DESPACHO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

16 de julho de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça — Medicamento para uso humano — Certificado complementar de proteção para os medicamentos (CCP) — Regulamento (CE) n.o 469/2009 — Condições de obtenção — Artigo 3.o, alínea d) — Primeira autorização de introdução no mercado (AIM) — Medicamentos que contêm o mesmo princípio ativo e que obtiveram várias AIM — Retirada da AIM anterior»

No processo C‑181/24,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital, Hungria), por Decisão de 27 de fevereiro de 2024, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 6 de março de 2024, no processo

Genmab A/S,

sendo interveniente:

Szellemi Tulajdon Nemzeti Hivatala,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: K. Jürimäe (relatora), presidente da Terceira Secção, exercendo funções de presidente da Oitava Secção, N. Jääskinen e M. Gavalec, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de decidir por despacho fundamentado, nos termos do artigo 99.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça,

profere o presente

Despacho

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.o, alíneas b) e d), do Regulamento (CE) n.o 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos (JO 2009, L 152, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2019/933 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019 (JO 2019, L 153, p. 1) (a seguir «Regulamento n.o 469/2009»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um pedido da Genmab A/S, uma sociedade com sede na Dinamarca, de alteração de uma decisão do Szellemi Tulajdon Nemzeti Hivatala (Instituto Nacional da Propriedade Intelectual, Hungria) pela qual este instituto recusou conceder‑lhe um certificado complementar de proteção (a seguir «CCP») para um medicamento comercializado sob o nome de «Kesimpta».

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 3, 4 e 7 a 10 do Regulamento n.o 469/2009 enunciam o seguinte:

«(3)

Os medicamentos, nomeadamente os resultantes de uma investigação longa e onerosa, só continuarão a ser desenvolvidos na Comunidade [Europeia] e na Europa se beneficiarem de uma regulamentação favorável que preveja uma proteção suficiente para incentivar tal investigação.

(4)

Atualmente, o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de introdução no mercado [(AIM)] do referido medicamento reduz a proteção efetiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efetuados na investigação.

[...]

(7)

É conveniente prever uma solução uniforme a nível comunitário, evitando assim uma evolução divergente das legislações nacionais que origine novas disparidades suscetíveis de entravar a livre circulação dos medicamentos na Comunidade e de, por isso, afetar diretamente o funcionamento do mercado interno.

(8)

É pois necessário prever um [CCP] para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada [AIM] e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado‑Membro. Consequentemente, o regulamento é o instrumento mais adequado.

(9)

A duração da proteção conferida pelo [CCP] deverá ser determinada de forma a permitir uma proteção efetiva suficiente. Para este efeito, o titular de uma patente e de um [CCP] deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira [AIM] da Comunidade do medicamento em causa.

(10)

No entanto, todos os interesses em causa num setor tão complexo e sensível como o farmacêutico, incluindo os relativos à saúde pública, deverão ser tomados em consideração. Para este efeito, o [CCP] não poderá ser concedido por um período superior a cinco anos. Além disso, a proteção que o certificado confere deverá ser estritamente limitada ao produto abrangido pela [AIM] como medicamento.»

4

O artigo 1.o deste regulamento dispõe:

«Para efeitos do presente regulamento entende‑se por:

a)

“Medicamento”: qualquer substância ou associação de substâncias com propriedades curativas ou preventivas em relação a doenças humanas ou animais, bem como qualquer substância ou associação de substâncias que possa ser administrad[a] ao homem ou a animais com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou alterar funções orgânicas no homem ou nos animais;

b)

“Produto”: o princípio ativo ou associação de princípios ativos contidos num medicamento;

c)

“Patente de base”: a patente que protege um produto como tal, um processo de obtenção de um produto ou uma aplicação de um produto e que tenha sido designado pelo seu titular para efeitos do processo de obtenção de um [CCP];

[...]»

