51998XG1215

Relatório explicativo sobre a Convenção relativa à luta contra a corrupção em que estejam implicados funcionários das Comunidades Europeias ou dos Estados- membros da União Europeia (Texto aprovado pelo Conselho em 3 de Dezembro de 1998)

Jornal Oficial nº C 391 de 15/12/1998 p. 0001 - 0012


RELATÓRIO EXPLICATIVO sobre a Convenção relativa à luta contra a corrupção em que estejam implicados funcionários das Comunidades Europeias ou dos Estados-membros da União Europeia (Texto aprovado pelo Conselho em 3 de Dezembro de 1998) (98/C 391/01)

INTRODUÇÃO

O direito penal dos Estados-membros da União Europeia, como virtualmente o de qualquer parte do Mundo, contém disposições para combater a corrupção activa e passiva dos funcionários nacionais. Se bem que as definições das infracções de corrupção possam variar consoante os Estados-membros, existem elementos comuns a todas elas que tornam possível chegar a uma definição comum.

Numa perspectiva internacional, mais do que nacional, reconheceu-se há muito que a principal debilidade na luta contra a corrupção com características transnacionais tem sido o facto de o direito penal dos Estados-membros se abster frequentemente de contemplar o problema da corrupção dos funcionários estrangeiros e dos funcionários ao serviço de organizações internacionais. Com efeito, a definição de «funcionário público» ou de funcionário, para efeitos de aplicação do direito penal interno, só é aplicável, em muitos Estados-membros, aos funcionários nacionais; mesmo que não seja definido mais estritamente, o termo é frequentemente interpretado restritivamente.

Portanto, o direito penal da maioria dos Estados-membros não criminaliza a conduta que tem em vista corromper funcionários de outros Estados-membros, mesmo que a mesma tenha lugar no seu próprio território ou seja instigada por um dos seus próprios nacionais (1). Mesmo que a conduta criminosa possa em determinados casos ser objecto de procedimento penal com base em acusações que não a de corrupção, tais como a de fraude ou a de abuso de representação, o mais provável é que a corrupção em si fique impune.

A situação, que é há muito objecto das atenções de instâncias internacionais [em especial a OCDE (2) e o Conselho da Europa] e de numerosas recomendações e resoluções, tornou-se cada vez mais intolerável na União Europeia devido ao estreitamento dos laços entre os seus Estados-membros e à pertença dos mesmos à Comunidade Europeia, uma organização supranacional fundada no primado do Direito, com instituições próprias e um vasto efectivo de funcionários.

Pondo de parte a questão de princípio, este estado de coisas dificulta frequentemente a cooperação judiciária entre os Estados-membros nos casos em que a condição da dupla incriminação não se encontra preenchida.

Uma resposta inicial a este estado de coisas foi o estabelecimento pelo Conselho, em 27 de Setembro de 1996, do protocolo (3) da Convenção, de 26 de Julho de 1995, relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (4); o referido protocolo visava igualmente dar resposta ao disposto na alínea h) do nº 7 da resolução do Conselho, de 6 de Dezembro de 1994, relativa à protecção jurídica dos interesses financeiros da Comunidade (5), em que se declara que «Os Estados-membros deverão tomar medidas eficazes para punir os actos de suborno activo ou passivo praticados por funcionários das Comunidades Europeias que afectem os interesses financeiros das Comunidades».

Todavia, em virtude da temática da convenção-mãe, o protocolo só podia exigir aos Estados-membros que punissem condutas relacionadas com a fraude contra os interesses financeiros das Comunidades, ou seja, de acordo com os artigos 2º e 3º do protocolo, um acto ou omissão «. . . lesiva ou susceptível de lesar os interesses financeiros das Comunidades».

Em 1996, o Governo italiano apresentou um projecto de convenção com vista a assegurar a incriminação de todas as condutas corruptas que envolvam funcionários comunitários ou dos Estados-membros, e não apenas das relacionadas com a fraude contra os interesses financeiros das Comunidades. Embora amplamente baseado nas disposições e definições acordadas pelas delegações nos precedentes debates sobre o protocolo, constituía não obstante uma proposta de acto autónomo de aplicação geral e continha as disposições complementares requeridas em matéria de cooperação judiciária e de competência do Tribunal de Justiça. Na sequência dessa iniciativa, o Conselho adoptou, em 26 de Maio de 1997, o acto que estabelece a Convenção relativa à luta contra a corrupção em que estejam implicados funcionários das Comunidades Europeias ou dos Estados-membros da União Europeia (6).

A vigência da convenção contribuirá igualmente para o correcto funcionamento do mercado interno e para a implementação da orientação política nº 13 do plano de acção, de 28 de Abril de 1997, contra a criminalidade organizada (7), aprovado pelo Conselho Europeu de Amesterdão de 1997.

Registe-se que algumas partes do presente relatório explicativo foram elaboradas com base nas observações contidas nos relatórios explicativos da Convenção de 1995 relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (8) e do protocolo de 1996 dessa convenção (9).

II. OBSERVAÇÕES RELATIVAS AOS ARTIGOS

Artigo 1º Definições

Esta disposição introdutória define os termos «funcionário», «funcionário comunitário» e «funcionário nacional» para efeitos da convenção, definição válida sempre que são empregues os referidos termos.

1.1. A definição genérica do termo «funcionário» na alínea a) abrange diversas categorias de pessoas - funcionários comunitários e funcionários nacionais, incluindo os funcionários nacionais de outro Estado-membro - por forma a garantir a aplicação mais lata e homogénea possível das disposições materiais da convenção no âmbito do combate à corrupção.

Estas categorias são definidas por remissão para os respectivos estatutos.

1.2. A alínea b) refere-se aos «funcionários comunitários», expressão que abrange não apenas os funcionários efectivos stricto sensu aos quais é aplicável o Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias, mas também as diversas categorias de pessoal contratado ao abrigo do Regime aplicável aos outros Agentes. Abrange também os peritos nacionais destacados nas Comunidades Europeias para desempenharem funções equivalentes às exercidas pelos funcionários e outros agentes das Comunidades.

