19.10.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

L 282/63


DECISÃO (UE) 2016/1848 DA COMISSÃO

de 4 de julho de 2016

relativa à medida SA.40018 (2015/C) (ex 2015/NN) aplicada pela Hungria no que respeita à alteração de 2014 da taxa de inspeção da cadeia alimentar húngara

[notificada com o número C(2016) 4056]

(Apenas faz fé o texto na língua húngara)

(Texto relevante para efeitos do EEE)

A COMISSÃO EUROPEIA,

Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo,

Tendo em conta o Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, nomeadamente o artigo 62.o, n.o 1, alínea a),

Tendo convidado as partes interessadas a apresentarem as suas observações nos termos das disposições acima citadas (1) e tendo em conta essas observações,

Considerando o seguinte:

1.   PROCEDIMENTO

(1)

Através de artigos de imprensa publicados em dezembro de 2014, a Comissão tomou conhecimento da alteração de 2014 da Lei húngara de 2008 sobre a cadeia alimentar, que regula a taxa de inspeção da cadeia alimentar. Por carta de 17 de março de 2015, a Comissão enviou um pedido de informações às autoridades húngaras, que responderam por carta de 16 de abril de 2015.

(2)

Por carta de 15 de julho de 2015, a Comissão informou a Hungria de que tinha decidido dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (a seguir designado «Tratado») relativamente à medida de auxílio em questão («decisão de início do procedimento»). Na decisão de início do procedimento, a Comissão ordenou igualmente a suspensão imediata da medida, nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 659/1999 (2).

(3)

A decisão de início do procedimento foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia  (3). A Comissão convidou os terceiros interessados a apresentarem as suas observações relativamente ao auxílio.

(4)

A Comissão recebeu observações de uma parte interessada. Por carta de 13 de Outubro de 2015, a Comissão transmitiu essas observações à Hungria, dando-lhe a oportunidade de se pronunciar sobre as mesmas. A Hungria não tomou posição em relação às referidas observações.

2.   DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DA MEDIDA

2.1.   Lei da Cadeia Alimentar de 2008, que estabelece uma taxa de inspeção da cadeia alimentar

(5)

As disposições aplicáveis à taxa de inspeção da cadeia alimentar constam da Lei XLVI de 2008 sobre a cadeia alimentar e a sua supervisão oficial («Lei da Cadeia Alimentar») e do Decreto n.o 40 do Ministério do Desenvolvimento Rural, de 27 de abril de 2012, sobre as normas relativas à elaboração das declarações e ao pagamento da taxa de inspeção da cadeia alimentar. As empresas classificadas como operadores da cadeia alimentar, nos termos da Lei da Cadeia Alimentar, devem pagar a taxa correspondente ao volume de negócios que realizam com determinadas atividades. A lei estabelece uma lista das atividades (4) em relação às quais as empresas são obrigadas a pagar a taxa de inspeção.

(6)

Todas as empresas (sociedades e outras pessoas coletivas, mas também pessoas singulares que exerçam as suas atividades como comerciantes independentes ou produtores primários) que operem na Hungria e tenham realizado algum volume de negócios com as atividades mencionadas na lista supracitada no ano anterior à declaração estão sujeitas ao pagamento da taxa de inspeção da cadeia alimentar. O objetivo desta taxa é cobrir as despesas em que o instituto nacional de segurança da cadeia alimentar (um organismo público) incorre na execução de tarefas relativas a certas atividades de regulação e supervisão da cadeia alimentar. A taxa de supervisão é calculada anualmente e as pessoas que lhe estão sujeitas são obrigadas a apresentar uma declaração e a pagar a taxa independentemente de terem ou não sido efetuados controlos oficiais específicos no local.

(7)

Até 31 de dezembro de 2014, a Lei da Cadeia Alimentar obrigava todos os operadores da cadeia alimentar a pagar a taxa respeitante ao volume de negócios em causa à taxa fixa de 0,1 %.

(8)

A receita da taxa de inspeção da cadeia alimentar só pode ser despendida nas tarefas definidas na estratégia de segurança da cadeia alimentar e nas atividades da autoridade responsável pela cadeia alimentar.

2.2.   Alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar

(9)

Em conformidade com a alteração do artigo 47.o-B da Lei da Cadeia Alimentar pela Lei LXXIV de 2014 (5), que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2015 (a seguir designada «alteração de 2014»), foram introduzidas regras específicas para o cálculo da taxa de inspeção aplicável ao volume de negócios gerado por lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida (6) no mercado húngaro.

(10)

A alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar introduz uma estrutura progressiva da taxa, com percentagens que variam entre 0 % e 6 %, aplicável aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida (7). Mais precisamente, eram aplicadas as seguintes percentagens ao volume de negócios sujeito à taxa de inspeção da cadeia alimentar:

0 % sobre a parte do volume de negócios não superior a 500 milhões HUF (cerca de 1,6 milhões de euros);

0,1 % sobre a parte do volume de negócios acima de 500 milhões HUF, mas não superior a 50 mil milhões HUF (cerca de 160,6 milhões de euros);

1 % sobre a parte do volume de negócios acima de 50 mil milhões HUF, mas não superior a 100 mil milhões HUF (cerca de 321,2 milhões de euros);

2 % sobre a parte do volume de negócios acima de 100 mil milhões HUF, mas não superior a 150 mil milhões HUF (cerca de 481,8 milhões de euros);

3 % sobre a parte do volume de negócios acima de 150 mil milhões HUF, mas não superior a 200 mil milhões HUF (cerca de 642,4 milhões de euros);

4 % sobre a parte do volume de negócios acima de 200 mil milhões HUF, mas não superior a 250 mil milhões HUF (cerca de 803 milhões de euros);

5 % sobre a parte do volume de negócios acima de 250 mil milhões HUF, mas não superior a 300 mil milhões HUF (cerca de 963,5 milhões de euros);

6 % sobre a parte do volume de negócios acima de 300 mil milhões HUF.

(11)

Nos termos da alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar, todos os outros operadores da cadeia alimentar continuaram sujeitos à taxa calculada sobre o volume de negócios em causa com base numa taxa fixa de 0,1 %.

(12)

Nem a disposição alterada da Lei da Cadeia Alimentar húngara nem a sua exposição de motivos fazem referência às razões que levaram à introdução de regras específicas no que respeita à taxa relativa aos estabelecimentos de venda de produtos de consumo de venda rápida. Também não é dada qualquer explicação relativa à determinação dos diferentes intervalos de volume de negócios e aos correspondentes regimes de taxas.

