ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)
11 de setembro de 2025 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Saúde pública — Cuidados de saúde transfronteiriços — Diretiva 2011/24/UE — Artigo 3.o, alíneas d) e e) — Prestação de cuidados de saúde por telemedicina — Conceito de “telemedicina” — Cuidados de saúde transfronteiriços prestados por telemedicina — Tratamento médico complexo incluindo cuidados de saúde prestados por telemedicina e presencialmente — Estado‑Membro de tratamento — Diretiva 2000/31/CE — Serviços da sociedade da informação — Diretiva 2005/36/CE — Qualificações profissionais — Liberdade de prestação de serviços — Âmbito de aplicação — Artigo 56.o TFUE»
No processo C‑115/24,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Oberster Gerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça, Áustria), por Decisão de 25 de janeiro de 2024, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 13 de fevereiro de 2024, no processo
UJ
contra
Österreichische Zahnärztekammer,
sendo intervenientes:
Urban Technology GmbH,
DZK Deutsche Zahnklinik GmbH,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),
composto por: I. Jarukaitis, presidente de secção, N. Jääskinen, A. Arabadjiev, M. Condinanzi (relator) e R. Frendo, juízes,
advogado‑geral: A. Rantos,
secretário: D. Dittert, chefe de unidade,
vistos os autos e após a audiência de 13 de fevereiro de 2025,
vistas as observações apresentadas:
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             em representação de UJ, por D. Boyadjiyska e J. Hütthaler‑Brandauer, Rechtsanwälte,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação de l’Österreichische Zahnärztekammer, por F. Schulz, Rechtsanwalt,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação de Urban Technology GmbH, por U. Karpenstein, R. Sangi e T. Shulman, Rechtsanwälte,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação de DZK Deutsche Zahnklinik GmbH, por R. Kreuml e M. Nill, Rechtsanwälte,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação do Governo Austríaco, por A. Posch, bem como C. Gabauer e J. Schmoll, na qualidade de agentes,  | 
      
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             em representação do Governo Neerlandês, por M. Bulterman, A. Hanje e J. Langer, na qualidade de agentes,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,  | 
      
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             –  | 
         
             em representação da Comissão Europeia, por L. Armati, S. Delaude e E. Schmidt, na qualidade de agentes,  | 
      
ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 8 de maio de 2025,
profere o presente
Acórdão
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             1  | 
         
             O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação, por um lado, do artigo 56.o TFUE e, por outro, dos artigos 2.o, alínea n), 3.o, alíneas d) e e), 4.o, n.o 1, alínea a), e artigo 7.o da Diretiva 2011/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços (JO 2011, L 88, p. 45), da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspetos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno («Diretiva sobre comércio eletrónico») (JO 2000, L 178, p. 1), e do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2005/36/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro de 2005, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais (JO 2005, L 255, p. 22).  | 
      
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             2  | 
         
             Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe UJ, médica dentista, à Österreichische Zahnärztekammer (Ordem dos Médicos Dentistas da Áustria) a respeito do pedido de medidas provisórias apresentado por esta última para que UJ seja provisoriamente intimada a deixar de participar direta ou indiretamente em atividades de medicina dentária exercidas na Áustria por sociedades estrangeiras que não disponham das autorizações previstas pelo direito austríaco.  | 
      
Quadro jurídico
Direito da União
Diretivas 98/34 e (UE) 2015/1535
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             3  | 
         
             A Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO 1998, L 204, p. 37), conforme alterada pelo Regulamento (UE) n.o 1025/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012 (JO 2012, L 316, p. 12) (a seguir «Diretiva 98/34»), foi revogada pela Diretiva (UE) 2015/1535 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015, relativa a um procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO 2015, L 241, p. 1), que entrou em vigor em 7 de outubro de 2015.  | 
      
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             4  | 
         
             O artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2015/1535 prevê: «Para efeitos da presente diretiva, aplicam‑se as seguintes definições: […] 
 […]»  | 
      
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             5  | 
         
             Nos termos do artigo 10.o, segundo parágrafo, desta diretiva: «As remissões para a diretiva revogada entendem‑se como sendo feitas para a presente diretiva e devem ler‑se nos termos da tabela de correspondência que consta do anexo IV.»  | 
      
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             6  | 
         
             Resulta desta tabela, por um lado, que o artigo 1.o, n.o 1, alínea b), primeiro parágrafo, da Diretiva 2015/1535 corresponde ao artigo 1.o, primeiro parágrafo, ponto 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/34 e, por outro lado, que o anexo I da Diretiva 2015/1535 corresponde ao anexo V da Diretiva 98/34.  | 
      
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             7  | 
         
             O anexo I da Diretiva 2015/1535 tem por título «Lista indicativa de serviços não abrangidos pelo artigo 1.o, n.o 1, alínea b), segundo parágrafo».  | 
      
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             8  | 
         
             O ponto 1 deste anexo I, sob a epígrafe «Serviços que não são prestados “à distância”», menciona: «Serviços prestados na presença física do prestador e do destinatário, mesmo que impliquem a utilização de dispositivos eletrónicos: 
 […]»  | 
      
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             9  | 
         
             O ponto 2 do referido anexo I, sob a epígrafe «Serviços que não são fornecidos “por via eletrónica”», menciona: «[…] 
 […] d) consulta de um médico por telefone/telecópia; […]»  | 
      
Diretiva 2000/31
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             10  | 
         
             O considerando 18 da Diretiva 2000/31 enuncia: «Os serviços da sociedade da informação abrangem uma grande diversidade de atividades económicas. Tais atividades podem, nomeadamente, consistir na venda de mercadorias em linha. Não são abrangidas atividades como a entrega de mercadorias enquanto tal ou a prestação de serviços fora de linha. Os serviços da sociedade da informação não dão apenas a possibilidade de celebrar contratos em linha, mas também, tratando‑se de uma atividade económica, serviços que não são remunerados pelo respetivo destinatário, como os que consistem em prestar informações em linha ou comunicações comerciais, ou ainda os que fornecem ferramentas de pesquisa, acesso e descarregamento de dados. Os serviços da sociedade da informação abrangem igualmente a transmissão de informação por meio de uma rede de comunicações, de fornecimento de acesso a uma rede de comunicações ou de armazenagem de informações prestadas por um destinatário do serviço. […] A utilização do correio eletrónico ou de comunicações comerciais equivalentes, por exemplo, por parte de pessoas singulares agindo fora da sua atividade comercial, empresarial ou profissional, incluindo a sua utilização para celebrar contratos entre essas pessoas, não são serviços da sociedade da informação. A relação contratual entre um assalariado e a sua entidade patronal não é um serviço da sociedade da informação. As atividades que, pela sua própria natureza, não podem ser exercidas à distância e por meios eletrónicos, tais como a revisão oficial de contas de sociedades, ou o aconselhamento médico, que exija o exame físico do doente, não são serviços da sociedade da informação.»  | 
      
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             11  | 
         
             O artigo 2.o desta Diretiva, com o título «Definições», dispõe: «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por: 
 […] 
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             12  | 
         
             O artigo 3.o desta diretiva, sob a epígrafe «Mercado interno», prevê, no seu n.o 1: «Cada Estado‑Membro assegurará que os serviços da sociedade da informação prestados por um prestador estabelecido no seu território cumpram as disposições nacionais aplicáveis nesse Estado‑Membro que se integrem no domínio coordenado.»  | 
      
Diretiva 2005/36
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             13  | 
         
             Os considerandos 4 e 5 da Diretiva 2005/36 enunciam: 
 
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             14  | 
         
             O artigo 2.o desta diretiva, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê, no seu n.o 1: «A presente diretiva é aplicável a qualquer nacional de um Estado‑Membro que pretenda exercer uma profissão regulamentada, incluindo as profissões liberais, por conta própria ou por conta de outrem, num Estado‑Membro diferente daquele em que adquiriu as suas qualificações profissionais.»  | 
      
