ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

9 de março de 2023 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — União aduaneira — Pauta‑aduaneira comum — Classificação pautal — Nomenclatura combinada — Subposição 94019080 — Partes de assentos para veículos automóveis — Rede para fabrico de bolsas para a parte posterior dos assentos — Proteção para o interior dos assentos»

No processo C‑725/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal, Eslovénia), por Decisão de 10 de novembro de 2021, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 30 de novembro de 2021, no processo

SOMEO S.A., anteriormente PEARL STREAM S.A.

contra

Republika Slovenija,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: D. Gratsias, presidente de secção, I. Jarukaitis e Z. Csehi (relator), juízes,

advogado‑geral: A. Rantos,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação do Governo esloveno, por N. Pintar Gosenca, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por U. Babovič, A. Kraner e M. Salyková, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto, em substância, a interpretação da posição pautal 9401 da nomenclatura combinada (a seguir «NC») que figura no anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO 1987, L 256, p. 1), nas suas versões resultantes do Regulamento de Execução (UE) n.o 1101/2014 da Comissão, de 16 de outubro de 2014 (JO 2014, L 312, p. 1), do Regulamento de Execução (UE) 2015/1754 da Comissão, de 6 de outubro de 2015 (JO 2015, L 285, p. 1), e do Regulamento de Execução (UE) 2016/1821 da Comissão, de 6 de outubro de 2016 (JO 2016, L 294, p. 1).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a SOMEO S.A. à Republika Slovenija, representada pelo Ministrstvo za finance (Ministério das Finanças, Eslovénia), a respeito da classificação pautal, na subposição 94019080 da NC, de mercadorias importadas por esta sociedade para a Eslovénia e declaradas como partes de assentos para veículos automóveis.

Quadro jurídico

SH

3

O Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (a seguir «SH») foi instituído pela Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias, celebrada em Bruxelas, em 14 de junho de 1983, no âmbito da Organização Mundial das Alfândegas (OMA), e aprovada, com o seu Protocolo de alteração de 24 de junho de 1986, em nome da Comunidade Económica Europeia, pela Decisão 87/369/CEE do Conselho, de 7 de abril de 1987 (JO 1987, L 198, p. 1). As notas explicativas do SH são elaboradas pela OMA, em conformidade com as disposições desta convenção.

4

Por força do artigo 3.o, n.o 1, da Convenção sobre o SH, cada parte contratante compromete‑se a aplicar as Regras Gerais de Interpretação do SH, bem como todas as notas de secção, de capítulo e de subposição e a não modificar a estrutura das secções, dos capítulos, das posições ou das subposições do SH.

5

As notas explicativas do SH, na sua versão de 2012, enunciam, no que respeita ao capítulo 94 deste, intitulado «Móveis; mobiliário médico‑cirúrgico; colchões, almofadas e semelhantes; aparelhos de iluminação não especificados nem compreendidos noutros capítulos; anúncios, cartazes ou tabuletas e placas indicadoras, luminosos e artigos semelhantes; construções prefabricadas»:

«1. O presente Capítulo não compreende:

[…]

3.

A) Não se consideram partes dos artigos das posições 9401 a 9403, quando isoladas, as chapas ou placas, de vidro (incluindo os espelhos), mármore ou outras pedras, ou de quaisquer outras matérias incluídas nos Capítulos 68 ou 69, mesmo em forma própria, mas não combinadas com outros elementos.

[…]

CONSIDERAÇÕES GERAIS

O presente capítulo engloba, ressalvadas as exceções mencionadas nas Notas Explicativas deste Capítulo:

1) O conjunto dos móveis, bem como as suas partes (posições 9401 a 9403).

[…]

PARTES

O presente Capítulo cobre apenas as partes dos produtos das posições 9401 a 9403 e 9405. Consideram‑se como tais os artefactos, mesmo simplesmente esboçados, que, pela sua forma ou outras características, sejam reconhecíveis como tendo sido concebidos exclusiva ou principalmente para um artefacto dessas posições e que não sejam incluídos mais especificamente em outra posição.

