28.5.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 160/1


O texto seguinte substitui a nota informativa publicada no JO C 297, de 5 de Dezembro de 2009, p. 1, na sequência do aditamento de um novo n.o 25, bem como da alteração do n.o 40.

NOTA INFORMATIVA

relativa à instauração de processos prejudiciais pelos órgãos jurisdicionais nacionais

2011/C 160/01

I –   Disposições gerais

1.

O sistema de reenvio prejudicial é um mecanismo fundamental do direito da União Europeia, que tem por finalidade fornecer aos órgãos jurisdicionais nacionais o meio de assegurar uma interpretação e uma aplicação uniformes deste direito em todos os Estados-Membros.

2.

O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial, sobre a interpretação do direito da União Europeia e sobre a validade dos actos dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União. Esta competência genérica é-lhe conferida pelos artigos 19.o, n.o 3, alínea b), do Tratado da União Europeia (JOUE 2008, C 115, p. 13, a seguir «TUE») e 267.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (JOUE 2008, C 115, p. 47, a seguir «TFUE»).

3.

Nos termos do artigo 256.o, n.o 3, do TFUE, o Tribunal Geral é competente para conhecer das questões prejudiciais submetidas à sua apreciação por força do disposto no artigo 267.o nas matérias específicas definidas pelo Estatuto. Uma vez que o Estatuto não foi adaptado nesta matéria, o Tribunal de Justiça da União Europeia, a seguir «Tribunal de Justiça» ou «Tribunal», continua a ser o único competente para se pronunciar a título prejudicial.

4.

Embora o artigo 267.o TFUE confira ao Tribunal uma competência genérica, diversas disposições prevêem, no entanto, excepções ou limitações a esta competência. Trata-se, nomeadamente, dos artigos 275.o e 276.o TFUE, bem como do artigo 10.o do Protocolo (n.o 36) relativo às disposições transitórias do Tratado de Lisboa (JOUE 2008, C 115, p. 322).

5.

O processo prejudicial assenta na colaboração entre o Tribunal e os juízes nacionais, pelo que se afigura oportuno, a fim de assegurar a sua eficácia, fornecer aos órgãos jurisdicionais nacionais as indicações subsequentes.

6.

As presentes indicações práticas, sem carácter vinculativo, têm por objectivo orientar os órgãos jurisdicionais nacionais quanto à oportunidade de proceder a um reenvio prejudicial e, eventualmente, ajudá-los a formular e a apresentar as questões que tencionam submeter ao Tribunal.

Quanto ao papel do Tribunal no âmbito do processo prejudicial

7.

No âmbito do processo prejudicial, incumbe ao Tribunal interpretar o direito da União ou pronunciar-se sobre a sua validade, e não aplicar este direito à situação de facto que está em discussão no processo principal, o que incumbe ao juiz nacional. Não compete ao Tribunal pronunciar-se sobre questões de facto suscitadas no âmbito do litígio no processo principal nem sobre as divergências de opinião na interpretação ou na aplicação das regras de direito nacional.

8.

O Tribunal pronuncia-se sobre a interpretação ou a validade do direito da União, procurando dar uma resposta útil para a resolução do litígio, mas é ao órgão jurisdicional de reenvio que cabe tirar as consequências dessa resposta, eventualmente afastando a aplicação da disposição nacional em questão.

Quanto à decisão de submeter uma questão ao Tribunal

O autor da questão

9.

No âmbito do artigo 267.o TFUE, qualquer órgão jurisdicional de um Estado-Membro, chamado a conhecer de um processo que culminará numa decisão de carácter judicial, pode, em princípio, submeter uma questão prejudicial ao Tribunal (1). A qualidade de órgão jurisdicional é interpretada pelo Tribunal como um conceito autónomo do direito da União.

10.

É unicamente ao órgão jurisdicional nacional que cabe a iniciativa de pedir ao Tribunal que se pronuncie a título prejudicial, independentemente de as partes no processo principal o terem ou não requerido.

O reenvio de interpretação

11.

Qualquer órgão jurisdicional dispõe do poder de submeter ao Tribunal uma questão de interpretação de uma norma do direito da União quando o considere necessário para resolver um litígio que lhe tenha sido submetido.

12.

No entanto, um órgão jurisdicional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial em direito interno é, em princípio, obrigado a submeter essa questão ao Tribunal, excepto quando já exista jurisprudência na matéria (e quando o quadro eventualmente novo não suscite nenhuma dúvida real quanto à possibilidade de aplicar essa jurisprudência) ou quando o modo correcto de interpretar a norma jurídica em causa seja inequívoca.