Os membros das instituições comunitárias - Parlamento Europeu, Comissão, Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e Tribunal de Contas das Comunidades Europeias - não são abrangidos por esta definição mas deles se ocupa o artigo 4º da convenção.

1.3. A última frase da alínea b) inclui na definição de «funcionário comunitário» o pessoal dos organismos instituídos nos termos do direito comunitário. Trata-se, presentemente, dos seguintes organismos:

- Agência Europeia de Cooperação (10),

- Banco Europeu de Investimento (11),

- Centro Europeu para o Desenvolvimento da Formação Profissional (12),

- Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (13),

- Instituto Universitário Europeu (14),

- Fundo Europeu de Investimento (15),

- Agência Europeia do Ambiente (16),

- Fundação Europeia para a Formação (17),

- Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (18),

- Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos (19),

- Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (20),

- Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (21),

- Banco Central Europeu (22),

- Instituto Comunitário das Variedades Vegetais (23),

- Centro de Tradução dos Organismos da União (24),

- Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia (25).

Esta disposição abrange o pessoal dos organismos, existentes ou futuros, responsável, numa acepção extremamente lata, pela aplicação da legislação comunitária, já adoptada ou a adoptar ao abrigo dos tratados.

1.4. A alínea c) define «funcionário nacional» como um funcionário ou funcionário público tal como os define o direito nacional de cada Estado-membro para efeitos do seu próprio direito penal. É dada, deste modo, prioridade à definição dada no direito penal do Estado da nacionalidade do funcionário. Quando estiver implicado um funcionário nacional do Estado que move o procedimento, é inequivocamente aplicável a sua definição nacional. Quando, todavia, estiver implicado um funcionário de outro Estado-membro, a definição contida no direito desse Estado-membro deverá em princípio ser aplicada pelo Estado-membro que move o procedimento. Se a pessoa em questão não tivesse a qualidade de funcionário segundo o direito desse Estado, essa definição pode não ser decisiva. Tal resulta claramente do segundo parágrafo da alínea c), nos termos do qual um Estado-membro não é obrigado a aplicar a definição de «funcionário público» de outro Estado-membro excepto na medida em que essa definição é compatível com o seu direito interno e pode, por conseguinte, decidir que as infracções em matéria de corrupção que envolvam funcionários nacionais de outro Estado-membro só são imputáveis aos funcionários cujo estatuto seja compatível com a sua própria definição de funcionários nacionais. Não havendo obrigação específica nesse sentido, um Estado-membro pode fazer uma declaração nos termos da qual decidiu fazer um uso geral desta faculdade.

Cumpre assinalar que, em geral, a remissão para o direito do Estado-membro do funcionário significa que podem ser tidas em devida conta situações nacionais específicas no que se refere ao estatuto das pessoas que exercem funções públicas.

Os nºs 2 e 3 do artigo 4º, todavia, revelam que a noção de «funcionário nacional» não inclui automaticamente os membros do Parlamento, os ministros do Governo, os membros dos Supremos Tribunais ou dos Tribunais de Contas dos Estados-membros. Todavia, tal não impede qualquer Estado-membro de tornar extensiva a sua própria definição de «funcionário nacional» a uma ou mais destas categorias de pessoas.

Artigo 2º Corrupção passiva

O artigo 2º define os elementos constitutivos da infracção de corrupção passiva. À semelhança de muitas das demais disposições da convenção, a redacção é substancialmente decalcada, com as correcções necessárias, da dos artigos correspondentes do protocolo da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (doravante, «primeiro protocolo»).

2.1. O nº 1 enumera uma série de elementos constitutivos de corrupção de um funcionário, de que a intenção faz necessariamente parte.

2.2. Os elementos materiais da corrupção incluem o facto de solicitar, aceitar e receber determinadas coisas «de forma directa ou por interposta pessoa».

O que inclui:

- o acto unilateral de um funcionário que solicita um benefício para si próprio dando a conhecer a outra pessoa, explícita ou implicitamente, que esta terá de «pagar» para que ele pratique ou se abstenha de praticar determinado acto oficial; é irrelevante que a solicitação produza efeitos, dado que é a própria solicitação que constitui a infracção,

- a aceitação ou recepção pelo prevaricador de determinadas coisas em execução de um acordo de vontades entre o mesmo e o ofertante; a infracção considera-se consumada quando haja troca de consentimentos, mesmo que posteriormente o funcionário renuncie à execução do acordo ou restitua a coisa recebida.

A convenção não faz distinção entre meios de corrupção directos e indirectos. O facto de poder estar envolvido um intermediário, elemento que alargaria o âmbito da corrupção passiva para incluir a acção indirecta do funcionário, tem necessariamente por consequência que se reconheça a natureza ilícita da conduta do funcionário, independentemente da boa ou má-fé do intermediário envolvido.

2.3. A infracção abrange também os casos em que um funcionário, por exemplo, solicita a oferta ou outra vantagem, não para si próprio, mas para terceiros, que podem ser o seu cônjuge ou sócio, um amigo íntimo, um partido político ou outra organização.

2.4. Os elementos que constituem a substância material da corrupção incluem ofertas, promessas ou vantagens de qualquer espécie em benefício do funcionário ou de qualquer outra pessoa.

«Vantagens de qualquer natureza» é um conceito deliberadamente lato, que abarca não apenas objectos materiais (dinheiro, objectos preciosos, bens de qualquer espécie, serviços prestados), mas também tudo que possa representar um interesse indirecto, como liquidação de dívidas do corrompido ou realização de obras em propriedade deste. Esta lista não é exaustiva. O conceito de vantagem, solicitada, recebida ou prometida, abrange todas as espécies de vantagens patrimoniais ou não patrimoniais.

Para efeitos da convenção, é irrelevante o momento em que são dadas ou fornecidas as coisas que constituem a substância da corrupção. Ao incluir expressamente a aceitação de promessas, o nº 1 abrange os pagamentos diferidos, desde que a sua origem resida num acordo ilícito entre corrompido e corruptor.