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             15  | 
         
             O artigo 5.o desta diretiva, sob a epígrafe «Princípio da livre prestação de serviços», prevê, nos seus n.os 2 e 3: «2. As disposições do presente título apenas serão aplicáveis quando o prestador de serviços se deslocar ao território do Estado‑Membro de acolhimento para exercer, de forma temporária e ocasional, a profissão referida no n.o 1. O carácter temporário e ocasional da prestação será avaliado caso a caso, nomeadamente em função da respetiva duração, frequência, periodicidade e continuidade. 3. Em caso de deslocação, o prestador de serviços ficará sujeito às normas de conduta de carácter profissional, legal ou administrativo diretamente relacionadas com as qualificações profissionais, designadamente as que dizem respeito à definição das profissões, ao uso de títulos, ou aos erros profissionais graves direta e especificamente relacionados com a defesa e segurança do consumidor, bem como às disposições disciplinares, aplicáveis no Estado‑Membro de acolhimento aos profissionais que aí exercem a mesma profissão.»  | 
      
Diretiva 2011/24
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             16  | 
         
             O considerando 10 da Diretiva 2011/24 enuncia: «A presente diretiva tem por objetivo estabelecer regras destinadas a facilitar o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade na União, a assegurar a mobilidade dos doentes de acordo com os princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça e a promover a cooperação entre os Estados‑Membros em matéria de cuidados de saúde, respeitando simultaneamente as responsabilidades dos Estados‑Membros no que se refere à definição das prestações de segurança social no domínio da saúde e à organização e prestação de cuidados de saúde e de cuidados médicos, e de outras prestações de segurança social, em particular ligadas à doença.»  | 
      
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             17  | 
         
             Esta diretiva é composta por cinco capítulos, a saber, o capítulo I, intitulado «Disposições gerais», que contém os artigos 1.o a 3.o; o capítulo II, intitulado «Obrigações dos Estados‑Membros no que diz respeito aos cuidados de saúde transfronteiriços», que inclui os artigos 4.o a 6.o; o capítulo III, intitulado «Reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços», que inclui os artigos 7.o a 9.o; o capítulo IV, intitulado «Cooperação no domínio dos cuidados de saúde», que inclui os artigos 10.o a 15.o, e, por último, o capítulo V, intitulado «Disposições de execução e disposições finais», composto pelos artigos 16.o a 23.o  | 
      
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             18  | 
         
             O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objeto e âmbito de aplicação», prevê, nos seus n.os 1 e 2: «1. A presente diretiva estabelece regras para facilitar o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade e promove a cooperação em matéria de cuidados de saúde entre os Estados‑Membros, no pleno respeito das competências nacionais em matéria de organização e prestação de cuidados de saúde. A presente diretiva visa igualmente clarificar a sua articulação com o quadro de coordenação dos regimes de segurança social já existente [Regulamento (CE) n.o 883/2004] com vista à aplicação dos direitos dos doentes. 2. A presente diretiva aplica‑se à prestação de cuidados de saúde aos doentes, independentemente da forma como sejam organizados, prestados ou financiados.»  | 
      
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             19  | 
         
             O artigo 2.o da mesma diretiva, com a epígrafe «Articulação com outros atos da União», dispõe: «A presente diretiva é aplicável sem prejuízo do disposto: […] e) Na Diretiva [2000/31]; […] n) Na Diretiva [2005/36]; […]»  | 
      
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             20  | 
         
             O artigo 3.o da Diretiva 2011/24, que tem por epígrafe «Definições», tem a seguinte redação: «Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por: 
 […] 
 
 
 
 […]»  | 
      
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             21  | 
         
             O artigo 4.o desta diretiva, sob a epígrafe «Obrigações do Estado‑Membro de tratamento», prevê, no seu n.o 1: «Tendo em conta os princípios da universalidade, do acesso a cuidados de saúde de boa qualidade, da equidade e da solidariedade, os cuidados de saúde transfronteiriços são prestados: 
 
 
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             22  | 
         
             O artigo 7.o desta diretiva, sob a epígrafe «Princípios gerais de reembolso dos custos», dispõe, no seu n.o 7: «O Estado‑Membro de afiliação pode impor a uma pessoa segurada que solicite o reembolso dos custos de cuidados de saúde transfronteiriços, incluindo cuidados de saúde recebidos por telemedicina, as mesmas condições, critérios de elegibilidade e formalidades legais e administrativas, quer sejam estabelecidos a nível local, nacional ou regional, que imporia se esses cuidados de saúde tivessem sido prestados no seu território. Tal pode incluir uma avaliação por um profissional de saúde ou por um administrador de cuidados de saúde que preste serviços no âmbito do regime obrigatório de segurança social ou do sistema nacional de saúde do Estado‑Membro de afiliação, como o médico de clínica geral ou o médico de medicina geral ou familiar junto do qual o doente está registado, se tal for necessário para determinar individualmente o direito do doente aos cuidados de saúde. No entanto, as condições, os critérios de elegibilidade e as formalidades legais e administrativas impostos nos termos do presente número não podem ser discriminatórios nem constituir um entrave à livre circulação de doentes, serviços ou mercadorias, salvo se objetivamente justificados por requisitos de planeamento relacionados com o objetivo de garantir um acesso suficiente e permanente a uma gama equilibrada de tratamentos de elevada qualidade no Estado‑Membro em questão ou com o desejo de controlar os custos e evitar, tanto quanto possível, o desperdício de recursos financeiros, técnicos e humanos.»  | 
      
Direito austríaco
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             23  | 
         
             Resulta do pedido de decisão prejudicial que nem a EU‑Patientenmobilitätsgesetz (Lei relativa à Mobilidade dos Pacientes na União Europeia) (BGBl. I, 32/2014), que transpõe a Diretiva 2011/24, nem a Zahnärztegesetz (Lei relativa aos Médicos Dentistas) (BGBl. I. 126/2005), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «ZÄG»), contêm disposições relativas às prestações de telemedicina.  | 
      
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             24  | 
         
             De acordo com o § 3, n.o 1, da ZÄG, a profissão de médico dentista só pode ser exercida segundo as modalidades previstas nesta lei.  | 
      
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             25  | 
         
             Nos termos do § 4, n.o 2, desta lei, a profissão de médico dentista abrange qualquer atividade baseada em conhecimentos científicos no domínio da medicina dentária, incluindo os tratamentos de medicina complementar e alternativa, exercida diretamente no ser humano ou indiretamente para o ser humano.  | 
      
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             26  | 
         
             Segundo o § 4, n.o 3, dessa mesma lei, o âmbito das atividades reservadas aos médicos dentistas compreende, entre outros, o exame para detetar a presença ou a ausência de doenças e de anomalias dos dentes, o respetivo tratamento, incluindo intervenções de cosmética e de estética sobre os dentes, desde que estas careçam de um exame e de um diagnóstico de medicina dentária, bem como a prescrição de medicamentos, de remédios e de auxiliares de diagnóstico de medicina dentária.  | 
      
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             27  | 
         
             De acordo com os § 24, 25 e 26 da ZÄG, os médicos dentistas devem exercer a sua profissão pessoal e diretamente, se necessário em colaboração com outros profissionais médicos dentistas ou com outros profissionais de saúde, nomeadamente sob a forma de partilha de consultórios e equipamentos ou de consultórios de grupo. Além disso, podem, no âmbito do exercício da sua profissão, recorrer a colaboradores, desde que estes atuem de acordo com as suas instruções precisas e sob sua supervisão permanente. Um consultório de grupo pode ser explorado sob a forma jurídica de uma sociedade de responsabilidade limitada, com a condição, nomeadamente, de todos os sócios serem membros da profissão de médico dentista habilitados a exercer essa profissão de modo independente.  | 
      