13.

Assim, um órgão jurisdicional cujas decisões possam ser objecto de recurso pode, designadamente quando se considere suficientemente esclarecido pela jurisprudência do Tribunal, decidir ele próprio da interpretação correcta do direito da União e da sua aplicação à situação factual que lhe cabe decidir. Todavia, um reenvio prejudicial pode revelar-se particularmente útil, na fase apropriada da tramitação do processo, quando se trate de uma questão de interpretação nova que apresente um interesse geral para a aplicação uniforme do direito da União em todos os Estados-Membros ou quando a jurisprudência existente não se afigure aplicável a um quadro factual inédito.

14.

Compete ao órgão jurisdicional nacional expor em que medida a interpretação solicitada é necessária para proferir a sua decisão.

O reenvio de apreciação da validade

15.

Embora os órgãos jurisdicionais nacionais possam rejeitar os fundamentos de invalidade perante eles invocados, a possibilidade de declarar inválido um acto adoptado por uma instituição, órgão ou organismo da União é da exclusiva competência do Tribunal.

16.

Qualquer órgão jurisdicional nacional deve, portanto, apresentar uma questão ao Tribunal quando tenha dúvidas sobre a validade de tal acto, indicando as razões pelas quais considera que o mesmo poderia ser inválido.

17.

No entanto, quando tenha dúvidas sérias sobre a validade de um acto adoptado por uma instituição, órgão ou organismo da União em que se baseia um acto interno, o juiz nacional pode excepcionalmente suspender, a título temporário, a aplicação deste último ou adoptar qualquer outra medida provisória a seu respeito. Nesse caso, é obrigado a colocar a questão da validade ao Tribunal, indicando as razões pelas quais considera que o referido acto não é válido.

Quanto ao momento de submeter uma questão prejudicial

18.

O órgão jurisdicional nacional pode colocar ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial a partir do momento em que considera que uma decisão sobre a questão ou as questões de interpretação ou de validade é necessária para proferir a sua decisão; é o órgão jurisdicional nacional que está melhor colocado para apreciar em que fase do processo deve apresentar tal questão.

19.

No entanto, é desejável que a decisão de submeter uma questão prejudicial seja adoptada numa fase do processo em que o juiz de reenvio esteja em situação de definir o quadro factual e jurídico do problema, a fim de permitir ao Tribunal dispor de todos os elementos necessários para verificar, sendo caso disso, que o direito da União é aplicável ao litígio no processo principal. Pode ser igualmente útil para uma boa administração da justiça que a questão prejudicial seja colocada após um debate contraditório.

Quanto à forma do reenvio prejudicial

20.

A decisão pela qual o juiz nacional submete uma questão prejudicial ao Tribunal pode assumir qualquer forma que o direito nacional admita em matéria de incidentes processuais. No entanto, há que ter presente que é este documento que serve de fundamento ao processo no Tribunal e que este último deve dispor de todos os elementos que lhe permitam dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional nacional. Além disso, só o pedido de decisão prejudicial é notificado aos interessados que têm o direito de apresentar observações ao Tribunal – designadamente aos Estados-Membros e às instituições – e é objecto de tradução.

21.

A necessidade de traduzir o pedido requer que este seja redigido de forma simples, clara e precisa, sem elementos supérfluos.

22.

Para descrever adequadamente o contexto de um pedido de decisão prejudicial serão regra geral suficientes cerca de dez páginas. Embora sucinta, a decisão de reenvio deve ser suficientemente completa e conter todas as informações pertinentes de forma a permitir ao Tribunal, bem como aos interessados que têm o direito de apresentar observações, compreender correctamente o quadro factual e jurídico do processo principal. Em especial, a decisão de reenvio deve:

conter uma exposição sucinta do objecto do litígio, bem como dos factos pertinentes tal como foram dados como provados ou, pelo menos, explicar as hipóteses factuais em que a questão prejudicial se baseia;

reproduzir o teor das disposições nacionais susceptíveis de serem aplicadas e identificar, sendo caso disso, a jurisprudência nacional relevante, indicando em cada situação as referências precisas (por exemplo, página de um jornal oficial ou de determinada colectânea; eventualmente com referências da Internet);

identificar de forma tão precisa quanto possível as disposições do direito da União pertinentes para o caso;

explicar as razões que levaram o órgão jurisdicional de reenvio a questionar-se sobre a interpretação ou a validade de certas disposições do direito da União bem como o nexo que estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal;

conter, se for caso disso, um resumo do essencial dos argumentos pertinentes das partes no processo principal.