2.5. A disposição está redigida por forma a que a solicitação ou aceitação tenham de ser anteriores ao acto ou à abstenção do funcionário, posto que o texto reza inequivocamente que: «o facto de um funcionário . . . . solicitar ou receber vantagens . . . . ou aceitar a promessa . . . para que pratique ou se abstenha de praticar . . .».

Na acepção desta disposição, portanto, quando uma vantagem é recebida após ter sido praticado um acto sem ter havido solicitação ou aceitação anteriores, não há obrigação de os Estados-membros preverem responsabilidade penal. O artigo também não se aplica às dádivas que não se relacionem com qualquer acto subsequente realizado pelo funcionário no exercício das suas funções.

Nos termos do artigo 11º da convenção, nada evidentemente impede os Estados-membros que assim desejarem de criminalizarem igualmente a corrupção que consiste em receber uma vantagem solicitada ou aceite após o funcionário ter praticado o acto em que viola os seus deveres oficiais.

2.6. A convenção aplica-se a condutas relacionadas com os deveres ou funções do funcionário. A convenção aplica-se à prática ou à abstenção da prática de qualquer acto que se enquadre nas competências que o titular do cargo ou função detenha por força de lei ou regulamento (deveres oficiais), desde que tais actos sejam realizados com violação dos deveres do funcionário.

O direito de certos Estados-membros abrange igualmente casos em que o funcionário, contrariamente ao seu dever oficial de agir com imparcialidade, recebe uma vantagem como contrapartida de um acto conforme com as suas funções (por exemplo, para dar um tratamento preferencial acelerando ou suspendendo os trâmites de um processo). Esses casos são abrangidos pelo presente artigo.

2.7. O nº 2 estabelece que os Estados-membros devem adoptar as medidas de direito penal necessárias para assegurar que os comportamentos do tipo descrito no nº 1 constituam infracção penal.

Cabe, por conseguinte, aos Estados-membros assegurarem-se de que o respectivo direito penal em vigor abrange efectivamente todas as categorias de pessoas e formas de comportamento em causa e, caso contrário, adoptarem medidas que instituam uma ou mais infracções penais que correspondam a esses comportamentos. Poderão fazê-lo instituindo quer uma única infracção genérica quer várias infracções específicas.

Artigo 3º Corrupção activa

Este artigo descreve os elementos constitutivos da infracção de corrupção activa de um funcionário.

A disposição é o corolário da infracção definida no artigo 2º, considerada do ponto de vista do corruptor; destina-se em especial a garantir o funcionamento devido da administração pública e a proteger os funcionários de eventuais manobras de que sejam alvo, na assunção de que, na maior parte dos Estados-membros, a corrupção activa e a corrupção passiva constituem infracções distintas e autónomas, em relação às quais podem ser movidas acções distintas e autónomas.

O nº 1 enumera uma série de comportamentos por parte do corruptor que constituem corrupção activa de um funcionário.

3.1. O «facto de uma pessoa prometer ou dar intencionalmente . . . uma vantagem . . .» refere-se ao corruptor, qualquer que seja a qualidade (negócios, função pública, etc.) em que age; o corruptor pode ser um particular agindo a título individual ou por conta de uma empresa, ou uma pessoa que exerce um cargo público.

O acto que constitui corrupção tem de ser intencional, o que significa que deve decorrer de uma vontade deliberada de que o funcionário pratique actos contrários aos deveres inerentes ao serviço público.

A existência ou não de infracção nos casos em que o corruptor age deliberadamente mas erra quanto aos poderes de que julga investido o funcionário será determinada em conformidade com o direito interno dos Estados-membros.

3.2. A acção do corruptor pode consistir em prometer ou dar, directamente ou por interposta pessoa, uma vantagem patrimonial ou não patrimonial de qualquer espécie, independentemente de essa oferta ter seguimento e de a vantagem se concretizar.

A manobra de corrupção pode ser unilateral ou bilateral; pode estar relacionada com um bem tangível ou intangível; o conceito de vantagem deve ser tomado no seu sentido mais lato, tendo presente os pontos 2.4 e 2.5, supra.

Este artigo não distingue os meios - directos ou indirectos - de realização da manobra de corrupção. Inclui qualquer tipo de manobra de corrupção de que seja alvo o funcionário, tanto directa como através de terceiros.

3.3. A corrupção activa tem por alvo uma pessoa que é, por definição, um funcionário, independentemente de a vantagem reverter a favor do próprio funcionário ou de qualquer outra pessoa.

3.4. O objectivo da corrupção activa é o mesmo que o da corrupção passiva; ver ponto 2.6.

3.5. O nº 2 do artigo 3º está redigido nos mesmos termos que o nº 2 do artigo 2º; ver ponto 2.7.

Artigo 4º Equiparação

Este artigo destina-se a alargar e reforçar o alcance das medidas anticorrupção instauradas pela convenção ao exigir a adaptação do direito penal de cada um dos Estados-membros por forma a contemplar determinada infracção cometida por indivíduos que ocupam determinados cargos nas instituições comunitárias. À semelhança do primeiro protocolo, é instaurado um princípio de equiparação nos termos do qual os Estados-membros serão obrigados a aplicar aos membros das instituições comunitárias os mesmos tipos de infracções de corrupção que dizem respeito aos indivíduos que ocupam cargos semelhantes nas suas próprias instituições.

4.1. O nº 1 afirma o princípio segundo o qual os tipos de infracções que digam respeito aos ministros do Governo, membros do Parlamento, membros dos Supremos Tribunais e membros do Tribunal de Contas serão alargados por forma a incluírem os seus homólogos agindo no exercício das suas funções no seio das instituições comunitárias (membros da Comissão, deputados ao Parlamento Europeu, membros do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e membros do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias).

Segue-se que, para efeitos de sanção das infracções de corrupção, os membros da Comissão serão equiparados a ministros dos Governos, os deputados ao Parlamento Europeu a membros dos Parlamentos nacionais, os membros do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias a membros dos Supremos Tribunais nacionais e os membros do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias aos seus homólogos nacionais. Em virtude desta equiparação, deve ser conferido um âmbito mais amplo às disposições nacionais correspondentes a essas infracções quando cometidas por membros dos Parlamentos nacionais, ministros dos Governos, etc. por forma a serem aplicáveis aos membros das instituições das Comunidades Europeias acima referidos.