[…]»

6

No que respeita à posição 9401, intitulada «Assentos (exceto os da posição 9402), mesmo transformáveis em camas, e suas partes», essas notas explicativas precisam, no que respeita ao conceito de «partes», na aceção desta posição:

«A presente posição também abrange as partes de assentos reconhecíveis como tais e, nomeadamente, os encostos, fundos e braços, mesmo empalhados, revestidos de cana, acolchoados ou com molas, bem como os conjuntos de molas espirais que se empregam para o estofamento dos referidos assentos.

[…]»

7

No que respeita a este conceito, as notas explicativas do SH, na sua versão de 2017, enunciam que este visa, além disso, «as capas destinadas a ser fixadas permanentemente a assentos ou encostos de assentos».

NC

8

Como resulta do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2658/87, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 254/2000 do Conselho, de 31 de janeiro de 2000 (JO 2000, L 28, p. 16) (a seguir «Regulamento n.o 2658/87»), a NC, estabelecida pela Comissão Europeia, regula a classificação pautal das mercadorias importadas para a União Europeia. Segundo o artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2658/87, a NC reproduz as posições e as subposições com seis algarismos do SH e só o sétimo e oitavo algarismos formam subdivisões próprias.

9

Nos termos do artigo 12.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2658/87, a Comissão adotará anualmente um regulamento com a versão completa da NC e das taxas dos direitos em conformidade com o artigo 1.o, tal como resulta das medidas aprovadas pelo Conselho ou pela Comissão. Este último regulamento é publicado no Jornal Oficial da União Europeia até 31 de outubro e é aplicável a partir de 1 de janeiro do ano seguinte.

10

Os Regulamentos de Execução n.os 1101/2014, 2015/1754 e 2016/1821 foram adotados com base nesta disposição. Cada um destes regulamentos de execução alterou a NC a partir, respetivamente, de 1 de janeiro de 2015, de 1 de janeiro de 2016 e de 1 de janeiro de 2017. No entanto, a redação das disposições desta nomenclatura pertinentes para o processo principal permaneceu inalterada.

11

Nos termos das Regras Gerais para a interpretação da NC, que figuram no anexo I, primeira parte, título I, secção A, nas suas versões resultantes de cada um dos referidos regulamentos de execução:

«A classificação das mercadorias na [NC] rege‑se pelas seguintes Regras:

1.

Os títulos das Secções, Capítulos e Subcapítulos têm apenas valor indicativo. Para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das Notas de Secção e de Capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e Notas, pelas Regras seguintes:

[…]

3.

Quando pareça que a mercadoria pode classificar‑se em duas ou mais posições por aplicação da Regra 2 b) ou por qualquer outra razão, a classificação deve efetuar‑se da forma seguinte:

a)

A posição mais específica prevalece sobre as mais genéricas. Todavia, quando duas ou mais posições se refiram, cada uma delas, a apenas uma parte das matérias constitutivas de um produto misturado ou de um artigo composto, ou a apenas um dos componentes de sortidos acondicionados para venda a retalho, tais posições devem considerar‑se, em relação a esses produtos ou artigos, como igualmente específicas, ainda que uma delas apresente uma descrição mais precisa ou completa da mercadoria.

b)

Os produtos misturados, as obras compostas de matérias diferentes ou constituídas pela reunião de artigos diferentes e as mercadorias apresentadas em sortidos acondicionados para venda a retalho, cuja classificação não se possa efetuar pela aplicação da Regra 3 a), classificam‑se pela matéria ou artigo que lhes confira a característica essencial, quando for possível realizar esta determinação.

c)

Nos casos em que as Regras 3 a) e 3 b) não permitam efetuar a classificação, a mercadoria classifica‑se na posição situada em último lugar na ordem numérica, dentre as suscetíveis de validamente se tomarem em consideração.

[…]»

12

A segunda parte deste anexo I, intitulada «Tabela de Direitos», contém uma secção VII, intitulada «Plásticos e suas obras; borracha e suas obras». Esta secção inclui um capítulo 39, intitulado «Plástico e suas obras». Segundo a nota 2, alínea x), deste capítulo, este último não compreende «[o]s artigos do Capítulo 94 (por exemplo, móveis, aparelhos de iluminação, sinais luminosos, construções prefabricadas)».

