levou a uma forte pressão da procura em todo o mercado de matérias-primas. |
5.26 |
No entanto, as diferenças em relação à situação actual parecem ser mais importantes do que as semelhanças. A única coisa em comum é apenas o forte crescimento da economia mundial. Por outro lado, não se parece vislumbrar grandes manipulações do mercado, excepto as operações especulativas, que são, no entanto, algo de muito distinto da acção do cartel petrolífero da OPEP que esteve presente oficialmente em conferências internacionais propriamente ditas. |
5.27 |
O CESE considera que nem mesmo a actual acumulação de reservas em dólares, sobretudo por países como a China e o Japão, é muito semelhante à proliferação de reservas monetárias análogas entre o fim dos anos 60 e o início dos anos 70. A China e o Japão são previdentes o suficiente para não lançarem as suas enormes reservas de dólares no mercado de modo repentino e inesperado. |
5.28 |
A duríssima política monetária dos grandes países ocidentais levou, sobretudo a partir de 1986, à queda das cotações. É interessante indicar que, sempre em termos reais, a média das cotações para o período de sete anos entre 1993 e 1999 era igual a 23 dólares o barril, exactamente a mesma média de quarenta anos atrás (1953-1959), na sequência de um enorme crescimento da economia mundial e da procura de petróleo. |
5.29 |
O CESE concorda com a opinião da Comissão de que o aceleramento do crescimento económico mundial, apesar de não ter o seu epicentro nas economias avançadas mas sim nas emergentes, não deixa de ser menos pertinente. Este desenvolvimento parece ter desencadeado uma tendência de fundo para o aumento das cotações, nominais e reais, de um valor moderado de cerca de 30 dólares o barril em 2003 (ano que marca o início da fase «forte» da conjuntura mundial) para os valores actuais, acima dos 60 dólares, ou seja praticamente o dobro. É verdade que entre 2003 e 2007 o dólar perdeu um quarto do seu valor em relação ao euro, razão pela qual os preços do petróleo em euros não duplicaram, mas acabaram por aumentar em 50 %. |
5.30 |
O exposto é válido ainda que o «pico» de Julho passado de 147 dólares seja fruto, provavelmente, de uma «bolha especulativa». Se esse pico se deve à especulação, devemo-nos preparar para um aumento dos preços no futuro próximo, quando os especuladores começarem a comprar o petróleo por eles considerado agora a bom preço. Os protagonistas da indústria petrolífera mundial, cujo poder de influência tem sido pelo menos reduzido e tornado mais transparente, consideram na verdade como «natural» para os dias de hoje um preço de cerca de 80 dólares o barril, ou seja, a um nível sensivelmente superior aos valores registados no início da fase de retoma (por volta dos 30 dólares em 2002-2003). |
Bruxelas, 25 de Fevereiro de 2009.
O Presidente
do Comité Económico e Social Europeu
Mario SEPI