(13)

A taxa está sujeita à declaração dos operadores da cadeia alimentar. É cobrada anualmente em duas parcelas iguais, até 31 de julho e 31 de janeiro. A lei também prevê procedimentos simplificados nos casos em que a taxa é inferior a 1 000 HUF (cerca de 3,20 euros). Nesses casos, a taxa continua a ser sujeita a declaração, mas não tem de ser paga.

(14)

É devida uma sanção por atraso de pagamento sobre qualquer taxa de inspeção que não seja paga dentro do prazo. Podem ser aplicadas sanções por incumprimento se as pessoas ou entidades sujeitas à taxa de inspeção da cadeia alimentar não cumprirem a obrigação de apresentar uma declaração, ou se a cumprirem com atraso, de forma incompleta ou com dados falsos.

3.   O PROCEDIMENTO FORMAL DE INVESTIGAÇÃO

3.1.   Fundamentos para dar início ao procedimento formal de investigação

(15)

A Comissão deu início ao procedimento formal de investigação porque considerou, nessa fase, que a estrutura progressiva da taxa (taxas e intervalos de volume de negócios) introduzida pela alteração de 2014 constituía um auxílio estatal ilegal e incompatível.

(16)

A Comissão considerou, em especial, que as taxas progressivas introduzidas pela referida alteração estabelecem uma distinção entre empresas com base no seu volume de negócios e, consequentemente, na sua dimensão, concedendo uma vantagem seletiva às empresas com um volume de negócios mais baixo e, por conseguinte, mais pequenas. A Hungria não apresentou quaisquer elementos de prova de que a estrutura de taxas progressivas aplicável a lojas de venda de produtos de consumo de venda rápida como, por exemplo, os supermercados, corresponde a uma tendência progressiva similar verificada nas despesas efetuadas pelo instituto nacional de segurança da cadeia alimentar com a inspeção desses estabelecimentos. A Hungria não demonstrou, por conseguinte, que a medida era justificada pela natureza ou pelo regime geral do sistema fiscal. Em consequência, a Comissão considerou que a medida constituía um auxílio estatal, visto que todas as outras condições previstas no artigo 107.o, n.o 1, do Tratado pareciam estar preenchidas.

(17)

Por último, a Comissão levantou dúvidas quanto à compatibilidade da medida com o mercado interno. Recordou, em especial, que não pode considerar compatível uma medida de auxílio estatal que viola outras regras do direito da União, tais como as liberdades fundamentais consagradas no Tratado ou as disposições dos regulamentos e diretivas da UE. Nessa fase, a Comissão não podia excluir que a medida tivesse predominantemente como alvos as empresas detidas por estrangeiros, o que podia implicar uma violação do artigo 49.o do Tratado, que consagra a liberdade fundamental de estabelecimento, tendo também expressado dúvidas de que as diferenças de tratamento fiscal que a medida implicava fossem necessárias e proporcionais ao objetivo de cumprir as obrigações estabelecidas no Regulamento (CE) n.o 882/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho (8).

3.2.   Alterações da base jurídica da taxa de inspeção após o início do procedimento formal de investigação

(18)

Em 27 de outubro de 2015, o Governo da Hungria apresentou ao Parlamento húngaro uma proposta de lei que alterava a Lei XLVI de 2008 sobre a cadeia alimentar e a sua supervisão oficial. Em 17 de novembro de 2015, o Parlamento húngaro aprovou a Lei CLXXXII de 2015, que altera a Lei XLVI de 2008 sobre a cadeia alimentar e a sua supervisão oficial, a qual foi publicada no jornal oficial húngaro (Magyar Közlöny) n.o 182/2015, em 26 de novembro de 2015. A nova lei entrou em vigor no 31.o dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, em 27 de dezembro de 2015.

(19)

A alteração de novembro de 2015 elimina a estrutura progressiva da taxa introduzida pela alteração de 2014 e reintroduz uma taxa de inspeção fixa de 0,1 % para todos os operadores da cadeia alimentar, como acontecia antes de a lei ser alterada em 2014.

3.3.   Observações da Hungria

(20)

A Hungria não enviou quaisquer observações à Comissão em resposta à decisão de início do procedimento.

(21)

Em vez disso, por carta de 16 de setembro de 2015, endereçada à comissária responsável pela concorrência, a Hungria enviou à Comissão uma proposta de alteração da taxa de inspeção da cadeia alimentar. Nessa proposta, a taxa de 0 % seria revogada e, em lugar da estrutura progressiva com oito percentagens (entre 0 % e 6 %), introduzir-se-ia um sistema com apenas dois níveis (0,1 % para os operadores do setor retalhista com um volume de negócios baixo e 0,3 % para os operadores do setor retalhista com um volume de negócios mais elevado).

(22)

Por carta de 7 de outubro de 2015, os serviços da Comissão informaram a Hungria de que, embora a diferença entre as taxas fosse menor nos termos da nova proposta, esta ainda previa uma estrutura de taxas progressivas, a qual seria problemática do ponto de vista dos auxílios estatais se não fosse justificada pelos princípios orientadores do sistema relativo à taxa de inspeção.

(23)

Por carta de 7 de outubro de 2015, a Hungria enviou informações e dados complementares destinados a justificar a estrutura progressiva em dois níveis, com base nos custos da supervisão dos principais operadores do mercado e de outras unidades comerciais. A Hungria alegou, designadamente, que os principais operadores possuem uma estrutura complexa, a qual exige um controlo mais complicado e recursos muito mais significativos por parte da autoridade que realiza tais controlos.

(24)

Na sequência do pedido da Hungria para que lhe fossem enviados comentários sobre a proposta apresentada na sua carta de 16 de setembro de 2015 e as informações complementares fornecidas na sua carta de 7 de outubro de 2015, os serviços da Comissão informaram a Hungria, por carta de 17 de março de 2016, de que os dados facultados não demonstravam que os custos dos controlos em percentagem do volume de negócios aumentavam da mesma forma que os regimes de taxas. Em especial, os serviços da Comissão confirmaram a sua opinião de que os dados fornecidos não mostravam que os custos das inspeções de empresas abrangidas pela taxa de 0,3 % fossem três vezes superiores — por cada forint de volume de negócios controlado — aos das empresas abrangidas pela taxa de 0,1 %. Por conseguinte, deve considerar-se que a estrutura de taxas em dois níveis proporciona uma vantagem seletiva para as empresas situadas no escalão mais baixo.

(25)

A Hungria acabou por não apresentar ao Parlamento húngaro esta proposta legislativa de alteração da Lei XLVI de 2008 sobre a cadeia alimentar e a sua supervisão oficial.

