ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

15 de dezembro de 2022 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Emprego e política social — Trabalho temporário — Diretiva 2008/104/CE — Artigo 5.o — Princípio da igualdade de tratamento — Necessidade de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários em caso de derrogação deste princípio — Convenção coletiva que prevê uma remuneração inferior à do pessoal recrutado diretamente pelo utilizador — Proteção jurisdicional efetiva — Fiscalização jurisdicional»

No processo C‑311/21,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal, Alemanha), por Decisão de 16 de dezembro de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 18 de maio de 2021, no processo

CM

contra

TimePartner Personalmanagement GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: A. Prechal, presidente de secção, L. Arastey Sahún (relatora), F. Biltgen, N. Wahl e J. Passer, juízes,

advogado‑geral: A. M. Collins,

secretário: S. Beer, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 5 de maio de 2022,

vistas as observações apresentadas:

em representação de CM, por R. Buschmann e T. Heller, Prozessbevollmächtigte,

em representação da TimePartner Personalmanagement GmbH, por O. Bertram, M. Brüggemann e A. Förster, Rechtsanwälte,

em representação do Governo alemão, por J. Möller e D. Klebs, na qualidade de agentes,

em representação do Governo sueco, por H. Eklinder, J. Lundberg, C. Meyer‑Seitz, A. Runeskjöld, M. Salborn Hodgson, R. Shahsavan Eriksson, H. Shev e O. Simonsson, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann e D. Recchia, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 14 de julho de 2022,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o da Diretiva 2008/104/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa ao trabalho temporário (JO 2008, L 327, p. 9).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a CM à TimePartner Personalmanagement GmbH (a seguir «TimePartner») relativo ao montante da remuneração devida pela TimePartner pelo trabalho temporário prestado por CM a um utilizador.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos 10 a 12, 16 e 19 da Diretiva 2008/104 indicam:

«(10)

Na União Europeia, a cedência temporária de trabalhadores e a respetiva situação jurídica, o estatuto e as condições de trabalho dos trabalhadores temporários caracterizam‑se por uma grande diversidade.

(11)

O trabalho temporário responde não só às necessidades de flexibilidade das empresas, mas também à necessidade de os trabalhadores conciliarem a vida privada e profissional. Contribui deste modo para a criação de empregos, bem como para a participação e inserção no mercado de trabalho.

(12)

A presente diretiva estabelece um quadro de proteção para os trabalhadores temporários que se caracteriza pela não discriminação, pela transparência e proporcionalidade, sem deixar de respeitar a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais.

[…]

(16)

Para enfrentar de forma flexível a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais, os Estados‑Membros podem dar aos parceiros sociais a possibilidade de definirem as condições de trabalho e emprego, desde que seja respeitado o nível geral de proteção dos trabalhadores temporários.

[…]

(19)

A presente diretiva não afeta a autonomia dos parceiros sociais nem deverá afetar as relações entre eles, nomeadamente o direito de negociar e celebrar convenções coletivas de acordo com as legislações e práticas nacionais, no respeito pelo primado do direito comunitário.»

4

Nos termos do artigo 2.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objetivo»:

«A presente diretiva tem como objetivo assegurar a proteção dos trabalhadores temporários e melhorar a qualidade do trabalho temporário, assegurando que o princípio da igualdade de tratamento, tal como definido no artigo 5.o é aplicável aos trabalhadores temporários, reconhecendo às empresas de trabalho temporário a qualidade de empregadores, tendo em conta a necessidade de estabelecer um quadro de utilização do trabalho temporário por forma a contribuir efetivamente para a criação de emprego e para o desenvolvimento de formas de trabalho flexíveis.»

5

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, alínea f), da referida diretiva:

«Para efeitos da [mesma], entende‑se por:

“Condições fundamentais de trabalho e emprego”:

as condições de trabalho e emprego estabelecidas por legislação, regulamentação, disposições administrativas, convenções coletivas e/ou outras disposições de caráter geral vinculativas em vigor no utilizador, relativas:

i)

à duração do trabalho, às horas suplementares, aos períodos de pausa e de descanso, ao trabalho noturno e às férias e feriados,

ii)

à remuneração.»

6

O artigo 5.o da Diretiva 2008/104, sob a epígrafe «Princípio da igualdade de tratamento», dispõe:

«1.   As condições fundamentais de trabalho e emprego dos trabalhadores temporários são, enquanto durar a respetiva cedência ao utilizador, pelo menos iguais às condições que lhes seriam aplicáveis se tivessem sido recrutados diretamente pelo utilizador para ocuparem a mesma função.

Para efeitos da aplicação do primeiro parágrafo, as regras em vigor no utilizador em matéria de:

a)

Proteção das mulheres grávidas e lactantes e proteção das crianças e dos jovens; e

b)

Igualdade de tratamento de homens e mulheres, e ainda quaisquer ações destinadas a combater a discriminação por motivos de sexo, raça ou origem étnica, religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual,

devem ser respeitadas, conforme estabelecidas por lei, regulamento, disposição administrativa, convenção coletiva e/ou por outras disposições de caráter geral.

2.   Em matéria de remuneração, os Estados‑Membros podem, após consulta aos parceiros sociais, prever a possibilidade de derrogar ao princípio previsto no n.o 1 sempre que os trabalhadores temporários ligados a uma empresa de trabalho temporário por um contrato permanente continuem a ser remunerados durante o período que decorre entre duas cedências.

3.   Após consulta aos parceiros sociais, os Estados‑Membros podem dar‑lhes a possibilidade de manterem ou celebrarem, ao nível adequado e sob reserva das condições estabelecidas pelos Estados‑Membros, convenções coletivas que, assegurando embora a proteção geral dos trabalhadores temporários, estabeleçam as condições de trabalho e emprego desses trabalhadores, as quais podem ser distintas das referidas no n.o 1.