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             28  | 
         
             O § 31 desta lei diz respeito à livre prestação de serviços e tem a seguinte redação: «(1) Os nacionais de um Estado‑Membro do Espaço Económico Europeu (EEE) ou da Confederação Suíça que exerçam legalmente a profissão de médico dentista num dos outros Estados‑Membros do EEE ou na Suíça podem, no âmbito da livre prestação de serviços, exercer temporariamente, a partir do seu domicílio profissional ou do seu local de trabalho no estrangeiro, a atividade de medicina dentária na Áustria sem estarem inscritos na lista de médicos dentistas. (2) Antes de prestar, pela primeira vez, um serviço de medicina dentária na Áustria que exija uma permanência temporária no território federal, o prestador de serviços deve disso informar por escrito a Ordem dos Médicos Dentistas austríaca através da Ordem dos Médicos Dentistas do Land onde o serviço será prestado, juntando os seguintes documentos: […]»  | 
      
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             29  | 
         
             Resulta da decisão de reenvio que órgãos jurisdicionais nacionais já declararam, em processos de direito da concorrência, que o § 31 da ZÄG visa unicamente pessoas singulares autorizadas a exercer a profissão e não sociedades de responsabilidade limitada, sobretudo quando a estrutura das respetivas participações sociais não está em conformidade com o § 26 da ZÄG.  | 
      
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
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             30  | 
         
             A Ordem dos Médicos Dentistas austríaca é um organismo de direito público com sede em Viena (Áustria) e que tem por missão, segundo a legislação nacional, defender os interesses dos médicos dentistas e dos dentistas austríacos.  | 
      
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             31  | 
         
             UJ é uma médica dentista estabelecida na Áustria e habilitada, no território deste Estado‑Membro, a tratar pacientes no âmbito de um contrato de cuidados de saúde celebrado com esses pacientes.  | 
      
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             32  | 
         
             A Urban Technology GmbH e a DZK Deutsche Zahnklinik GmbH estão estabelecidas na Alemanha e fazem parte de um grupo empresarial com atividade na medicina dentária, presente em todo o mundo.  | 
      
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             33  | 
         
             A Urban Technology tem por objeto social «a prestação de serviços no domínio dos produtos lifestyle para consumidores finais». Promove, através do seu sítio Internet, alinhadores dentários invisíveis constituídos por goteiras orais transparentes comercializadas sob a marca DrSmile. A partir desse sítio Internet, os potenciais clientes podem solicitar a marcação de uma consulta com um «médico dentista parceiro» na Áustria, tal como UJ, estabelecido no local por si escolhido. No dia da consulta, esse médico dentista parceiro realiza, no seu consultório, uma anamnese, uma consulta de esclarecimento e um scanner 3D do maxilar, bem como os cuidados preliminares que sejam eventualmente necessários para a futura instalação de goteiras dentárias. O referido médico dentista parceiro transmite em seguida à DZK Deutsche Zahnklinik o conteúdo de imagem e uma recomendação relativa ao plano do alinhamento dentário.  | 
      
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             34  | 
         
             A DZK Deutsche Zahnklinik, cujos sócios não são médicos dentistas, dispõe de uma permissão e das outras autorizações necessárias para explorar na Alemanha um centro de cuidados de medicina dentária, denominado «clínica dentária», na qual médicos dentistas tratam pacientes, em conformidade com o direito alemão aplicável a este tipo de estabelecimento.  | 
      
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             35  | 
         
             Só a DZK Deutsche Zahnklinik celebra com os pacientes um contrato de cuidados de saúde que inclui todas as prestações relativas à colocação do alinhador dentário da marca DrSmile. A DZK Deutsche Zahnklinik adquire as goteiras dentárias à Urban Technology, que, por sua vez, as encomenda junto de terceiros. O acompanhamento subsequente é assegurado através de uma aplicação da DZK Deutsche Zahnklinik, para a qual os pacientes enviam regularmente imagens da sua dentição. A DZK Deutsche Zahnklinik tem uma relação contratual com o médico dentista parceiro e paga‑lhe uma remuneração pelos serviços prestados no âmbito do tratamento em causa.  | 
      
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             36  | 
         
             A Ordem dos Médicos Dentistas intentou, no Landesgericht Klagenfurt (Tribunal Regional de Klagenfurt, Áustria), uma ação inibitória contra UJ, com um pedido de providência cautelar. Esta visava proibir UJ, através de uma injunção provisória até ao transito em julgado da decisão a proferir na ação principal, de participar, direta ou indiretamente, em quaisquer atividades de medicina dentária exercidas na Áustria por sociedades estrangeiras que não disponham das autorizações previstas pelo direito austríaco, como por exemplo na realização de moldes dentários em caso de má posição dentária, ainda que realizados digitalmente por meio de um scanner intraoral, por conta das referidas sociedades.  | 
      
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             37  | 
         
             UJ alegou que a DZK Deutsche Zahnklinik é um estabelecimento de cuidados dentários privado reconhecido na Alemanha, cujas atividades tanto de telemedicina como de repartição do trabalho no âmbito do tratamento ortodôntico em causa são lícitas. Além disso, acrescenta que UJ exerce a sua atividade de forma direta, pessoal e independente de quaisquer instruções.  | 
      
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             38  | 
         
             O Landesgericht Klagenfurt (Tribunal Regional de Klagenfurt) indeferiu o pedido de providência cautelar. Considerou, primeiro, que UJ não participa em atividades de medicina dentária exercidas pela Urban Technology e pela DZK Deutsche Zahnklinik; segundo, que existem dois contratos de prestação de cuidados de saúde que devem ser considerados separadamente; terceiro, que, por essa razão, UJ não deve ser qualificada como colaboradora auxiliar e, quarto, que UJ também não participa, no território nacional, em atividades de medicina dentária levadas a cabo por pessoa estrangeira.  | 
      
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             39  | 
         
             Chamado a pronunciar‑se em sede de recurso, o Oberlandesgericht Graz (Tribunal Regional Superior de Graz, Áustria) deferiu, no essencial, o pedido de providência cautelar. Considerou, nomeadamente, que primeiro UJ atuava como colaboradora auxiliar da DZK no âmbito dos contratos de prestação de cuidados de saúde celebrados entre esta e os doentes; segundo, que a DZK não estava habilitada a prestar cuidados de medicina dentária na Áustria; terceiro, que os cuidados de saúde prestados pela DZK na Áustria, por intermédio de UJ, enquanto colaboradora auxiliar, eram realizados diretamente e sem recurso a tecnologias da informação e da comunicação; quarto, que UJ participa por isso em atividades de medicina dentária exercidas no território nacional por uma sociedade estrangeira que não está habilitada a exercer a profissão de médico dentista nos termos da ZÄG e que não dispõe de autorização de exploração nos termos da legislação austríaca aplicável aos estabelecimentos de prestação de cuidados de saúde; quinto, que, por conseguinte, UJ, por um lado, violou as disposições relativas à colaboração previstas no § 24 da ZÄG e, por outro lado, participou, enquanto colaboradora auxiliar, numa infração cometida por uma sociedade estrangeira à reserva de atividade profissional prevista no § 3 e no § 4 n.o 3, da ZÄG.  | 
      
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             40  | 
         
             O Oberster Gerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça, Áustria), que é o órgão jurisdicional de reenvio, é chamado a pronunciar‑se sobre um recurso interposto por UJ da decisão do Oberlandesgericht Graz (Tribunal Regional Superior de Graz).  | 
      
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             41  | 
         
             Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se UJ participa realmente em atividades de medicina dentária exercidas na Áustria por sociedades estrangeiras.  | 
      
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             42  | 
         
             O Oberster Gerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça) salienta que existe um contrato de cuidados de saúde único que vincula o paciente e a DZK Deutsche Zahnklinik, pelo que é apenas esta última que, juridicamente, presta um serviço. UJ, por seu turno, só atua no âmbito da sua relação contratual com a DZK Deutsche Zahnklinik, enquanto colaboradora auxiliar desta. Consequentemente, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre o lugar de execução da prestação dos serviços de medicina dentária em causa.  | 
      
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             43  | 
         
             Assim, o referido órgão jurisdicional pretende saber se o artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24, nos termos do qual, no caso da telemedicina, os cuidados de saúde são considerados prestados no Estado‑Membro em que o prestador dos cuidados de saúde está estabelecido, se aplica exclusivamente para efeitos de reembolso dos custos na aceção do artigo 7.o desta diretiva, ou se estabelece, para os cuidados prestados por telemedicina, um princípio geral do país de origem, ou ainda se esse princípio pode ser deduzido da Diretiva 2000/31.  | 
      