5

O artigo 2.o do referido regulamento prevê:

«Os produtos protegidos por uma patente no território de um Estado‑Membro e sujeitos, enquanto medicamentos, antes da sua introdução no mercado, a um processo de autorização administrativa por força da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano [(JO 2001, L 311, p. 67)] ou da Diretiva 2001/82/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos veterinários [(JO 2001, L 311, p. 1)] podem ser objeto de um [CCP], nas condições e segundo as regras previstas no presente regulamento.»

6

O artigo 3.o do mesmo regulamento enuncia:

«O [CCP] é concedido se no Estado‑Membro onde for apresentado o pedido previsto no artigo 7.o e à data de tal pedido:

a)

O produto estiver protegido por uma patente de base em vigor;

b)

O produto tiver obtido, enquanto medicamento, uma autorização válida de introdução no mercado, nos termos do disposto na Diretiva [2001/83] ou na Diretiva [2001/82], conforme o caso;

c)

O produto não tiver sido já objeto de um [CCP];

d)

A autorização referida na alínea b) for a primeira autorização de introdução do produto no mercado, como medicamento.»

7

Nos termos do artigo 4.o do Regulamento n.o 469/2009:

«Dentro dos limites da proteção assegurada pela patente de base, a proteção conferida pelo [CCP] abrange apenas o produto coberto pela [AIM] do medicamento correspondente para qualquer utilização do produto, como medicamento, que tenha sido autorizada antes do termo da validade do [CCP].»

8

O artigo 5.o, n.o 1, deste regulamento dispõe:

«Sob reserva do artigo 4.o, o [CCP] confere os mesmos direitos que os conferidos pela patente de base e está sujeito às mesmas limitações e obrigações.»

9

O artigo 7.o, n.o 1, do referido regulamento prevê:

«O pedido de [CCP] deve ser apresentado no prazo de seis meses a contar da data em que o produto obteve a [AIM], como medicamento, referida na alínea b) do artigo 3.o»

10

Nos termos do artigo 8.o, n.o 1, alínea a), do mesmo regulamento:

«O pedido de certificado deve incluir:

a)

Um requerimento de emissão do [CCP] mencionando designadamente:

i)

o nome e endereço d[o] requerente,

ii)

o nome e o endereço do mandatário, se existir,

iii)

o número da patente de base, bem como o título da invenção;

iv)

o número e a data da primeira autorização de introdução do produto no mercado, de acordo com a alínea b) do artigo 3.o, bem como o número e a data desta última [AIM] caso esta não seja a primeira [AIM] na Comunidade;»

Direito húngaro

11

O artigo 22/A da találmányok szabadalmi oltalmáról szóló 1995. évi XXXIII. törvény (Lei n.o XXXIII de 1995, relativa à Proteção das Invenções pela Patente) prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   O objeto da invenção goza de proteção complementar nos casos, nas condições e durante o período previstos nos regulamentos da Comunidade Europeia assim que cesse a proteção conferida pela patente, no termo do período de proteção.

2.   As modalidades de implementação dos regulamentos da Comunidade Europeia visados no n.o 1 são objeto de regulamentação específica.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

12

A Genmab é titular da patente europeia EP 328 4753 que designa a República da Hungria. Esta patente, com o título «anticorpos monoclonais humanos contra a CD20 para o tratamento da esclerose múltipla» (a seguir «patente de base»), está em vigor na Hungria e abrange, nomeadamente, o princípio ativo «ofatumumab».

13

A Genmab comercializou um primeiro medicamento, o Arzerra, que contém o referido princípio ativo, utilizado numa terapêutica contra a leucemia linfática crónica não tratada. Em 21 de abril de 2010, a Genmab obteve uma AIM para este medicamento (a seguir «AIM anterior»). No entanto, retirou esta AIM em 27 de fevereiro de 2019.

14

Em 29 de março de 2021, a Genmab obteve uma AIM para o medicamento Kesimpta, cujo princípio ativo também é o ofatumumab (a seguir «AIM posterior»). Este medicamento é indicado para o tratamento da esclerose múltipla recorrente‑remitente.

15

Em 7 de julho de 2021, com fundamento na patente de base e na AIM posterior, a Genmab apresentou ao Instituto Nacional da Propriedade Intelectual um pedido de concessão de um CCP. Este instituto indeferiu o pedido por considerar que a AIM posterior não era a primeira AIM, na aceção do artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009, para o ofatumumab. Com efeito, o Arzerra e o Kesimpta têm o mesmo princípio ativo, isto é, o ofatumumab, e a única diferença entre os dois medicamentos reside nas respetivas indicações terapêuticas. Com base nos Acórdãos de 21 de março de 2019, Abraxis Bioscience (C‑443/17, a seguir Acórdão Abraxis, EU:C:2019:238), e 9 de julho de 2020, Santen (C‑673/18, a seguir Acórdão Santen, EU:C:2020:531), o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual considerou que, para efeitos do artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009, é decisivo que os princípios ativos sejam idênticos, e não que as aplicações terapêuticas sejam diferentes, a fim de determinar qual é a primeira AIM na aceção desta disposição. Assim, a AIM anterior deveria ser considerada a primeira AIM. É irrelevante que esta última tenha sido retirada e que já não estivesse em vigor na data de apresentação do pedido de CCP, uma vez que a questão de saber quando é que uma determinada AIM pode ser considerada a primeira depende apenas da definição do «produto».

16

A Genmab impugnou a decisão do Instituto Nacional da Propriedade Intelectual perante o Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital, Hungria), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Esta sociedade alega que a primeira AIM, na aceção deste artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009, só pode ser uma AIM em vigor na data da apresentação do pedido de CCP. Por conseguinte, o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual cometeu um erro ao considerar que a primeira AIM do produto ofatumumab, como medicamento, era a que tinha sido concedida para o medicamento Arzerra, uma vez que essa AIM já não estava em vigor na data da apresentação do pedido de CCP. Os Acórdãos Abraxis e Santen não são relevantes, uma vez que nenhum deles aborda a questão da validade da AIM anterior. A Genmab alega, além disso, que, nos processos que deram origem a estes acórdãos, as AIM em causa estavam em vigor.

17

A Genmab remete para a versão em língua inglesa do artigo 3.o, alíneas b) e d), do Regulamento n.o 469/2009, que condiciona a concessão do CCP à existência de uma primeira AIM válida (valid) no dia da apresentação do pedido desse certificado. Esta interpretação é confirmada pelas versões alemã e francesa destas disposições. A Genmab salienta que, no caso em apreço, a AIM posterior é a primeira AIM relevante, na aceção do artigo 3.o, alínea d), do referido regulamento, uma vez que, na data da apresentação do pedido de CCP, era a única AIM em vigor na Hungria para o princípio ativo ofatumumab, como medicamento.

18

O órgão jurisdicional de reenvio acolhe, em substância, os argumentos da Genmab. Observa que o Tribunal de Justiça já foi chamado a pronunciar‑se em processos em que os pedidos de CCP em causa diziam respeito a medicamentos que continham o mesmo princípio ativo que outro medicamento que tinha sido objeto de uma AIM anterior e que diferiam apenas nas suas indicações terapêuticas ou na formulação desse princípio ativo. No entanto, nesses processos, todas as AIM estavam em vigor. Assim, o Tribunal de Justiça ainda não se debruçou sobre a questão de saber qual a AIM que deve ser considerada a primeira AIM para o produto em causa, enquanto medicamento, na aceção do artigo 3.o, alíneas b) e d), do Regulamento n.o 469/2009, quando o produto em questão já tenha sido objeto de uma AIM anterior que tenha sido, contudo, retirada.

19

Embora salientando que a versão em língua húngara do artigo 3.o, alínea b), do Regulamento n.o 469/2009 não contém o equivalente do termo inglês valid, o órgão jurisdicional de reenvio considera, no entanto, que uma interpretação teleológica desta disposição indica que só devem ser tomados em consideração os medicamentos que contenham o princípio ativo em causa e que se encontrem efetivamente no mercado à data da apresentação do pedido de CCP. Esta interpretação decorre do n.o 55 do Acórdão Santen, segundo o qual o legislador da União, ao instituir o regime do CCP, não pretendeu favorecer a proteção de todas as pesquisas farmacêuticas que deem origem à concessão de uma patente e à comercialização de um novo medicamento, tendo antes pretendido favorecer a proteção das pesquisas que conduzam à primeira introdução no mercado de um princípio ativo ou de uma combinação de princípios ativos como medicamento.

20

Dito isto, tendo em conta as posições diametralmente opostas da Genmab e do Instituto Nacional da Propriedade Intelectual, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à interpretação correta do conceito de «primeira autorização de introdução do produto no mercado».

21

Nestas condições, o Fővárosi Törvényszék (Tribunal de Budapeste‑Capital) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 3.o, alíneas b) e d), do [Regulamento n.o 469/2009] ser interpretado no sentido de que uma [AIM] anterior à [AIM] constante do pedido de [CCP] e relativa ao mesmo produto se considera a primeira [AIM] para efeitos do referido regulamento, inclusivamente quando essa [AIM] anterior tenha sido [retirada] antes da apresentação do pedido de certificado?»

Quanto à questão prejudicial

22

Nos termos do artigo 99.o do seu Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, mediante proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, decidir pronunciar‑se por meio de despacho fundamentado, quando a resposta a uma questão submetida a título prejudicial possa ser claramente deduzida da jurisprudência ou quando a resposta a essa questão não suscite nenhuma dúvida razoável.

23

Neste caso, há que aplicar esta disposição no presente processo.

24

Com a sua única questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a AIM apresentada em apoio de um pedido de CCP para um produto seja considerada a primeira AIM, na aceção desta disposição, quando esse produto tenha sido objeto de uma AIM anterior que tenha sido, contudo, retirada antes da apresentação do pedido de CCP.

25

A este respeito, há que salientar que a redação do artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009, o contexto em que esta disposição se insere, os objetivos visados pelo legislador da União e os elementos que compõem a génese deste regulamento indicam todos que a condição prevista nesta disposição assenta num critério cronológico objetivo segundo o qual a primeira autorização de introdução do produto no mercado, na aceção da referida disposição, designa a AIM para esse produto que foi emitida na data mais antiga no Estado‑Membro em causa, independentemente de essa AIM ainda estar em vigor ou não.

26

Primeiro, a redação da referida disposição enuncia que o CCP é concedido se, no Estado‑Membro onde é apresentado o pedido, a AIM obtida para o produto para o qual o CCP é pedido for a primeira autorização de introdução do produto no mercado, como medicamento. Todavia, não resulta desta redação que a primeira AIM deva ser a primeira apenas entre as AIM que estão em vigor à data da apresentação do pedido de CCP. Pelo contrário, a referida redação indica claramente que é necessário ter em conta a este respeito todas as AIM que foram concedidas para o produto em causa no Estado‑Membro onde foi apresentado o pedido de CCP em questão.

27

Segundo, a análise do contexto em que se insere o artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009 conduz à mesma conclusão. Com efeito, resulta do artigo 3.o deste regulamento que este enuncia quatro condições autónomas e cumulativas que não podem ser fundidas.

28

A este respeito, o artigo 3.o, alínea b), do referido regulamento exige que o produto, enquanto medicamento, tenha obtido uma autorização «válida» de introdução no mercado. O artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009 só se refere a este artigo 3.o, alínea b), para identificar a AIM que deve preencher a condição suplementar e autónoma que enuncia. Assim, no contexto deste artigo 3.o, alínea d), há que ter em conta todas as AIM concedidas para o produto antes da data da apresentação do pedido de CCP. Se, de entre todas estas AIM, a primeira delas for a que preenche a condição prevista na alínea b), então, a condição da alínea d) também se considera preenchida.

29

Uma interpretação contrária do artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009, no sentido de que apenas devem ser tidas em conta as AIM em vigor nessa data, equivaleria a confundir as duas condições através da fusão do conceito de «AIM» com o conceito de «autorização válida de introdução no mercado».