4.   Desde que seja concedido aos trabalhadores temporários um nível de proteção adequado, os Estados‑Membros que não disponham de um sistema jurídico pelo qual as convenções coletivas possam ser declaradas universalmente aplicáveis ou um sistema em que a lei ou a prática permitam a extensão dessas disposições a todas as empresas semelhantes de um determinado setor ou região, podem, após consulta aos parceiros sociais a nível nacional e com base em acordos por eles celebrados, estabelecer disposições relativas às condições fundamentais de trabalho e de emprego que derroguem o princípio previsto no n.o 1. Tais disposições podem incluir um prazo de qualificação para a igualdade de tratamento.

As disposições referidas no presente número devem ser conformes com a legislação comunitária e ser suficientemente precisas e acessíveis para que os setores e empresas em causa identifiquem e cumpram os seus deveres. Em especial, os Estados‑Membros devem especificar, por força do n.o 2 do artigo 3.o, se os regimes profissionais de segurança social, incluindo os regimes profissionais de reforma e de seguro na doença e os regimes de participação financeira estão incluídos nas condições fundamentais de trabalho e emprego referidas no n.o 1. Tais disposições não prejudicam os acordos celebrados a nível nacional, regional, local ou setorial que não sejam menos favoráveis aos trabalhadores.

5.   Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias, nos termos da lei e/ou prática nacional, para evitar uma aplicação abusiva do presente artigo e, em especial, para evitar cedências sucessivas com o propósito de contornar o disposto na presente diretiva. Os Estados‑Membros devem informar a Comissão [Europeia] de qualquer medida tomada nesse sentido.»

7

O artigo 9.o desta diretiva, sob a epígrafe «Requisitos mínimos», enuncia:

«1.   A presente diretiva não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem ou aprovarem disposições de natureza legislativa, regulamentar ou administrativa mais favoráveis aos trabalhadores, ou promoverem ou permitirem convenções coletiva celebradas entre parceiros sociais mais favoráveis aos trabalhadores.

2.   A aplicação da presente diretiva não constitui, em caso algum, motivo suficiente para justificar uma redução do nível geral de proteção dos trabalhadores nos domínios que abrange. As medidas adotadas em aplicação da presente diretiva não prejudicam o direito de os Estados‑Membros e/ou os parceiros sociais, atendendo à alteração das circunstâncias, estabelecerem disposições de natureza legislativa, regulamentar ou contratual diferentes das vigentes no momento da aprovação da presente diretiva, desde que sejam respeitados os requisitos mínimos nela previstos.»

8

O artigo 11.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Aplicação», dispõe, no seu n.o 1:

«Os Estados‑Membros devem aprovar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 5 de dezembro de 2011, ou assegurar que os parceiros sociais estabeleçam as disposições necessárias, através de acordo, cabendo aos Estados‑Membros tomar todas as disposições necessárias que lhes permitam, a qualquer momento, garantir a realização dos objetivos definidos na presente diretiva. Devem informar imediatamente a Comissão desse facto.»

Direito alemão

9

O § 9, n.o 2, da Arbeitnehmerüberlassungsgesetz (Lei sobre o Regime da Cedência de Trabalhadores), de 3 de fevereiro de 1995 (BGBl. 1995 I, p. 158, a seguir «AÜG»), na sua versão em vigor até 31 de março de 2017, tinha a seguinte redação:

«São inválidas:

[…]

2) Convenções que prevejam condições de trabalho, incluindo a remuneração, para os trabalhadores temporários, durante o período de cedência a uma empresa utilizadora, que sejam menos favoráveis que as condições fundamentais de trabalho aplicáveis na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa que se encontre numa situação comparável; uma convenção coletiva pode autorizar derrogações, desde que a remuneração prevista não seja inferior à remuneração horária mínima estabelecida por regulamento, nos termos do § 3a, n.o 2; no quadro de tal convenção coletiva, os empregadores e os trabalhadores não vinculados por uma convenção coletiva podem concordar na aplicação das disposições desta convenção; uma derrogação efetuada por meio de convenção coletiva não é aplicável aos trabalhadores temporários que, nos últimos seis meses anteriores à cedência à empresa utilizadora, tenham cessado uma relação laboral com esta empresa ou com um empregador que forme um grupo com esta empresa na aceção do § 18 da Aktiengesetz (Lei das Sociedades Anónimas),

[…]»

10

O § 10, n.o 4, da AÜG, na sua versão em vigor até 31 de março de 2017, enunciava:

«A empresa de trabalho temporário é obrigada a conceder ao trabalhador temporário, durante o período de cedência à empresa utilizadora, as condições fundamentais de trabalho, incluindo a remuneração, aplicáveis na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa que se encontre numa situação comparável. Se a convenção coletiva aplicável à relação laboral estabele[cer] derrogações (§ 3, n.o 1, ponto 3, e § 9, ponto 2), a empresa de trabalho temporário deve conceder ao trabalhador temporário as condições de trabalho aplicáveis ao abrigo desta convenção coletiva. Se tal convenção coletiva previr uma remuneração inferior à remuneração horária mínima estabelecida por decreto, nos termos do § 3a, n.o 2, a empresa de trabalho temporário deve conceder ao trabalhador temporário, por cada hora de trabalho, a remuneração devida na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa que se encontre numa situação comparável, por uma hora de trabalho. No caso de invalidade da convenção celebrada entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador temporário por força do § 9, n.o 2, a empresa de trabalho temporário deve conceder ao trabalhador temporário as condições fundamentais de trabalho, incluindo a remuneração, aplicáveis na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa que se encontre numa situação comparável.»

11

O § 8 da AÜG, conforme alterado pela Lei de 21 de fevereiro de 2017 (BGBl. 2017 I, p. 258), em vigor desde 1 de abril de 2017, dispõe:

«1.   A empresa de trabalho temporário é obrigada a conceder ao trabalhador temporário, durante o período de cedência à empresa utilizadora, as condições fundamentais de trabalho, incluindo a remuneração, aplicáveis na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa que se encontre numa situação comparável (princípio da igualdade de tratamento). Se o trabalhador temporário receber a remuneração devida ao abrigo de uma convenção coletiva aplicável a um trabalhador da empresa utilizadora que se encontre numa situação comparável ou, alternativamente, a remuneração devida ao abrigo de uma convenção coletiva a trabalhadores do mesmo setor que se encontrem numa situação comparável, presume‑se que o trabalhador temporário recebe o mesmo tratamento no que respeita à remuneração na aceção do primeiro período. Caso a empresa utilizadora conceda uma remuneração em espécie, pode ser concedida uma compensação em euros.

2.   Uma convenção coletiva pode derrogar o princípio da igualdade de tratamento, desde que a remuneração prevista não seja inferior à remuneração horária mínima estabelecida por decreto, nos termos do § 3a, n.o 2. Se a convenção coletiva derrogar o princípio da igualdade de tratamento, a empresa de trabalho temporário deve conceder ao trabalhador temporário as condições fundamentais de trabalho aplicáveis ao abrigo dessa convenção coletiva. No quadro desta convenção coletiva, os empregadores e os trabalhadores não vinculados por uma convenção coletiva podem concordar na aplicação da mesma. Se tal convenção coletiva previr uma remuneração inferior à remuneração horária mínima estabelecida por decreto, nos termos do § 3a, n.o 2, a empresa de trabalho temporário deve conceder ao trabalhador temporário, por cada hora de trabalho, a remuneração devida na empresa utilizadora a um trabalhador desta empresa, que se encontre numa situação comparável, por uma hora de trabalho.

3.   Uma derrogação efetuada por meio de uma convenção coletiva na aceção do n.o 2 não é aplicável aos trabalhadores temporários que, nos últimos seis meses anteriores à cedência à empresa utilizadora, tenham cessado uma relação laboral com esta empresa ou com um empregador que forme um grupo com esta empresa na aceção do § 18 da Aktiengesetz (Lei das Sociedades Anónimas).

4.   Uma convenção coletiva na aceção do n.o 2 pode derrogar, em matéria de remuneração, o princípio da igualdade de tratamento durante os primeiros nove meses de cedência à empresa utilizadora. Só é permitida uma derrogação efetuada por meio de convenção coletiva por um período de tempo mais longo se:

1)

o mais tardar 15 meses após a cedência a uma empresa utilizadora, for alcançada uma remuneração que seja, pelo menos, a remuneração estabelecida pela convenção coletiva como sendo equivalente à remuneração prevista na convenção coletiva para trabalhadores do setor que se encontrem [numa] situação comparável, e

2)

após um período de adaptação aos métodos de trabalho de uma duração máxima de seis semanas, a remuneração paga for progressivamente alinhada pela remuneração supramencionada.

No quadro de tal convenção coletiva, os empregadores e os trabalhadores não vinculados por uma convenção coletiva podem concordar na aplicação das disposições da convenção. O período de cedências anteriores pela mesma ou por uma empresa de trabalho temporário diferente à mesma empresa utilizadora deve ser tido em conta, na sua integralidade, se o respetivo período entre as cedências não ultrapassar os três meses.

5.   A empresa de trabalho temporário deverá pagar ao trabalhador temporário pelo menos a remuneração horária mínima estabelecida por regulamento, nos termos do § 3a, n.o 2, pelo período de cedência e pelos períodos sem cedência.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

12

Entre janeiro e abril de 2017, a TimePartner, uma empresa de trabalho temporário, empregou CM na qualidade de trabalhadora temporária ao abrigo de um contrato de trabalho a termo. No âmbito deste contrato, CM foi cedida a uma empresa de comércio a retalho enquanto operadora logística.

13

Os trabalhadores comparáveis do utilizador, aos quais é aplicável a Convenção coletiva dos trabalhadores do setor do comércio a retalho nos Land da Baviera (Alemanha), auferiam uma remuneração horária bruta de 13,64 euros.

14

Durante a sua cedência a esta empresa, CM auferiu uma remuneração horária bruta de 9,23 euros em conformidade com a Convenção coletiva aplicável aos trabalhadores temporários, celebrada entre o Interessenverband Deutscher Zeitarbeitsunternehmen eV (Sindicato das empresas alemãs de trabalho temporário), no qual estava filiada a TimePartner, e a Deutscher Gewerkschaftsbund (Confederação sindical alemã), da qual fazia parte o Vereinte Dienstleistungsgewerkschaft (Sindicato dos prestadores de serviços), no qual CM estava filiada.

15

Esta última convenção coletiva derrogava o princípio da igualdade de tratamento consagrado, para o período entre janeiro e março de 2017, no § 10, n.o 4, primeiro período, da AÜG, na sua versão em vigor até 31 de março de 2017 e, relativamente ao mês de abril de 2017, no § 8, n.o 1, da AÜG, na sua versão em vigor a partir de 1 de abril de 2017, prevendo, em relação aos trabalhadores temporários, uma remuneração inferior à concedida aos trabalhadores do utilizador.

16

CM intentou uma ação no Arbeitsgericht Würzburg (Tribunal do Trabalho de Wurtzbourg, Alemanha) com vista a obter um suplemento de remuneração de 1296,72 euros, montante equivalente à diferença que lhe seria aplicada se tivesse sido remunerada em conformidade com a Convenção coletiva dos trabalhadores do setor do comércio a retalho na Baviera. Alegava que as disposições pertinentes da AÜG e da Convenção coletiva aplicável aos trabalhadores temporários não eram conformes com o artigo 5.o da Diretiva 2008/104. A TimePartner considerou não estar obrigada a pagar nenhuma remuneração diferente da prevista pelas convenções coletivas aplicáveis aos trabalhadores temporários.

17

Tendo a ação sido julgada improcedente, CM interpôs recurso para o Landesarbeitsgericht Nürnberg (Tribunal Superior do Trabalho de Nuremberga, Alemanha). Após este tribunal ter negado provimento ao seu recurso, CM interpôs recurso de «Revision» para o órgão jurisdicional de reenvio, o Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal, Alemanha).