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             44  | 
         
             Em segundo lugar, para determinar se a Diretiva 2011/24 é aplicável no caso em apreço, o referido órgão jurisdicional pergunta se a menção, contida no artigo 3.o, alínea d), desta diretiva, relativa aos cuidados de saúde prestados no caso da telemedicina, se refere exclusivamente a prestações médicas específicas efetuadas, de forma transfronteiriça, através das tecnologias da informação e da comunicação ou se diz respeito a um contrato de cuidados de saúde completo que pode incluir exames físicos efetuados no Estado‑Membro de residência do paciente, e se, nesse caso, as prestações efetuadas com estas tecnologias devem ser preponderantes para que os cuidados de saúde sejam considerados como tendo sido prestados no caso da telemedicina, conforme esta disposição. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se, havendo uma conexão entre estes dois tipos de prestação, como sucede no caso em apreço, se pode considerar que se trata de um conjunto de cuidados de saúde transfronteiriços na aceção do artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24.  | 
      
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             45  | 
         
             A este propósito, o Tribunal de Justiça já considerou que um serviço de intermediação pode ser qualificado de «serviço da sociedade da informação», mas que deve ser diferente se se verificar que esse serviço de intermediação faz parte integrante de um serviço global cujo elemento principal é um serviço abrangido por outra qualificação jurídica (Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Airbnb Ireland, C‑390/18, EU:C:2019:1112, n.o 50).  | 
      
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             46  | 
         
             Em terceiro lugar, esse órgão jurisdicional questiona‑se sobre o direito aplicável à telemedicina. A este respeito, pode ser pertinente a articulação entre, por um lado, o artigo 2.o, alínea n), o artigo 3.o, alínea d), e o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2011/24, e, por outro lado, o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2005/36, nos termos do qual, em caso de «deslocação» do prestador de serviços para outro Estado‑Membro, este fica sujeito às normas de conduta de caráter profissional, legal ou administrativo aplicáveis no Estado‑Membro de acolhimento. É, também, pertinente a articulação entre a Diretiva 2000/31, nomeadamente o seu artigo 2.o, alínea h), ii), e o seu considerando 18, a Diretiva 2005/36, nomeadamente o seu artigo 5.o e o seu considerando 4, e a Diretiva 2011/24, nomeadamente o seu artigo 2.o, alínea n), o seu artigo 3.o, alínea d), e o seu artigo 4.o, n.o 1, alínea a).  | 
      
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             47  | 
         
             Com efeito, o Tribunal de Justiça já declarou, noutro contexto, que a colaboração comercial em matéria fiscal, prestada de modo transfronteiriço, sem que as pessoas que atuam se desloquem a outro Estado‑Membro, não está abrangida pelo artigo 5.o da Diretiva 2005/36, uma vez que este apenas é aplicável quando o prestador de serviços se desloca para o território do Estado‑Membro de acolhimento (Acórdão de 17 de dezembro de 2015, X‑Steuerberatungsgesellschaft, C‑342/14, EU:C:2015:827, n.os 34 e 35).  | 
      
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             48  | 
         
             Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, no que respeita aos cuidados de saúde, para proteger o paciente, pode ser necessário respeitar as regras profissionais do Estado de residência deste último.  | 
      
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             49  | 
         
             Em quarto lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, caso se deva considerar que as prestações de medicina dentária efetuadas por UJ são fornecidas na Áustria, se UJ, uma vez que não atua com base num contrato de cuidados de saúde próprio mas apenas na qualidade de colaborador auxiliar da DZK Deutsche Zahnklinik, viola a legislação austríaca que rege a profissão dos médicos dentistas. Com efeito, a DZK Deutsche Zahnklinik, ainda que reconhecida na Alemanha como clínica dentária, não dispõe, na Áustria, de uma autorização de exploração ao abrigo do direito aplicável aos estabelecimentos de saúde nem de uma habilitação ao abrigo da ZÄG. Além disso, a sua estrutura acionista é contrária às disposições desta lei.  | 
      
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             50  | 
         
             Este órgão jurisdicional tem dúvidas de que as disposições da ZÄG, cuja previsão se refere principalmente ao exercício direto e pessoal da profissão e à livre prestação de serviços apenas «a título temporário» para os «nacionais do EEE», estejam em conformidade com a livre prestação de serviços prevista nos artigos 56.o TFUE e seguintes, em particular na situação em causa no processo principal. O referido órgão jurisdicional sublinha, a este respeito, que o médico dentista estrangeiro presta os seus serviços, de forma permanente, no âmbito de um contrato de cuidados de saúde único, em parte no estrangeiro, com o auxílio das tecnologias da informação e da comunicação, e em parte no território nacional, recorrendo, como colaborador auxiliar, a um médico dentista habilitado a exercer essa profissão na Áustria.  | 
      
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             51  | 
         
             No que respeita à DZK Deutsche Zahnklinik, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se a aplicação das disposições relativas aos consultórios de grupo que figuram no § 26 da ZÄG, segundo as quais os sócios só podem ser médicos dentistas, é também contrária à livre prestação de serviços. Refere‑se, sobre isto, à jurisprudência segundo a qual é permitido aos Estados‑Membros restringir a livre prestação de serviços médicos e hospitalares, na medida em que a manutenção da capacidade de tratamento ou de uma especialidade médica no território nacional seja essencial para a saúde pública, ou mesmo para a sobrevivência, da sua população (Acórdãos de 28 de abril de 1998, Kohll, C‑158/96, EU:C:1998:171, n.o 51, e de 13 de maio de 2003, Müller‑Fauré e van Riet, C‑385/99, EU:C:2003:270, n.o 67). Segundo este tribunal, as pessoas singulares não garantem necessariamente um nível mais elevado de competência médica do que as pessoas coletivas.  | 
      
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             52  | 
         
             Tendo em conta o exposto, o Oberster Gerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais: 
 
 
 
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Quanto às questões prejudiciais
Quanto à admissibilidade das questões prejudiciais
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             53  | 
         
             A República da Áustria e a Ordem dos Médicos Dentistas austríaca alegam que as questões prejudiciais são inadmissíveis.  | 
      
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             54  | 
         
             Antes de mais, a primeira, a segunda e a terceira questões seriam hipotéticas dado que assentam na premissa errada de que o tratamento dentário em causa no processo principal pode ser qualificado como telemedicina. Na realidade, a telemedicina implica a prestação à distância de um serviço de saúde. No caso em apreço, a parte essencial do tratamento médico é realizada pelo médico dentista parceiro, na presença do paciente. Por conseguinte, não existindo, no caso em apreço, nenhum ato de telemedicina, as Diretivas 2011/24, 2000/31 e 2005/36 não são aplicáveis.  | 
      
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             55  | 
         
             Em seguida, a terceira questão é também hipotética devido à circunstância de a Diretiva 2005/36 não se aplicar a pessoas coletivas, como é o caso da DZK Deutsche Zahnklinik.  | 
      
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             56  | 
         
             Por último, a quarta questão não responde às exigências de clareza e precisão previstas no artigo 94.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.  | 
      
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             57  | 
         
             A este respeito, bastará notar, por um lado, que, quando, como no presente processo, não seja manifesto que a interpretação de uma disposição do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, a objeção relativa à inaplicabilidade dessa disposição ao processo principal não diz respeito à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial, mas enquadra‑se no mérito das questões (v., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2025, Elektrorazdelitelni mrezhi Zapad,C‑310/24, EU:C:2025:406, n.o 46 e jurisprudência referida).  | 
      
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             58  | 
         
             Por outro lado, resulta claramente do pedido de decisão prejudicial que a quarta questão, relativa à interpretação do artigo 56.o TFUE, está relacionada com a circunstância de o órgão jurisdicional de reenvio não excluir a possibilidade de as Diretivas 2011/24, 2000/31 e 2005/36 não serem aplicáveis no caso em apreço. Assim, segundo este órgão jurisdicional, pode considerar‑se que a DZK Deutsche Zahnklinik presta serviços de saúde transfronteiriços, suscetíveis de serem abrangidos pelo âmbito de aplicação deste artigo.  | 
      