Este preceito não exige, obviamente, que os Estados-membros apliquem disposições incriminatórias especiais a esses indivíduos. No caso de um Estado-membro já aplicar à corrupção de ministros, membros dos Parlamentos ou membros dos órgãos judiciais, as mesmas disposições que aplica à corrupção dos funcionários públicos, apenas se lhe exigirá que além disso criminalize a corrupção dos membros das instituições comunitárias utilizando essas disposições genéricas.

4.2. Uma vez que alguns Estados-membros não possuem um Tribunal de Contas propriamente dito, os respectivos órgãos homólogos são os seguintes:

- o National Audit Office, no Reino Unido,

- o Office of the Comptroller and Auditor-General, na Irlanda,

- o Rigsrevisionen, na Dinamarca,

- o Riksrevisionsverket, na Suécia,

- a Valtiontalouden tarkastusvirasto/Statens revisionsverk, na Finlândia.

4.3. O nº 2 prevê a possibilidade de derrogar o princípio da equiparação estabelecido no nº 1 nos Estados-membros onde a responsabilidade penal dos ministros do Governo é regida por legislação especial aplicável em situações nacionais específicas. O recurso à faculdade de derrogação não exclui, porém, a necessidade de instaurar uma forma de responsabilidade penal por infracções ao direito penal nacional cometidas por membros da Comissão ou que os envolvam.

Esta possibilidade pode revelar-se útil em Estados-membros como a Dinamarca, onde as normas de direito penal que regem a responsabilidade dos ministros se aplicam em situações específicas (por exemplo, um ministro pode ser considerado penalmente responsável por actos praticados por subordinados seus) em que outras pessoas em lugares de chefia não seriam em princípio imputáveis penalmente.

4.4. Nos termos do nº 3, os nºs 1 e 2 sobre a equiparação, no que diz respeito à punibilidade, «não prejudicam as disposições aplicáveis em cada Estado-membro em matéria de processo penal e de determinação dos órgãos jurisdicionais competentes».

Para efeitos dos diferentes números do artigo 4º tomados em conjunto, a convenção não afecta nem põe em causa as normas internas de processo penal ou as regras que determinam os tribunais competentes para julgar casos relacionados com as infracções em questão. Tal não impede no entanto que o artigo produza plenos efeitos na ordem jurídica interna.

No que se refere especialmente às pessoas abrangidas pelo nº 1, relativamente às quais o princípio da equiparação implica, em termos gerais e sem excepção, igual tratamento nos termos do direito penal, cabe assinalar o seguinte: sempre que legislação especial de um Estado-membro atribuir competência a um tribunal especial (ou a uma composição específica de um tribunal ordinário) para julgar ministros do Governo, membros do Parlamento, membros dos Supremos Tribunais ou membros do Tribunal de Contas acusados da prática de uma infracção, esse tribunal poderá ser igualmente competente em casos similares respeitantes aos membros da Comissão, aos deputados ao Parlamento Europeu, aos membros do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e aos membros do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias, embora sem prejuízo das disposições nacionais que regem a determinação da competência dos tribunais.

4.5. O nº 4 determina que a convenção não prejudica as disposições que regem o levantamento da imunidade do pessoal das instituições comunitárias.

O levantamento da imunidade continua, assim, a ser uma condição prévia para o exercício da competência. Nesta matéria, a convenção reconhece a obrigação de cada uma das instituições envolvidas aplicarem as disposições que regem os privilégios e imunidades, sob reserva da observância dos procedimentos e vias de recurso ordinárias previstos no direito comunitário (26).

Artigo 5º Sanções

5.1. O nº 1 dispõe que os Estados-membros devem assegurar que as infracções de corrupção activa e passiva definidas nos artigos 2º e 3º sejam sempre puníveis com sanções penais, isto é, possam ser julgadas pelos tribunais.

O mesmo se aplica à cumplicidade e à instigação a essas infracções, conceitos que serão interpretados em conformidade com as definições dadas no direito penal de cada Estado-membro.

Uma vez que as infracções de corrupção activa e passiva abrangem a conduta que consiste em fazer promessas, independentemente de essas promessas serem efectivamente mantidas ou cumpridas, não foi considerado necessário impor a incriminação da tentativa de corrupção activa ou passiva. Não obstante, é óbvio que os Estados-membros que o desejarem podem tornar igualmente punível a tentativa de cometer as infracções em questão.

As sanções devem ser efectivas, proporcionadas e dissuasoras, em conformidade com o bem conhecido acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias no processo 68/88 (27), em que declarou: (os Estados-membros) «devem, designadamente, velar para que as violações do direito comunitário sejam punidas em condições, substantivas e de processo, análogas às aplicáveis às violações do direito nacional de natureza e importância semelhantes e que, de qualquer forma, confiram à sanção um carácter efectivo, proporcionado e dissuasor».

Para se conformarem a esta regra, os Estados-membros dispõem de algum poder discricionário na determinação da natureza e da severidade das sanções que podem ser previstas. Estas nem sempre implicarão necessariamente a privação da liberdade: será igualmente possível aplicar multas em acréscimo ou como alternativa às penas de prisão.

5.2. Nos casos graves, a convenção exige, todavia, que os Estados-membros imponham sanções que impliquem a privação da liberdade, podendo determinar a extradição. Em qualquer caso, cabe a cada Estado-membro decidir que critérios ou elementos factuais usar para determinar a gravidade de uma infracção à luz da respectiva tradição jurídica.

5.3. O nº 2 trata da relação entre o direito penal e as normas disciplinares nos casos em que o mesmo acto de corrupção possa estar sujeito a ambos os regimes; é dada prioridade ao princípio da independência dos sistemas disciplinares nacionais ou europeu ao estabelecer-se que a tramitação do processo penal «não prejudica o exercício dos poderes disciplinares pelas autoridades competentes relativamente aos funcionários nacionais ou comunitários».