3.4.   Observações das partes interessadas

(26)

A Comissão recebeu observações de uma parte interessada. Essa parte interessada opera no mercado húngaro e concorda com a apreciação feita pela Comissão na decisão de início do procedimento. No seu entender, a medida tinha especificamente como alvo as empresas estrangeiras, o que alega ser possível devido à estrutura do mercado retalhista húngaro. Segundo essa parte, as empresas estrangeiras do setor retalhista da Hungria possuem sucursais ou filiais, o que aumenta o nível do seu volume de negócios (consolidado). Em contrapartida, as empresas húngaras estão organizadas num sistema de franquia em que cada loja — ou número limitado de lojas — é explorada por uma entidade jurídica diferente, que não faz parte da entidade ou grupo empresarial do franqueador. De acordo com as estimativas fornecidas pela parte interessada, os retalhistas estrangeiros (grupos empresariais), em conjunto, deteriam atualmente na Hungria uma quota de mercado próxima dos 50 %, mas suportam cerca de 95 % do volume da taxa de inspeção, enquanto os retalhistas húngaros se enquadram normalmente nos escalões de 0 % ou 0,1 % da taxa, nos termos do artigo 47.o-B da Lei da Cadeia Alimentar.

(27)

Por outras palavras, os retalhistas de produtos alimentares húngaros, devido ao seu sistema de organização em franquia, ficam automaticamente enquadrados nos escalões mais baixos (sujeitos a percentagens de 0 % ou 0,1 %), enquanto as sucursais e filiais das empresas-mãe estrangeiras da UE, que não estão organizadas dessa forma, são geralmente sujeitas a níveis elevados da taxa. Por conseguinte, no entender da parte interessada, a taxa de inspeção da cadeia alimentar concede uma vantagem seletiva às empresas mais pequenas e àquelas que operam no comércio retalhista sem estar enquadradas num sistema de filiais, ou seja, às empresas húngaras, em detrimento das empresas detidas por estrangeiros.

3.5.   Observações da Hungria sobre os comentários das partes interessadas

(28)

A Comissão não recebeu qualquer resposta da Hungria aos comentários formulados pela única parte interessada e que lhe foram transmitidos por carta de 13 de outubro de 2015.

4.   APRECIAÇÃO DO AUXÍLIO

(29)

A Comissão circunscreve a sua apreciação, na presente decisão, às disposições da alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar, mais especificamente à disposição alterada que estabelece uma estrutura de taxas progressivas (taxas e intervalos de volume de negócios) aplicável às lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida na Hungria, tal como referido no considerando 10 acima.

4.1.   Existência de auxílio estatal à luz do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado

(30)

Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, «salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções».

(31)

A qualificação de uma medida como auxílio, na aceção desta disposição, exige, por conseguinte, o preenchimento cumulativo das seguintes condições: i) a medida deve ser imputável ao Estado e financiada através de recursos estatais; ii) deve conferir uma vantagem ao beneficiário; iii) essa vantagem deve ser seletiva; e iv) a medida deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência e afetar as trocas comerciais entre Estados-Membros.

4.1.1.   Recursos estatais e imputabilidade ao Estado

(32)

Para constituir um auxílio estatal, uma medida deve ser financiada através de recursos estatais e ser imputável a um Estado-Membro.

(33)

Uma vez que a medida decorre de uma lei do Parlamento húngaro, é claramente imputável ao Estado húngaro. O argumento da Hungria de que a taxa não pode ser imputada ao Estado húngaro por ter como base jurídica o Regulamento (CE) n.o 882/2004 não pode ser aceite.

(34)

Os tribunais da União já declararam que uma isenção fiscal adotada por um Estado-Membro que execute uma diretiva da União em conformidade com as suas obrigações derivadas do Tratado não é imputável a esse Estado-Membro, mas decorre de um ato do legislador da União, não constituindo, portanto, um auxílio Estatal (9). Contudo, o Regulamento (CE) n.o 882/2004 define obrigações gerais dos Estados-Membros, não lhes impondo a obrigação de estabelecer taxas progressivas em função do volume de negócio para a realização dos controlos, pelo que não é possível afirmar que a alteração de 2014 decorre de um ato do legislador da União. O artigo 26.o do Regulamento (CE) n.o 882/2004 dispõe que «os Estados-Membros devem garantir a disponibilização dos recursos financeiros adequados para garantir a existência de recursos humanos e outros necessários à execução dos controlos oficiais, por quaisquer meios que sejam considerados apropriados, nomeadamente através de uma tributação geral ou do estabelecimento de taxas ou encargos». Nos termos do artigo 27.o, n.o 1, «os Estados-Membros podem cobrar taxas ou encargos para cobrir as despesas ocasionadas pelos controlos oficiais». Compete, assim, a cada Estado-Membro fixar o montante das taxas a cobrar em conformidade com essa legislação, nomeadamente com o seu artigo 27.o. Qualquer opção assumida nesse contexto é, por conseguinte, imputável ao Estado húngaro.

(35)

Quanto ao financiamento da medida através de recursos estatais, se uma medida tiver como resultado a renúncia pelo Estado a receitas que teria de cobrar a uma empresa em circunstâncias normais, essa condição encontra-se igualmente preenchida (10). No caso em apreço, o Estado húngaro renuncia aos recursos que, de outro modo, deveria cobrar aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida com um volume de negócios mais baixo (e, logo, empresas mais pequenas), se estes estivessem sujeitos à mesma taxa de inspeção que os operadores do mesmo tipo de lojas com um volume de negócios elevado.

4.1.2.   Vantagem

(36)

Segundo a jurisprudência dos tribunais da União, a noção de auxílio abrange não só prestações positivas mas também intervenções que, sob diversas formas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa (11). Embora uma medida que reduz um imposto ou uma taxa não implique uma transferência positiva de recursos estatais, dá origem a uma vantagem porque coloca as empresas beneficiárias numa situação financeira mais favorável do que a dos outros contribuintes e resulta numa perda de receitas para o Estado (12). Uma vantagem pode ser concedida através de uma redução da carga fiscal da empresa sob diversas formas e, em especial, através de uma redução da taxa de imposto aplicável, da base tributável ou do montante do imposto devido (13).