Para facilitar a leitura e a possibilidade de lhes fazer referência, é útil que os diferentes pontos ou números da decisão de reenvio sejam numerados.

23.

Finalmente, o órgão jurisdicional de reenvio pode, se considerar estar em condições de o fazer, indicar sucintamente o seu ponto de vista sobre a resposta a dar às questões submetidas a título prejudicial.

24.

A própria questão ou questões prejudiciais devem figurar numa parte distinta e claramente identificada da decisão de reenvio, normalmente no início ou no fim desta. Devem ser compreensíveis sem necessidade de referência à exposição de motivos do pedido, que, no entanto, fornecerá o contexto necessário para uma apreciação adequada.

25.

No âmbito do processo prejudicial, o Tribunal retoma, em princípio, os dados contidos na decisão de reenvio, incluindo os dados nominativos ou de carácter pessoal. Incumbe, portanto, ao órgão jurisdicional de reenvio, se considerar necessário, proceder ele próprio, no seu pedido de decisão prejudicial, à anonimização de uma ou de várias das pessoas às quais o litígio no processo principal diz respeito.

Quanto aos efeitos do reenvio prejudicial no processo nacional

26.

A apresentação de uma questão prejudicial acarreta a suspensão do processo nacional até à decisão do Tribunal.

27.

No entanto, o juiz nacional tem competência para adoptar medidas provisórias, em especial no quadro do reenvio de apreciação da validade (ver ponto 17, supra).

Quanto às despesas e à assistência judiciária

28.

O processo prejudicial no Tribunal é gratuito, não decidindo este Tribunal quanto às despesas das partes no processo principal, decisão que cabe ao órgão jurisdicional nacional.

29.

Caso uma parte não disponha de recursos suficientes e na medida em que as normas jurídicas nacionais o permitam, o órgão jurisdicional de reenvio pode conceder a essa parte apoio judiciário destinado a fazer face aos encargos que deve suportar para assegurar, designadamente, a sua representação no Tribunal. O próprio Tribunal pode igualmente conceder apoio judiciário nos casos em que a parte em causa não beneficie já de tal apoio a nível nacional ou na medida em que esse apoio não cubra, ou cubra apenas parcialmente, as despesas efectuadas com o processo no Tribunal.

Quanto aos contactos entre o órgão jurisdicional nacional e o Tribunal

30.

A decisão de reenvio e os documentos pertinentes (nomeadamente, sendo caso disso, os autos do processo principal, mesmo sob a forma de cópia) devem ser enviados directamente ao Tribunal pelo órgão jurisdicional nacional por carta registada (dirigida a «Greffe de la Cour de justice, L-2925 Luxembourg», telefone +352-4303-1).

31.

Até ser proferida a decisão, a Secretaria do Tribunal permanecerá em contacto com o órgão jurisdicional nacional, ao qual enviará cópia das peças processuais.

32.

O Tribunal envia a sua decisão ao órgão jurisdicional de reenvio, pedindo-lhe que o informe da aplicação que tiver feito dessa decisão no litígio no processo principal e que lhe transmita, oportunamente, a sua decisão final.

II –   O processo prejudicial urgente (PPU)

33.

Esta parte da presente nota fornece indicações práticas em relação ao processo prejudicial urgente aplicável aos reenvios relativos ao espaço de liberdade, de segurança e de justiça. Esta forma de processo é regulada pelos artigos 23.o-A do Protocolo (n.o 3) relativo ao Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia (JOUE 2008, C 115, p. 210) e 104.o-B do Regulamento de Processo do Tribunal. A possibilidade de pedir a aplicação desta forma de processo acresce à possibilidade de requerer a aplicação da tramitação acelerada, nas condições previstas nos artigos 23.o-A do referido protocolo e 104.o-B do Regulamento de Processo.

Quanto aos requisitos de aplicação do processo prejudicial urgente

34.

O processo prejudicial urgente só pode ser aplicado nas matérias abrangidas pelo Título V da Parte III do TFUE, relativo ao espaço de liberdade, segurança e justiça.

35.

A aplicação desta forma de processo é decidida pelo Tribunal. Em princípio, essa decisão só é adoptada com base em pedido fundamentado do órgão jurisdicional de reenvio. A título excepcional, o Tribunal pode, oficiosamente, decidir, quando considerar que isso se justifica, submeter um reenvio ao processo prejudicial urgente.