A fim de ter em conta certas tradições jurídicas, o nº 2 permite ainda que as autoridades nacionais apliquem os princípios das respectivas legislações que estabelecem que, na determinação da sanção penal a aplicar, poder-se-ão ter em conta as sanções disciplinares já aplicadas à mesma pessoa pelo mesmo comportamento. Trata-se de uma disposição particular que não é obrigatória nos Estados-membros que não reconhecem ou aplicam sanções disciplinares.

Artigo 6º Responsabilidade penal dos dirigentes de empresas

6.1. Este artigo é quase integralmente decalcado do artigo 3º da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias. À semelhança dessa disposição, o seu objectivo consiste em não exonerar automaticamente de qualquer forma de responsabilidade penal os dirigentes de empresas ou outras pessoas que exerçam poder de decisão ou de controlo nas empresas quando um membro do pessoal que lhes esteja subordinado praticar, por conta da empresa, um acto de corrupção activa.

A convenção deixa uma considerável margem de liberdade aos Estados-membros para que determinem o fundamento da responsabilidade penal dos dirigentes de empresas e detentores do poder de decisão.

Para além da responsabilidade penal dos dirigentes de empresas ou dos detentores do poder de decisão, a título dos seus actos pessoais (autoria, co-autoria, cumplicidade ou instigação da corrupção), o artigo 6º permite aos Estados-membros responsabilizarem penalmente os dirigentes de empresas e detentores do poder de decisão com base noutros fundamentos.

Na acepção do artigo 6º, os Estados-membros podem responsabilizar penalmente dirigentes de empresas ou detentores do poder de decisão sempre que estes faltarem ao cumprimento de uma obrigação de vigilância ou de controlo (culpa in vigilando). Conexamente, a responsabilidade penal dos dirigentes de empresas poderá igualmente encontrar fundamento num ilícito, distinto do de corrupção, por violação de uma obrigação de vigilância ou de controlo especificada na legislação nacional.

A negligência ou imperícia poderão igualmente servir de fundamento à responsabilização penal dos dirigentes de empresas ou dos detentores do poder de decisão.

Por último, o artigo 6º não impede os Estados-membros de instituírem uma responsabilidade penal objectiva dos dirigentes de empresas e dos detentores do poder de decisão por factos praticados por outrem, sem que seja necessário provar a existência de culpa, negligência ou vigilância inadequada por parte daqueles.

A convenção não trata todavia directamente do problema da responsabilidade das pessoas colectivas. Há que ter presente, contudo, que o artigo 3º do segundo protocolo da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias exige que os Estados-membros determinem diversas formas de responsabilidade por parte das pessoas colectivas, incluindo a responsabilidade por actos de corrupção activa que afectem os interesses financeiros da Comunidade. A recente convenção da OCDE compreende uma disposição análoga. Pode pois afirmar-se com segurança que os Estados-membros terão em qualquer caso de apreciar a matéria à luz das obrigações decorrentes desses instrumentos jurídicos.

Artigo 7º Competência

7.1. Este artigo fixa uma série de critérios por força dos quais as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da lei e judiciais são competentes para instaurar e julgar acções penais em casos que envolvam infracções abrangidas pela convenção - ou seja, corrupção activa e passiva e quaisquer infracções introduzidas ao abrigo do princípio da equiparação especificadas no artigo 4º Por analogia com a solução já adoptada no âmbito de instrumentos relativos à protecção dos interesses financeiros da Comunidade, são propostos quatro critérios de competência, dos quais, todavia, apenas um (o princípio da territorialidade) é obrigatório para todos os Estados-membros, uma vez que podem ser introduzidas derrogações a cada um dos três demais critérios, dada a possibilidade de fazer a declaração prevista no nº 2.

7.2. Nos termos do nº 1, um Estado-membro deve em princípio estabelecer a sua competência em pelo menos quatro tipos de situações, a saber:

a) Quando a infracção tiver sido cometida, no todo ou em parte, no seu território, ou seja, o acto de corrupção teve lugar nesse território, a vantagem foi aí adquirida ou o acordo ilícito foi aí concluído, independentemente da qualidade ou da nacionalidade do corruptor ou do funcionário envolvido (princípio da territorialidade);

b) Quando o autor da infracção for seu nacional ou seu funcionário (princípio da personalidade activa): o critério da qualidade do autor da infracção implica que a competência pode ser estabelecida independentemente da lex loci delicti. Cabe então aos Estados-membros instaurar acções penais por infracções cometidas no estrangeiro, mesmo em países não membros. Esta possibilidade assume especial importância para os Estados-membros que não extraditam os seus nacionais;

c) Quando a infracção tiver por sujeito passivo um nacional do Estado-membro que seja funcionário ou membro de uma instituição comunitária (princípio da personalidade passiva). Este princípio assume especial interesse em casos de corrupção activa praticada no estrangeiro por pessoas que não são nacionais do Estado-membro em questão;

d) Quando o autor da infracção for um funcionário comunitário ao serviço de uma instituição das Comunidades Europeias com sede no Estado-membro em causa. Este critério da sede pode revelar-se útil em casos excepcionais não abrangidos por outras regras de competência, por exemplo quando uma infracção é cometida fora da Comunidade por um funcionário comunitário que não seja nacional de um Estado-membro (28).

7.3. Como já se referiu, o nº 2 permite a qualquer Estado-membro que o deseje não aceitar ou aceitar sob reserva de certas condições qualquer das regras definidas nas alíneas b), c) e d) do nº 1, fazendo uma declaração para esse efeito no momento da notificação prevista no nº 2 do artigo 13º da convenção.

Há que ter presente que, nos termos do artigo 15º da convenção, esta disposição é uma das duas únicas em relação às quais, como se verá, podem ser formuladas reservas.

Artigo 8º Extradição e procedimento penal

Também o artigo 8º, assim como os artigos 9º, 10º e 11º, se baseia largamente na Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, em especial no artigo 5º da mesma, alterando-o apenas na medida do necessário; de facto, ambas as disposições foram expressamente tornadas aplicáveis também ao primeiro protocolo nos termos da cláusula remissiva contida no artigo 7º deste último. Tal como no artigo 5º da convenção acima referida, as normas enunciadas no artigo 8º destinam-se a completar, no que se refere às infracções de corrupção em que estejam implicados funcionários comunitários ou dos Estados-membros, as disposições relativas à extradição dos nacionais em vigor nos Estados-membros que resultam de acordos bilaterais ou multilaterais relativos à extradição.