13

Esta segunda parte contém, além disso, uma secção XI, intitulada «Matérias têxteis e suas obras». Segundo a nota 1, alínea s), desta secção, esta última não compreende «os artigos do Capítulo 94 (por exemplo, móveis, colchões, almofadas e semelhantes e aparelhos de iluminação)». A referida secção contém um capítulo 63, intitulado «Outros artigos têxteis confecionados; sortidos; artigos de matérias têxteis e artigos de uso semelhante, usados; trapos». Segundo a nota 1 deste capítulo 63, o seu subcapítulo I, intitulado «Outros artigos têxteis confecionados», compreende «artigos de qualquer matéria têxtil [e] só se aplica a artigos confecionados».

14

A segunda parte da NC contém ainda uma secção XX, intitulada «Mercadorias e produtos diversos», na qual figura um capítulo 94, intitulado «Móveis; mobiliário médico‑cirúrgico; colchões, almofadas e semelhantes; aparelhos de iluminação não especificados nem compreendidos noutros capítulos; anúncios, cartazes ou tabuletas e placas indicadoras, luminosos e artigos semelhantes; construções prefabricadas».

15

As notas 1 e 3 deste capítulo 94 enunciam:

«1.

O presente Capítulo não compreende:

[…]

d)

As partes de uso geral, na aceção da Nota 2 da Secção XV, de metais comuns (Secção XV), os artigos semelhantes de plástico (Capítulo 39) e os cofres‑fortes da posição 8303;

[…]

3.

A)

Não se consideram partes dos artigos das posições 9401 a 9403, quando isoladas, as chapas ou placas, de vidro (incluindo os espelhos), mármore ou outras pedras, ou de quaisquer outras matérias incluídas nos Capítulos 68 ou 69, mesmo em forma própria, mas não combinadas com outros elementos.

B)

Os artigos da posição 9404, apresentados isoladamente, permanecem ali classificados, mesmo que constituam partes de móveis das posições 9401 a 9403.»

16

O referido capítulo compreende, nomeadamente, a posição 9401, que tem a seguinte redação:

«Código NC

Designação das mercadorias

Taxas dos direitos convencionais (%)

Unidade suplementar

1

2

3

4

9401

Assentos (exceto os da posição 9402), mesmo transformáveis em camas, e suas partes

 

 

[…]

[…]

[…]

 

9401 90

— Partes:

 

 

9401 90 10

— — De assentos do tipo utilizado em veículos aéreos

1,7

 

— — Outros

 

 

9401 90 30

— — — De madeira

2,7

9401 90 80

— — — Outros

2,7

—»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17

Entre agosto de 2015 e junho de 2017, a recorrente no processo principal declarou, na subposição 94019080 da NC, as mercadorias «rede para fabrico de bolsas para a parte posterior dos assentos — Bend and net» (a seguir «rede para fabrico de bolsas» e «proteção do assento — Skirt assy» (a seguir «proteção do assento»), qualificados de partes de assentos para veículos automóveis, para efeitos da sua introdução em livre prática.

18

Na sequência de um controlo a posteriori das declarações em causa, a autoridade fiscal de primeira instância considerou que essas mercadorias não deviam ser classificadas na subposição 94019080 da NC e, por Decisão de 13 de julho de 2018, condenou a recorrente no processo principal no pagamento do montante de 298810,52 euros, a título de direitos aduaneiros sobre as referidas mercadorias, acrescidos de juros de mora. Segundo essa autoridade, o produto «rede para fabrico de bolsas» devia ser classificado na subposição 63079010 da NC, que diz respeito a outros artigos confecionados de malha, e o produto «proteção do assento», na subposição 39269097 da NC, que diz respeito a outras obras de plástico, uma vez que esses produtos não podiam ser considerados partes de assentos para automóveis e deviam ser qualificados de acessórios.

19

O Ministério das Finanças, na qualidade de autoridade fiscal de segunda instância, negou provimento ao recurso interposto pela recorrente no processo principal contra essa decisão. Precisou que a posição 9401 da NC, que inclui determinadas partes de assentos, não se aplicava a acessórios, como os referidos produtos. Com efeito, no seu entender, por um lado, a proteção do assento não constitui um suporte sem o qual o assento não pode cumprir a sua função essencial e principal e, por outro, a rede para fabrico de bolsas, que é fixada na proteção em plástico à parte posterior do assento de um veículo, tem apenas uma função acessória de arrumação de pequenos objetos, pelo que, sem essa rede, o assento conserva todas as suas funções principais.