(37)

A alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar estabelece uma estrutura de taxas progressivas aplicável aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida em função dos intervalos em que se enquadra o volume de negócios dessas empresas. O caráter progressivo dessas taxas leva a que a percentagem média da taxa cobrada sobre o volume de negócios de um estabelecimento aumente quando o seu volume de negócios aumenta e atinge os escalões imediatamente superiores. Em consequência disto, as empresas com um volume de negócios baixo (empresas mais pequenas) estão sujeitas a taxas médias substancialmente inferiores às das empresas com um volume de negócios elevado (empresas de maior dimensão). A aplicação de taxas médias substancialmente inferiores diminui os encargos que as empresas com um volume de negócios baixo têm de suportar comparativamente às empresas com um grande volume de negócios e constitui, por conseguinte, uma vantagem em benefício das empresas mais pequenas e em detrimento das empresas de maior dimensão, para efeitos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado.

4.1.3.   Seletividade

(38)

Uma medida é seletiva, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, se favorecer certas empresas ou certas produções.

(39)

No que respeita aos regimes fiscais, o Tribunal de Justiça determinou que a seletividade de uma medida deve, em princípio, ser avaliada através de uma análise em três fases (14). Em primeiro lugar, é identificado o regime comum ou normal aplicável no Estado-Membro: o «sistema de referência». Em segundo lugar, é necessário determinar se uma dada medida constitui uma derrogação a esse sistema, na medida em que estabelece uma diferenciação entre operadores económicos que, à luz dos objetivos intrínsecos ao sistema, se encontram numa situação factual e jurídica comparável. Se a medida em causa não constituir uma derrogação ao sistema de referência, não é seletiva. Se constituir uma derrogação (e, por conseguinte, for seletiva prima facie), é necessário determinar, na terceira fase da análise, se a medida derrogatória é justificada pela natureza ou pelo regime geral do sistema fiscal (de referência) (15). Se uma medida seletiva prima facie for justificada pela natureza ou pelo regime geral do sistema, não será considerada seletiva e, por conseguinte, não será abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado.

a)   Sistema de referência

(40)

No caso em apreço, a Comissão considera que o sistema de referência é a taxa de inspeção aplicada às empresas da cadeia alimentar que operam na Hungria (16). No seu entender, a estrutura de taxas progressivas introduzida pela alteração de 2014 não pode fazer parte desse sistema de referência.

(41)

Tal como o Tribunal de Justiça especificou (17), a análise da seletividade nem sempre se pode limitar a apurar se a medida constitui uma derrogação ao sistema de referência definido pelo Estado-Membro. Também é necessário avaliar se o Estado-Membro concebeu os limites desse sistema de uma forma coerente ou, pelo contrário, de uma forma claramente arbitrária ou tendenciosa, de modo a favorecer determinadas empresas em detrimento de outras. Caso contrário, em vez de prever normas gerais para todas as empresas, com exceções a favor de certas empresas, o Estado-Membro poderia chegar a um resultado idêntico, contornando as regras em matéria de auxílios estatais, se ajustasse e combinasse as suas normas de modo a que a própria aplicação destas implicasse um encargo diferenciado para as diferentes empresas (18). Importa, sobretudo, recordar, a este respeito, que o Tribunal de Justiça tem sistematicamente sustentado que o artigo 107.o, n.o 1, do Tratado não faz distinções consoante as causas ou os objetivos das intervenções estatais, antes definindo essas intervenções em função dos respetivos efeitos e, portanto, independentemente das técnicas utilizadas (19).

(42)

Embora a aplicação de uma taxa fixa ao volume de negócios dos operadores da cadeia alimentar seja uma forma adequada de cobrir os custos incorridos pelo Estado no exercício das suas atividades de inspeção, em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 882/2004, a estrutura de taxas progressivas introduzida pela alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar parece ter sido deliberadamente concebida pela Hungria para favorecer certas empresas em detrimento de outras. Antes da alteração de 2014, todos os operadores da cadeia alimentar, incluindo estabelecimentos que vendem produtos de consumo de venda rápida, tinham de pagar a taxa correspondente ao seu volume de negócios à percentagem fixa de 0,1 %. Nos termos da estrutura de taxas progressivas introduzida pela referida alteração, os operadores das lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida estão potencialmente sujeitos a uma série de oito percentagens diferentes, começando em 0 % e aumentando progressivamente até atingir 6 %, em função dos intervalos em que o seu volume de negócios se enquadra. Consequentemente, em resultado da alteração de 2014, aplica-se uma taxa média diferente às empresas sujeitas ao pagamento da taxa em função da natureza das suas atividades (se explorarem estabelecimentos que vendem produtos de consumo de venda rápida) e da dimensão do seu volume de negócios (se ultrapassar os limiares estabelecidos por essa alteração).

(43)

Dado que cada empresa é tributada a uma taxa diferente, a Comissão não consegue identificar uma taxa de referência única nas taxas alteradas em 2014. Além disso, a Hungria não apresentou nenhuma taxa específica como taxa de referência ou taxa «normal», nem explicou por que razão uma taxa mais elevada seria justificada por circunstâncias excecionais no caso dos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida com volumes de negócios elevados, nem porque é que deveriam aplicar-se taxas mais baixas a certas categorias de operadores ou aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida com volumes de negócios mais baixos.

(44)

A alteração de 2014 resulta, assim, no pagamento por diferentes empresas de diferentes níveis de tributação (expressos em percentagem do seu volume de negócios anual global), em função das suas atividades e da sua dimensão, uma vez que o montante do volume de negócios realizado por uma empresa está, em certa medida, relacionado com a dimensão dessa empresa. Contudo, o objetivo da taxa de inspeção da cadeia alimentar é financiar os controlos de saúde e segurança dos géneros alimentícios em circulação na cadeia alimentar, e a estrutura de taxas progressivas, com percentagens que variam entre 0 % e 6 %, não reflete a relação entre o custo das inspeções nas instalações das empresas abrangidas pela medida e o respetivo volume de negócios.

(45)

À luz desse objetivo, a Comissão considera que todos os operadores da cadeia alimentar, em geral, e todos os operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida, em particular, se encontram numa situação jurídica e factual comparável, independentemente das suas atividades ou da dimensão do seu volume de negócios, e que a Hungria não apresentou nenhuma justificação convincente para fazer uma discriminação entre esses tipos de empresas na cobrança da taxa de inspeção da cadeia alimentar. A Comissão remete, a este respeito, para os considerandos 52 a 57 abaixo. Por conseguinte, a Hungria concebeu deliberadamente a referida taxa de modo a favorecer arbitrariamente certas empresas, nomeadamente os operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida com um volume de negócios de menor dimensão (ou seja, empresas mais pequenas) e a colocar outras em desvantagem, nomeadamente as empresas maiores, que também tendem a ser detidas por estrangeiros (20).