Cabe referir em primeiro lugar que alguns Estados-membros não extraditam os seus nacionais. O artigo 8º estabelece disposições que têm por objectivo evitar que pessoas que alegadamente praticaram actos de corrupção beneficiem de impunidade total pelo facto de a extradição ser recusada em princípio.

Para efeitos do artigo 8º, a noção de «nacional» deve ser entendida à luz das declarações relativas ao nº 1, alínea b), do artigo 6º da Convenção europeia de extradição, de 13 de Dezembro de 1957, feitas pelos Estados que são partes nessa convenção.

O artigo 8º impõe, em primeiro lugar, a um Estado-membro que não extradite os seus nacionais, que tome as medidas necessárias para definir a sua competência relativamente às infracções definidas e punidas nos termos dos artigos 2º, 3º e 4º da convenção, quando cometidas noutro Estado-membro por um dos seus nacionais.

Além disso, quando um acto de corrupção tiver sido cometido no território de um Estado-membro por um nacional de outro Estado-membro cuja extradição não possa ser concedida por este Estado-membro unicamente em virtude de não extraditar os seus nacionais, o artigo 8º impõe ao Estado-membro requerido que submeta o caso às suas autoridades judiciárias para efeitos de instauração de acção penal. O nº 2 do artigo 8º afirma inequivocamente o princípio aut dedere aut judicare. Esta disposição não pretende, contudo, afectar as regras processuais penais nacionais.

Para a aplicação deste princípio, o Estado-membro requerente compromete-se a transmitir os autos, informações e objectos relativos à infracção ao Estado-membro que se encarregará de instaurar a acção contra o seu nacional. O Estado-membro requerente será informado da tramitação do procedimento e dos resultados deste.

O artigo 8º não sujeita a qualquer condição prévia a instauração da acção penal pelo Estado requerido. Não é necessário que o Estado requerente solicite ao Estado requerido a instauração da acção penal para que este lhe dê início.

Cabe também assinalar que, tal como aquando da celebração do primeiro protocolo, no presente caso não se considerou necessário incluir a cláusula, contida no nº 3 do artigo 5º da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, que proíbe a recusa da extradição unicamente com o fundamento da natureza fiscal da infracção. Uma tal excepção, ao contrário do que se verifica em relação às infracções contra a protecção dos interesses financeiros da Comunidade, não é relevante no caso das infracções de corrupção.

Artigo 9º Cooperação

Como já se observou, a convenção trata da incriminação e exercício da acção penal tanto contra os casos de corrupção interna como nos que implicam funcionários comunitários ou de outros Estados-membros. Esta segunda categoria de casos constitui todavia, de longe, a parte mais inovadora da convenção e envolve necessariamente aspectos transnacionais. Face à especial complexidade das investigações transfronteiriças numa matéria de tal natureza, a cooperação reveste-se de uma importância fundamental.

As formas de cooperação enunciadas no nº 1 são citadas a título exemplificativo. A expressão «por exemplo» inserida nesta disposição destina-se a tomar em consideração a situação de certos Estados-membros que não são partes em todas as convenções europeias pertinentes no domínio da cooperação em matéria penal. As formas de cooperação enunciadas como exemplos são: o auxílio judiciário mútuo em matéria penal, a extradição, a transmissão de processos e a execução de sentenças proferidas noutro Estado-membro, permitindo escolher em cada caso concreto os meios de cooperação mais adequados. As convenções em vigor nesta matéria entre os Estados-membros não são afectadas pela presente convenção.

O nº 2 toma em consideração o caso em que vários Estados-membros sejam competentes para instaurar acções penais por infracções relativas aos mesmos factos.

Nesses casos, o nº 2 impõe aos Estados-membros que cooperem entre si a fim de determinarem qual deles será competente para instaurar a acção em questão. Esta disposição deverá melhorar a eficácia ao permitir, na medida do possível, centralizar o processo num único Estado-membro.

Para solucionar tais conflitos de competência, os Estados-membros poderão tomar em consideração, por exemplo: a dimensão da corrupção cometida no respectivo território, o lugar da concessão das vantagens em causa, o lugar da detenção dos suspeitos, a nacionalidade destas, acções anteriores, etc.

Artigo 10º Ne bis in idem

O nº 1 consagra o princípio ne bis in idem.

Este princípio reveste-se de importância particular nos casos de corrupção internacional relativamente aos quais possam ser competentes órgãos jurisdicionais de vários Estados-membros, quando não tenha sido possível proceder à centralização do processo num mesmo Estado-membro, em aplicação do princípio enunciado no nº 2 do artigo 9º

Este artigo baseia-se largamente na Convenção relativa à aplicação do princípio «ne bis in idem», assinada em Bruxelas em 25 de Maio de 1987 no âmbito da cooperação política europeia. Existem disposições semelhantes nos artigos 54º e seguintes da Convenção de 1990 de aplicação do Acordo de Schengen.

O nº 2 restringe a um número diminuto de casos específicos a possibilidade de os Estados-membros fazerem declarações. Esses casos coincidem com as três hipóteses contempladas no artigo 2º da Convenção relativa à aplicação do princípio «ne bis in idem». Nos termos do nº 4, contudo, as excepções consideradas em tais declarações não se aplicarão se o Estado-membro que as fez tiver não obstante intentado acção contra a pessoa em questão, ao pedir ao outro Estado-membro que instaure a acção penal ou ao conceder a extradição.

