Processo C‑135/23
Gesellschaft für musikalische Aufführungs‑ und mechanische Vervielfältigungsrechte eV (GEMA)
contra
GL
(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Amtsgericht Potsdam)
Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 20 de junho de 2024
«Reenvio prejudicial — Propriedade intelectual — Direito de autor e direitos conexos — Diretiva 2001/29/CE — Artigo 3.o, n.o 1 — Comunicação ao público — Conceito — Mera disponibilização de meios materiais — Disponibilização, em apartamentos, de televisores equipados com uma antena interior que permite a captação de sinais e a difusão de emissões — Caráter lucrativo — Princípio da neutralidade tecnológica»
Aproximação das legislações — Direitos de autor e direitos conexos — Diretiva 2001/29 — Harmonização de certos aspetos dos direitos de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação — Comunicação ao público — Conceito — Critérios de apreciação
(Diretiva 2001/29 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 3.o, n.o 1)
(cf. n.os 17‑26)
Aproximação das legislações — Direitos de autor e direitos conexos — Diretiva 2001/29 — Harmonização de certos aspetos dos direitos de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação — Comunicação ao público — Conceito — Disponibilização, em apartamentos arrendados, de televisores equipados com uma antena interior que permite a captação de sinais e a difusão de emissões — Inclusão — Requisito — Público novo — Arrendatários com contratos de curta duração
(Diretiva 2001/29 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 3.o, n.o 1)
(cf. n.os 27‑46 e disp.)
Resumo
Chamado a pronunciar‑se a título prejudicial pelo Amtsgericht Potsdam (Tribunal de Primeira Instância de Potsdam, Alemanha), o Tribunal de Justiça esclarece o conceito de «comunicação ao público» de uma obra protegida, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29/CE ( 1 ), no contexto da disponibilização, pelo administrador de um condomínio, de televisores equipados com uma antena interior que permite a captação de sinais e a difusão de emissões.
A Gesellschaft für musikalische Aufführungs‑ und mechanische Vervielfältigungsrechte eV (GEMA), uma entidade de gestão coletiva de direitos de autor no domínio musical, intentou uma ação de indemnização, por violação do direito de autor, contra GL, administrador de um imóvel com 18 apartamentos arrendados, com o fundamento de que este disponibiliza, nos apartamentos, esses televisores.
Para a resolução deste litígio, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o conceito de «comunicação ao público», referido no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 (a seguir conceito de «comunicação ao público»), abrange a disponibilização de tais televisores.
Apreciação do Tribunal de Justiça
Antes de mais, o Tribunal de Justiça recorda que o conceito de «comunicação ao público» associa dois elementos cumulativos, a saber, um ato de comunicação de uma obra e a comunicação desta última a um público, e implica uma apreciação individualizada. Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, é, em especial, o papel incontornável do utilizador para dar aos seus clientes o acesso a obras protegidas e o caráter intencional da sua intervenção, nomeadamente se esta tem caráter lucrativo, que permitem distinguir, por um lado, a «comunicação ao público» e, por outro, a «mera disponibilização de meios materiais» ( 2 ).
O Tribunal de Justiça declara que, embora caiba ao juiz nacional determinar se o administrador do condomínio no processo principal pratica um ato de «comunicação ao público», incumbe ao Tribunal de Justiça fornecer‑lhe indicações úteis para o efeito que lhe permitam dirimir o litígio que lhe foi submetido.
A este respeito, o Tribunal de Justiça salienta, em primeiro lugar, que, ao equipar esses apartamentos com televisores e antenas interiores que, sem outra intervenção, captam sinais e permitem a difusão de emissões, nomeadamente musicais, o administrador de um condomínio realiza intencionalmente uma intervenção para dar aos seus clientes o acesso a essas emissões, no interior dos apartamentos arrendados e durante o período de arrendamento, sem que seja determinante que estes façam ou não uso dessa possibilidade. Além disso, esta intervenção do administrador deve ser considerada uma prestação de serviços suplementar realizada com o objetivo de obter um certo lucro. Assim, a oferta desse serviço permite demonstrar o caráter lucrativo da comunicação. A este respeito, é irrelevante a circunstância de os televisores estarem ligados a uma antena «interior» e não a uma antena «central», pois esta distinção entre antenas não é conforme com o princípio da neutralidade tecnológica.
Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se as obras protegidas são efetivamente comunicadas a um público, o Tribunal de Justiça sublinha que o conceito de «público» visa um número indeterminado de potenciais destinatários e implica, por outro lado, um número considerável de pessoas. Este conceito inclui, assim, um certo limiar de minimis, o que exclui deste conceito um número demasiado reduzido de pessoas em causa, ou mesmo insignificante. Para determinar esse número, há que ter em conta, nomeadamente, o número de pessoas que podem ter acesso à mesma obra em paralelo mas também sucessivamente. Se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que os apartamentos do imóvel em causa no processo principal são objeto de locações de curta duração, nomeadamente no âmbito do alojamento turístico, os seus arrendatários devem ser qualificados de «público», uma vez que constituem, juntos, um número indeterminado de potenciais destinatários.
Em terceiro lugar, o Tribunal de Justiça declara que, para ser qualificada de «comunicação ao público», uma obra protegida deve ser comunicada segundo uma técnica específica, diferente das utilizadas até então ou, na sua falta, junto de um «público novo», isto é, um público que não tenha sido tomado em consideração pelo titular do direito quando autorizou a comunicação inicial da sua obra ao público. A este respeito, os arrendatários de apartamentos de um imóvel objeto de locações de curta duração, nomeadamente no âmbito do alojamento turístico, podem constituir esse público «novo», uma vez que essas pessoas, embora se encontrem no interior da zona de cobertura da referida emissão, não poderiam, sem a intervenção do administrador desse imóvel, através da qual este instala, nesses apartamentos, televisores equipados com uma antena interior, usufruir da obra difundida. Em contrapartida, se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que esses apartamentos são arrendados a arrendatários residentes nos mesmos, estes últimos não podem ser considerados «público novo».
Por conseguinte, o Tribunal de Justiça considera que o conceito de «comunicação ao público» deve ser interpretado no sentido de que abrange a disponibilização intencional, pelo administrador de um imóvel de apartamentos arrendados, de televisores equipados com uma antena interior que, sem outra intervenção, captam sinais e permitem a difusão de emissões, desde que os arrendatários desses apartamentos possam ser considerados «público novo».
( 1 ) Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10), os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.
( 2 ) De acordo com o considerando 27 da Diretiva 2001/29, a «mera disponibilização de meios materiais para permitir ou realizar uma comunicação não constitui só por si uma comunicação na aceção [desta] diretiva».