(46)

Por conseguinte, o sistema de referência é seletivo pela sua conceção, de uma forma não justificada pelo objetivo da taxa de inspeção da cadeia alimentar, ou seja, financiar os controlos de saúde e segurança dos géneros alimentícios que circulam na cadeia alimentar. Por conseguinte, o sistema de referência adequado no caso em apreço é a imposição às empresas que operam na Hungria de uma taxa de inspeção da cadeia alimentar assente no seu volume de negócios, sem incorporar nesse sistema a estrutura de taxas progressivas.

b)   Derrogação ao sistema de referência

(47)

Numa segunda fase, é necessário determinar se a medida em causa constitui uma derrogação ao sistema de referência, favorecendo certas empresas que se encontram numa situação factual e jurídica semelhante à luz do objetivo intrínseco do sistema de referência.

(48)

Tal como explicado no considerando 44, o objetivo intrínseco da taxa de inspeção da cadeia alimentar é financiar os controlos de saúde e segurança dos géneros alimentícios em circulação na cadeia alimentar da Hungria. Conforme é ainda explicado nesse considerando, deve considerar-se que todos os operadores da cadeia alimentar, em geral, e todos os operadores das lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida, em particular, estão numa situação jurídica e factual comparável à luz desse objetivo, independentemente das suas atividades ou da dimensão do seu volume de negócios.

(49)

Tal como explicado no considerando 37, a estrutura de taxas progressivas, que, nos termos da alteração de 2014 é exclusivamente aplicável aos operadores das lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida, leva a que as empresas com volumes de negócios elevados estejam sujeitas tanto a taxas marginais como a taxas médias de inspeção substancialmente superiores às aplicáveis aos operadores de lojas com volumes de negócios baixos e aos outros operadores da cadeia alimentar. Por outras palavras, a estrutura de taxas progressivas introduzida pela alteração de 2014 estabelece uma distinção entre empresas numa situação factual e jurídica comparável no que respeita ao objetivo da taxa de inspeção da cadeia alimentar, com base nas suas atividades e na sua dimensão.

(50)

A Comissão observa, em especial, que as taxas estabelecidas pela alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar e os intervalos a que estas se aplicam resultam num aumento da taxa, para as empresas que lhe estão sujeitas, em função do volume de negócios gerado por determinadas atividades e, por conseguinte, da dimensão dessas empresas. A taxa marginal é de 0,1 % para as empresas que geram um volume de negócios acima de 500 milhões HUF, mas não superior a 50 mil milhões HUF. Essa taxa marginal é multiplicada por 60, atingindo 6 %, no caso das empresas que vendem produtos de consumo de venda rápida que geram um volume de negócios superior a 300 mil milhões HUF. Um tal aumento da taxa marginal implica que, para um estabelecimento com um volume de negócios situado no escalão máximo, o nível médio da taxa seja substancialmente superior ao aplicável a empresas com volumes de negócios mais baixos (e, por conseguinte, mais pequenas).

(51)

Por conseguinte, a estrutura de taxas progressivas introduzida pela alteração de 2014 constitui uma derrogação ao sistema de referência que consiste na imposição de uma taxa de inspeção às empresas da cadeia alimentar que operam na Hungria, favorecendo os operadores das lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida com volumes de negócio mais baixos (e, por conseguinte, empresas mais pequenas). A Comissão considera, portanto, que a medida impugnada é seletiva prima facie.

c)   Justificação

(52)

Uma medida que constitui uma derrogação ao sistema de referência não é seletiva se for justificada pela natureza ou pelo regime geral do sistema. É o que sucede quando o tratamento seletivo resulta de mecanismos inerentes necessários para o funcionamento e a eficácia do sistema (21). Para este efeito, os Estados-Membros não podem invocar objetivos de política externa — tais como objetivos de política regional, ambiental ou industrial — para justificar o tratamento diferenciado das empresas no âmbito de um determinado regime. Incumbe ao Estado-Membro, ou seja, às autoridades húngaras, apresentar uma justificação.

(53)

As autoridades húngaras alegaram que o objetivo da derrogação é assegurar que a percentagem da taxa de inspeção é mais proporcional aos recursos de que a autoridade necessita para proceder à inspeção de operadores de mercado importantes (por exemplo, certificados, tempo necessário para a inspeção com sistemas informáticos e de garantia da qualidade, número de instalações de empresas, recurso a peritos e despesas com a frota automóvel). No entender das autoridades húngaras, os operadores da cadeia alimentar com volumes de negócios mais elevados ou que apresentam um risco acrescido devido ao maior número de consumidores envolvidos devem contribuir mais para o financiamento da inspeção da cadeia alimentar.

(54)

A Comissão considera que as taxas progressivas em função do volume de negócios só podem ser justificadas se o objetivo específico prosseguido pela taxa exigir a aplicação desse tipo de taxas, ou seja, se os custos que a taxa deve cobrir ou as externalidades negativas que a taxa deve resolver também aumentarem — e aumentarem mais do que proporcionalmente (22) — em relação ao volume de negócios. Dado que a taxa de inspeção da cadeia alimentar se destina a financiar os controlos de saúde e segurança dos géneros alimentícios que circulam na cadeia alimentar, a Comissão não vê nenhum motivo para que o custo desses controlos aumente mais do que proporcionalmente ao volume de negócios das empresas de maior dimensão.

(55)

Por exemplo, a Hungria não apresentou quaisquer elementos de prova que expliquem por que razão o operador de um estabelecimento de venda a retalho com um volume de negócios significativo, que venda, por exemplo, um pacote de açúcar, implica um risco 60 vezes maior ou justifica a realização de controlos 60 vezes mais onerosos do que o operador de um pequeno supermercado com um volume de negócios baixo, que venda o mesmo pacote de açúcar. Na verdade, embora o volume de negócios resultante da venda desse pacote de açúcar seja semelhante para ambas as empresas, a taxa cobrada por cada forint do volume de negócios gerado pela sua venda é 60 vezes menor para o operador do pequeno supermercado.

(56)

A Comissão observa ainda que a justificação apresentada pela Hungria de que os operadores da cadeia alimentar com volumes de negócios mais elevados devem dar uma contribuição maior para o financiamento da inspeção da cadeia alimentar é posta em causa pelo facto de um estabelecimento de venda de produtos de consumo de venda rápida que realiza um volume de negócios elevado estar sujeito ao pagamento de taxas mais altas sobre esse volume de negócios do que os operadores da cadeia alimentar que não vendem esse tipo de produtos e têm um volume de negócios igualmente elevado mas permanecem sujeitos a uma taxa fixa de 0,1 %.