Há que conferir especial atenção à possibilidade de excepção prevista na alínea c) do nº 2, que diz respeito a factos objecto de sentença estrangeira que tenham sido praticados por um funcionário público desse Estado-membro em violação das suas obrigações profissionais. Embora decalcada da Convenção relativa à aplicação do princípio «ne bis in idem», afigura-se na realidade de especial relevância para a presente convenção, que se ocupa exclusivamente de infracções de corrupção, uma vez que, em todos os casos em que o objecto de sentença estrangeira sejam actos de corrupção passiva por parte do funcionário estrangeiro, tais factos terão certamente sido praticados por esse funcionário em violação das suas obrigações profissionais. A alínea c) do nº 2 pode, pois, revestir-se de importância particular no âmbito da presente convenção em função das declarações que os Estados-membros possam fazer no momento da ratificação.

O nº 3 estabelece que qualquer período de privação de liberdade cumprido noutro Estado-membro será sempre tomado em consideração pelo Estado-membro que tiver instaurado nova acção penal.

Por último, o nº 5 especifica que os princípios em vigor entre os Estados-membros e as declarações contidas nos acordos bilaterais ou multilaterais não serão afectados pelo presente artigo.

Artigo 11º Disposições de direito interno

O artigo 11º autoriza os Estados-membros a adoptarem disposições de Direito interno mais rigorosas do que as obrigações decorrentes da presente convenção. À semelhança da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, também a presente convenção constitui, de facto, um conjunto de normas mínimas.

Artigo 12º Tribunal de Justiça

Este artigo especifica a competência conferida ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias para conhecer dos diferendos entre Estados-membros e, em determinados casos, entre os Estados-membros e a Comissão relacionados com a interpretação ou aplicação da convenção; dispõe igualmente que o Tribunal de Justiça é competente para interpretar alguns dos artigos da convenção a título prejudicial a rogo dos tribunais nacionais. O artigo remete em parte para disposições análogas já introduzidas nos outros instrumentos adoptados até à data no âmbito do título VI do Tratado da União Europeia; cabe salientar, todavia, que é a primeira vez que a questão da competência do Tribunal de Justiça para se pronunciar a título prejudicial é tratada e resolvida directamente numa convenção, em vez de remeter para um protocolo separado, como sucedeu com a Convenção que cria um Serviço Europeu de Polícia (Europol) (29), a Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias e a Convenção sobre a utilização da informática no domínio aduaneiro (30).

O nº 1 especifica as condições em que o Tribunal de Justiça é competente para conhecer dos diferendos entre Estados-membros sobre a interpretação ou aplicação da convenção.

Reza o nº 1 que qualquer diferendo deve, numa primeira fase, ser apreciado pelo Conselho nos termos do título VI do Tratado da União Europeia, tendo em vista chegar a uma solução. Se, no final de um prazo de seis meses, não tiver sido encontrada uma solução, o diferendo pode ser submetido ao Tribunal de Justiça por um Estado-membro parte ou pelos Estados-membros partes no diferendo.

À semelhança da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, a disposição que se refere aos diferendos entre um ou mais Estados-membros e a Comissão restringe-se às disposições da convenção em relação às quais existe a possibilidade de tais diferendos ocorrerem. São essas disposições o artigo 1º, «Definições», com a exclusão expressa da alínea c), em que se define «funcionário nacional» remetendo unicamente para o Direito nacional de cada Estado-membro, e os artigos sobre o ilícito de corrupção activa e passiva e a equiparação da corrupção dos membros das instituições comunitárias na medida em que se refiram a questões de direito comunitário ou aos interesses financeiros das Comunidades ou estejam implicados membros ou funcionários das Comunidades.

No que se refere ao procedimento, dispõe o nº 2 que, nos diferendos entre os Estados-membros e a Comissão, deve em primeiro lugar tentar-se alcançar uma solução por via de negociação. Caso a negociação falhe, o diferendo pode ser submetido ao Tribunal de Justiça.

A competência do Tribunal de Justiça para se pronunciar a título prejudicial sobre uma questão relativa à interpretação da convenção, sobre o que dispõe o nº 3, não é extensiva a todas as disposições da convenção, ficando restrita aos artigos que dizem respeito a questões com relevância para o direito comunitário e não abrangendo os artigos relativos às sanções, à responsabilidade penal dos dirigentes de empresas, às regras de competência, às disposições em matéria de cooperação judiciária e às de aplicação do princípio ne bis in idem. Pode afirmar-se que esta abordagem constitui mais uma inovação relativamente à solução anteriormente adoptada no caso dos protocolos das convenções acima referidas, que previam a possibilidade de a interpretação ser extensiva a todas as disposições de tais convenções e protocolos, sem excepção.

Os nºs 4, 5 e 6 baseiam-se nas disposições em matéria de decisões a título prejudicial contidas no protocolo de 29 de Novembro de 1996 relativo à interpretação a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias da Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (31). O nº 4 dispõe que a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial está subordinada à sua aceitação pelo Estado-membro em questão através de uma declaração nesse sentido. Nos termos do nº 5, essa declaração pode limitar a faculdade de solicitar a decisão a título prejudicial aos órgãos jurisdicionais cujas decisões não são susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno. O nº 6 dispõe que, em relação aos processos abrangidos pelo artigo 12º, são aplicáveis o Estatuto do Tribunal de Justiça e o seu regulamento de processo.

Artigo 13º Entrada em vigor

13.1. Este artigo diz respeito à entrada em vigor da convenção em conformidade com as normas estabelecidas nessa matéria pelo Conselho. A convenção entra em vigor 90 dias após a notificação referida no nº 2 pelo último Estado-membro a proceder a essa formalidade.

13.2. À semelhança do que sucede relativamente à celebração de algumas outras convenções entre Estados-membros, cabe ainda assinalar que o nº 4 dispõe em relação à aplicação das disposições da convenção, antes da sua entrada em vigor, nas relações mútuas entre Estados-membros que tenham feito a correspondente declaração. A inclusão na presente convenção de semelhante cláusula, que não figura na Convenção relativa à protecção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, parece ser justificada. Para a presente convenção, é essencial que todos os Estados-membros estejam igualmente empenhados na protecção do interesse comum. Contudo, nos termos da convenção, que não tem por único objectivo a protecção do interesse comum a todos os Estados-membros prosseguindo igualmente a protecção dos interesses de cada Estado-membro, nada se opõe a que dois ou mais Estados-membros possam a ela recorrer, por antecipação relativamente à sua adopção por todos os Estados-membros.