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             59  | 
         
             Daqui resulta que as questões prejudiciais são admissíveis.  | 
      
Quanto à segunda questão
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             60  | 
         
             Com a sua segunda questão, que importa tratar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de cuidados de saúde transfronteiriços prestados no caso da telemedicina, na aceção desta disposição, corresponde apenas aos cuidados de saúde prestados a um paciente por um prestador de cuidados de saúde estabelecido num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação desse paciente, à distância e, portanto, sem a presença física simultânea no mesmo local do referido paciente e desse prestador, exclusivamente através das tecnologias da informação e da comunicação, ou se este conceito pode corresponder a um tratamento médico complexo, que inclui, além dos cuidados de saúde prestados à distância através dessas tecnologias, cuidados de saúde prestados no Estado‑Membro de afiliação por outro prestador, estabelecido nesse Estado, na presença física do paciente. Neste segundo caso, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a parte dos cuidados de saúde realizada através das referidas tecnologias deve ser preponderante e, sendo caso disso, com base em que critérios essa preponderância deve ser apreciada.  | 
      
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             61  | 
         
             Há que salientar antes de mais que, por um lado, o artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24 se limita a prever que o Estado‑Membro de tratamento é definido como o Estado‑Membro em cujo território os cuidados de saúde são efetivamente prestados ao doente e que, no caso da telemedicina, os cuidados de saúde são considerados prestados no Estado‑Membro em que o prestador de cuidados de saúde se encontra estabelecido. Por outro lado, segundo o artigo 3.o, alínea e), desta diretiva, os cuidados de saúde transfronteiriços são cuidados de saúde prestados ou prescritos num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação.  | 
      
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             62  | 
         
             Uma vez que nem este artigo 3.o, alíneas d) e e), nem nenhuma outra disposição da referida diretiva define o termo «telemedicina» e não contém nenhuma remissão para o direito dos Estados‑Membros no que respeita a essa definição, este termo constitui um conceito autónomo do direito da União. Assim, deve ser interpretado em conformidade com o seu sentido habitual na linguagem comum, tendo em conta o contexto em que é utilizado e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (Acórdão de 30 de abril de 2025, Galte, C‑63/24, EU:C:2025:292, n.o 29 e jurisprudência referida). Além disso, a génese de uma disposição do direito da União pode igualmente revestir elementos pertinentes para a sua interpretação (Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o., C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 47 e jurisprudência referida).  | 
      
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             63  | 
         
             Quanto à interpretação literal, o sentido habitual do termo «telemedicina», pela sua própria etimologia, faz referência a serviços de medicina que são prestados à distância, remetendo o prefixo «tele» precisamente para a ideia de distância. Do mesmo modo, como resulta da redação do artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24, para que um cuidado de saúde prestado no caso da telemedicina seja abrangido pelo conceito de cuidados de saúde transfronteiriços, é necessário que seja prestado ou prescrito num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação.  | 
      
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             64  | 
         
             No que respeita à interpretação contextual, importa salientar, primeiro, que o artigo 3.o, alínea d), primeiro período, da Diretiva 2011/24 prevê a regra geral aplicável, em princípio, a todos os cuidados de saúde, a saber, que o Estado‑Membro de tratamento é aquele em cujo território os cuidados de saúde são efetivamente prestados. O segundo período deste artigo 3.o, alínea d), segundo o qual, no caso da telemedicina, os cuidados de saúde são considerados prestados no Estado‑Membro onde o prestador de cuidados de saúde está estabelecido, institui assim uma exceção a esta regra geral.  | 
      
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             65  | 
         
             Ora, segundo jurisprudência constante, as exceções são de interpretação estrita para que as regras gerais não sejam esvaziadas da sua substância [Acórdão de 30 de abril de 2025, Generalstaatsanwaltschaft Frankfurt am Main (Exportação de dinheiro líquido na Rússia),C‑246/24, EU:C:2025:295, n.o 27 e jurisprudência referida].  | 
      
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             66  | 
         
             Daqui resulta que este segundo período não pode ser interpretado no sentido de que cuidados de saúde diferentes dos que estão abrangidos pela telemedicina podem beneficiar desta exceção. Por conseguinte, o Estado‑Membro de tratamento para cuidados diferentes dos da telemedicina deve ser determinado com base no território onde esses cuidados são efetivamente prestados.  | 
      
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             67  | 
         
             Segundo, o artigo 3.o, alínea a), da Diretiva 2011/24 define o conceito de «cuidados de saúde» como os serviços de saúde prestados por profissionais de saúde aos doentes com o objetivo de avaliar, manter ou reabilitar o seu estado de saúde, incluindo a prescrição, a dispensa e o fornecimento de medicamentos e dispositivos médicos.  | 
      
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             68  | 
         
             Assim, o conceito de cuidados de saúde é suscetível de abranger uma ampla variedade de serviços de saúde. Embora esses serviços contribuam, em princípio, para a mesma finalidade terapêutica, cada um deles pode ser prestado por profissionais diferentes ou para fins específicos no âmbito do mesmo cuidado de saúde, uma vez que este constitui um tratamento médico complexo. Se necessário, alguns desses serviços podem ser prestados ou prescritos num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação.  | 
      
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             69  | 
         
             Por conseguinte, um serviço de saúde prestado no âmbito da telemedicina pode ser abrangido por um tratamento de saúde transfronteiriço, na aceção do artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24, ainda que, em razão das modalidades de prestação próprias desse serviço, este esteja sujeito a regras específicas, nomeadamente no que respeita à determinação do direito aplicável à sua prestação. Estas regras podem ser diferentes das aplicáveis a outros serviços de saúde incluídos no âmbito do mesmo tratamento médico complexo.  | 
      
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             70  | 
         
             Terceiro, há que recordar que o artigo 7.o, n.o 7, da Diretiva 2011/24 prevê que o Estado‑Membro de afiliação pode impor a uma pessoa segurada que solicite o reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços, «incluindo os cuidados de saúde recebidos por telemedicina», as mesmas condições que as estabelecidas para os cuidados prestados nesse Estado. Como, em substância, o advogado‑geral sublinhou no n.o 56 das suas conclusões, a expressão «incluindo» implica claramente que os cuidados de saúde prestados ou prescritos através da telemedicina podem ser abrangidos pelos «cuidados de saúde transfronteiriços», definidos no artigo 3.o, alínea e), desta diretiva.  | 
      
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             71  | 
         
             Quarto, como a Comissão salientou nas suas observações escritas, o artigo 2.o da Diretiva 2000/31, lido em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2015/1535, define o «serviço da sociedade da informação» como «qualquer serviço prestado normalmente mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e mediante pedido individual de um destinatário de serviços». É «à distância»«um serviço prestado sem que as partes estejam simultaneamente presentes».  | 
      
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             72  | 
         
             Importa sublinhar que o anexo I da Diretiva 2015/1535, relativo à «lista indicativa de serviços não abrangidos pelo artigo 1.o, n.o 1, alínea b), segundo parágrafo», indica no ponto 1 como «serviços não prestados “à distância”», os «[s] erviços prestados na presença física do prestador e do destinatário, mesmo que impliquem a utilização de dispositivos eletrónicos», nomeadamente, um «exame ou tratamento num consultório médico por meio de equipamentos eletrónicos mas na presença física do paciente». Da mesma forma, o considerando 18 da Diretiva 2000/31 indica que «[a]s atividades que, pela sua própria natureza, não podem ser exercidas à distância e por meios eletrónicos, tais como […] o aconselhamento médico, que exija o exame físico do doente, não são serviços da sociedade da informação».  | 
      
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             73  | 
         
             Assim, os serviços de saúde transfronteiriços prestados por um prestador a um paciente, simultaneamente presentes no mesmo local, ainda que impliquem a utilização de tecnologias da informação e da comunicação, não podem ser considerados serviços da sociedade da informação e da comunicação e não podem, portanto, ser abrangidos pelo conceito de telemedicina na aceção do artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24.  | 
      