(57)

A Comissão não considera, assim, que a medida seja justificada pela natureza e pelo regime geral do sistema de referência. Por conseguinte, deve considerar-se que esta medida confere uma vantagem seletiva às empresas que exploram estabelecimentos de venda de produtos de consumo de venda rápida com um volume de negócios de menor dimensão (e, por conseguinte, empresas mais pequenas).

4.1.4.   Distorção da concorrência e efeitos no comércio intra-União

(58)

Nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, para que uma medida constitua um auxílio estatal, é necessário que falseie ou ameace falsear a concorrência e afete as trocas comerciais intra-União. A medida em apreço é aplicável a empresas cujo volume de negócios provém de certas atividades relacionadas com a cadeia alimentar e da venda de produtos de consumo de venda rápida no mercado húngaro, nomeadamente a operadores de outros Estados-Membros. O mercado servido por empresas que vendem esse tipo de produtos caracteriza-se — tanto na Hungria como noutros Estados-Membros — pela presença de operadores de outros Estados-Membros que já operam — ou podem desenvolver as suas operações — à escala internacional. O caráter progressivo da taxa em função do volume de negócios pode favorecer substancialmente alguns desses operadores, em detrimento de outros, e reforçar a sua posição tanto no mercado húngaro como no mercado europeu em geral. Consequentemente, a medida tem influência na situação concorrencial das empresas sujeitas à taxa progressiva, falseia ou ameaça falsear a concorrência e afeta as trocas comerciais intra-União.

4.1.5.   Conclusão

(59)

Uma vez que todas as condições previstas no artigo 107.o, n.o 1, do Tratado se encontram preenchidas, a Comissão considera que a alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar, que introduz uma estrutura de taxas progressivas aplicável às empresas que vendem produtos de consumo de venda rápida, constitui um auxílio estatal na aceção dessa disposição.

4.2.   Compatibilidade do auxílio com o mercado interno

(60)

Considera-se que um auxílio estatal é compatível com o mercado interno quando se enquadra numa das categorias enumeradas no artigo 107.o, n.o 2, do Tratado (23), podendo ser considerado compatível com o mercado interno caso a Comissão entenda que se enquadra numa das categorias enumeradas no artigo 107.o, n.o 3, do Tratado (24). No entanto, é sobre o Estado-Membro que concede o auxílio que recai o ónus de provar que o auxílio estatal concedido é compatível com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.os 2 ou 3, do Tratado (25).

(61)

A Comissão observa que as autoridades húngaras não apresentaram nenhuns argumentos que justifiquem a compatibilidade da alteração de 2014 da Lei da Cadeia Alimentar com o mercado interno. A Hungria não apresentou quaisquer observações sobre as dúvidas expressas na decisão de início do procedimento quanto à compatibilidade da medida, nem tomou posição sobre os comentários do terceiro sobre essa compatibilidade (26). A Comissão entende que nenhuma das derrogações previstas nas disposições acima mencionadas é aplicável, visto não se afigurar que a medida pretenda alcançar qualquer dos objetivos nelas enunciados. Por conseguinte, a medida não pode ser declarada compatível com o mercado interno.

(62)

A Comissão recorda ainda que não pode considerar compatível uma medida de auxílio estatal que viola outras regras do direito da União, tais como as liberdades fundamentais consagradas no Tratado ou as disposições dos regulamentos e diretivas da UE. A este respeito, não se dissiparam as dúvidas manifestadas pela Comissão na decisão de início do procedimento quanto à possibilidade de a medida ter predominantemente como alvos as empresas detidas por estrangeiros, o que poderia implicar uma violação do artigo 49.o do Tratado, que consagra a liberdade fundamental de estabelecimento. A Hungria não se pronunciou sobre a eventual violação do artigo 49.o do Tratado, nem sobre os comentários do terceiro parte interessada relativamente a este aspeto.

(63)

A Hungria alegou que o Regulamento (CE) n.o 882/2004 constitui a base jurídica da taxa de inspeção da cadeia alimentar, alterada pela alteração de 2014. Todavia, com base nas informações facultadas pelas autoridades húngaras (27), a Comissão discorda que a medida — alterada em 2014 — esteja conforme com o Regulamento (CE) n.o 882/2004, pelas quatro razões seguintes.

(64)

Em primeiro lugar, não foi possível comprovar, com base nas informações facultadas pela Hungria, que a taxa de inspeção — alterada em 2014 — foi calculada segundo os critérios de cálculo das taxas definidos no Regulamento (CE) n.o 882/2004, nem que esta não era superior às despesas globalmente suportadas pelas autoridades competentes na execução dos controlos oficiais, tal como é expressamente exigido pelo artigo 27.o, n.o 4, alínea a), desse regulamento.

(65)

Em segundo lugar, os custos que foram tidos em conta quando o método de cálculo da taxa de inspeção foi estabelecido não parecem corresponder às despesas a que o artigo 27.o, n.o 4, alínea a), se refere, quando lido em conjugação com o anexo VI do Regulamento (CE) n.o 882/2004. Em particular, enquanto este último dispõe que os custos a ter em conta no cálculo das taxas podem incluir as despesas relativas ao pessoal «envolvido nos controlos oficiais», as autoridades húngaras informaram a Comissão de que a taxa de inspeção cobrada também inclui os custos (mais gerais) decorrentes da categoria mais vasta dos «salários do pessoal» (28).

(66)

Em terceiro lugar, apesar de as autoridades húngaras terem o direito de cobrar taxas fixas em conformidade com o artigo 27.o, n.o 4, alínea b), do Regulamento (CE) n.o 882/2004, não conseguiram apresentar uma justificação convincente para a progressividade da taxa de inspeção, nem para as estruturas em que esta se baseia (escalões e percentagens). Em particular, a Hungria não apresentou nenhuns elementos que comprovem que a estrutura de taxas progressivas (taxas e intervalos) aplicável aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida corresponde a uma tendência progressiva similar verificada nas despesas efetuadas pelo instituto nacional de segurança da cadeia alimentar para proceder à inspeção das ditas empresas.

(67)

Por último, embora a taxa progressiva seja alegadamente justificada, à luz do Regulamento (CE) n.o 882/2004, pela necessidade de existir uma taxa proporcional aos recursos administrativos mais avultados que as autoridades competentes têm de obter para efetuar os controlos dos principais operadores de mercado, a Comissão não entende, dada a natureza dos controlos oficiais, como é que o controlo de vários estabelecimentos de grandes retalhistas pode ser mais oneroso e complexo do que o controlo de vários estabelecimentos de operadores franquiados (que, no entanto, estão sujeitos a taxas de inspeção substancialmente inferiores, em virtude de o volume de negócios de cada estabelecimento considerado individualmente ser muito mais baixo).