20

Por Sentença de 23 de junho de 2020, o Upravno sodišče (Tribunal Administrativo, Eslovénia) confirmou a classificação pautal efetuada pelas autoridades fiscais. Esse órgão jurisdicional considerou, nomeadamente, que o facto de uma mercadoria se destinar exclusivamente a um modelo específico de máquina ou de objeto não é determinante para efeitos da qualificação dessa mercadoria como «parte» ou «acessório».

21

A recorrente no processo principal interpôs recurso de «Revision» dessa sentença no órgão jurisdicional de reenvio. Sustenta que os produtos em causa no processo principal deveriam ter sido classificados na posição 94019080 da NC, uma vez que a proteção do assento não é um produto de utilização geral nem um produto semelhante de plástico abrangido pelo capítulo 39 da NC. Uma rede para fabrico de bolsas não é um produto têxtil abrangido pelo capítulo 63 da NC. Segundo a recorrente no processo principal, estes dois produtos são utilizados exclusivamente para os assentos dos automóveis e, se não forem instalados nestes últimos, não têm utilização autónoma. Sustenta igualmente que a não instalação da proteção do assento impede a utilização efetiva deste, uma vez que não se trata de um acessório estético ou substituível, mas de uma funcionalidade suplementar do assento, a saber, o reforço e a proteção da própria estrutura do assento, que é essencial do ponto de vista da segurança. Do mesmo modo, a rede para fabrico de bolsas não é um acessório estético ou substituível de um assento, mas tem uma funcionalidade suplementar, a saber, de suporte e de proteção.

22

Por Despacho de 18 de novembro de 2020, o órgão jurisdicional de reenvio admitiu a «Revision» da referida sentença.

23

No que diz respeito ao produto «rede para fabrico de bolsas», esse órgão jurisdicional observa que este produto se apresenta sob a forma de uma rede elástica de malha, que mede 30 × 20 cm, produzida com filamentos sintéticos, de cor negra, com uma tira de plástico, num dos lados, cozida longitudinalmente para a fixar na parte posterior do assento do automóvel. Quanto ao produto «proteção do assento», o referido órgão jurisdicional indica que este é de plástico e recoberto de feltro e que é montado atrás e sob o assento do automóvel para proteger o seu interior.

24

Segundo o mesmo órgão jurisdicional, a classificação dos produtos em causa no processo principal na NC depende da interpretação do conceito de «partes» constante da posição 9401 da NC e, portanto, da interpretação do direito da União. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se este conceito tem o mesmo alcance que o previsto noutros capítulos da NC que já foram objeto de interpretação pelo Tribunal de Justiça, o que significaria que apenas um produto sem o qual o assento não pode exercer a sua função essencial e principal constitui uma parte desse assento. Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio observa que das notas explicativas do SH pode resultar uma interpretação mais ampla do conceito de «partes» na aceção do capítulo 94 da NC do que a que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

25

Nestas condições, o Vrhovno sodišče (Supremo Tribunal, Eslovénia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Para efeitos da classificação de um determinado produto como “parte” de um assento para veículos automóveis na aceção do Capítulo 94 da [NC], nas versões aplicáveis ao processo principal, é necessário que o assento, sem o referido produto, não possa cumprir a sua função essencial e principal (no sentido da sua unidade funcional), ou é suficiente que a parte em causa, destinada exclusivamente a ser instalada em assentos de automóveis, possa ser reconhecida como parte do assento?

2)

A possibilidade de uma utilização geral (não) autónoma dos dois produtos em causa é relevante para a sua classificação (ou não) na subposição 94019080?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

26

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a posição 9401 da NC deve ser interpretada no sentido de que o conceito de «partes» de um assento de um veículo automóvel abrange mercadorias que não são indispensáveis para que esse assento possa cumprir a sua função.

27

A título preliminar, importa recordar que, quando é chamado a conhecer de um pedido prejudicial em matéria de classificação pautal, a função do Tribunal de Justiça consiste em esclarecer o órgão jurisdicional de reenvio sobre os critérios cuja aplicação lhe permitirá classificar corretamente os produtos em causa na NC e não em proceder ele próprio a essa classificação. Esta classificação resulta de uma apreciação puramente factual que não cabe ao Tribunal de Justiça efetuar no âmbito de um reenvio prejudicial (v. Acórdão de 20 de outubro de 2022, Mikrotīkls, C‑542/21, EU:C:2022:814, n.o 21 e jurisprudência referida).

28

Importa igualmente recordar que, em conformidade com a Regra Geral 1 para a interpretação da NC, a classificação pautal das mercadorias é determinada pelos textos das posições e das notas de secção e de capítulo desta nomenclatura. para garantir a segurança jurídica e a facilidade dos controlos, o critério decisivo para a classificação pautal das mercadorias deve ser procurado, de uma maneira geral, nas suas características e propriedades objetivas, tal como definidas no teor da posição em causa da referida nomenclatura e das notas de secção ou de capítulo correspondentes (Acórdão de 20 de outubro de 2022, Mikrotīkls, C‑542/21, EU:C:2022:814, n.o 22 e jurisprudência referida).

29

Além disso, o Tribunal de Justiça tem declarado reiteradamente que, apesar de as notas explicativas do SH não terem força vinculativa, constituem instrumentos importantes para assegurar a aplicação uniforme da pauta aduaneira comum e fornecem, enquanto tais, elementos válidos para a sua interpretação (Acórdão de 20 de outubro de 2022, Lukoyl Mikrotīkls, C‑542/21, EU:C:2022:814, n.o 23 e jurisprudência referida).

30

No que respeita à posição 9401 da NC, há que observar que a sua redação compreende os assentos e as suas partes. Estas últimas pertencem à subposição 940190, intitulada «partes», e classificam‑se numa das três subposições específicas de oito algarismos previstas para este efeito. Cumpre ainda constatar que as mercadorias em causa no processo principal, a saber, a «rede para fabrico de bolsas» e a «proteção do assento», não são mencionadas em nenhuma destas subposições com oito algarismos.

31

A NC não define o conceito de «partes» na aceção da posição 9401 da NC. Importa igualmente salientar que a nota 3, alínea A), do capítulo 94 da NC, que diz respeito a chapas ou placas, de vidro, mármore ou outras pedras, ou de quaisquer outras matérias incluídas nos capítulos 68 ou 69, isto é, produtos diferentes dos que estão em causa no processo principal, não permite retirar indicações úteis no que respeita à interpretação deste conceito. Por outro lado, as notas explicativas da NC pertinentes no quadro do litígio no processo principal, que foram adotadas pela Comissão ao abrigo do artigo 9.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 2658/87 e publicadas no Jornal Oficial da União Europeia de 4 de março de 2015 (JO 2015, C 76, p. 1), não contêm nenhuma precisão sobre o referido conceito.

32

As notas explicativas do SH, na sua versão de 2012, enunciam que o capítulo 94 cobre apenas as partes dos produtos das posições 9401 a 9403 e 9405 e que se consideram como tais os artefactos, mesmo simplesmente esboçados, que, pela sua forma ou outras características, sejam reconhecíveis como tendo sido concebidos exclusiva ou principalmente para um artefacto dessas posições e que não sejam incluídos mais especificamente em outra posição. Além disso, resulta destas notas que a posição 9401 abrange as partes de assentos reconhecíveis como tais e, especialmente, os encostos, fundos e braços, bem como os conjuntos de molas espirais que se empregam para o estofamento dos referidos assentos. As notas explicativas do SH, na sua versão de 2017, precisam que as capas destinadas a ser fixadas permanentemente a assentos ou encostos de assentos são igualmente abrangidas por esta posição 9401, enquanto «partes» de assentos.