36.

O processo prejudicial simplifica as diferentes etapas do processo no Tribunal, mas a sua aplicação impõe contingências significativas a este Tribunal, às partes e aos outros interessados que intervenham no processo, em particular aos Estados-Membros.

37.

Por conseguinte, só deve ser requerido em circunstâncias em que seja absolutamente necessário que o Tribunal profira uma decisão sobre o pedido de decisão prejudicial o mais rapidamente possível. Não sendo possível enumerar aqui essas situações de modo exaustivo, em virtude, designadamente, do carácter variado e evolutivo das normas da União que regulam o espaço de liberdade, segurança e justiça, um órgão jurisdicional nacional poderá apresentar um pedido de tramitação segundo o processo prejudicial urgente, por exemplo, nas situações seguintes: no caso, previsto no artigo 267.o, quarto parágrafo, TFUE, de uma pessoa detida ou privada de liberdade, quando a resposta à questão colocada seja determinante para a apreciação da situação jurídica dessa pessoa ou, no caso de um litígio relativo ao poder parental ou à guarda de crianças, quando a competência do juiz chamado a julgar a causa nos termos do direito da União dependa da resposta à questão prejudicial.

Quanto ao pedido de aplicação do processo prejudicial urgente

38.

A fim de permitir ao Tribunal decidir rapidamente se há que aplicar o processo prejudicial urgente, o pedido deve expor as circunstâncias de direito e de facto comprovativas da urgência, designadamente os riscos em que se incorre se o reenvio seguir os trâmites do processo prejudicial normal.

39.

Na medida do possível, o órgão jurisdicional de reenvio indica, de forma sucinta, o seu ponto de vista sobre a resposta a dar à questão ou às questões colocadas. Essa indicação facilita a tomada de posição das partes e dos outros interessados que intervenham no processo, bem como a decisão do Tribunal, contribuindo, assim, para a celeridade do mesmo.

40.

O pedido de tramitação urgente deve ser apresentado sob uma forma não ambígua que permita à Secretaria do Tribunal constatar de imediato que os autos devem ser objecto de um tratamento específico. Para este efeito, o órgão jurisdicional de reenvio é convidado a incluir no seu pedido a referência ao artigo 104.o-B do Regulamento de Processo, fazendo figurar essa menção num local claramente identificável do seu reenvio (por exemplo, no cabeçalho ou em acto separado). Se for caso disso, pode ser útil uma carta de acompanhamento do órgão jurisdicional de reenvio que mencione esse pedido.

41.

No que respeita à decisão de reenvio propriamente dita, o seu carácter sucinto é ainda mais importante numa situação de urgência, na medida em que pode contribuir para a celeridade do processo.

Quanto aos contactos entre o Tribunal, o órgão jurisdicional nacional e as partes

42.

Para as comunicações com o órgão jurisdicional nacional e as partes, os órgãos jurisdicionais nacionais que apresentem um pedido de tramitação urgente são convidados a indicar o endereço electrónico, eventualmente, o número de telecopiador, que o Tribunal poderá utilizar, bem como os endereços electrónicos, e, eventualmente, os números de telecopiador, dos representantes das partes em causa.

43.

Uma cópia da decisão de reenvio assinada, com um pedido de tramitação urgente, pode ser transmitida previamente ao Tribunal por correio electrónico (ECJ-Registry@curia.europa.eu) ou por telecopiador (+352 43 37 66). O tratamento do reenvio e do pedido pode iniciar-se logo que essa cópia seja recebida. O original desses documentos deve, contudo, ser transmitido à Secretaria do Tribunal o mais rapidamente possível.


(1)  Em conformidade com o artigo 10.o, n.os 1 a 3, do Protocolo n.o 36, as competências do Tribunal de Justiça relativas aos actos adoptados antes da entrada em vigor do Tratado de Lisboa (JO 2007, C 306, p. 1), nos termos do Título VI do TUE, no domínio da cooperação policial e da cooperação judiciária em matéria penal, e não alterados posteriormente, permanecerão todavia inalteradas pelo período máximo de cinco anos após a data de entrada em vigor do Tratado de Lisboa (1 de Dezembro de 2009). Durante este período, esses actos só podem, assim, ser objecto de reenvio prejudicial por órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros que tenham aceite a competência do Tribunal de Justiça, competindo a cada Estado determinar se todos os seus órgãos jurisdicionais ou apenas os que decidem em última instância têm a faculdade de pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie.