ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

20 de junho de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Livre prestação de serviços — Artigos 56.° e 57.° TFUE — Destacamento de nacionais de países terceiros por uma empresa de um Estado‑Membro para trabalhar noutro Estado‑Membro — Período superior a 90 dias num período de 180 dias — Obrigação de os trabalhadores destacados nacionais de países terceiros serem titulares de uma autorização de residência no Estado‑Membro de acolhimento em caso de prestação superior a três meses — Limitação do período de validade das autorizações de residência — Montante das taxas relativas ao pedido de autorização de residência — Restrição à livre prestação de serviços — Razões imperiosas de interesse geral — Proporcionalidade»

No processo C‑540/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo rechtbank Den Haag, zittingsplaats Middelburg (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência em Midelburgo, Países Baixos), por Decisão de 11 de agosto de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça, no processo

SN e o.

contra

Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: E. Regan (relator), presidente de secção, Z. Csehi, M. Ilešič, I. Jarukaitis e D. Gratsias, juízes,

advogado‑geral: A. Rantos,

secretário: R. Stefanova‑Kamisheva, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de setembro de 2023,

vistas as observações apresentadas:

em representação de SN e o., por B. J. Maes e D. O. Wernsing, advocaten,

em representação do Governo Neerlandês, por M. K. Bulterman, A. Hanje e J. M. Hoogveld, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Belga, por M. Jacobs e L. Van den Broeck, na qualidade de agentes,

em representação do Governo Norueguês, por I. Collett, E. Eikeland e S. Hammersvik, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por L. Armati, A. Katsimerou, P.‑J. Loewenthal e M. Mataija, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral apresentadas na audiência de 30 de novembro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.° e 57.° TFUE.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe SN e outros trabalhadores nacionais de países terceiros que foram destacados numa sociedade neerlandesa por uma sociedade eslovaca ao Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Secretário de Estado da Justiça e da Segurança, Países Baixos) (a seguir «Secretário de Estado»), a respeito da obrigação de esses trabalhadores obterem uma autorização de residência neerlandesa e das condições de concessão dessa autorização.

Quadro jurídico

Direito da União

CAAS

3

A Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinada em Schengen, em 19 de junho de 1990, e entrada em vigor em 26 de março de 1995 (JO 2000, L 239, p. 19), conforme alterada pelo Regulamento (UE) n.o 265/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de março de 2010 (JO 2010, L 85, p. 1), e pelo Regulamento (UE) n.o 610/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013 (JO 2013, L 182, p. 1) (a seguir «CAAS»), define, no seu artigo 1.o, o conceito de «[e]strangeiro» como «qualquer pessoa que não seja nacional dos Estados‑Membros das Comunidades Europeias».

4

O artigo 21.o, n.o 1, desta convenção prevê:

«Os cidadãos estrangeiros detentores de um título de residência válido emitido por um dos Estados-Membros podem circular livremente, ao abrigo desse título e de um documento de viagem válido, por um período máximo de 90 dias num período de 180 dias no território dos outros Estados-Membros, desde que preencham as condições de entrada a que se referem as alíneas a), c) e e) do n.o 1 do artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 562/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2006, que estabelece o código comunitário relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) [JO 2006, L 105, p. 1] e não constem da lista nacional de pessoas indicadas do Estado-Membro em causa.»

Código das Fronteiras Schengen

5

O artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2016, L 77, p. 1, a seguir «Código das Fronteiras Schengen»), sob a epígrafe «Condições de entrada para os nacionais de países terceiros», que substituiu o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento n.o 562/2006, dispõe:

«Para uma estada prevista no território dos Estados‑Membros de duração não superior a 90 dias em qualquer período de 180 dias, o que implica ter em conta o período de 180 dias anterior a cada dia de estada, as condições de entrada para os nacionais de países terceiros são as seguintes:

a)

Estar na posse de um documento de viagem válido que autorize o titular a passar a fronteira e que preencha os seguintes critérios:

i)

ser válido pelo menos para os três meses seguintes à data prevista de partida do território dos Estados‑Membros. Em caso de emergência devidamente justificada, esta obrigação pode ser dispensada,

ii)

ter sido emitido há menos de 10 anos;

[...]

c)

Justificar o objetivo e as condições da estada prevista e dispor de meios de subsistência suficientes, tanto para a duração dessa estada como para o regresso ao país de origem ou para o trânsito para um país terceiro em que a sua admissão esteja garantida, ou estar em condições de obter licitamente esses meios;

[...]

e)

Não ser considerado suscetível de perturbar a ordem pública, a segurança interna, a saúde pública ou as relações internacionais de qualquer Estado‑Membro, e em especial não estar indicado para efeitos de não admissão, pelos mesmos motivos, nas bases de dados nacionais dos Estados‑Membros.»

Diretiva 96/71/CE

6

A Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO 1997, L 18, p. 1), enuncia, no seu considerando 20:

«Considerando que a presente diretiva não afeta os acordos celebrados pela Comunidade com países terceiros nem as legislações dos Estados‑Membros relativas ao acesso de prestadores de serviços de países terceiros ao seu território; que a presente diretiva também não afeta as legislações nacionais relativas às condições de entrada, residência e emprego de trabalhadores nacionais de países terceiros.»

7

O artigo 1.o, n.o 1, desta diretiva dispõe:

«A presente diretiva é aplicável às empresas estabelecidas num Estado‑Membro que, no âmbito de uma prestação transnacional de serviços e nos termos do n.o 3, destaquem trabalhadores para o território de um Estado‑Membro.»

Regulamento (CE) n.o 1030/2002

8

O artigo 1.o do Regulamento (CE) n.o 1030/2002 do Conselho, de 13 de junho de 2002, que estabelece um modelo uniforme de título de residência para os nacionais de países terceiros (JO 2002, L 157, p. 1), enuncia:

«1.   Os títulos de residência concedidos pelos Estados‑Membros a nacionais de países terceiros devem ser emitidos de acordo com um modelo uniforme e reservar um espaço para as informações que constam do anexo. [...] Os Estados‑Membros podem acrescentar no espaço do modelo uniforme previsto para o efeito quaisquer informações importantes quanto à natureza do título e ao estatuto jurídico do seu titular, incluindo informações sobre se este possui ou não uma autorização de trabalho.

2.   Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)

“Título de residência”, qualquer autorização emitida pelas autoridades de um Estado‑Membro que permite a um nacional de um país terceiro permanecer legalmente no seu território [...]»

9

O artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento prevê:

«Devem ser estabelecidas especificações técnicas suplementares para o modelo uniforme de título de residência, nos termos do n.o 2 do artigo 6.o [...]»

Regulamento (CE) n.o 883/2004

10

O Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO 2004, L 166, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 465/2012 (JO 2012, L 12, p. 4), dispõe, no seu artigo 12.o, n.o 1:

«A pessoa que exerça uma atividade por conta de outrem num Estado‑Membro ao serviço de um empregador que normalmente exerce as suas atividades nesse Estado‑Membro, e que seja destacada por esse empregador para realizar um trabalho por conta deste noutro Estado‑Membro, continua sujeita à legislação do primeiro Estado‑Membro, desde que a duração previsível do referido trabalho não exceda 24 meses e que essa pessoa não seja enviada em substituição de outra pessoa destacada.»

Diretiva 2004/38/CE

11

A Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77), prevê, no seu artigo 3.o, n.o 1:

«A presente diretiva aplica‑se a todos os cidadãos da União que se desloquem ou residam num Estado‑Membro que não aquele de que são nacionais, bem como aos membros das suas famílias, na aceção do ponto 2 do artigo 2.o, que os acompanhem ou que a eles se reúnam.»

12

O artigo 9.o desta diretiva dispõe, no seu n.o 1:

«Se o período previsto de residência ultrapassar três meses, os Estados‑Membros devem emitir um cartão de residência aos membros da família de um cidadão da União que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro.»

Diretiva 2006/123/CE

13

A Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO 2006, L 376, p. 36), prevê, no seu artigo 17.o, sob a epígrafe «Exceções adicionais à liberdade de prestação de serviços»:

«O artigo 16.o [que confere aos prestadores de serviços o direito de prestarem serviços num Estado‑Membro diferente daquele em que estão estabelecidos] não é aplicável:

[...]

9)

No que diz respeito aos nacionais de países terceiros que se deslocam para outro Estado‑Membro no quadro da prestação de um serviço, à faculdade de os Estados‑Membros exigirem visto ou autorização de residência a nacionais de países terceiros que não estejam abrangidos pelo regime de reconhecimento mútuo previsto no artigo 21.o da [CAAS], ou à faculdade de obrigar nacionais de países terceiros, à data ou após a sua entrada, a se apresentarem às autoridades competentes do Estado‑Membro onde o serviço é prestado;

[...]»

Diretiva 2009/52/CE

14

Os considerandos 1 a 3 da Diretiva 2009/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de junho de 2009, que estabelece normas mínimas sobre sanções e medidas contra os empregadores de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2009, L 168, p. 24), enunciam:

«(1)

Na reunião do Conselho Europeu de 14 e 15 de dezembro de 2006 ficou acordado reforçar a cooperação entre Estados‑Membros na luta contra a imigração clandestina e, em especial, intensificar as medidas contra o emprego ilegal a nível dos Estados‑Membros e da UE.

(2)

Um fator de atração importante para a imigração clandestina para a UE é a possibilidade de aí obter trabalho sem o estatuto legal exigido. Por conseguinte, a luta contra a imigração clandestina e a permanência ilegal deverá incluir medidas contra esse fator de atração.

(3)

O elemento central dessas medidas deverá ser uma proibição geral de emprego de nacionais de países terceiros não autorizados a residir na UE, acompanhada de sanções contra os empregadores que não respeitem essa proibição.»

15

Em conformidade com o artigo 2.o, alínea b), desta diretiva, para os efeitos específicos desta, entende‑se por «[n]acional de país terceiro em situação irregular», um «nacional de um país terceiro presente no território de um Estado‑Membro que não preenche ou deixou de preencher as condições de permanência ou residência nesse Estado‑Membro».

16

O artigo 3.o, n.o 1, da mesma diretiva enuncia:

«Os Estados‑Membros proíbem o emprego de nacionais de países terceiros em situação irregular.»

Diretiva 2011/98/UE

17

A Diretiva 2011/98/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa a um procedimento de pedido único de concessão de uma autorização única para os nacionais de países terceiros residirem e trabalharem no território de um Estado‑Membro e a um conjunto comum de direitos para os trabalhadores de países terceiros que residem legalmente num Estado‑Membro (JO 2011, L 343, p. 1), prevê, no seu artigo 1.o, n.o 1:

«A presente diretiva estabelece:

a)

Um procedimento de pedido único de concessão de uma autorização única para os nacionais de países terceiros residirem para efeitos de trabalho no território de um Estado‑Membro, a fim de simplificar os procedimentos para a sua admissão e de facilitar o controlo do seu estatuto [...]

[...]»

18

O artigo 3.o, n.o 2, desta diretiva enuncia:

«A presente diretiva não se aplica aos nacionais de países terceiros que:

[...]

c) Estejam destacados, durante todo o período de destacamento;

[...]»

19

O artigo 6.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Autorização única», dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros emitem a autorização única utilizando o modelo uniforme estabelecido no Regulamento (CE) n.o 1030/2002 e inserem a informação relativa à autorização de trabalho nos termos do disposto na alínea a), pontos 7.5 a 9, do anexo desse regulamento.

Os Estados‑Membros podem prestar informações suplementares sobre a relação de trabalho do nacional de um país terceiro (nomeadamente, o nome e o endereço do empregador, o local de trabalho, o tipo de trabalho, o horário de trabalho e a remuneração) em formato papel, ou armazenar esses dados em formato eletrónico, em conformidade com o artigo 4.o do Regulamento [n.o 1030/2002] e com a alínea a), ponto 16, do anexo desse regulamento.

2.   Caso emitam uma autorização única, os Estados‑Membros não emitem autorizações suplementares como prova de autorização de acesso ao mercado de trabalho.»

20

O artigo 7.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Autorizações de residência emitidas para fins não relacionados com trabalho», prevê:

«1.   Sempre que emitam títulos de residência em conformidade com o Regulamento [n.o 1030/2002], os Estados‑Membros inserem as informações relativas à autorização de trabalho, independentemente do tipo de autorização.

Os Estados‑Membros podem prestar informações suplementares sobre a relação de trabalho do nacional de um país terceiro (nomeadamente, o nome e o endereço do empregador, o local de trabalho, o tipo de trabalho, o horário de trabalho e a remuneração) em formato papel, ou armazenar esses dados em formato eletrónico, em conformidade com o artigo 4.o do Regulamento [n.o 1030/2002] e com a alínea a), ponto 16, do anexo desse regulamento.

2.   Caso emitam títulos de residência nos termos do Regulamento [n.o 1030/2002], os Estados‑Membros não emitem autorizações suplementares como prova de autorização de acesso ao mercado de trabalho.»

Diretiva 2003/109/CE

21

O artigo 3.o, n.o 2, alínea e), da Diretiva 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração (JO 2004, L 16, p. 44), enuncia:

«A presente diretiva não é aplicável aos nacionais de países terceiros que:

[...]

e)

Tenham residência exclusivamente por motivos de caráter temporário, como trabalhadores sazonais ou au pair, trabalhadores destacados por um prestador de serviços para efeitos de prestação de serviços transfronteiriços, ou prestadores de serviços transfronteiriços, ou nos casos em que a sua autorização de residência tenha sido formalmente limitada.»

Diretiva 2014/67/UE

22

O artigo 9.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2014/67/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, respeitante à execução da Diretiva 96/71/CE relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços e que altera o Regulamento (UE) n.o 1024/2012 relativo à cooperação administrativa através do Sistema de Informação do Mercado Interno («Regulamento IMI») (JO 2014, L 159, p. 11), sob a epígrafe «Requisitos administrativos e medidas de controlo», prevê:

«1.   Os Estados‑Membros só podem impor os requisitos administrativos e medidas de controlo necessários para garantir o controlo efetivo do cumprimento das obrigações estabelecidas na presente diretiva e na Diretiva [96/71], desde que as mesmas sejam justificadas e proporcionadas de acordo com o direito da União.

Para esse efeito, os Estados‑Membros podem impor designadamente as seguintes medidas:

a)

A obrigação de um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro fazer uma simples declaração às autoridades nacionais competentes, o mais tardar no início da prestação de serviços, na língua oficial (numa das línguas oficiais) do Estado‑Membro de acolhimento, ou noutra(s) língua(s) aceite(s) pelo Estado‑Membro de acolhimento, a qual contenha as informações pertinentes necessárias para poderem ser efetuados controlos factuais no local de trabalho, incluindo:

i)

a identidade do prestador de serviços;

ii)

o número previsto de trabalhadores destacados claramente identificáveis;

iii)

as pessoas a que se referem as alíneas e) e f);

iv)

a duração prevista e as datas previstas para o início e o fim do destacamento;

v)

o(s) endereço(s) do local de trabalho; e

vi)

a natureza dos serviços que justificam o destacamento;

b)

A obrigação de conservar ou fornecer, em papel ou em formato eletrónico, os documentos seguintes, e/ou guardar as suas cópias: contrato de trabalho ou documento equivalente na aceção da Diretiva 91/533/CEE do Conselho[, de 14 de outubro de 1991, relativa à obrigação de a entidade patronal informar o trabalhador sobre as condições aplicáveis ao contrato ou à relação de trabalho (JO 1991, L 288, p. 32),] incluindo, se necessário ou pertinente, as informações adicionais referidas no artigo 4.o da referida diretiva, recibos de retribuição, registos de tempos de trabalho com indicação do início, do fim e da duração do tempo de trabalho diário, e comprovativos do pagamento de salários ou cópias de documentos equivalentes, durante todo o período de destacamento, num local acessível e claramente identificado no território do Estado‑Membro de destacamento, tal como o local de trabalho ou o estaleiro de construção ou ainda, no caso dos trabalhadores móveis no setor dos transportes, a base de operações ou o veículo com o qual o serviço é fornecido;

c)

A obrigação de, a pedido das autoridades do Estado‑Membro de acolhimento e num prazo razoável, entregar os documentos referidos na alínea b), após o período de destacamento;

d)

A obrigação de fornecer uma tradução dos documentos referidos na alínea b) numa das línguas oficiais do Estado‑Membro de acolhimento, ou noutra(s) língua(s) aceite(s) pelo Estado‑Membro de acolhimento;

e)

A obrigação de designar uma pessoa para estabelecer a ligação com as autoridades competentes no Estado‑Membro de acolhimento onde os serviços são prestados e para enviar e receber documentos e/ou avisos, se necessário;

f)

A obrigação de designar uma pessoa de contacto, se necessário, agindo na qualidade de representante através do qual os parceiros sociais pertinentes possam procurar mobilizar o prestador de serviços a fim de que participe na negociação coletiva no Estado‑Membro de acolhimento, em conformidade com a legislação e/ou as práticas nacionais, durante o período em que são prestados os serviços. Essa pessoa pode ser uma pessoa diferente da referida na alínea e) e não tem de estar presente no Estado‑Membro de acolhimento, mas tem de estar disponível mediante pedido razoável e justificado;

2.   Os Estados‑Membros podem impor outros requisitos administrativos e medidas de controlo, caso surjam situações ou novos acontecimentos para os quais os requisitos administrativos e as medidas de controlo existentes não sejam suficientes ou eficazes para garantir o controlo efetivo do cumprimento das obrigações estabelecidas na Diretiva 96/71/CE e na presente diretiva, desde que sejam justificadas e proporcionadas.

3.   Nenhuma disposição do presente artigo afeta outras obrigações decorrentes da legislação da União, incluindo da Diretiva 89/391/CEE do Conselho[, de 12 de junho de 1989, relativa à aplicação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores no trabalho (JO 1989, L 183, p. 1),] e do [Regulamento n.o 883/2004], e/ou decorrentes do direito nacional respeitantes à proteção ou ao emprego dos trabalhadores, desde que as mesmas sejam igualmente aplicáveis às empresas estabelecidas no Estado‑Membro em questão e sejam justificadas e proporcionadas.»

Direito neerlandês

Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros

23

O artigo 2.o, n.o 1, da Wet arbeid vreemdelingen (Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros), de 21 de dezembro de 1994 (Stb. 1994, n.o 959), enuncia:

«Um empregador não pode contratar um cidadão estrangeiro nos Países Baixos sem uma autorização de trabalho ou sem que este cidadão estrangeiro seja titular de uma autorização única para trabalhar para esse empregador.»

Decreto de Execução da Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros

24

O artigo 1.o, n.o 1, do Besluit uitvoering Wet arbeid vreemdelingen (Decreto de Execução da Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros), na sua versão aplicável à data dos factos no processo principal, prevê:

«A restrição prevista no artigo 2.o, n.o 1, da Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros não se aplica a um estrangeiro que, no âmbito de uma prestação de serviços transfronteiriça, preste temporariamente serviços nos Países Baixos a um empregador estabelecido fora dos Países Baixos, noutro Estado‑Membro da União Europeia, noutro Estado parte no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu ou na Suíça, desde que:

a.

o cidadão estrangeiro preencha todos os requisitos de residência, de autorização de trabalho e de segurança social exigidos para trabalhar por conta de outrem no país onde o empregador está estabelecido;

b.

o cidadão estrangeiro preste um trabalho análogo àquele para o qual está habilitado no país em que o empregador está estabelecido;

c.

o cidadão estrangeiro seja apenas o substituto de outro cidadão estrangeiro que tenha prestado trabalho análogo, desde que a duração total da prestação de serviços acordada não seja excedida; e

d.

o empregador exerça efetivamente atividades substanciais [...]»

Lei relativa às Condições de Emprego dos Trabalhadores Destacados na União Europeia

25

Nos termos do artigo 8.o, n.os 1 a 4, da Wet arbeidsvoorwaarden gedetacheerde werknemers in de Europese Unie (Lei relativa às Condições de Emprego dos Trabalhadores Destacados na União Europeia), de 1 de junho de 2016 (Stb. 2016, n.o 219, a seguir «WagwEU»):

«1.   O prestador de serviços que destaca um trabalhador para os Países Baixos deve comunicar o destacamento [ao Minister van Sociale Zaken en Werkgelegenheid (Ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego, Países Baixos)], por escrito ou por via eletrónica, antes do início da atividade. A notificação do prestador de serviços deve incluir:

a.

a sua identidade;

b.

a identidade do destinatário dos serviços e a do trabalhador destacado;

c.

a pessoa de contacto referida no artigo 7.o;

d.

a identidade da pessoa singular ou coletiva responsável pelo pagamento dos salários;

e.

a natureza e a duração prevista da atividade;

f.

o endereço do local de trabalho; e

g.

as contribuições para os regimes de segurança social aplicáveis.

2.   Caso o prestador de serviços que destacar um trabalhador para os Países Baixos forneça ao destinatário dos serviços, antes do início da atividade, uma cópia escrita ou eletrónica da notificação a que se refere o n.o 1, esta deve incluir, pelo menos, as informações relativas à sua identidade e à do trabalhador destacado, o endereço do local de trabalho, bem como a natureza e a duração da atividade.

3.   O destinatário da prestação verifica se a cópia da notificação a que se refere o n.o 2 inclui as informações referidas neste n.o 2 e comunica ao Ministro, por escrito ou por via eletrónica, qualquer inexatidão ou a não receção da cópia, o mais tardar cinco dias úteis após o início da atividade.

4.   Os dados tratados pelo [Ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego] nos termos do presente artigo são comunicados aos órgãos administrativos e de fiscalização, uma vez que são necessários para o exercício das suas funções relacionadas com a prestação transnacional de serviços.»

Decreto relativo às Condições de Emprego dos Trabalhadores Destacados na União Europeia

26

O artigo 3.o, n.o 2, do Besluit arbeidsvoorwaarden gedetacheerde werknemers in de Europese Unie (Decreto relativo às Condições de Emprego dos Trabalhadores Destacados na União Europeia), tem a seguinte redação:

«[O Ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego] está habilitado e tem de, a pedido, disponibilizar gratuitamente ao Immigratie‑ en Naturalisatiedienst [(Serviço de Imigração e Naturalização, Países Baixos) (a seguir “IND”)] os dados relativos aos prestadores de serviços, aos destinatários de serviços, às pessoas de contacto, às pessoas responsáveis pelo pagamento dos salários e aos trabalhadores destacados, que tenham sido tratados nos termos do artigo 8.o da [WagEU], incluindo o número de identificação nacional, na medida em que esses dados sejam necessários para as tarefas relacionadas com a execução da Vreemdelingenwet 2000 [(Lei de 2000 relativa aos Estrangeiros)].»

27

Nos termos do artigo 11.o, n.o 3, deste decreto, o prestador de serviços disponibiliza, além das informações referidas no artigo 8.o, n.o 1, da WagwEU, a data do termo do período de emprego regular.

Lei de 2000 relativa aos Estrangeiros

28

O artigo 14.o, n.o 1, alínea a), e n.o 3, da Lei de 2000 relativa aos Estrangeiros enuncia:

«1.   [O Minister van Justitie en Veiligheid (Ministro da Justiça e da Segurança, Países Baixos)] está habilitado:

a.

deferir, indeferir ou não apreciar o pedido de concessão de uma autorização de residência de duração determinada;

[...].

3.   A concessão de uma autorização de residência de duração determinada está sujeita a restrições relacionadas com o objetivo para o qual a estada é autorizada. Podem também ser previstas outras condições relativas à autorização. As regras relativas à concessão, à alteração ou à renovação automática, às restrições e às condições podem ser estabelecidas por um regulamento da Administração Pública ou ao abrigo de tal regulamento.»

Decreto de 2000 relativo aos Estrangeiros

29

O artigo 3.31.a, n.o 1, do Vreemdelingenbesluit 2000 (Decreto de 2000 relativo aos Estrangeiros), de 23 de novembro de 2000 (Stb. 2000, n.o 497), na versão aplicável ao litígio no processo principal, tem a seguinte redação:

«Pode ser emitida uma autorização de residência ordinária por tempo determinado sujeita a uma restrição relacionada com a atividade exercida no âmbito da prestação de serviços transfronteiriça prevista no artigo 4.6. do Besluit uitvoering Wet arbeid vreemdelingen 2022 [(Decreto de Execução da Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros de 2022)], se a notificação prevista no artigo 8.o da [WagwEU] tiver sido efetuada, prestando as informações previstas neste artigo e no artigo 11.o, n.o 3, do [Decreto relativo às Condições de Emprego dos Trabalhadores Destacados na União Europeia].»

30

Nos termos do artigo 3.4, n.o 1, alínea i), do Decreto de 2000 relativo aos Estrangeiros, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal:

«As restrições previstas no artigo 14.o, n.o 3, da [Lei de 2000 relativa aos estrangeiros] estão relacionadas com:

[...]

i. a prestação de serviços transfronteiriça.»

31

Em conformidade com o artigo 3.58, n.o 1, alínea i), do Decreto de 2000 relativo aos Estrangeiros e da parte B5/3.1 da Vreemdelingencirculaire 2000 (Circular de 2000 Relativa aos Estrangeiros), de 2 de março de 2001 (Stcrt. 2001, n.o 64), na sua versão aplicável à data dos factos no processo principal, o IND emite a autorização de residência para a prestação de serviços transfronteiriça por um período de validade igual à duração da atividade referida no artigo 1.o, n.o 2, do Decreto de Execução da Lei relativa ao Trabalho dos Estrangeiros, na sua versão aplicável à data dos factos no processo principal, sem poder exceder dois anos.

Regulamento de 2000 relativo aos Estrangeiros

32

O artigo 3.34. do Voorschrift Vreemdelingen 2000 (Regulamento de 2000 relativo aos Estrangeiros), de 18 de dezembro de 2000 (Stcrt. 2001, n.o 10), estabelece que um cidadão estrangeiro que não seja titular de uma autorização de residência provisória válida para o objetivo para o qual o pedido de residência é apresentado está sujeito ao pagamento de taxas pelo tratamento de um pedido de concessão, de alteração ou de renovação de uma autorização de residência para a prestação de serviços transfronteiriça.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

33

Os recorrentes no processo principal, nacionais ucranianos, são titulares de uma autorização de residência temporária emitida pelas autoridades eslovacas, válida até 21 de novembro de 2020, inclusive. Trabalham para a ROBI spol s.r.o. (a seguir «ROBI»), sociedade de direito eslovaco, que os destacou para a Ivens NV, sociedade de direito neerlandês, para efetuar uma missão no porto de Roterdão (Países Baixos).

34

Para o efeito, a ROBI notificou, em 4 de dezembro de 2019, as autoridades neerlandesas competentes da natureza da atividade para a qual esses recorrentes estavam destacados e a duração da mesma, inicialmente prevista para o período de 6 de dezembro de 2019 a 4 de março de 2020. Por notificação de 28 de fevereiro de 2020, a ROBI informou essas autoridades da prorrogação dessa atividade até 31 de dezembro de 2021.

35

Na medida em que a duração prevista da referida atividade excedia a duração do direito de circulação de 90 dias durante um período de 180 dias de que gozam os estrangeiros com um título de residência emitido por um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 21.o, n.o 1, da CAAS, a ROBI pediu às autoridades neerlandesas, em 6 de março de 2020, em nome e por conta de cada um dos recorrentes no processo principal, a emissão de uma autorização de residência ordinária de duração determinada. O tratamento de cada um destes pedidos deu lugar ao pagamento de taxas num montante que ascendia, consoante a situação individual destes recorrentes, a 290 ou a 320 euros.

36

O IND, atuando em nome do Secretário de Estado, emitiu as autorizações de residência solicitadas. O prazo de validade dessas autorizações de residência foi, contudo, limitado ao período de validade das autorizações de residência temporária eslovacas emitidas aos recorrentes no processo principal, ou seja, uma duração inferior à da atividade para a qual estava previsto destacá‑los para os Países Baixos.

37

Numa data não especificada pelo órgão jurisdicional de reenvio, os recorrentes no processo principal apresentaram reclamações contra cada uma das decisões que lhes concederam uma autorização de residência. Contestaram, nessa ocasião, tanto a obrigação de obter uma autorização de residência para a prestação de serviços transfronteiriça como a duração da validade das autorizações de residência emitidas e as taxas devidas pelo tratamento dos pedidos dessas autorizações.

38

Após uma análise dessas reclamações, em 16 de março de 2021, pela Comissão Administrativa de Audiência do IND, o Secretário de Estado, por Decisões de 7 de abril de 2021, julgou improcedentes as referidas reclamações.

39

Em 7 de maio de 2021, a ROBI apresentou às autoridades neerlandesas novos pedidos de autorização de residência em nome e por conta de alguns dos recorrentes no processo principal, em apoio dos quais alegou que lhes tinham sido concedidas novas autorizações de residência pelas autoridades eslovacas válidas até 31 de março de 2022.

40

O IND, atuando em nome do Secretário de Estado, deferiu esses pedidos e concedeu aos recorrentes em causa autorizações de residência válidas até à data de cessação da atividade notificada pela ROBI às autoridades neerlandesas, ou seja, em 31 de dezembro de 2021.

41

Por outro lado, em 20 de maio de 2022, a ROBI apresentou novamente pedidos de autorização de residência para um certo número de recorrentes para os afetar a outra atividade nos Países Baixos.

42

Paralelamente, os recorrentes no processo principal interpuseram no órgão jurisdicional de reenvio um recurso de anulação das Decisões de 7 de abril de 2021, com fundamento na violação dos artigos 56.° e 57.° TFUE.

43

Neste órgão jurisdicional, os recorrentes no processo principal contestam a obrigação, no âmbito de uma prestação de serviços transfronteiriça, de os trabalhadores nacionais de países terceiros empregados por um prestador de serviços estabelecido num Estado‑Membro serem titulares, além de uma autorização de residência nesse Estado‑Membro, de uma autorização de residência no Estado‑Membro em que a prestação é realizada, após o termo do período de 90 dias previsto no artigo 21.o, n.o 1, da CAAS. Sustentam que essa obrigação constitui uma duplicação do procedimento de notificação prévia à prestação de serviços transfronteiriça. Consideram que a circunstância de a duração das autorizações de residência que lhes foram concedidas pelas autoridades neerlandesas estar limitada ao período de validade das suas autorizações de residência eslovacas e, no máximo, a dois anos constituía uma restrição injustificada à livre prestação de serviços garantida pelos artigos 56.° e 57.° TFUE. Por último, alegam que o montante dos direitos a que estão sujeitos os pedidos de concessão de autorizações de residência nos Países Baixos não é conforme com o direito da União, uma vez que esse montante é mais elevado do que o exigido pelos atestados de residência legal emitidos aos cidadãos da União. O Secretário de Estado contesta todos os argumentos invocados pelos recorrentes no processo principal.

44

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, no processo que deu origem ao Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria (C‑168/04, EU:C:2006:595, n.os 31 e 32), a Comissão Europeia alegou que, no âmbito da livre prestação de serviços, qualquer prestador de serviços transmite aos seus trabalhadores o «direito derivado» de obter uma autorização de residência para a duração necessária da prestação, que a decisão relativa ao direito de residência tinha um caráter puramente formal e que esse direito devia ser reconhecido de forma automática. Ora, o Tribunal de Justiça declarou, nesse processo, que a República da Áustria não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 49.o CE, atual artigo 56.o TFUE. Por conseguinte, esse órgão jurisdicional interroga‑se quanto à questão de saber se o direito à livre prestação de serviços, conforme previsto nos artigos 56.° e 57.° TFUE, não confere um «direito de residência derivado» aos trabalhadores destacados no âmbito de uma prestação de serviços transfronteiriça.

45

Em todo o caso, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se a obrigação que decorre do artigo 56.o TFUE de eliminar qualquer restrição à livre prestação de serviços se opõe à exigência de uma autorização de residência individual para o destacamento, para um Estado‑Membro, de trabalhadores de um país terceiro, assalariados de um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro, quando, como no caso em apreço, a regulamentação nacional já exige que o destacamento de trabalhadores nacionais de países terceiros por um empregador estabelecido noutro Estado‑Membro seja objeto de uma notificação contendo as mesmas informações que as necessárias à concessão de uma autorização de residência no Estado‑Membro de acolhimento. Com efeito, mesmo que a exigência de uma autorização de residência só se aplique no termo de um período de 90 dias, não deixa de ser verdade que essa exigência pode ser equiparada a uma autorização prévia, procedimento suscetível de constituir uma restrição à livre prestação de serviços.

46

Por último, admitindo que essa autorização de residência possa ser exigida, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, por um lado, se o prazo de validade dessa autorização pode ser limitado pela legislação neerlandesa ao período de validade da autorização de trabalho e de residência no Estado‑Membro em que o prestador de serviços está estabelecido, não podendo, contudo, exceder um período máximo de dois anos, e, por outro, se o requerente da referida autorização de residência pode ser obrigado a pagar taxas cujo montante é cinco vezes mais elevado do que o montante das taxas devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União.

47

Nestas condições, o rechtbank Den Haag, zittingsplaats Middelburg (Tribunal de Primeira Instância de Haia, lugar da audiência em Midelburgo, Países Baixos) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

A livre prestação de serviços consagrada nos artigos 56.° e 57.° TFUE inclui um direito derivado de residência num Estado‑Membro a favor dos trabalhadores nacionais de Estados terceiros empregados nesse Estado‑Membro por um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro?

2)

Em caso de resposta negativa, o artigo 56.o TFUE, no caso de uma prestação de serviços de duração superior a três meses, opõe‑se à obrigação de pedir uma autorização de residência para cada trabalhador individual, para além da simples obrigação de declaração por parte do prestador de serviços?

3)

Em caso de resposta negativa, o artigo 56.o TFUE opõe‑se:

a)

A uma disposição de direito nacional segundo a qual o prazo de validade de tal autorização de residência não pode exceder dois anos, independentemente da duração da prestação de serviços?

b)

À limitação do prazo de validade de tal autorização de residência ao prazo de validade da autorização de trabalho e de residência do Estado‑Membro onde está estabelecido o prestador de serviços?

c)

À cobrança de uma taxa por cada pedido ou por cada pedido de renovação de montante equivalente à taxa devida por uma autorização de residência normal para o exercício de atividade profissional por um nacional de um Estado terceiro, mas cinco vezes superior ao montante da taxa relativa ao atestado de residência legal de um cidadão da União?»

Quanto à primeira questão

48

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a livre prestação de serviços, garantida pelos artigos 56.° e 57.° TFUE, deve ser interpretada no sentido de que deve ser automaticamente reconhecido um «direito de residência derivado» aos trabalhadores nacionais de países terceiros que são destacados para um Estado‑Membro por um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro.

49

A este respeito, resulta do pedido de decisão prejudicial que o órgão jurisdicional de reenvio utiliza o conceito de «direito de residência derivado» por referência a um direito de residência dos trabalhadores destacados nacionais de países terceiros decorrente do exercício, pelo seu empregador, do seu direito à livre prestação de serviços e cuja existência foi invocada pela Comissão no processo que deu origem ao Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria (C‑168/04, EU:C:2006:595).

50

Ora, embora, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça tenha julgado procedente a ação por incumprimento intentada pela Comissão, não estabeleceu a existência desse direito de residência. Com efeito, para declarar que o Estado‑Membro em causa não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito à livre prestação de serviços, o Tribunal de Justiça salientou, segundo a sua abordagem habitual, por um lado, que certos aspetos da regulamentação em causa geravam restrições à livre prestação de serviços e, por outro, que essas restrições excediam o que era necessário à realização dos objetivos de interesse geral invocados por esse Estado‑Membro.

51

É certo que, como sublinhado pelo advogado‑geral no n.o 35 das suas conclusões, o conceito de «direito de residência derivado» remete, mais genericamente, para a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual, em matéria de cidadania, os nacionais de países terceiros, membros da família de um cidadão da União, que não podem beneficiar, com fundamento nas disposições da Diretiva 2004/38, de um direito de residência no Estado‑Membro de que esse cidadão é nacional podem obter, em determinados casos, um «direito derivado» com fundamento no artigo 21.o, n.o 1, TFUE (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de junho de 2018, Coman e o., C‑673/16, EU:C:2018:385, n.o 23, e de 12 de julho de 2018, Banger, C‑89/17, EU:C:2018:570, n.o 27 e jurisprudência referida).

52

No entanto, importa recordar que esta solução se baseia na consideração de que, na falta de um direito de residência derivado a favor desse nacional de um país terceiro, esse cidadão da União poderia ser dissuadido de abandonar o Estado‑Membro de que é nacional a fim de exercer o seu direito de residência, ao abrigo do artigo 21.o, n.o 1, TFUE, noutro Estado‑Membro, pelo facto de não ter a certeza de poder prosseguir no Estado‑Membro de que é originário uma vida familiar desenvolvida ou consolidada, com o referido nacional de um país terceiro, no Estado‑Membro de acolhimento por ocasião de um período de residência efetivo (v., neste sentido, Acórdão de 12 de julho de 2018, Banger, C‑89/17, EU:C:2018:570, n.o 28 e jurisprudência referida).

53

Daqui resulta que o direito de residência derivado, na aceção dessa jurisprudência, tem por fundamento o direito, consagrado no artigo 21.o, n.o 1, TFUE, de uma pessoa singular, cidadão da União, circular e residir livremente no território dos Estados‑Membros. Ora, como salientou o advogado‑geral no n.o 36 das suas conclusões, este direito não diz respeito às empresas que podem invocar a liberdade de estabelecimento ou a livre prestação de serviços, consagradas, respetivamente, nos artigos 49.° e 56.° TFUE.

54

Além disso, como sublinha, em substância, o advogado‑geral no n.o 37 das suas conclusões, as relações entre os membros em primeiro grau de uma mesma família ou entre as pessoas que desenvolveram ou consolidaram relações análogas, que beneficiam todos do direito fundamental ao respeito pela vida privada e familiar, garantido pelo artigo 7.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, não são comparáveis às relações entre uma empresa e os seus assalariados. Por conseguinte, não se pode deduzir, nem por analogia, da jurisprudência referida no n.o 51 do presente acórdão que, numa situação como a que está em causa no processo principal, qualquer trabalhador nacional de um país terceiro enviado por uma empresa para outro Estado‑Membro para aí prestar serviços por conta desta deve beneficiar automaticamente de um direito de residência nesse Estado‑Membro durante o período de duração desses serviços.

55

Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que os artigos 56.° e 57.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que não deve ser automaticamente reconhecido aos trabalhadores nacionais de países terceiros destacados num Estado‑Membro por um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro um «direito de residência derivado» no Estado‑Membro onde trabalham ou no Estado‑Membro para onde são destacados.

Quanto à segunda questão

56

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que prevê que, na hipótese de uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro prestar no primeiro Estado‑Membro serviços cuja duração seja superior a três meses, essa empresa está obrigada não apenas a notificar a prestação de serviços às autoridades do primeiro Estado‑Membro, mas também a obter uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que pretenda destacar para esse Estado‑Membro.

57

Antes de mais, importa recordar que, por um lado, como resulta da resposta à primeira questão, o exercício, por um empregador estabelecido num Estado‑Membro, do seu direito à livre prestação de serviços não confere, em benefício dos trabalhadores nacionais de países terceiros que destaca para esse efeito para outro Estado‑Membro, um direito próprio de residência no território desse Estado‑Membro. Por conseguinte, esta segunda questão deve ser examinada tendo unicamente em conta os efeitos que uma regulamentação, como a que está em causa no processo principal, pode produzir sobre o direito à livre prestação de serviços de que goza esse empregador.

58

Por outro lado, embora, na sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio se tenha referido não só à obrigação de o prestador de serviços pedir, para cada trabalhador que pretenda destacar, uma autorização de residência mas também a uma obrigação, para a empresa em causa, de notificar a prestação de serviços, resulta do pedido de decisão prejudicial que as dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio dizem respeito à compatibilidade com o artigo 56.o TFUE não desta segunda obrigação, considerada isoladamente, mas da obrigação de obter uma autorização de residência, visto que esta acresce à obrigação de notificar a prestação de serviços.

59

A este respeito, importa recordar que a livre prestação de serviços, garantida pelos artigos 56.° e 57.° TFUE, tal como as outras liberdades de circulação, só é aplicável aos domínios que não tenham sido objeto de harmonização exaustiva (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft, C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 57 e jurisprudência referida). Por conseguinte, para responder à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio, importa começar por examinar se uma regulamentação como a referida pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua questão se insere num domínio que foi objeto de uma harmonização exaustiva ou, pelo menos, num aspeto de um domínio que foi objeto dessa harmonização.

60

No caso em apreço, a regulamentação nacional em causa no processo principal tem por objeto o direito de residência dos trabalhadores por conta de outrem, nacionais de um país terceiro, legalmente empregados num Estado‑Membro, mas destacados noutro Estado‑Membro para prestar um serviço. Por conseguinte, uma vez que se dirige aos trabalhadores por conta de outrem destacados para o território de outro Estado‑Membro, esta regulamentação é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 96/71 e da Diretiva 2006/123, e, na parte em que diz respeito ao direito de residência de nacionais de um país terceiro, pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1030/2002, da Diretiva 2003/109 e da CAAS.

61

No entanto, no que respeita, antes de mais, à Diretiva 96/71, embora esta seja suscetível de se aplicar aos trabalhadores destacados nacionais de países terceiros pelos direitos nela previstos, não deixa de ser verdade que, em conformidade com o seu considerando 20, esta diretiva não prejudica as legislações nacionais relativas às condições de entrada, residência e emprego de trabalhadores nacionais de países terceiros.

62

Em seguida, no que respeita à Diretiva 2006/123, é facto assente que, quando uma prestação de serviços está abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva, não há que examinar a medida nacional em causa à luz do artigo 56.o TFUE (v., neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2023, AUTOTECHNICA FLEET SERVICES, C‑278/22, EU:C:2023:1026, n.o 55). Todavia, decorre do artigo 17.o, ponto 9, da referida diretiva que esta não se aplica aos nacionais de países terceiros que se deslocam para outro Estado‑Membro no quadro da prestação de um serviço.

63

Por outro lado, embora o Regulamento n.o 1030/2002 tenha estabelecido um modelo uniforme de título de residência para os nacionais de países terceiros, resulta da redação do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), deste regulamento que os títulos assim emitidos por um Estado‑Membro só são válidos no seu território.

64

Do mesmo modo, o artigo 3.o, n.o 2, alínea e), da Diretiva 2003/109, menciona expressamente que esta não se aplica aos nacionais de países terceiros que tenham residência exclusivamente por motivos de caráter temporário, como trabalhadores destacados por um prestador de serviços para efeitos de prestação de serviços transfronteiriços.

65

Por último, o artigo 21.o, n.o 1, da CAAS prevê que os cidadãos estrangeiros detentores de um título de residência válido emitido por um dos Estados‑Membros podem circular livremente, ao abrigo desse título e de um documento de viagem válido, por um período máximo de 90 dias num período de 180 dias no território dos outros Estados-Membros, desde que preencham as condições de entrada a que se refere o artigo 6.o, n.o 1, alíneas a), c) e e), do Código das Fronteiras Schengen e não constem da lista nacional de pessoas indicadas do Estado‑Membro em causa. Em contrapartida, as estadas superiores a 90 dias num período de 180 dias continuam a ser da competência exclusiva dos Estados‑Membros (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2017, X e X, C‑638/16 PPU, EU:C:2017:173, n.os 44 e 51).

66

Daqui resulta que a matéria relativa à entrada e à permanência de nacionais de países terceiros no território de um Estado‑Membro, no âmbito de um destacamento efetuado por uma empresa prestadora de serviços estabelecida noutro Estado‑Membro, está abrangida por um domínio que não foi objeto de harmonização ao nível do direito da União e que, por conseguinte, uma regulamentação como a que está em causa no processo principal é suscetível de ser apreciada à luz das disposições do artigo 56.o TFUE (v., por analogia, Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria, C‑168/04, EU:C:2006:595, n.os 59 e 60).

67

Nos termos deste artigo 56.o TFUE, as restrições à livre prestação de serviços na União são proibidas em relação aos nacionais dos Estados‑Membros estabelecidos num Estado‑Membro que não seja o do destinatário da prestação. Tais restrições incluem as regulamentações nacionais que implicam encargos administrativos ou económicos suplementares ou que têm por efeito tornar a prestação de serviços entre Estados‑Membros mais difícil do que a prestação de serviços puramente interna de um Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 18 de junho de 2019, Áustria/Alemanha, C‑591/17, EU:C:2019:504, n.os 135 e 136 e jurisprudência referida) e que, a esse título, são suscetíveis de tornar menos atrativas as atividades dos prestadores de serviços estabelecidos noutros Estados‑Membros onde prestam legalmente os seus serviços.

68

Em contrapartida, em conformidade com o artigo 57.o TFUE, o direito à livre prestação de serviços implica o direito de o prestador, para efeitos da execução da prestação, exercer, a título temporário, a sua atividade no Estado‑Membro onde a prestação é realizada, nas mesmas condições que esse Estado‑Membro impõe aos seus próprios nacionais. Por conseguinte, não são, em princípio, abrangidas pelo conceito de restrição, as medidas que afetam da mesma maneira a execução da prestação de serviços entre Estados‑Membros e a prestação de serviços interna de um Estado‑Membro e cujo único efeito é o de agravar o custo da prestação em causa independentemente do prestador que a realiza (v., neste sentido, Acórdão de 18 de junho de 2019, Áustria/Alemanha, C‑591/17, EU:C:2019:504, n.o 137 e jurisprudência referida).

69

Não obstante, para não privar o artigo 56.o TFUE de efeito útil, a legislação de um Estado‑Membro, aplicável aos prestadores de serviços estabelecidos nesse Estado‑Membro, não pode ser aplicada integralmente da mesma forma às atividades transfronteiriças (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de dezembro de 1981, Webb, 279/80, EU:C:1981:314, n.o 16; de 25 de julho de 1991, Säger, C‑76/90, EU:C:1991:331, n.o 13, e de 24 de janeiro de 2002, Portugaia Construções, C‑164/99, EU:C:2002:40, n.o 17).

70

Por conseguinte, devem ser consideradas restrições à livre prestação de serviços na União as medidas que afetam a execução das prestações de serviços no território de um Estado‑Membro que, embora indistintamente aplicáveis, não têm em conta as exigências a que as atividades dos prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro, onde prestam legalmente serviços análogos, já estão sujeitas nesse Estado e que, a esse título, são suscetíveis de impedir, perturbar ou tornar menos atrativas as atividades desses prestadores nesse território.

71

No caso em apreço, é certo que a regulamentação em causa, que afeta a execução das prestações de serviços no território nacional, deve ser considerada indistintamente aplicável, uma vez que impõe não só aos prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro mas também aos estabelecidos no território nacional a obrigação de garantir que os trabalhadores que empregam, nacionais de países terceiros, sejam titulares de uma autorização de residência.

72

Não é menos verdade que, no caso de a duração das prestações de serviços realizadas pelas empresas estabelecidas noutro Estado‑Membro ser superior a três meses, essa regulamentação impõe que essas empresas cumpram formalidades suplementares relativamente àquelas a que, em conformidade com a Diretiva 2009/52, já estão sujeitas pelo Estado‑Membro onde estão estabelecidas para empregar, para efeitos da sua atividade, nacionais de países terceiros.

73

Assim, uma vez que tem por efeito tornar a prestação de serviços entre Estados‑Membros mais difícil do que a prestação de serviços puramente interna de um Estado‑Membro, deve considerar‑se que essa regulamentação prevê uma restrição à livre prestação de serviços, na aceção dos artigos 56.° e 57.° TFUE, mesmo que os prestadores de serviços estabelecidos no território nacional tenham igualmente a obrigação de pedir uma autorização de residência para empregar trabalhadores nacionais de países terceiros para realizar uma prestação de serviços análoga nesse território.

74

Segundo jurisprudência constante, uma regulamentação nacional indistintamente aplicável pode, apesar do efeito restritivo para a livre prestação de serviços, ser justificada se prosseguir uma razão imperiosa de interesse geral (v., neste sentido, Acórdão de 24 de janeiro de 2002, Portugaia Construções, C‑164/99, EU:C:2002:40, n.o 19).

75

No entanto, tal justificação só pode ser admitida se, por um lado, o interesse que a legislação em causa visa proteger não estiver já salvaguardado por regras a que o prestador está sujeito no Estado‑Membro onde está estabelecido (Acórdãos de 11 de setembro de 2014, Essent Energie Productie, C‑91/13, EU:C:2014:2206, n.o 48; de 10 de março de 2016, Safe Interenvíos, C‑235/14, EU:C:2016:154, n.o 100, e de 14 de novembro de 2018, Danieli & C. Officine Meccaniche e o., C‑18/17, EU:C:2018:904, n.o 46).

76

Por outro lado, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, essa regulamentação deve ser apta a realizar o objetivo que prossegue, o que implica que responda verdadeiramente à intenção de o alcançar de maneira coerente e sistemática (Acórdão de 14 de novembro de 2018, Memoria e Dall’Antonia, C‑342/17, EU:C:2018:906, n.o 52), e não deve ultrapassar o que é necessário para atingir esse objetivo (Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria, C‑168/04, EU:C:2006:595, n.o 37).

77

No caso em apreço, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que o Governo Neerlandês apresentou quatro justificações, que dizem respeito, primeiro, à necessidade de proteger o acesso ao mercado de trabalho nacional, segundo, à necessidade de verificar se um prestador de serviços estabelecido num Estado‑Membro diferente daquele em que a prestação é realizada não utiliza a livre prestação de serviços para um fim diferente da realização dessa prestação, terceiro, ao respeito do direito à segurança jurídica dos trabalhadores destacados, uma vez que a concessão a estes últimos de um documento de residência lhes permite provar que não residem ilegalmente no território do Estado‑Membro para o qual são destacados e, quarto, à necessidade de controlar se o trabalhador destacado não representa uma ameaça para a ordem pública.

78

No que se refere, em primeiro lugar, à proteção do acesso ao mercado nacional de trabalho, é certo que a preocupação de evitar perturbações no mercado de trabalho constitui uma razão imperiosa de interesse geral (v., neste sentido, Acórdão de 14 de novembro de 2018, Danieli & C. Officine Meccaniche e o., C‑18/17, EU:C:2018:904, n.o 48 e jurisprudência referida), visto que esta preocupação se exprime a respeito, não dos trabalhadores dos Estados‑Membros, que beneficiam, em conformidade com o artigo 45.o, n.o 3, alínea c), TFUE, do direito, sob reserva das limitações justificadas por razões de ordem pública, de segurança pública e de saúde pública, de residir noutro Estado‑Membro para nele exercer uma atividade profissional, mas de nacionais de países terceiros.

79

No entanto, há que salientar que uma legislação nacional que não se aplica apenas aos nacionais de países terceiros que são destacados, temporariamente, para exercer, no âmbito de uma operação de colocação ou de fornecimento de trabalhadores, as tarefas que lhes são confiadas sob o controlo e a autoridade de uma empresa instalada no Estado‑Membro de acolhimento mas também, como no processo principal, aos nacionais de países terceiros que são destacados pela empresa prestadora de serviços estabelecida noutro Estado‑Membro para prestar, sob o seu controlo e a sua autoridade, um serviço diferente da cedência de trabalhadores, não pode, em todo o caso, ser considerada como prosseguindo esse objetivo de forma coerente.

80

Com efeito, embora os trabalhadores abrangidos por uma operação de colocação ou de fornecimento de trabalhadores estejam ativos no mercado de trabalho do Estado‑Membro em que são destacados para esse efeito, aqueles que são destacados para prestar um serviço diferente da cedência de trabalhadores, sob o controlo e a autoridade do seu empregador, não reclamam o acesso a esse mercado, uma vez que as tarefas que desempenham são executadas sob o controlo e a autoridade do seu empregador e regressam ao seu país de origem ou de residência após o cumprimento da sua missão (v., neste sentido, Acórdão de 14 de novembro de 2018, Danieli & C. Officine Meccaniche e o., C‑18/17, EU:C:2018:904, n.o 48 e jurisprudência referida).

81

Nestas condições, a restrição à livre prestação de serviços declarada no n.o 73 do presente acórdão não pode ser justificada pela razão imperiosa de interesse geral de evitar perturbações no mercado de trabalho.

82

No que respeita, em segundo lugar, à necessidade de verificar se as empresas estabelecidas num Estado‑Membro diferente daquele em que prestam o seu serviço não utilizam a livre prestação de serviços para um fim diferente do da realização dessa prestação, o Tribunal de Justiça já admitiu que um Estado‑Membro pode controlar se essas empresas não utilizam a livre prestação de serviços para um fim diferente da realização da prestação em causa, por exemplo, o de deslocar o seu pessoal para efeitos de colocação ou de fornecimento de trabalhadores (Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria, C‑168/04, EU:C:2006:595, n.o 56), e isto apesar de a livre circulação dos trabalhadores, tal como garantida no artigo 45.o TFUE, se aplicar unicamente aos trabalhadores dos Estados‑Membros.

83

Todavia, a regulamentação nacional em causa no processo principal já exige que os prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro notifiquem as autoridades nacionais da prestação de serviços e, nessa ocasião, como resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça, a identidade dos trabalhadores que pretendem destacar, bem como a natureza e a duração da atividade. Ora, tal exigência, que, se necessário, poderia ser reforçada pela obrigação de fornecer outras informações, desde que, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2014/67, estas sejam justificadas e proporcionadas, já oferece garantias às referidas autoridades quanto à regularidade da presença no seu território de trabalhadores aí destacados e, consequentemente, do exercício, pelas empresas em causa, do seu direito à livre prestação de serviços, e isto de forma menos restritiva e tão eficaz como uma exigência de autorização de residência (v., por analogia, Acórdãos de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria, C‑168/04, EU:C:2006:595, n.o 52, e de 14 de novembro de 2018, Danieli & C. Officine Meccaniche e o., C‑18/17, EU:C:2018:904, n.o 50).

84

Por conseguinte, a restrição à livre prestação de serviços, declarada no n.o 73 do presente acórdão, também não pode ser justificada pela razão imperiosa de interesse geral que consiste em verificar se as empresas estabelecidas num Estado‑Membro diferente daquele em que realizam a sua prestação não utilizam a livre prestação de serviços para um fim diferente da realização dessa prestação.

85

No que respeita, em terceiro lugar, à garantia da segurança jurídica dos trabalhadores destacados, permitindo‑lhes provar mais facilmente que estão legalmente destacados no território do Estado‑Membro em que o serviço é prestado e, por conseguinte, que aí residem regularmente, deve admitir‑se que tal objetivo constitui uma razão imperiosa de interesse geral (v., neste sentido, Acórdão de 19 de janeiro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑244/04, EU:C:2006:49, n.os 47 a 49).

86

Ora, importa igualmente salientar, no que respeita à proporcionalidade de tal medida, que, por um lado, obrigar os prestadores de serviços estabelecidos num Estado‑Membro diferente daquele onde prestam o seu serviço a pedir uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que esses prestadores pretendam destacar, para que estes disponham materialmente de um documento seguro, constitui uma medida apta a atingir os objetivos de melhoria da segurança jurídica dos trabalhadores destacados. Com efeito, essa autorização, que, em conformidade com o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1030/2002, deve ser emitida com base no modelo uniforme nele previsto e nas especificações técnicas complementares adotadas em conformidade com o procedimento previsto por este regulamento, assegura o reconhecimento, pela autoridade pública, a um cidadão estrangeiro maior de idade do direito de residir no território nacional e prova que os trabalhadores destacados dispõem de um direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento.

87

É certo que esses trabalhadores já dispõem, em princípio, de uma autorização única, na aceção da Diretiva 2011/98, emitida com base no modelo uniforme previsto no Regulamento n.o 1030/2002, no qual figuram, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, desta diretiva, as informações relativas à autorização de trabalho de que beneficiam no Estado‑Membro em que o seu empregador está estabelecido. Na sua falta, dispõem de um título de residência emitido para fins não relacionados com trabalho, previsto no artigo 7.o, n.o 1, da referida diretiva, emitido em conformidade com o Regulamento n.o 1030/2002 e no qual se declara que estão autorizados a trabalhar no Estado‑Membro onde está estabelecido o seu empregador. Ora, decorre do artigo 2.o deste regulamento que os documentos emitidos com base no modelo uniforme previsto pelo referido regulamento respeitam padrões de proteção reforçados contra o risco de contrafação e de falsificação.

88

No entanto, dado que o legislador da União previu expressamente no artigo 3.o, n.o 2, alínea c), da Diretiva 2011/98, que esta última não se aplica aos nacionais de países terceiros destacados durante o período do seu destacamento e, no artigo 1.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1030/2002, que as autorizações de residência emitidas em conformidade com este último só são válidas para o território do Estado‑Membro que a emitiu, não se pode acusar os outros Estados‑Membros de exigirem aos trabalhadores destacados, nacionais de países terceiros, que obtenham um documento seguro emitido pelos seus próprios serviços. De resto, a circunstância de um trabalhador, nacional de um país terceiro, dispor num Estado‑Membro de uma autorização de residência e de uma autorização de trabalho não implica necessariamente que esse trabalhador possa permanecer noutro Estado‑Membro, mesmo que aí seja destacado para efeitos de uma prestação de serviços, podendo esse outro Estado‑Membro subordinar esse destacamento ao respeito de determinados requisitos, desde que as condições recordadas nos n.os 74 a 76 do presente acórdão estejam preenchidas.

89

Por outro lado, não se afigura que a regulamentação em causa no processo principal exceda o que é necessário para a realização do objetivo identificado no n.o 85 do presente acórdão. Com efeito, segundo as indicações do órgão jurisdicional de reenvio, esta regulamentação limita‑se a exigir aos prestadores de serviços, para obterem uma autorização de residência para os trabalhadores nacionais de países terceiros que pretendam destacar por um período superior a três meses, que tenham previamente notificado as autoridades competentes da prestação de serviços em causa e que lhes tenham comunicado as autorizações de residência de que dispõem esses trabalhadores no Estado‑Membro em que estão estabelecidos, bem como o seu contrato de trabalho.

90

Ora, a obrigação de notificar previamente a prestação de serviços é uma das obrigações que um Estado‑Membro pode exigir que seja respeitada quando um prestador de serviços pretende exercer o seu direito à livre prestação de serviços, ao passo que a obrigação de comunicar as autorizações de residência e os contratos de trabalho dos trabalhadores destacados é necessária para verificar se os trabalhadores em causa podem ser considerados legalmente destacados e, como tal, participam na prestação de serviços em causa.

91

Concretamente, o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de declarar que um Estado‑Membro pode exigir aos prestadores de serviços instalados noutro Estado‑Membro que o notifiquem dos serviços que pretendem prestar no seu território e que lhe forneçam, nessa ocasião, os documentos necessários para verificar se os trabalhadores que pretendem destacar estão em situação regular, designadamente no que respeita às condições de residência, de autorização de trabalho e de segurança social, no Estado‑Membro em que essa empresa os emprega (v., neste sentido, Acórdão de 19 de janeiro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑244/04, EU:C:2006:49, n.os 40 e 41 e jurisprudência referida).

92

Por conseguinte, uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, é suscetível de ser justificada pelo objetivo de melhorar a segurança jurídica dos trabalhadores destacados e de facilitar os controlos da Administração e, tendo em conta as condições de concessão das autorizações de residência descritas pelo órgão jurisdicional de reenvio, deve ser considerada proporcionada.