(68)

Tendo em conta o que precede, a Comissão não considera que as diferenças de tratamento fiscal resultantes da medida sejam necessárias e proporcionais ao objetivo de cumprir as obrigações decorrentes do Regulamento (CE) n.o 882/2004.

4.3.   Alteração legislativa da taxa de inspeção da cadeia alimentar

(69)

Conforme indicado na secção 3.2, a taxa de inspeção da cadeia alimentar alterada em 17 de novembro de 2015 deixou de aplicar taxas progressivas. A Lei CLXXXII de 2015, que altera a Lei XLVI de 2008 sobre a cadeia alimentar e a sua supervisão oficial, prevê a substituição das mesmas por uma taxa fixa de 0,1 %, aplicável a todos os operadores da cadeia alimentar. A eliminação da estrutura progressiva da taxa responde às preocupações em matéria de auxílios estatais suscitadas por essa estrutura na decisão de início do procedimento.

4.4.   Recuperação do auxílio

(70)

A alteração de 2014 nunca foi notificada nem declarada compatível com o mercado interno pela Comissão. Uma vez que tal alteração constitui um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado e um novo auxílio na aceção do artigo 1.o, alínea c), do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho (29), executado em violação da obrigação de suspensão prevista no artigo 108.o, n.o 3, do Tratado, essa medida constitui igualmente um auxílio ilegal na aceção do artigo 1.o, alínea f), do Regulamento (UE) 2015/1589.

(71)

Em consequência da conclusão de que a medida constitui um auxílio estatal ilegal e incompatível, o auxílio deve ser recuperado junto dos seus beneficiários, em conformidade com o artigo 16.o do Regulamento (UE) 2015/1589.

(72)

Contudo, em resultado da injunção de suspensão emitida pela Comissão na sua decisão de início do procedimento, a Hungria confirmou que tinha suspendido o pagamento da taxa de inspeção da cadeia alimentar para os operadores sujeitos às diversas categorias da taxa progressiva.

(73)

Por conseguinte, nenhum auxílio estatal foi efetivamente concedido ao abrigo da medida, não sendo, assim, necessário proceder à sua recuperação.

5.   CONCLUSÃO

(74)

A Comissão considera que a Hungria aplicou ilegalmente o auxílio em causa, em violação do artigo 108.o, n.o 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

(75)

A presente decisão não obsta à realização de eventuais investigações sobre a conformidade da medida com as liberdades fundamentais consagradas no Tratado, nomeadamente a liberdade de estabelecimento garantida pelo seu artigo 49.o,

ADOTOU A PRESENTE DECISÃO:

Artigo 1.o

A estrutura progressiva da taxa (taxas e intervalos de volume de negócios) aplicável aos operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida, introduzida na taxa de inspeção da cadeia alimentar húngara através da sua alteração pela Lei LXXIV de 2014, constitui um auxílio estatal incompatível com o mercado interno, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, ilegalmente concedido pela Hungria, em violação do artigo 108.o, n.o 3, do referido Tratado.

Artigo 2.o

Os auxílios individuais concedidos com base na medida a que o artigo 1.o se refere não constituem um auxílio se, à data da respetiva concessão, satisfizerem as condições definidas pelo regulamento adotado nos termos do artigo 2.o do Regulamento (CE) n.o 994/98 do Conselho (30) ou do Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho (31), conforme o que for aplicável nessa data.

Artigo 3.o

A Hungria deve cancelar todos os pagamentos pendentes de auxílios concedidos ao abrigo do regime referido no artigo 1.o, com efeitos a contar da data de adoção da presente decisão.

Artigo 4.o

A Hungria deve assegurar a aplicação da presente decisão no prazo de quatro meses a contar da data da respetiva notificação.

Artigo 5.o

A destinatária da presente decisão é a Hungria.

Feito em Bruxelas, em 4 de julho de 2016.

Pela Comissão

Margrethe VESTAGER

Membro da Comissão


(1)  JO C 277 de 21.8.2015, p. 12.

(2)  Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 83 de 27.3.1999, p. 1).

(3)  Ver nota 1.

(4)  Segundo as informações facultadas pelas autoridades húngaras na sua carta de resposta à Comissão de 16 de abril de 2015, «As seguintes atividades estão sujeitas à taxa de inspeção:

distribuição de animais criados para produção alimentar, reprodução ou fins experimentais;

distribuição de plantas, sementes para sementeira, produtos vegetais, propágulos e materiais de multiplicação destinados à produção de géneros alimentícios ou de alimentos para animais;

produção ou distribuição de géneros alimentícios, incluindo serviços de restauração prestados por restaurantes e estabelecimentos de restauração pública;

produção ou distribuição de alimentos para animais;

produção ou distribuição de preparações e produtos veterinários;

produção ou distribuição de pesticidas, materiais para aumentar o rendimento ou adubos CE;

tratamento, utilização, transformação ulterior e transporte de subprodutos de origem animal ou colocação no mercado de produtos com estes fabricados;

exploração de uma empresa de transporte de animais vivos, de uma instalação que lava e desinfeta veículos de transporte de animais vivos, de um centro de quarentena selecionado para receber animais provenientes do estrangeiro, de uma instalação para carregar animais, de um local de recolha, de um espaço comercial, de uma estação de alimentação e abeberamento, de uma estação de repouso ou de um mercado de animais;

produção ou armazenamento de materiais de reprodução;

exploração de um laboratório fitossanitário, veterinário ou de análises de géneros alimentícios e alimentos para animais;

distribuição de dispositivos utilizados na marcação dos animais».

(5)  Lei LXXIV de 2014, que altera determinadas leis fiscais, outras leis com estas relacionadas e a Lei CXXII de 2010 relativa à Administração Nacional dos Impostos e Alfândegas

(6)  Os produtos de consumo de venda rápida são definidos da seguinte forma no artigo 2.o, n.o 18, alínea a), da Lei do Comércio: «Entende-se por produtos de consumo de venda rápida, com exceção dos produtos vendidos no setor da restauração, os géneros alimentícios, produtos cosméticos, produtos de drogaria, produtos químicos e de limpeza para uso doméstico e produtos à base de papel de uso higiénico que satisfazem as necessidades e exigências quotidianas da população e que o consumidor geralmente consome, gasta ou substitui no período de um ano.» Na aceção do artigo 2.o, n.o 18, alínea b), da Lei do Comércio, entende-se por «estabelecimentos que vendem produtos de consumo de venda rápida» as «lojas cujo volume de negócios é quase exclusivamente gerado por esse tipo de produtos».