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             74  | 
         
             Em contrapartida, os serviços de saúde que são efetivamente prestados à distância, ou seja, fora da situação de presença física simultânea do prestador e do paciente no mesmo local, através destas tecnologias são suscetíveis de ser abrangidos pelo conceito de serviço da sociedade da informação e, portanto, pelo de «telemedicina», mesmo quando são prestados no âmbito de um tratamento médico complexo que inclui também cuidados de saúde prestados por um prestador que se encontra fisicamente no mesmo local que o paciente.  | 
      
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             75  | 
         
             Esta análise não é posta em causa pela jurisprudência referida pelo órgão jurisdicional de reenvio e recordada no n.o 45 do presente acórdão.  | 
      
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             76  | 
         
             Com efeito, resulta desta jurisprudência que um serviço que tenha por objeto estabelecer relações entre clientes e prestadores de outro serviço de natureza diferente e que preencha todas as condições previstas no artigo 1.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2015/1535, deve ser qualificado de «serviço da sociedade da informação» quando esse serviço é um serviço distinto do serviço de natureza diferente fornecido por esses prestadores. Por outro lado, a situação deve ser diferente se se verificar que esse serviço de intermediação faz parte integrante de um serviço global cujo elemento principal tem uma qualificação jurídica diferente da de «serviço da sociedade da informação» (v., neste sentido, Acórdão de 29 de fevereiro de 2024, Doctipharma, C‑606/21, EU:C:2024:179, n.o 35 e jurisprudência referida).  | 
      
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             77  | 
         
             Esta jurisprudência respeita a serviços prestados através de plataformas em linha que estão necessariamente ligados a outros serviços com os quais, em função do seu grau de integração, são suscetíveis de constituir um serviço global único.  | 
      
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             78  | 
         
             Em contrapartida, cada cuidado de saúde, incluindo o que, em associação com outros, compõe um tratamento médico complexo, é autónomo, uma vez que exige competências profissionais específicas e responde a exigências técnicas que lhe são próprias.  | 
      
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             79  | 
         
             No caso em apreço, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que o tratamento ortodôntico da marca DrSmile é de natureza complexa. Com efeito, compreende vários cuidados de saúde, que, embora partilhando a mesma finalidade terapêutica, não estão integrados a ponto de constituir um serviço global único.  | 
      
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             80  | 
         
             Com efeito, embora a DZK Deutsche Zahnklinik preste os cuidados de saúde de telemedicina previstos nesse tratamento, UJ, na qualidade de médico dentista parceiro, procede, no seu próprio consultório, a uma anamnese, a uma consulta de esclarecimento e a um scanner 3D do maxilar, bem como aos cuidados preliminares eventualmente necessários à futura instalação das goteiras dentárias. Independentemente de qualquer apreciação da eventual preponderância dos cuidados de saúde prestados por UJ ou pela DZK Deutsche Zahnklinik, verifica‑se que UJ presta cuidados de saúde de forma autónoma, a pedido do paciente, no âmbito do exercício da sua profissão de médica dentista na Áustria e regista o resultado da sua atividade numa recomendação dirigida à DZK Deutsche Zahnklinik relativa ao procedimento de alinhamento dentário. É certo que a atividade de UJ faz parte do tratamento ortodôntico da marca DrSmile. Todavia, esta atividade não se confunde com este tratamento, cuja realização completa requer também a prestação, igualmente autónoma, de outros cuidados de saúde de telemedicina pela DZK Deutsche Zahnklinik, no âmbito de uma repartição do trabalho regida pelas relações contratuais entre esta e UJ.  | 
      
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             81  | 
         
             Estas considerações são corroboradas pelo Acórdão de 2 de dezembro de 2010, Ker‑Optika (C‑108/09, EU:C:2010:725, n.os 32 a 40), no qual o Tribunal de Justiça procedeu precisamente a uma análise da prestação de um serviço de saúde complexo constituído pela venda por Internet e pela entrega de lentes de contacto, precedida de uma consulta médica. Nessa ocasião, o Tribunal de Justiça estabeleceu uma distinção entre a venda por Internet e a entrega de lentes de contacto, e considerou que a Diretiva 2000/31 era aplicável apenas à venda e não à entrega. Além disso, precisou que esta diretiva não se aplica, de acordo com o seu considerando 18, ao aconselhamento médico que exija um exame físico do doente, o qual não pode ser considerado um serviço da sociedade da informação.  | 
      
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             82  | 
         
             No que respeita à interpretação teleológica, há que recordar que a Diretiva 2011/24, em conformidade com o seu artigo 1.o, n.o 1, primeiro período, lido à luz do seu considerando 10, visa, nomeadamente, facilitar o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade e incentiva a cooperação em matéria de cuidados de saúde entre os Estados‑Membros, no pleno respeito das competências nacionais em matéria de organização e prestação de cuidados de saúde.  | 
      
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             83  | 
         
             Ora, a telemedicina é precisamente uma prática médica, neste caso transfronteiriça, que permite facilitar o acesso a cuidados de saúde, prestados num Estado‑Membro onde o prestador desses cuidados está estabelecido, diferente do Estado‑Membro de afiliação onde residem os pacientes de que são destinatários.  | 
      
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             84  | 
         
             É, por conseguinte, em razão da natureza e especificidades desta prática médica, tendo em conta o caráter transfronteiriço dos cuidados de saúde, a prestação à distância, ou seja, sem a presença simultânea do profissional de saúde e do paciente no mesmo local, bem como o recurso às tecnologias da informação e da comunicação, que o legislador da União previu uma regulamentação derrogatória no que respeita à determinação do Estado‑Membro de tratamento e ao direito aplicável a essa prática médica.  | 
      
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             85  | 
         
             Não só essa regulamentação derrogatória não se justifica para a prestação de cuidados de saúde que requerem a presença física simultânea do prestador e do paciente, como pode colidir com o objetivo da Diretiva 2011/24, mencionado no n.o 82 do presente acórdão, e com o artigo 168.o TFUE, que, em conjunto com o artigo 114.o TFUE, constitui a base jurídica desta diretiva. Importa recordar, a este respeito, que o artigo 168.o, n.os 1 e 7, TFUE, fixa o objetivo geral de manter um elevado nível de proteção da saúde, prevendo simultaneamente o necessário respeito pela responsabilidade dos Estados‑Membros na definição das respetivas políticas de saúde pública, bem como na organização e prestação de serviços e de cuidados de saúde.  | 
      
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             86  | 
         
             Como a Comissão salienta com razão, aplicar à atividade de um médico que exerce no Estado‑Membro onde está estabelecido, em relação aos exames físicos dos seus pacientes, as regras de segurança, higiene e responsabilidade de outro Estado‑Membro pela simples razão de o tratamento médico complexo, do qual essa atividade faz parte, incluir também cuidados de saúde prestados, através da telemedicina, por outros médicos estabelecidos noutros Estados‑Membros viola a competência do Estado‑Membro de tratamento para organizar os seus cuidados de saúde e expõe os médicos e os pacientes a uma insegurança jurídica.  | 
      
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             87  | 
         
             Quanto à génese do artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24, importa recordar, antes de mais, que a Comunicação da Comissão, de 4 de novembro de 2008, ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre os benefícios da telemedicina para os doentes, os sistemas de saúde e a sociedade [COM (2008) 689 final], define a «telemedicina» como «a prestação de serviços de saúde através da utilização das tecnologias da informação e das comunicações em situações em que o profissional de saúde e o doente (ou dois profissionais de saúde) não se encontrem no mesmo local. A telemedicina compreende a transmissão segura de informações e dados médicos, necessários para a prevenção, diagnóstico, tratamento e seguimento dos doentes, por meio de texto, som, imagens ou outras vias».  | 
      