No que se refere a casos que possam envolver funcionários comunitários, deverá ter-se presente que, na eventualidade da aplicação antecipada da convenção nos termos do nº 4, os Estados-membros que fizerem uma tal declaração serão igualmente obrigados a dar execução à convenção nos casos de corrupção activa ou passiva desses funcionários.

Esta análise parece corroborada pelo nº 5, o qual dispõe que, mesmo que um Estado-membro não tenha feito qualquer declaração de aplicação antecipada, poderá aplicar a presente convenção nas suas relações com outros Estados-membros, meramente com base em acordos bilaterais. A disposição parece essencialmente abrir a possibilidade de um Estado-membro aplicar a convenção numa base bilateral com outro Estado-membro, sem ter necessariamente de permitir a aplicação da mesma nas suas próprias relações com outros Estados-membros ou no que respeita aos funcionários comunitários.

Em qualquer caso, as disposições do artigo 12º respeitantes ao Tribunal de Justiça só se aplicam após a entrada em vigor da convenção, após ter sido ratificada por todos os Estados-membros.

Artigo 14º Adesão de novos Estados-membros

Este artigo diz respeito à adesão à convenção por futuros Estados-membros da União em conformidade com o já preceituado noutros instrumentos da União. O único aspecto digno de realce diz respeito ao nº 5 que, no caso de a convenção não ter ainda entrado em vigor no momento da respectiva adesão, prevê a possibilidade de também os Estados aderentes fazerem uso da cláusula que permite a aplicação antecipada.

Artigo 15º Reservas

Este artigo dispõe que não são admitidas quaisquer reservas, com excepção das expressamente previstas no texto da convenção no que diz respeito à determinação de diversas regras de competência para além do princípio da estrita territorialidade (artigo 7º) e à aplicação do princípio «ne bis in idem» (artigo 10º). Uma reserva pode ser retirada em qualquer momento através de notificação ao secretário-geral do Conselho.

(1) Ver comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre uma política da União contra a corrupção [COM(97) 192 final], p. 3.

(2) Após a celebração da presente convenção, foi celebrada e aberta à assinatura, em 17 de Dezembro de 1997, uma convenção da OCDE sobre o combate à corrupção de funcionários públicos estrangeiros nas transacções comerciais internacionais.

(3) JO C 313 de 23.10.1996, p. 1.

(4) JO C 316 de 27.11.1995, p. 49.

(5) JO C 355 de 14.12.1994, p. 2.

(6) JO C 195 de 25.6.1997, p. 1.

(7) JO C 251 de 15.8.1997, p. 1.

(8) JO C 191 de 23.6.1997, p. 1.

(9) JO C 11 de 15.1.1998, p. 5.

(10) Regulamento (CEE) nº 3245/81 do Conselho (JO L 328 de 16.11.1981, p. 1).

(11) Artigos 198ºD e 198ºE do Tratado CE.

(12) Regulamento (CEE) nº 337/75 do Conselho (JO L 39 de 13.2.1975, p. 1). Regulamento com a última redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) nº 354/95 (JO C 41 de 23.2.1995, p. 1).

(13) Regulamento (CEE) nº 1365/75 do Conselho (JO L 139 de 30.5.1975, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CEE) nº 1947/93 (JO L 181 de 27.7.1993, p. 13).

(14) Convenção que cria um Instituto Universitário Europeu (JO C 29 de 9.2.1976, p. 1).

(15) Estatutos do Fundo Europeu de Investimento (JO L 173 de 7.7.1994, p. 1), ver também o artigo 30º do protocolo relativo aos Estatutos do Banco Europeu de Investimento e o artigo 239º do Tratado CE.

(16) Regulamento (CEE) nº 1210/90 do Conselho (JO L 120 de 11.5.1990, p. 1).

(17) Regulamento (CEE) nº 1360/90 do Conselho (JO L 131 de 23.5.1990, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CE) nº 2063/94 (JO L 216 de 20.8.1994, p. 9).

(18) Regulamento (CEE) nº 302/93 do Conselho (JO L 36 de 12.2.1993, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CE) nº 3294/94 (JO L 341 de 30.12.1994, p. 7).

(19) Regulamento (CEE) nº 2309/93 do Conselho (JO L 214 de 24.8.1993, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CE) nº 649/98 (JO L 88 de 24.3.1998, p. 7).

(20) Regulamento (CE) nº 2062/94 do Conselho (JO L 216 de 20.8.1994, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CE) nº 1643/95 (JO L 156 de 7.7.1995, p. 1).

(21) Regulamento (CE) nº 40/94 do Conselho (JO L 11 de 14.1.1994, p. 1). Regulamento alterado pelo Regulamento (CE) nº 2868/95 (JO L 303 de 15.12.1995, p. 1).

(22) Artigo 4ºA do Tratado; protocolo relativo aos estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu, anexo ao Tratado da União Europeia.

(23) Regulamento (CE) nº 2100/94 do Conselho (JO L 227 de 1.9.1994, p. 1). Regulamento com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) nº 2506/95 (JO L 258 de 28.10.1995, p. 3).

(24) Regulamento (CE) nº 2965/94 do Conselho (JO L 314 de 7.12.1994, p. 1). Regulamento com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) nº 2610/95 (JO L 268 de 10.11.1995, p. 1).

(25) Regulamento (CE) nº 1035/97 do Conselho (JO L 151 de 10.6.1997, p. 1).

(26) Ver, em especial, o artigo 18º do Protocolo relativo aos Privilégios e Imunidades das Comunidades Europeias.

(27) Acórdão de 21 de Setembro de 1989, Colectânea, p. 2965.

(28) A este respeito, cumpre assinalar que embora, regra geral, os funcionários comunitários sejam nacionais dos Estados-membros, é possível verificarem-se excepções a este princípio.

(29) JO C 316 de 27.11.1995, p. 2.

(30) JO C 316 de 27.11.1995, p. 34.

(31) JO C 151 de 20.5.1997, p. 2.