93

No que respeita, em quarto lugar, à justificação relativa à necessidade de controlar se o trabalhador em causa não representa uma ameaça para a ordem pública, pode salientar‑se, desde já, que o artigo 52.o, n.o 1, TFUE, para o qual remete o artigo 62.o TFUE, se refere expressamente à proteção da ordem pública como motivo suscetível de justificar uma restrição à livre prestação de serviços.

94

É certo que, em conformidade com jurisprudência constante, razões de ordem pública ou de segurança pública só podem ser invocadas em relação a uma pessoa em caso de ameaça real e suficientemente grave que afete um interesse fundamental da sociedade, e não podem, além disso, servir para fins puramente económicos (v., por analogia, Acórdão de 2 de março de 2023, PrivatBank e o., C‑78/21, EU:C:2023:137, n.o 62).

95

Todavia, não é menos verdade que deve ser possível, para os Estados‑Membros, proceder a esse controlo. Por conseguinte, o objetivo baseado na necessidade de controlar se o trabalhador em causa não representa uma ameaça para a ordem pública deve ser considerado suscetível de justificar uma restrição à livre prestação de serviços.

96

Ora, no que respeita à conformidade, à luz do princípio da proporcionalidade, de uma medida que consiste em impor às empresas estabelecidas noutro Estado‑Membro a obrigação de requererem e obterem uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que pretendam destacar para esse Estado‑Membro para realizar uma prestação de serviços de duração superior a três meses, além de essa obrigação se afigurar apta a realizar esse objetivo, não se pode considerar que essa obrigação vá além do que é necessário para esse efeito, desde que leve a recusar a permanência apenas a pessoas que representem uma ameaça real e suficientemente grave para um interesse fundamental da sociedade (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de janeiro de 2010, Comissão/Alemanha, C‑546/07, EU:C:2010:25, n.o 49, e de 14 de fevereiro de 2019, Milivojević, C‑630/17, EU:C:2019:123, n.o 67).

97

Esta interpretação não é posta em causa pela eventual existência de exigências análogas no Estado‑Membro onde o prestador de serviços está estabelecido nem pela possibilidade, salientada no Acórdão de 21 de setembro de 2006, Comissão/Áustria (C‑168/04, EU:C:2006:595, n.o 66), de proceder a um controlo da inexistência de ameaça para a ordem pública com base nas informações obtidas durante o procedimento de notificação.

98

É certo que a concessão de uma autorização de residência a trabalhadores nacionais de países terceiros já pode ter sido objeto, no Estado‑Membro em que está estabelecida a empresa que pretende proceder ao seu destacamento, de um controlo destinado a garantir que não existe risco de violação da ordem pública. No entanto, uma vez que a avaliação da ameaça que uma pessoa pode representar para a ordem pública pode variar de um país para outro e de um momento para outro (v., neste sentido, Acórdão de 27 de outubro de 1977, Bouchereau, 30/77, EU:C:1977:172, n.o 34), a existência desse controlo não pode tornar irrelevante a realização de um controlo, pelo Estado‑Membro no qual deve ser prestado o serviço, de que a permanência do interessado no seu território não gera um risco de violação da sua própria ordem pública, mesmo que, em conformidade com o artigo 21.o, n.o 1, da CAAS, esse controlo só ocorra após um prazo de três meses.

99

No que respeita ao Acórdão de 21 de setembro de 2006, Commission/Autriche (C‑168/04, EU:C:2006:595, n.o 66), é certo que o Tribunal de Justiça considerou que a proteção da ordem pública não pode justificar uma regra que exclua qualquer possibilidade de regularização de trabalhadores destacados nacionais de países terceiros em caso de entrada ilegal no território do Estado‑Membro de acolhimento, uma vez que, através das informações fornecidas no âmbito da declaração prévia ao destacamento, já era possível às autoridades nacionais competentes adotar, caso a caso, as medidas que se impunham se se verificasse que um trabalhador nacional de um país terceiro cujo destacamento estava previsto representava uma ameaça para a ordem pública e para a segurança pública, antes de este último entrar no território nacional.

100

No entanto, nesse acórdão, o Tribunal de Justiça não declarou que a exigência de o trabalhador destacado dispor de uma autorização de residência emitida pelo Estado‑Membro de acolhimento era, em si mesma, contrária ao direito da União. Com efeito, tal exigência, uma vez que é suscetível de permitir a um Estado‑Membro recolher ou verificar informações que não puderam ser recolhidas ou verificadas no âmbito do procedimento de notificação, reveste um interesse específico à luz do objetivo de prevenção das ameaças à ordem pública, que visa, nomeadamente, cumprir diferentes obrigações positivas que incumbem aos poderes públicos e que podem resultar dos direitos garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

101

Em especial, contrariamente ao procedimento de notificação que se baseia num controlo a partir de informações recebidas ou já detidas, o procedimento de autorização de residência, uma vez que exige que o interessado se apresente fisicamente nas instalações de uma autoridade competente, é suscetível de permitir uma verificação aprofundada da sua identidade, a qual reveste especial importância em matéria de luta contra as ameaças de violação da ordem pública.

102

Por conseguinte, há que considerar que o objetivo de proteção da ordem pública pode justificar que um Estado‑Membro exija que os prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro que pretendam destacar trabalhadores nacionais de países terceiros obtenham, após um período de residência de três meses no primeiro Estado‑Membro, uma autorização de residência para cada um desses trabalhadores e que, nessa ocasião, esse Estado‑Membro subordine a emissão dessa autorização à verificação de que o interessado não representa uma ameaça para a ordem pública e para a segurança pública, visto que os controlos efetuados para esse efeito não puderam ser realizados de forma fiável com base nas informações que o referido Estado‑Membro exige ou poderia razoavelmente ter exigido que fossem comunicadas no procedimento de notificação, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

103

Atendendo ao que precede, há que responder à segunda questão que o artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que prevê que, na hipótese de uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro prestar no primeiro Estado‑Membro serviços cuja duração é superior a três meses, essa empresa está obrigada a obter no Estado‑Membro de acolhimento uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que aí pretenda destacar, e que, para obter essa autorização, tem de notificar previamente a prestação de serviços em relação à qual esses trabalhadores serão destacados e tem de comunicar às autoridades do Estado‑Membro de acolhimento as autorizações de residência de que esses trabalhadores dispõem no Estado‑Membro em que está estabelecida, bem como os seus contratos de trabalho.

Quanto à terceira questão

Quanto à admissibilidade

104

O Governo Neerlandês salienta que, no processo principal, o prestador de serviços obteve autorizações de residência válidas até à data do termo da prestação de serviços controvertida, ou seja, 31 de dezembro de 2021. Por conseguinte, este Governo pergunta em que medida o órgão jurisdicional de reenvio necessita efetivamente de uma resposta à terceira questão para decidir o litígio em causa no processo principal.

105

A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo nos termos do artigo 267.o TFUE, que se baseia numa nítida separação de funções entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, o juiz nacional tem competência exclusiva para apurar e apreciar os factos do litígio no processo principal, assim como para interpretar e aplicar o direito nacional. De igual modo, cabe exclusivamente ao juiz nacional, que conhece desse litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se [Acórdãos de 7 de agosto de 2018, Banco Santander e Escobedo Cortés, C‑96/16 e C‑94/17, EU:C:2018:643, n.o 50, e de 24 de novembro de 2022, Varhoven administrativen sad (Revogação da disposição impugnada),C‑289/21, EU:C:2022:920, n.o 24].

106

Daqui resulta que a presunção de pertinência das questões prejudiciais submetidas pelos órgãos jurisdicionais nacionais só pode ser ilidida em casos excecionais (v., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2005, Pupino, C‑105/03, EU:C:2005:386, n.o 30). Assim, o Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 24 de julho de 2023, Lin, C‑107/23 PPU, EU:C:2023:606, n.o 62).

107

No caso em apreço, há que salientar, antes de mais, que as dúvidas manifestadas pelo Governo Neerlandês incidem apenas sobre a pertinência, para efeitos da resolução do litígio no processo principal, de uma das características da regulamentação referida pelo órgão jurisdicional de reenvio na sua questão, que consiste no facto de o período de validade das autorizações de residência não poder ser superior a dois anos.

108

Ora, a este respeito, é verdade que o IND, atuando em nome do Secretário de Estado, concedeu aos recorrentes no processo principal em causa autorizações de residência válidas até à data do termo da atividade em questão, tal como tinha sido notificada às autoridades competentes, ou seja, em 31 de dezembro de 2021. Não obstante, é facto assente que os recorrentes no processo principal contestam a duração da sua autorização de residência. Ora, além de não incumbir ao Tribunal de Justiça pronunciar‑se sobre as condições de admissibilidade de tais recursos no direito neerlandês, resulta dos autos que o seu empregador devia posteriormente realizar outra prestação de serviços nos Países Baixos e que, para o efeito, foi necessário apresentar novos pedidos de autorização, pelos quais foram novamente cobradas taxas administrativas.

109

Tendo em conta que não se pode excluir que o pagamento dessas taxas poderia ter sido evitado se os recorrentes no processo principal tivessem obtido autorizações de residência de duração mais longa, não é evidente que a interpretação solicitada do direito da União não tenha nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal ou que o problema seja hipotético.

110

Além disso, uma vez que o Tribunal de Justiça dispõe de todos os elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente à questão que lhe é submetida, há que declarar a terceira questão admissível na íntegra.

Quanto ao mérito

111

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 56.o TFUE se opõe a uma regulamentação nacional de um Estado‑Membro nos termos da qual, primeiro, a validade da autorização de residência suscetível de ser concedida a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado nesse Estado‑Membro não pode, seja como for, exceder um período determinado pela regulamentação nacional em causa, a qual pode assim ser inferior à que é necessária para realizar a prestação para a qual esse trabalhador está destacado, segundo, o período de validade dessa autorização de residência está limitado ao da autorização de trabalho e de residência de que o interessado dispõe no Estado‑Membro no qual o prestador de serviços está estabelecido, terceiro, a emissão da referida autorização de residência exige que sejam pagas taxas de montante superior às taxas devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União.