18

Este órgão jurisdicional considera que o desfecho do referido recurso de «Revision» depende da interpretação do artigo 5.o da Diretiva 2008/104.

19

Nestas condições, o Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Como deve ser definido o conceito de “proteção geral dos trabalhadores temporários” que figura no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2008/104]; mais concretamente, esse conceito vai além da proteção obrigatória exigida pelo direito nacional e pelo direito da União para a proteção de todos os trabalhadores?

2)

Que pressupostos e critérios têm de estar preenchidos para que se possa considerar que as disposições relativas às condições de trabalho e de emprego, aplicáveis aos trabalhadores temporários, que figuram numa convenção coletiva e que derrogam o princípio da igualdade de tratamento consagrado no artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva [2008/104], respeitam a proteção geral dos trabalhadores temporários?

a)

O exame do respeito pela proteção geral tem por objeto — em abstrato — as condições de trabalho acordadas numa convenção coletiva aplicáveis aos trabalhadores temporários abrangidos por essa convenção ou é exigido um exame comparativo e valorativo entre as condições de trabalho acordadas nessa convenção e as condições que vigoram na empresa à qual o trabalhador temporário é cedido (utilizador)?

b)

Se existir, em matéria de remuneração, uma derrogação ao princípio da igualdade de tratamento, o respeito pela proteção geral, previsto no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2008/104], exige que haja uma relação de trabalho permanente entre a empresa de trabalho temporário e o trabalhador temporário?

3)

Devem as condições e os critérios relativos ao respeito pela proteção geral dos trabalhadores temporários na aceção do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2008/104] ser impostos pelo legislador nacional aos parceiros sociais no caso de estes poderem celebrar convenções coletivas que contenham disposições derrogatórias do princípio da igualdade de tratamento no que diz respeito às condições de trabalho e de emprego dos trabalhadores cedidos por empresas de trabalho temporário; e o sistema nacional de negociação coletiva prevê requisitos que criem a expectativa de um equilíbrio adequado de interesses entre as partes na convenção (a designada presunção de conformidade das convenções coletivas)?

4)

Em caso de resposta afirmativa à terceira questão:

a)

O respeito pela proteção geral dos trabalhadores temporários, na aceção do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2008/104], é assegurado através de disposições legais como as da versão atual da [AÜG], que vigora desde 1 de abril de 2017, e que preveem um salário mínimo para trabalhadores temporários, uma duração máxima para a cedência ao mesmo utilizador, um limite temporal para a derrogação, em matéria de remuneração, ao princípio da igualdade de tratamento, a invalidade de um disposição de uma convenção, que derrogue o princípio da igualdade de tratamento aos trabalhadores temporários que, nos seis meses imediatamente anteriores à cedência ao utilizador, tenham deixado de trabalhar para este ou para um empregador que forme um grupo com esse mesmo utilizador, na aceção do § 18 da […] (Lei das Sociedades Anónimas), assim como a obrigação do utilizador de conceder ao trabalhador temporário, nas mesmas condições que se aplicam aos trabalhadores permanentes, acesso às infraestruturas e equipamentos coletivos do utilizador (nomeadamente infraestruturas de acolhimento de crianças, cantinas e serviços de transporte)?

b)

Em caso de resposta afirmativa:

O mesmo é igualmente válido quando, nas disposições legais correspondentes, como a Lei sobre o Regime da Cedência de Trabalhadores, na versão em vigor até 31 de março de 2017, não esteja previsto um limite temporal para a derrogação, em matéria de remuneração, ao princípio da igualdade de tratamento e não se concretize em termos de tempo a exigência de que a cedência seja meramente “temporária”?

5)

Em caso de resposta negativa à terceira questão:

No caso de disposições que derroguem ao princípio da igualdade de tratamento no que respeita às condições de trabalho e de emprego na aceção do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva [2008/104], dos trabalhadores temporários cedidos ao abrigo de convenção coletiva, podem os órgãos jurisdicionais nacionais examinar essas convenções coletivas sem nenhuma restrição a fim de saber se a derrogação respeitou a proteção geral dos trabalhadores temporários, ou o artigo 28.o da Carta dos Direitos Fundamentais e/ou a referência que figura no considerando 19 da Diretiva [2008/104] à “autonomia dos parceiros sociais” exige que seja concedida aos outorgantes da convenção coletiva uma margem de apreciação, no que toca ao respeito pela proteção geral dos trabalhadores temporários, que só pode ser objeto de fiscalização judicial em termos limitados? Em caso de resposta afirmativa à segunda alternativa, qual o alcance dessa margem de apreciação?»

Quanto ao pedido de reabertura da fase oral do processo

20

Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 11 de outubro de 2022, a TimePartner pediu a reabertura da fase oral do processo. Em apoio do seu pedido, esta parte alega que ainda não foi abordado um aspeto suscetível de exercer uma influência determinante na decisão do Tribunal de Justiça, a saber, a existência de diferentes regimes de trabalho temporário na União que resultam em diferenças consideráveis entre os Estados‑Membros ao nível da proteção social do trabalhador temporário que incumbe à empresa de trabalho temporário, nomeadamente durante os períodos de inatividade, razão pela qual, segundo a TimePartner, o Tribunal de Justiça não está suficientemente informado para se pronunciar.

21

Por força do artigo 83.o do seu Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a abertura ou a reabertura da fase oral do processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido, ou quando, após o encerramento dessa fase, uma parte invocar um facto novo que possa ter influência determinante na decisão do Tribunal, ou ainda quando o processo deva ser resolvido com base num argumento que não foi debatido entre as partes ou os interessados referidos no artigo 23.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

22

No caso em apreço, o Tribunal de Justiça, ouvido o advogado‑geral, atendendo aos elementos de facto e de direito fornecidos, por um lado, pelo órgão jurisdicional de reenvio e, por outro, pela TimePartner e pelos outros interessados que participaram tanto na fase escrita como na fase oral do presente processo, considera que dispõe de todos os elementos necessários para se pronunciar.