30

Esta última interpretação deve igualmente ser afastada à luz do artigo 8.o do Regulamento n.o 469/2009, que especifica o conteúdo do pedido de CCP. Nos termos deste artigo, este pedido deve conter o número e a data da AIM referida no artigo 3.o, alínea b), deste regulamento e, se não for a primeira AIM para o produto em causa, o número e a data da primeira AIM. Ora, se apenas fosse necessário ter em conta as AIM em vigor para determinar qual é a primeira AIM para o produto em causa, o artigo 8.o do referido regulamento teria exigido que esse detalhe fosse igualmente fornecido. No entanto, não é pedida nenhuma justificação para verificar se as AIM em causa são válidas, o que demonstra que a condição prevista no artigo 3.o, alínea d), do mesmo regulamento assenta num critério cronológico objetivo.

31

Terceiro, a génese dessa disposição confirma a interpretação recordada no n.o 25 do presente despacho. Com efeito, os pontos 35 e 36 da exposição de motivos da Proposta de Regulamento (CEE) do Conselho, de 11 de abril de 1990, relativo à criação de um certificado complementar de proteção para os medicamentos [COM(90) 101 final] explicam que é frequente o mesmo produto obter várias AIM, nomeadamente quando é introduzida uma alteração que afete a forma farmacêutica, a dosagem, a composição ou ainda as indicações. Contudo, é a primeira AIM do produto no Estado‑Membro em que o pedido é apresentado que é tida em conta para efeitos da proposta de regulamento, nomeadamente para o cálculo do prazo de seis meses de que dispõe o titular da patente de base para apresentar um pedido de CCP. Assim, embora o mesmo produto possa ser objeto de várias patentes e de várias AIM num único Estado‑Membro, o legislador da União decidiu que um CCP só é concedido para esse produto com base numa única patente e numa única AIM, a saber, a primeira, em termos cronológicos, concedida por esse Estado‑Membro.

32

Quarto, a análise dos objetivos visados pelo legislador da União está em plena consonância com esta interpretação restritiva do artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009. A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que esse legislador, ao instituir o regime do CCP, pretendeu proteger não todas as investigações farmacêuticas que deem origem à concessão de uma patente e à comercialização de um medicamento, mas apenas as investigações que conduzam à primeira AIM de um princípio ativo, como medicamento (v., neste sentido, Acórdãos Abraxis, n.o 37, e Santen, n.o 55). Ora, este objetivo ficaria comprometido se apenas as AIM em vigor fossem tidas em conta para determinar qual é a primeira AIM para um determinado produto. Com efeito, bastaria renunciar a uma AIM anterior para obter um CCP sobre a última versão comercializada do produto em causa, o que permitiria aos laboratórios farmacêuticos escolher a versão do produto a favorecer. Isto transformaria o critério objetivo previsto nesta disposição num critério subjetivo que dependeria da escolha dos laboratórios, o que claramente não corresponde à escolha do legislador da União.

33

Tendo em conta o que precede, há que responder à questão submetida que o artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 469/2009 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a AIM apresentada em apoio de um pedido de CCP para um produto seja considerada a primeira AIM, na aceção desta disposição, quando esse produto tenha sido objeto de uma AIM anterior que, contudo, tenha sido retirada antes da apresentação do pedido de CCP.

Quanto às despesas

34

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara:

 

O artigo 3.o, alínea d), do Regulamento (CE) n.o 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de proteção para os medicamentos, conforme alterado pelo Regulamento (UE) 2019/933 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019,

 

deve ser interpretado no sentido de que:

 

se opõe a que a autorização de introdução no mercado apresentada em apoio de um pedido de certificado complementar de proteção para um produto seja considerada a primeira autorização de introdução no mercado, na aceção desta disposição, quando esse produto tenha sido objeto de uma autorização de introdução no mercado anterior que, contudo, tenha sido retirada antes da apresentação do pedido de certificado complementar de proteção.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: húngaro.