112

A este respeito, no que se refere, antes de mais, à circunstância de a duração da validade das autorizações de residência suscetíveis de serem concedidas não poder exceder a mesma duração fixada pela regulamentação nacional em causa, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o conceito de «serviço», na aceção do Tratado FUE, pode abranger serviços de natureza muito diferente, incluindo serviços que um operador económico estabelecido num Estado‑Membro presta de forma mais ou menos frequente ou regular, mesmo durante um período prolongado, a pessoas estabelecidas num ou em vários outros Estados‑Membros (Acórdão de 2 de setembro de 2021, Institut des Experts en Automobiles, C‑502/20, EU:C:2021:678, n.o 35 e jurisprudência referida). Por conseguinte, não se pode excluir que a prestação de serviços num Estado‑Membro, efetuada por um prestador estabelecido noutro Estado‑Membro com pessoal destacado desse outro Estado‑Membro, ultrapasse o período máximo de validade que pode ser concedido a uma autorização de residência prevista pela regulamentação nacional.

113

Não obstante, não deixa de ser verdade que, para estar abrangido pela livre prestação de serviços garantida pelo artigo 56.o TFUE, o prestador que desloca o pessoal ao abrigo da livre prestação de serviços só o pode fazer a título temporário (Acórdão de 22 de novembro 2018, Vorarlberger Landes‑ und Hypothekenbank, C‑625/17, EU:C:2018:939, n.o 36 e jurisprudência referida) e que, por conseguinte, os Estados‑Membros devem poder atribuir um período de validade às autorizações de residência que concedem aos trabalhadores nacionais de países terceiros destacados no seu território.

114

É certo que o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2014/67 prevê que os Estados‑Membros podem exigir aos prestadores de serviços estabelecidos noutro Estado‑Membro que notifiquem as autoridades nacionais da prestação de serviços e, nessa ocasião, da identidade dos trabalhadores que pretendem destacar, bem como da natureza e da duração da atividade. Por conseguinte, esta disposição dá a essas autoridades, no momento da referida notificação, a possibilidade de apreciar as tarefas que devem ser efetuadas durante esse destacamento e o tempo necessário para a sua realização.

115

No entanto, mesmo quando um Estado‑Membro tenha feito uso desta faculdade, o facto de prever que a validade das autorizações de residência concedidas não pode, em nenhum caso, exceder um certo período, que é determinado pela regulamentação nacional em causa, não se afigura, por si só, contrário ao direito da União, mesmo que esse período possa, assim, ser inferior ao necessário para a realização da prestação para a qual esses trabalhadores estão destacados. Com efeito, é jurisprudência constante que uma medida nacional que não tenha por objeto regular as condições relativas ao exercício da prestação de serviços das empresas em causa e cujos efeitos restritivos que possa produzir sobre a livre prestação de serviços são demasiado aleatórios e demasiado indiretos para que possa ser considerada suscetível de restringir esta liberdade não é contrária à proibição prevista no artigo 56.o TFUE (Acórdão de 27 de outubro de 2022, Instituto do Cinema e do Audiovisual, C‑411/21, EU:C:2022:836, n.o 29).

116

Ora, o facto de prever que a validade das autorizações concedidas pelo Estado‑Membro de acolhimento não pode, em nenhum caso, exceder uma certa duração, não tem por objeto regular as condições de exercício do direito à livre prestação de serviços das empresas estabelecidas noutro Estado‑Membro, uma vez que tal limite é igualmente aplicável às empresas desse Estado‑Membro que empregam nacionais de países terceiros e não é suscetível de impedir, dificultar ou tornar menos atrativo o exercício, pelo empregador, do seu direito à livre prestação de serviços de forma suficientemente certa e direta se esse período inicial de validade for manifestamente demasiado curto para responder às necessidades da maioria dos prestadores de serviços ou se, em todo o caso, só for possível obter a renovação mediante o cumprimento de formalidades excessivas.

117

No que respeita, em seguida, ao facto de as autorizações de residência suscetíveis de ser concedidas, por um Estado‑Membro, aos trabalhadores nacionais de países terceiros destacados nesse Estado‑Membro por um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro não poderem ter um período de validade superior ao das autorizações de trabalho detidas pelos interessados nesse outro Estado‑Membro, importa recordar que a livre prestação de serviços, garantida pelo artigo 56.o TFUE, só pode ser invocada por prestadores estabelecidos num Estado‑Membro diferente daquele onde a prestação deve ser executada, onde prestam legalmente serviços análogos (v., neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2016, Safe Interenvíos, C‑235/14, EU:C:2016:154, n.o 98).

118

Uma vez que um prestador de serviços só pode prestar legalmente os seus serviços no Estado‑Membro em que está estabelecido e, por conseguinte, só pode beneficiar da livre prestação de serviços se os trabalhadores que emprega forem contratados em conformidade com o direito desse Estado‑Membro, o facto de um Estado‑Membro limitar o período de validade das autorizações de residência que concede aos nacionais de países terceiros destacados no seu território à duração das autorizações de trabalho de que estes são titulares no Estado‑Membro onde está estabelecido esse prestador, não pode ser considerado uma violação do seu direito à livre prestação de serviços.

119

Por último, no que respeita ao facto de as taxas devidas pela concessão de uma autorização de residência a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado para um Estado‑Membro por uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro, embora de montante igual ao das taxas devidas no âmbito de uma autorização de residência normal para efeitos do exercício de uma atividade profissional por um nacional de um país terceiro, serem superiores ao montante das taxas devidas pela concessão de um atestado de residência a um cidadão da União, é jurisprudência constante que, em conformidade com o princípio da proporcionalidade, para que uma medida que exige o pagamento de taxas em contrapartida da emissão, por um Estado‑Membro, de uma autorização de residência possa ser considerada compatível com o artigo 56.o TFUE, o montante dessas taxas não pode ser excessivo ou desmedido (v., por analogia, Acórdão de 22 de janeiro de 2002, Canal Satélite Digital, C‑390/99, EU:C:2002:34, n.o 42).

120

Não obstante, não deixa de ser verdade que o caráter excessivo ou desmedido e, consequentemente, desproporcionado do montante das taxas devidas deve ser apreciado à luz do custo gerado pelo tratamento desse pedido e que o Estado‑Membro em causa deve, assim, suportar.

121

Por conseguinte, a circunstância de as taxas pedidas para a emissão de uma autorização de residência a favor de um trabalhador destacado nacional de um país terceiro serem superiores às pedidas para um atestado de residência para um cidadão da União não basta, em princípio, para demonstrar, por si só, que o montante dessas taxas é excessivo ou desmedido e, por conseguinte, viola o artigo 56.o TFUE, mas pode constituir um indício sério do caráter desproporcionado desse montante, se as tarefas que a administração deve desempenhar para conceder essa autorização de residência, tendo em conta, nomeadamente, os requisitos impostos pela regulamentação nacional em causa para esse efeito, bem como os custos de produção do documento seguro correspondente, forem equivalentes aos custos necessários para a concessão de um atestado de residência a um cidadão da União, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar.

122

Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder à terceira questão que o artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual, primeiro, a validade da autorização de residência suscetível de ser concedida a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado nesse Estado‑Membro não pode, seja como for, exceder um período determinado pela regulamentação nacional em causa, a qual pode assim ser inferior à necessária para a realização da prestação para a qual esse trabalhador está destacado, segundo, o período de validade dessa autorização de residência está limitado ao da autorização de trabalho e de residência de que o interessado dispõe no Estado‑Membro no qual o prestador de serviços está estabelecido e, terceiro, para a emissão da referida autorização de residência é necessário proceder ao pagamento de taxas de montante superior às taxas devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União, desde que, antes de mais, o período inicial de validade dessa mesma autorização não seja manifestamente demasiado curto para responder às necessidades da maioria dos prestadores de serviços, em seguida, seja possível obter a renovação dessa autorização sem ter de cumprir formalidades excessivas e, por último, esse montante corresponda aproximadamente ao custo administrativo do tratamento de um pedido de obtenção dessa autorização.

Quanto às despesas

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Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

1)

Os artigos 56.° e 57.° TFUE devem ser interpretados no sentido de que não deve ser automaticamente reconhecido aos trabalhadores nacionais de países terceiros destacados num Estado‑Membro por um prestador de serviços estabelecido noutro Estado‑Membro um «direito de residência derivado» no Estado‑Membro onde trabalham ou no Estado‑Membro para onde são destacados.

 

2)

O artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro que prevê que, na hipótese de uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro prestar no primeiro Estado‑Membro serviços cuja duração é superior a três meses, essa empresa está obrigada a obter no Estado‑Membro de acolhimento uma autorização de residência para cada trabalhador nacional de um país terceiro que aí pretenda destacar, e que, para obter essa autorização, tem de notificar previamente a prestação de serviços em relação à qual esses trabalhadores serão destacados e tem de comunicar às autoridades do Estado‑Membro de acolhimento as autorizações de residência de que esses trabalhadores dispõem no Estado‑Membro em que está estabelecida, bem como os seus contratos de trabalho.

 

3)

O artigo 56.o TFUE deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação de um Estado‑Membro nos termos da qual, primeiro, a validade da autorização de residência suscetível de ser concedida a um trabalhador nacional de um país terceiro destacado nesse Estado‑Membro não pode, seja como for, exceder um período determinado pela regulamentação nacional em causa, a qual pode assim ser inferior à necessária para a realização da prestação para a qual esse trabalhador está destacado, segundo, o período de validade dessa autorização de residência está limitado ao da autorização de trabalho e de residência de que o interessado dispõe no Estado‑Membro no qual o prestador de serviços está estabelecido e, terceiro, para a emissão da referida autorização de residência é necessário proceder ao pagamento de taxas de montante superior às taxas devidas pela emissão de um atestado de residência legal a um cidadão da União, desde que, antes de mais, o período inicial de validade dessa mesma autorização não seja manifestamente demasiado curto para responder às necessidades da maioria dos prestadores de serviços, em seguida, seja possível obter a renovação dessa autorização sem ter de cumprir formalidades excessivas e, por último, esse montante corresponda aproximadamente ao custo administrativo do tratamento de um pedido de obtenção dessa autorização.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.