23

Por conseguinte, há que indeferir o pedido da TimePartner de reabertura da fase oral do processo.

Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

24

CM sustenta que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível. Em particular, a primeira e segunda questões, através das quais o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que defina o conceito de «proteção geral dos trabalhadores temporários», na aceção do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104, não são necessárias para decidir o litígio no processo principal, uma vez que este conceito não existe no direito alemão.

25

A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 7 de julho de 2022, Coca‑Cola European Partners Deutschland, C‑257/21 e C‑258/21, EU:C:2022:529, n.o 34 e jurisprudência referida).

26

Daqui se conclui que as questões relativas ao direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação ou a apreciação da validade de uma regra da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 7 de julho de 2022, Coca‑Cola European Partners Deutschland, C‑257/21 e C‑258/21, EU:C:2022:529, n.o 35 e jurisprudência referida).

27

Efetivamente, a primeira questão, que tem por objeto a interpretação do conceito de «proteção geral dos trabalhadores temporários», na aceção do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104, está formulada em termos gerais.

28

No entanto, resulta da decisão de reenvio que o órgão jurisdicional de reenvio pede que o Tribunal de Justiça, num primeiro momento, defina o referido conceito para, num segundo momento, com base na segunda questão, poder determinar em que medida uma convenção coletiva pode derrogar o princípio da igualdade de tratamento em matéria de remuneração garantindo em simultâneo a proteção geral dos trabalhadores temporários, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104. Com efeito, se a convenção coletiva aplicável aos trabalhadores temporários for contrária à referida disposição, CM poderá ter direito a um suplemento de remuneração conforme requereu. Assim sendo, a primeira e segunda questões não são manifestamente desprovidas de pertinência para a solução do litígio no processo principal.

29

Por conseguinte, o pedido de decisão prejudicial é admissível.

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

30

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que exige, ao referir o conceito de «proteção geral dos trabalhadores temporários», que se tenha em consideração um nível de proteção específico dos trabalhadores temporários que vá além do estabelecido para os trabalhadores em geral pelo direito nacional e pelo direito da União em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego.

31

Ao abrigo do disposto no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104, os Estados‑Membros podem, após consulta dos parceiros sociais, dar‑lhes a possibilidade de manterem ou celebrarem, ao nível adequado e sob reserva das condições estabelecidas pelos Estados‑Membros, convenções coletivas que, assegurando embora a proteção geral dos trabalhadores temporários, estabeleçam as condições de trabalho e emprego desses trabalhadores, as quais podem ser distintas das referidas no n.o 1 deste artigo, isto é, disposições ao abrigo das quais as condições fundamentais de trabalho e de emprego são pelo menos as que lhes seriam aplicáveis se tivessem sido recrutados diretamente pelo utilizador para ocuparem a mesma função.

32

O conceito de «condições fundamentais de trabalho e emprego» está definido no artigo 3.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2008/104 e refere‑se à duração do trabalho, às horas suplementares, aos períodos de pausa, aos períodos de descanso, ao trabalho noturno, às férias, aos feriados e à remuneração.

33

Decorre assim da redação do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 que a faculdade reconhecida aos Estados‑Membros de permitir aos parceiros sociais manterem ou celebrarem convenções coletivas que autorizem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego dos trabalhadores temporários é mitigada pelo dever de garantir a estes trabalhadores uma «proteção geral», pese embora esta diretiva não defina o conteúdo deste último conceito.

34

Ora, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para a interpretação das disposições do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos de acordo com o seu sentido habitual na linguagem corrente, mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte (Acórdão de 17 de março de 2022, Daimler, C‑232/20, EU:C:2022:196, n.o 29 e jurisprudência referida).

35

Quanto aos objetivos prosseguidos pela Diretiva 2008/104, resulta dos seus considerandos 10 a 12 que a situação jurídica, o estatuto e as condições de trabalho dos trabalhadores temporários na União caracterizam‑se por uma grande diversidade, que o trabalho temporário responde não só às necessidades de flexibilidade das empresas, mas também à necessidade de os trabalhadores conciliarem a vida privada e profissional, contribuindo deste modo para a criação de empregos, bem como para a participação e inserção no mercado de trabalho, e que a referida diretiva visa estabelecer um quadro de proteção para estes trabalhadores, que se caracteriza pela não discriminação, pela transparência e proporcionalidade, sem deixar de respeitar a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais.

36

No que respeita, mais especificamente, ao objetivo do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104, resulta do considerando 16 desta diretiva que, para enfrentar de forma flexível a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais, os Estados‑Membros podem dar aos parceiros sociais a possibilidade de definirem as condições de trabalho e emprego, desde que seja respeitado o nível geral de proteção dos trabalhadores temporários.

37

Na sequência do exposto nos referidos considerandos, o artigo 2.o desta diretiva enuncia que esta tem como objetivo assegurar a proteção dos trabalhadores temporários e melhorar a qualidade do trabalho temporário, assegurando que o princípio da igualdade de tratamento é aplicável a estes trabalhadores, reconhecendo às empresas de trabalho temporário a qualidade de empregadores, tendo em conta a necessidade de estabelecer um quadro adequado de utilização deste tipo de trabalho por forma a contribuir efetivamente para a criação de emprego e para o desenvolvimento de formas de trabalho flexíveis.

38

Este duplo objetivo reflete‑se na estrutura do artigo 5.o da Diretiva 2008/104, cujo n.o 1 estabelece a regra segundo a qual as condições fundamentais de trabalho e emprego dos trabalhadores temporários, conforme definidas no artigo 3.o, n.o 1, alínea f), desta diretiva, são, pelo menos, iguais às dos trabalhadores do utilizador. Esta regra é, nomeadamente, derrogada pela disposição prevista no n.o 3 deste artigo 5.o, sendo que essa derrogação deve, todavia, respeitar os limites da proteção geral dos trabalhadores temporários. Por outro lado, o seu alcance está limitado ao estritamente necessário para salvaguardar o interesse que a derrogação ao princípio da igualdade de tratamento adotada com base nesta disposição permite proteger, a saber, o interesse relativo à necessidade de enfrentar de forma flexível a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais (Acórdão de 21 de outubro de 2010, Accardo e o., C‑227/09, EU:C:2010:624, n.o 58 e jurisprudência referida).