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             88  | 
         
             Em seguida, como o advogado‑geral salientou no n.o 53 das suas conclusões, esta comunicação é relevante para apreciar o significado do termo «telemedicina» que a Comissão utilizou na Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à aplicação dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços, de 2 de julho de 2008 [COM(2008) 414 final], que evoca a referida comunicação. Nesta proposta, a Comissão indicou que um dos modos de prestação de «cuidados de saúde transfronteiriços» é «de cuidados de saúde transfronteiriços (ou seja, prestação de serviços a partir do território de um Estado‑Membro para o território de outro Estado‑Membro), nomeadamente serviços de telemedicina, de diagnóstico e prescrição à distância, e laboratoriais». Segundo a referida proposta, este modo de prestação distinguia‑se dos outros três modos de prestação de cuidados de saúde transfronteiriços, a saber, a utilização de cuidados de saúde noutro país, a presença permanente de um prestador de cuidados de saúde noutro Estado‑Membro e a presença temporária do prestador no Estado‑Membro do paciente para prestar os seus serviços.  | 
      
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             89  | 
         
             Por último, como o advogado‑geral salientou no n.o 54 das suas conclusões, esta compreensão da «telemedicina» não foi objeto de contestação ao longo de todo o processo legislativo.  | 
      
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             90  | 
         
             Daqui resulta que, no âmbito da Diretiva 2011/24, o elemento determinante do conceito de «telemedicina», segundo a aceção deste pretendido pelo legislador da União, reside no facto de que o serviço de saúde é prestado a um paciente por um prestador de cuidados de saúde estabelecido num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação, à distância e, portanto, sem a presença física simultânea no mesmo local desse paciente e desse prestador, através das tecnologias da informação e da comunicação.  | 
      
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             91  | 
         
             Por conseguinte, está excluída deste conceito qualquer prestação de um serviço de saúde realizada num contexto de presença física simultânea no mesmo local desses intervenientes, independentemente da circunstância de essa prestação ser realizada no âmbito de um tratamento médico complexo, que inclui a prestação de serviços de saúde de natureza diferente, prestados segundo modalidades distintas.  | 
      
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             92  | 
         
             Nestas condições, a apreciação da preponderância de um ou de outro destes serviços que compõem esse tratamento é desprovida de relevância para efeitos da qualificação jurídica de cada cuidado de saúde no que respeita à determinação do Estado‑Membro de tratamento, de acordo com o artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24.  | 
      
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             93  | 
         
             Tendo em conta o que precede, há que responder à segunda questão que o artigo 3.o, alíneas d) e e), da Diretiva 2011/24 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de cuidados de saúde transfronteiriços prestados no caso da telemedicina, na aceção desta disposição, corresponde apenas aos cuidados de saúde prestados a um paciente por um prestador de cuidados de saúde estabelecido num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação desse paciente, à distância e, portanto, sem a presença física simultânea no mesmo local do referido paciente e desse prestador, exclusivamente através das tecnologias da informação e da comunicação.  | 
      
Quanto à primeira questão
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             94  | 
         
             Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, por um lado, se o artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24 deve ser interpretado no sentido de que se aplica a todos os domínios regulados por esta diretiva ou apenas ao reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços referidos no artigo 7.o da referida diretiva e, por outro lado, se esse artigo 3.o, alínea d), e o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2000/31 devem ser interpretados no sentido de que as prestações de telemedicina devem ser dispensadas em conformidade com a legislação do Estado‑Membro em que o prestador está estabelecido.  | 
      
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             95  | 
         
             Em primeiro lugar, importa salientar que, como foi referido no n.o 82 do presente acórdão, conforme o seu artigo 1.o, n.o 1, primeiro período, lido em conjugação com o seu considerando 10, a Diretiva 2011/24 visa facilitar o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade na União, garantir a mobilidade dos doentes, em conformidade com os princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça, e promover a cooperação em matéria de cuidados de saúde entre os Estados‑Membros, no pleno respeito das responsabilidades dos Estados‑Membros em matéria de definição das prestações de segurança social relacionadas com a saúde, bem como de organização e prestação de cuidados de saúde, de cuidados médicos e de prestações de segurança social, em especial por doença.  | 
      
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             96  | 
         
             Além disso, resulta da própria estrutura desta diretiva, conforme descrita no n.o 17 do presente acórdão, que esta, para satisfazer os objetivos mencionados no número anterior do presente acórdão, não se limita a estabelecer regras em matéria de reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços.  | 
      
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             97  | 
         
             É certo que o capítulo III da referida diretiva estabelece efetivamente regras nesta matéria. No entanto, o capítulo II da Diretiva 2011/24 prevê regras relativas às responsabilidades dos Estados‑Membros em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços. Fazem nomeadamente parte deste capítulo II, por um lado, o artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva, nos termos do qual os cuidados de saúde transfronteiriços devem ser prestados em conformidade com a legislação do Estado‑Membro de tratamento, com as normas e orientações em matéria de qualidade e segurança estabelecidas por esse Estado‑Membro e com a legislação da União relativa às normas de segurança, e, por outro lado, o artigo 5.o da referida diretiva, segundo o qual o Estado‑Membro de afiliação assegura que os custos dos cuidados de saúde transfronteiriços são reembolsados em conformidade com o capítulo III da mesma diretiva, e também, nomeadamente, os direitos dos doentes no que respeita ao acompanhamento médico e ao acesso ao processo médico.  | 
      
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             98  | 
         
             Do mesmo modo, o capítulo IV da Diretiva 2011/24 enuncia regras relativas à cooperação em matéria de cuidados de saúde, sendo que essas regras não se limitam à cooperação necessária para assegurar o reembolso dos custos desses cuidados.  | 
      
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             99  | 
         
             Daqui decorre que o âmbito de aplicação da Diretiva 2011/24 e, portanto, o alcance do seu artigo 3.o, alínea d), não se limitam ao reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços.  | 
      
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             100  | 
         
             Em segundo lugar, resulta da redação do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 2011/24 que, como foi recordado no n.o 97 do presente acórdão, os cuidados de saúde transfronteiriços são prestados em conformidade com a legislação do Estado‑Membro de tratamento, com as normas e orientações em matéria de qualidade e segurança estabelecidas por esse Estado‑Membro e com a legislação da União relativa às normas de segurança.  | 
      
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             101  | 
         
             Assim, além da legislação da União relativa às normas de segurança, a única legislação nacional e as únicas normas e orientações nacionais em matéria de qualidade e de segurança que a prestação de cuidados de saúde deve respeitar, no âmbito de aplicação da Diretiva 2011/24, são as do Estado‑Membro de tratamento, conforme definido no artigo 3.o, alínea d), desta diretiva.  | 
      
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             102  | 
         
             Por conseguinte, os cuidados de saúde transfronteiriços que fazem parte da telemedicina, dado que são considerados como prestados no Estado‑Membro em que o prestador desses cuidados está estabelecido, devem estar em conformidade com a legislação, as normas e as orientações em matéria de qualidade e de segurança desse Estado‑Membro, como com a legislação da União relativa às normas de segurança.  | 
      
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             103  | 
         
             Além disso, importa salientar que o artigo 2.o, alínea e), da Diretiva 2011/24 refere precisamente que esta se aplica sem prejuízo da Diretiva 2000/31. Uma vez que uma prestação de telemedicina é suscetível de corresponder ao conceito de serviço da sociedade da informação na aceção do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 2000/31, essa prestação está abrangida pelo âmbito de aplicação desta última.  | 
      
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             104  | 
         
             O artigo 3.o da Diretiva 2000/31 prevê que os serviços da sociedade da informação prestados por um prestador estabelecido num Estado‑Membro devem cumprir as disposições nacionais aplicáveis nesse Estado‑Membro que se integrem no domínio coordenado.  | 
      
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             105  | 
         
             Ora, em conformidade com o artigo 2.o, alínea h), desta diretiva, este domínio coordenado inclui as exigências relativas, nomeadamente, às habilitações ou autorizações para o acesso a uma atividade de um serviço da sociedade da informação.  | 
      
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             106  | 
         
             Por conseguinte, no que respeita à prestação de cuidados de saúde no caso da telemedicina, tanto a Diretiva 2011/24 como a Diretiva 2000/31, cada uma no respetivo âmbito de aplicação, fazem aplicar a essa prestação a legislação do Estado‑Membro em que o prestador está estabelecido.  | 
      