33

Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, desenvolvida no contexto dos capítulos 84 e 85 da secção XVI e do capítulo 90 da secção XVIII da NC, que o conceito de «partes» implica a presença de um todo para cujo funcionamento estas são indispensáveis. Resulta desta jurisprudência que, para poder qualificar um produto de «parte», na aceção dos referidos capítulos, não basta demonstrar que, sem esse produto, a máquina ou o aparelho não está em condições de responder às necessidades a que se destina. É ainda necessário demonstrar que o funcionamento mecânico ou elétrico da máquina ou do aparelho em causa é condicionado pelo referido produto (Acórdão de 8 de dezembro de 2016, Lemnis Lighting, C‑600/15, EU:C:2016:937, n.o 48 e jurisprudência referida).

34

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, para uma aplicação coerente e uniforme da pauta aduaneira comum, o conceito de «partes» na aceção de um determinado capítulo da NC deveria ser objeto da mesma definição que a resultante da jurisprudência relativa a outros capítulos da NC (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 2013, HARK, C‑450/12, EU:C:2013:824, n.o 37; de 8 de dezembro de 2016, Lemnis Lighting, C‑600/15, EU:C:2016:937, n.o 52, e de 15 de maio de 2019, Korado, C‑306/18, EU:C:2019:414, n.o 44).

35

Além disso, o Tribunal de Justiça já teve oportunidade de precisar que esta definição do conceito de «partes» se aplica igualmente no contexto do capítulo 94 da NC. Assim, o Tribunal de Justiça considerou que o conceito de «partes» de aparelhos de iluminação não abrange as mercadorias que não são indispensáveis para o funcionamento desses aparelhos (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2016, Lemnis Lighting, C‑600/15, EU:C:2016:937, n.os 51 a 53).

36

O mesmo sucede no que respeita às «partes» de assentos na aceção da posição 9401 da NC.

37

Por conseguinte, as mercadorias só podem ser consideradas «partes» de assentos, na aceção desta posição, na condição de serem indispensáveis para que os assentos em causa possam cumprir a sua função.

38

A circunstância mencionada pelo órgão jurisdicional de reenvio segundo a qual resulta das notas explicativas do SH relativas à posição 9401 do mesmo que esta posição abrange também os braços não põe em causa a conclusão enunciada no número anterior. Com efeito, como sublinha a Comissão nas suas observações escritas, um assento pode ser concebido de diversas maneiras e inclui, em princípio, não só uma parte na qual a pessoa está efetivamente sentada, mas também um encosto ou os braços que apoiam as costas ou os braços da pessoa sentada nesse assento. Tais elementos são, portanto, partes integrantes de um assento especificamente concebido e constituem, assim, um elemento essencial da sua estrutura. Por conseguinte, estes elementos tornam‑se indispensáveis para que esse assento possa cumprir a sua função. Isto é igualmente válido para as capas destinadas a ser fixadas permanentemente a assentos ou encostos de assentos, que são expressamente mencionadas nas notas explicativas do SH, na sua versão de 2017, como «partes» de assentos na aceção da referida posição.

39

No caso em apreço, não resulta das constatações factuais efetuadas pelo órgão jurisdicional de reenvio que as mercadorias em causa no processo principal sejam indispensáveis para que um assento de um veículo automóvel possa cumprir a sua função, o que, no entanto, caberá a esse órgão jurisdicional verificar. Após essa verificação e tendo em conta as características objetivas destas mercadorias, caberá ao referido órgão jurisdicional proceder à sua classificação pautal.

40

Nestas condições, há que responder à primeira questão que a posição 9401 da NC deve ser interpretada no sentido de que o conceito de «partes» de um assento de um veículo automóvel não abrange mercadorias que não são indispensáveis para que esse assento possa cumprir a sua função.

Quanto à segunda questão

41

Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

Quanto às despesas

42

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

A posição 9401 da nomenclatura combinada, que figura no anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum, nas suas versões resultantes do Regulamento (UE) n.o 1101/2014 do Conselho, de 16 de outubro de 2014, do Regulamento de Execução (UE) 2015/1754 da Comissão, de 6 de outubro de 2015, e do Regulamento de Execução (UE) 2016/1821 da Comissão, de 6 de outubro de 2016,

 

deve ser interpretada no sentido de que:

 

o conceito de «partes» de um assento de um veículo automóvel não abrange mercadorias que não são indispensáveis para que esse assento possa cumprir a sua função.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: esloveno.