39

Para conciliar o objetivo de assegurar a proteção dos trabalhadores temporários enunciado no artigo 2.o da Diretiva 2008/104 e o respeito da diversidade dos mercados de trabalho há que considerar que, quando uma convenção coletiva autoriza, com base no artigo 5.o, n.o 3, desta diretiva, em derrogação do seu n.o 1, uma diferença de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários em relação às condições de que gozam os trabalhadores do utilizador, a «proteção geral» destes trabalhadores temporários só é garantida se, em contrapartida, lhes forem concedidos benefícios destinados a compensar os efeitos resultantes desta diferença de tratamento. Com efeito, a proteção geral dos trabalhadores temporários ficaria necessariamente enfraquecida se, em relação a estes trabalhadores, essa convenção se limitasse a reduzir uma ou mais das referidas condições fundamentais.

40

No entanto, atendendo ao objetivo do artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2008/104, que consiste em garantir que os trabalhadores temporários beneficiem das mesmas condições fundamentais que as dos trabalhadores do utilizador, o respeito pela proteção geral na aceção do n.o 3 deste artigo não exige que se tenha em conta um nível de proteção dos trabalhadores temporários que vá além do previsto, no que respeita a tais condições, pelas disposições vinculativas em matéria de proteção previstas para os trabalhadores em geral pelo direito nacional e pelo direito da União.

41

Os benefícios que compensam os efeitos de uma diferença de tratamento em detrimento dos trabalhadores temporários, conforme referido no n.o 39 do presente acórdão, devem referir‑se às condições fundamentais de trabalho e emprego definidas no artigo 3.o, n.o 1, alínea f), da Diretiva 2008/104, a saber, as relativas à duração do trabalho, às horas suplementares, aos períodos de pausa, aos períodos de descanso, ao trabalho noturno, às férias, aos feriados e à remuneração.

42

Esta interpretação do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 é corroborada pelo seu contexto. Com efeito, o artigo 5.o, n.o 2, desta diretiva permite, em substância, que, após consulta dos parceiros sociais, os Estados‑Membros derroguem o princípio da igualdade de tratamento previsto no artigo 5.o, n.o 1, da referida diretiva no que diz respeito à remuneração, sempre que, nomeadamente, os referidos trabalhadores continuem a ser remunerados durante o período que decorre entre duas cedências. Assim, se os Estados‑Membros só podem fixar a remuneração dos trabalhadores temporários num nível inferior ao que é imposto pelo princípio da igualdade de tratamento se compensarem esta desvantagem mediante a concessão de um benefício que, neste caso, está relacionado com a mesma condição fundamental de trabalho e emprego que é a remuneração, seria paradoxal aceitar que os parceiros sociais, apesar de obrigados a garantir a proteção geral dos referidos trabalhadores, pudessem proceder deste modo sem estarem, por sua vez, obrigados a prever a concessão de uma vantagem referente a tais condições fundamentais na convenção coletiva em causa.

43

Isto aplica‑se, a fortiori, aos trabalhadores temporários com um contrato a termo que, correndo o risco de raramente serem renumerados entre duas cedências, devem beneficiar de uma vantagem compensatória substancial no que respeita às referidas condições fundamentais, a qual, no essencial, deve ser pelo menos equivalente à concedida aos trabalhadores temporários com um contrato por tempo indeterminado.

44

Atentas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição não exige, ao referir o conceito de «proteção geral dos trabalhadores temporários», que se tenha em consideração um nível de proteção específico dos trabalhadores temporários que vá além do estabelecido para os trabalhadores em geral pelo direito nacional e pelo direito da União em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego. Todavia, quando, através de uma convenção coletiva, os parceiros sociais autorizarem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários, essa convenção coletiva deve, a fim de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários em causa, conceder a estes últimos vantagens em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego suscetíveis de compensar a diferença de tratamento suportada.

Quanto à segunda questão

45

Com a sua segunda questão, que está subdividida em duas subquestões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, em que condições se pode considerar que uma convenção coletiva que autoriza diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários garante a proteção geral dos trabalhadores temporários em causa, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104.

Quanto à segunda questão, alínea a)

46

Com a segunda questão, alínea a), o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o respeito do dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários deve ser apreciado em abstrato, à luz de uma convenção coletiva que autoriza uma diferença de tratamento, ou em concreto, procedendo a uma comparação das condições fundamentais de trabalho e emprego aplicáveis aos trabalhadores comparáveis recrutados diretamente pelo utilizador.

47

Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2008/104, durante a sua cedência a um utilizador, as condições fundamentais de trabalho e emprego dos trabalhadores temporários devem, pelo menos, corresponder às que lhes seriam aplicáveis se tivessem sido recrutados diretamente pelo utilizador para ocuparem a mesma função (Acórdão de 12 de maio de 2022, Luso Temp, C‑426/20, EU:C:2022:373, n.o 49). O legislador da União manifestou assim a sua intenção de assegurar que, em linha com o princípio da igualdade de tratamento, os trabalhadores temporários não se encontram, em princípio, numa situação menos favorável que a dos trabalhadores comparáveis do utilizador.