(7)  Para efeitos da presente decisão, a referência a operadores de lojas que vendem produtos de consumo de venda rápida inclui todas as empresas sujeitas à taxa de inspeção da cadeia alimentar respeitante a volumes de negócios provenientes de estabelecimentos que vendem esse tipo de produtos.

(8)  Regulamento (CE) n.o 882/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo aos controlos oficiais realizados para assegurar a verificação do cumprimento da legislação relativa aos alimentos para animais e aos géneros alimentícios e das normas relativas à saúde e ao bem-estar dos animais (JO L 165 de 30.4.2004, p. 1).

(9)  Processo T-351/02 Deutsche Bahn/Comissão, EU:T:2006:104, n.o 102.

(10)  Processo C-83/98 P República Francesa/Ladbroke Racing Ltd e Comissão EU:C:2000:248, n.os 48 a 51. Do mesmo modo, uma medida que concede a determinadas empresas uma redução de imposto ou um diferimento do pagamento do imposto normalmente devido pode constituir um auxílio estatal, ver processos apensos C-8/08 a C-0/08 Paint Graphos e outros, EU:C:2011:550, n.o 46.

(11)  Processo C-143/99, Adria-Wien Pipeline, EU:C:2001:598, n.o 38.

(12)  Processos apensos C-393/04 e C-41/05 Air Liquide Industries Belgium EU:C:2006:403, n.o 30, e Processo C-387/92 Banco Exterior de España EU:C:1994:100, n.o 14.

(13)  Ver processo C-66/02 República Italiana/Comissão EU:C:2005:768, n.o 78; Processo C-222/04, Cassa di Risparmio di Firenze SpA e outros, EU:C:2006:8, n.o 132; Processo C-522/13 Ministerio de Defensa e Navantia EU:C:2014:2262, n.os 21 a 31. Ver também o ponto 9 da Comunicação da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade direta das empresas (JO C 384 de 10.12.1998, p. 3).

(14)  Ver, por exemplo, Processo C-279/08 P Comissão/Reino dos Países Baixos (NOx) [2011] EU:C:2011:551; Processo C-143/99, Adria-Wien Pipeline, EU:C:2001:598; Processos apensos C-78/08 a C-80/08, Paint Graphos e outros EU:C:2011:550; Processo C-308/01 GIL Insurance EU:C:2004:252.

(15)  Comunicação da Comissão sobre a aplicação das regras relativas aos auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade direta das empresas (JO C 384 de 10.12.1998, p. 3).

(16)  Ver nota 4, acima.

(17)  Processos apensos C-106/09 P e C-107/09 P Comissão e Espanha/Governo de Gibraltar e Reino Unido EU:C:2011:732.

(18)  Ibidem, n.o 92.

(19)  Processo C-487/06 P British Aggregates/Comissão EU:C:2008:757, n.os 85 e 89 e jurisprudência citada, e processo C-279/08 P Comissão/Países Baixos (NOx) EU:C:2011:551, n.o 51.

(20)  Processos apensos C-106/09 P e C-107/09 P Comissão e Espanha/Governo de Gibraltar e Reino Unido EU:C:2011:732. Ver igualmente, por analogia, o processo C-385/12 Hervis Sport- és Divatkereskedelmi Kft. EU:C:2014:47, em que o Tribunal de Justiça declarou o seguinte: «Os artigos 49.o TFUE e 54.o TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação de um Estado-Membro relativa a um imposto sobre o volume de negócios do comércio a retalho em estabelecimentos que obriga os sujeitos passivos que são, no seio de um grupo de sociedades,» empresas coligadas«, na aceção dessa legislação, a acumular os seus volumes de negócios para efeitos da aplicação de uma taxa muito progressiva e, depois, a dividir entre si o montante do imposto assim obtido, proporcional aos respetivos volumes de negócios reais, tendo em conta que — o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar — os sujeitos passivos pertencentes a um grupo de sociedades e abrangidos pelo escalão mais elevado do imposto especial estão» coligados«, na maioria dos casos, com sociedades com sede noutro Estado-Membro».

(21)  Ver, por exemplo, os processos apensos C-78/08 a C-80/08 Paint Graphos e outros EU:C:2011:550, n.o 69.

(22)  Com efeito, uma taxa fixa já impõe a cobrança de um montante superior aos estabelecimentos que tenham um volume de negócios mais elevado.

(23)  As derrogações previstas no artigo 107.o, n.o 2, do TFUE referem-se: a) aos auxílios de natureza social atribuídos a consumidores individuais; b) aos auxílios destinados a remediar danos causados por calamidades naturais ou acontecimentos de caráter excecional; e c) aos auxílios atribuídos a certas regiões da República Federal da Alemanha.

(24)  As derrogações previstas no artigo 107.o, n.o 3, do TFUE referem-se: a) aos auxílios destinados a promover o desenvolvimento de certas regiões; b) aos auxílios destinados a determinados projetos importantes de interesse europeu comum ou a sanar uma perturbação grave da economia de um Estado-Membro; c) aos auxílios destinados a desenvolver certas atividades ou regiões económicas; d) aos auxílios destinados a promover a cultura e a conservação do património; e e) aos auxílios determinados por uma decisão do Conselho.

(25)  Processo T-68/03, Olympiaki Aeroporia Ypiresies/Comissão EU:T:2007:253 n.o 34.

(26)  Tal como referido no considerando 4, esses comentários foram transmitidos à Hungria em 13 de outubro de 2015, para que se pudesse pronunciar a seu respeito.

(27)  Informações fornecidas à Direção-Geral da Saúde e da Segurança dos Alimentos por cartas de 26 de fevereiro [Ares (2015) 835210] e 19 de maio de 2015, respetivamente [Ares (2015) 2083309].

(28)  Ver carta das autoridades húngaras de 7 de outubro de 2015 aos serviços da Comissão.

(29)  Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JO L 248 de 24.9.2015, p. 9).

(30)  Regulamento (CE) n.o 994/98 do Conselho, de 7 de maio de 1998, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais (JO L 142 de 14.5.1998, p. 1).

(31)  Regulamento (UE) 2015/1588 do Conselho, de 13 de julho de 2015, relativo à aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais (JO L 248 de 24.9.2015, p. 1).