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             107  | 
         
             Tendo em conta as considerações expostas, há que responder à primeira questão que, por um lado, o artigo 3.o, alínea d), da Diretiva 2011/24 deve ser interpretado no sentido de que se aplica a todos os domínios regulados por esta diretiva e não apenas ao reembolso dos custos dos cuidados de saúde transfronteiriços referidos no artigo 7.o da referida diretiva, e, por outro lado, que esse artigo 3.o, alínea d), e o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2000/31 devem ser interpretados no sentido de que as prestações de telemedicina devem ser dispensadas em conformidade com a legislação do Estado‑Membro em que o prestador está estabelecido.  | 
      
Quanto à terceira questão
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             108  | 
         
             Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o da Diretiva 2005/36 deve ser interpretado no sentido de que esta diretiva se aplica, por um lado, a um prestador de cuidados de saúde transfronteiriços no caso da telemedicina e, por outro lado, a um prestador, estabelecido num Estado‑Membro, que, sem se deslocar ele próprio, manda realizar, por um prestador estabelecido noutro Estado‑Membro, prestações de cuidados de saúde na presença física do paciente residente neste último Estado‑Membro.  | 
      
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             109  | 
         
             Quanto à primeira parte desta questão, importa recordar que o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2005/36 prevê expressamente que as disposições do título II desta diretiva, relativo à livre prestação de serviços, incluindo o seu artigo 5.o, só se aplicam em caso de deslocação do prestador de serviços para o território do Estado‑Membro de acolhimento para efeitos de um exercício profissional temporário e ocasional.  | 
      
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             110  | 
         
             Como resulta do n.o 90 do presente acórdão, o conceito de «telemedicina», conforme referido na Diretiva 2011/24, abrange qualquer serviço de saúde prestado a um paciente por um prestador de cuidados de saúde estabelecido num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de afiliação, à distância e, portanto, sem a presença física simultânea no mesmo local desse paciente e desse prestador, exclusivamente através das tecnologias da informação e da comunicação.  | 
      
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             111  | 
         
             Por conseguinte, a telemedicina implica necessariamente que o serviço de saúde seja prestado sem que sejam efetuadas deslocações, não apenas do paciente para o Estado‑Membro onde está estabelecido o prestador mas também deste último para o Estado‑Membro onde reside o paciente. Na realidade, é o serviço de saúde que, atento o seu caráter transfronteiriço, «se desloca».  | 
      
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             112  | 
         
             Com a segunda parte da terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se não se pode considerar que um prestador de cuidados de saúde se desloca para o território do Estado‑Membro de acolhimento se, neste último, esse prestador presta cuidados de saúde por intermédio de outro prestador, estabelecido nesse Estado‑Membro e em relação física direta com o paciente, com base nas disposições de um contrato que vincula estes dois prestadores.  | 
      
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             113  | 
         
             A este respeito, basta salientar que, em conformidade com o artigo 3.o, alínea g), da Diretiva 2011/24, é prestador de cuidados de saúde qualquer pessoa singular ou coletiva ou qualquer outra entidade que preste legalmente cuidados de saúde no território de um Estado‑Membro. Por força do artigo 3.o, alínea a), desta diretiva, constituem cuidados de saúde os serviços de saúde prestados por profissionais de saúde, ou seja, na aceção do artigo 3.o, alínea f), desta diretiva e desde que seja aplicável ao caso, um médico ou dentista, ou ainda uma pessoa considerada profissional de saúde nos termos da legislação do Estado‑Membro de tratamento.  | 
      
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             114  | 
         
             Ora, por um lado, sendo o Estado de tratamento, no caso em apreço, a Áustria para as prestações de medicina dentária efetuadas presencialmente, a DZK Deutsche Zahnklinik não pode ser considerada prestadora de cuidados de saúde nesse Estado‑Membro, uma vez que não tem a qualidade de profissional de saúde em conformidade com as disposições da ZÄG, e que, em todo o caso, não está autorizada a prestar cuidados de saúde no referido Estado.  | 
      
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             115  | 
         
             Por outro lado, uma vez que UJ presta cuidados de saúde, há que salientar, em primeiro lugar, que esta, estando autorizada a exercer a profissão de médico dentista na Áustria, é, pelo próprio facto de prestar legalmente esses cuidados de saúde, um profissional de saúde que pode ser considerado o prestador desses cuidados. A circunstância de o paciente não ter celebrado nenhum contrato com esse prestador e de, por conseguinte, não ser obrigado a remunerá‑lo diretamente, uma vez que os referidos cuidados fazem parte de um tratamento médico complexo previsto por um contrato celebrado entre esse paciente e uma entidade estabelecida noutro Estado‑Membro, não é relevante para efeitos da qualificação do referido profissional como prestador de cuidados de saúde.  | 
      
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             116  | 
         
             Em segundo lugar, seria artificial considerar que um cuidado de saúde prestado presencialmente por um primeiro profissional de saúde, no caso UJ, no Estado‑Membro onde está estabelecido, é prestado, na realidade, por uma entidade, no caso a DZK Deutsche Zahnklinik, estabelecida noutro Estado‑Membro, unicamente devido às estipulações do contrato que vincula esse profissional a essa entidade e que, por conseguinte, há que concluir que essa entidade se deslocou para prestar fisicamente esse cuidado de saúde.  | 
      
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             117  | 
         
             Em terceiro lugar, a circunstância de o prestador que exerce a sua atividade no Estado‑Membro de residência do paciente ter podido agir em nome do profissional de saúde estabelecido noutro Estado‑Membro não permite considerar, apenas por esta razão, que este último se tenha deslocado para o primeiro Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 2015, X‑Steuerberatungsgesellschaft, C‑342/14, EU:C:2015:827, n.os 34 e 35).  | 
      
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             118  | 
         
             Tendo em conta o exposto, há que responder à terceira questão que o artigo 5.o da Diretiva 2005/36 deve ser interpretado no sentido de que esta diretiva não se aplica nem a um prestador de cuidados de saúde transfronteiriços no caso da telemedicina nem a um prestador, estabelecido num Estado‑Membro, que, sem se deslocar ele próprio, manda realizar, por um prestador estabelecido noutro Estado‑Membro, prestações de cuidados de saúde presenciais a um paciente residente neste último Estado‑Membro.  | 
      
Quanto à quarta questão
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             119  | 
         
             Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 56.o TFUE se opõe à legislação de um Estado‑Membro que prevê principalmente o exercício direto e pessoal da profissão de médico dentista e que prevê a possibilidade de os nacionais da EEE exercerem essa profissão nesse Estado‑Membro apenas a título temporário.  | 
      
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             120  | 
         
             Tendo em conta as respostas dadas à primeira, segunda e terceira questões, há que salientar, no que respeita, em primeiro lugar, aos cuidados de saúde prestados pela DZK Deutsche Zahnklinik, que, por um lado, os cuidados de saúde de telemedicina são abrangidos pela Diretiva 2011/24, pelo que a legislação nacional austríaca, em causa na quarta questão, não lhes é aplicável. Por outro lado, como resulta dos n.os 114 a 117 do presente acórdão, a DZK Deutsche Zahnklinik não pode ser considerada um prestador de cuidados de saúde na Áustria tendo em conta os cuidados de saúde prestados presencialmente por UJ nesse Estado.  | 
      
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             121  | 
         
             Em segundo lugar, no que respeita aos cuidados de saúde prestados presencialmente por UJ, embora esta legislação lhe seja aplicável enquanto prestador desses cuidados de saúde, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que nenhum elemento transfronteiriço caracteriza a prestação dos referidos cuidados de saúde, pelo que o artigo 56.o TFUE não é aplicável a essa prestação.  | 
      
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             122  | 
         
             Nestas circunstâncias, não há que decidir sobre a quarta questão.  | 
      
Quanto às despesas
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             123  | 
         
             Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.  | 
      
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             Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:  | 
      
            
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                Assinaturas  | 
         
( *1 ) Língua do processo: alemão.