48

Consequentemente, os trabalhadores temporários têm, em princípio, direito às mesmas condições fundamentais de trabalho e emprego que lhes seriam aplicáveis se tivessem sido recrutados diretamente pelo utilizador. Decorre assim do caráter derrogatório do artigo 5.o, n.o 3, recordado no n.o 38 do presente acórdão, bem como da finalidade da Diretiva 2008/104, recordada no n.o 36 do presente acórdão, que a disposição derrogatória prevista no artigo 5.o, n.o 3, desta diretiva impõe que se verifique, em concreto, se uma convenção coletiva que autoriza uma diferença de tratamento, em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego, entre os trabalhadores temporários e os trabalhadores comparáveis do utilizador garante efetivamente a proteção geral dos trabalhadores temporários, concedendo‑lhes determinadas vantagens destinadas a compensar os efeitos deste tratamento. Assim sendo, esta verificação deve ser efetuada em relação às condições fundamentais de trabalho e emprego aplicáveis aos trabalhadores comparáveis do utilizador.

49

Por conseguinte, importa determinar, num primeiro momento, as condições fundamentais de trabalho e emprego que seriam aplicáveis ao trabalhador temporário se tivesse sido recrutado diretamente pelo utilizador para ocupar a mesma função. Num segundo momento, cabe comparar estas condições fundamentais de trabalho e emprego com as que resultam da convenção coletiva à qual o trabalhador temporário se encontra efetivamente vinculado (v., por analogia, Acórdão de 12 de maio de 2022, Luso Temp, C‑426/20, EU:C:2022:373, n.o 50). Num terceiro momento, para assegurar a proteção geral dos trabalhadores temporários, há que apreciar se as vantagens compensatórias concedidas permitem neutralizar a diferença de tratamento suportada.

50

Face ao exposto, há que responder à segunda questão, alínea a), que o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o respeito do dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários deve ser apreciado em concreto, comparando, a respeito de uma dada função, as condições fundamentais de trabalho e emprego aplicáveis aos trabalhadores recrutados diretamente pelo utilizador com as aplicáveis aos trabalhadores temporários, para que seja possível se as vantagens compensatórias concedidas em relação às referidas condições fundamentais permitem mitigar os efeitos da diferença de tratamento suportada.

Quanto à segunda questão, alínea b)

51

Com a segunda questão, alínea b), o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários exige que o trabalhador temporário em causa esteja vinculado à empresa de trabalho temporário através de um contrato de trabalho por tempo indeterminado.

52

Efetivamente, nos termos do artigo 5.o, n.o 2, desta diretiva, os Estados‑Membros podem, relativamente à remuneração, após consulta aos parceiros sociais, prever que o princípio da igualdade de tratamento pode ser derrogado quando os trabalhadores temporários, ligados a uma empresa de trabalho temporário por um contrato de trabalho por tempo indeterminado, continuem a ser remunerados durante o período que decorre entre duas cedências.

53

No entanto, ao contrário desta disposição, o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 não prevê nenhuma regra específica sobre a situação dos trabalhadores temporários com um contrato por tempo indeterminado.

54

Conforme salientou o advogado‑geral no n.o 54 das suas conclusões, a razão de ser desta diferença entre o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2008/104 e o artigo 5.o, n.o 3, da mesma prende‑se com o facto de os trabalhadores temporários com um contrato de trabalho por tempo indeterminado continuarem a ser remunerados durante o período compreendido entre as cedências a utilizadores. Este facto constitui a justificação da faculdade prevista no artigo 5.o, n.o 2, desta diretiva de prever, em relação a estes trabalhadores, uma diferença de tratamento em matéria de remuneração. O caráter específico desta regra contrasta com o caráter geral do artigo 5.o, n.o 3, da referida diretiva que, apesar de autorizar diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego, obriga, contudo, a garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários.

55

Assim, importa salientar que o próprio artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2008/104 fixa a compensação concreta — a saber, a remuneração entre o período que decorre entre duas cedências — que deve ser concedida aos trabalhadores temporários com um contrato por tempo indeterminado como contrapartida de uma derrogação ao princípio da igualdade de tratamento no que respeita à remuneração, ao passo que o n.o 3 deste artigo permite aos parceiros sociais negociar de autonomamente tanto a natureza exata da derrogação ao princípio da igualdade de tratamento como a vantagem suscetível de compensar os efeitos desta derrogação, desde que a proteção geral dos trabalhadores temporários seja garantida.

56

Por conseguinte, o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 permite, sob reserva dessa proteção geral, a celebração de uma convenção coletiva que derrogue o princípio da igualdade de tratamento em relação a qualquer trabalhador temporário, sem distinguir em função do caráter determinado ou indeterminado da duração do seu contrato de trabalho com a empresa de trabalho temporário. Neste caso, não é aliás de excluir que a manutenção da remuneração entre duas cedências, quer ao abrigo de um contrato por tempo indeterminado quer de um contrato a termo, possa ser tomada em consideração para efeitos da apreciação da referida proteção geral. Todavia, os trabalhadores temporários com um contrato a termo devem beneficiar de uma vantagem substancial que permita compensar a diferença de remuneração que suportam durante a cedência relativamente a um trabalhador comparável do utilizador.

57

Atentas as considerações precedentes, há que responder à segunda questão, alínea b), que o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários não exige que o trabalhador temporário em causa esteja vinculado à empresa de trabalho temporário através de um contrato de trabalho por tempo indeterminado.

Quanto à terceira questão

58

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o legislador nacional está obrigado a prever as condições e os critérios destinados a garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários, na aceção desta disposição, quando o Estado‑Membro em causa concede aos parceiros sociais a possibilidade de manterem ou celebrarem convenções coletivas que autorizem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos referidos trabalhadores.

59

Há que salientar que, nos termos do artigo 288.o, terceiro parágrafo, TFUE, uma diretiva vincula o Estado‑Membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando, no entanto, às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios. Embora efetivamente esta disposição reserve aos Estados‑Membros a liberdade de escolha das vias e dos meios destinados a assegurar a aplicação da diretiva, esta liberdade deixa, no entanto, intacta a obrigação de cada um dos Estados destinatários de adotar, no âmbito da sua ordem jurídica nacional, todas as medidas necessárias para assegurar a plena eficácia da diretiva, em conformidade com o objetivo que esta prossegue (Acórdão de 17 de março de 2022, Daimler, C‑232/20, EU:C:2022:196, n.o 94 e jurisprudência referida).

60

Como já foi recordado no n.o 36 do presente acórdão, resulta do considerando 16 da Diretiva 2008/104 que, para enfrentar de forma flexível a diversidade dos mercados de trabalho e das relações laborais, os Estados‑Membros podem dar aos parceiros sociais a possibilidade de definirem as condições de trabalho e emprego, desde que seja respeitado o nível geral de proteção dos trabalhadores temporários.

61

Além disso, resulta do considerando 19 da Diretiva 2008/104 que esta não afeta a autonomia dos parceiros sociais nem deverá afetar as relações entre eles, nomeadamente o direito de negociar e celebrar convenções coletivas de acordo com as legislações e práticas nacionais, no respeito pelo primado do direito da União.

62

Por outro lado, resulta do artigo 11.o, n.o 1, da Diretiva 2008/104 que, a fim de cumprir o objetivo de proteger os trabalhadores temporários, os Estados‑Membros tanto podem aprovar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias a este respeito, como assegurar que os parceiros sociais estabeleçam as disposições necessárias, através de acordo, cabendo aos Estados‑Membros tomar todas as disposições necessárias que lhes permitam, a qualquer momento, garantir a realização dos objetivos definidos pela mesma.

63

Assim, a faculdade reconhecida aos Estados‑Membros no artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 de permitir que os parceiros sociais celebrem convenções coletivas que derroguem o princípio da igualdade de tratamento, conforme concretizado no seu n.o 1, é conforme com a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual os Estados‑Membros podem deixar, em primeiro lugar, ao cuidado dos parceiros sociais a realização dos objetivos de política social visados por uma diretiva nesse domínio (Acórdão de 17 de março de 2022, Daimler, C‑232/20, EU:C:2022:196, n.o 108 e jurisprudência referida).

64

Porém, esta faculdade não dispensa os Estados‑Membros da obrigação de assegurar, através de medidas legislativas, regulamentares ou administrativas adequadas, que os trabalhadores possam beneficiar, em toda a sua extensão, da proteção que lhes é conferida pela Diretiva 2008/104 (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2022, Daimler, C‑232/20, EU:C:2022:196, n.o 109 e jurisprudência referida).

65

Por conseguinte, quando os Estados‑Membros oferecem aos parceiros sociais a possibilidade de celebrar convenções coletivas que autorizem, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104, diferenças de tratamento em detrimento dos trabalhadores temporários, não deixam de estar obrigados a garantir a proteção geral destes trabalhadores.

66

Ora, à luz da finalidade do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 conforme decorre dos seus considerandos 16 e 19, recordados nos n.os 60 e 61 do presente acórdão, o dever de os parceiros sociais assegurarem uma proteção geral dos trabalhadores temporários não exige que os Estados‑Membros prevejam detalhadamente as condições e os critérios a respeitar pelas convenções coletivas.

67

No entanto, como salientou o advogado‑geral no n.o 65 das suas conclusões, quando a legislação nacional concede aos parceiros sociais a possibilidade de negociarem e celebrarem convenções coletivas abrangidas pelo âmbito de aplicação de uma diretiva, estes devem agir no respeito do direito da União, em geral, e da referida diretiva, em particular. Assim, quando os parceiros sociais celebram uma convenção coletiva abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2008/104, devem agir no respeito desta diretiva, garantindo, nomeadamente, a proteção geral dos trabalhadores temporários em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, da mesma (v., por analogia, Acórdão de 19 de setembro de 2018, Bedi, C‑312/17, EU:C:2018:734, n.o 70 e jurisprudência referida).

68

Atentas as considerações precedentes, há que responder à terceira questão que o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que o legislador nacional não é obrigado a prever as condições e os critérios destinados a garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários, na aceção desta disposição, quando o Estado‑Membro em causa concede aos parceiros sociais a possibilidade de manterem ou celebrarem convenções coletivas que autorizem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos referidos trabalhadores.

Quanto à quarta questão

69

Tendo em conta a resposta dada à terceira questão, não há que responder à quarta questão.

Quanto à quinta questão

70

Com a sua quinta questão, que é submetida em caso de resposta negativa à terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que as convenções coletivas que, com base nesta disposição, autorizam diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários podem ser objeto de fiscalização jurisdicional efetiva a fim de verificar se os parceiros sociais respeitaram o seu dever de garantir a proteção geral destes trabalhadores.

71

Importa recordar, por um lado, que, por força do artigo 28.o da Carta dos Direitos Fundamentais, os trabalhadores e as entidades patronais, ou as respetivas organizações, têm, de acordo com o direito da União e as legislações e práticas nacionais, nomeadamente o direito de negociar e celebrar convenções coletivas aos níveis apropriados. Por outro lado, o artigo 152.o, primeiro parágrafo, TFUE precisa que a União «reconhece e promove o papel dos parceiros sociais ao nível da União, tendo em conta a diversidade dos sistemas nacionais» e que «facilita o diálogo entre os parceiros, no respeito pela sua autonomia», sendo a importância desta autonomia, aliás, igualmente recordada no considerando 19 da Diretiva 2008/104.

72

A referida autonomia implica que, na fase de negociação de um acordo pelos parceiros sociais, que incumbe exclusivamente a estes últimos, estes possam dialogar e agir livremente, sem receber ordens ou instruções de ninguém, nomeadamente dos Estados‑Membros ou das instituições da União (Acórdão de 2 de setembro de 2021, EPSU/Comissão, C‑928/19 P, EU:C:2021:656, n.o 61).

73

Importa assim salientar que os parceiros sociais dispõem de uma ampla margem de apreciação na escolha não só da prossecução de um determinado objetivo, entre outros, em matéria de política social e de emprego, mas também na definição das medidas suscetíveis de o realizar (Acórdão de 19 de setembro de 2018, Bedi, C‑312/17, EU:C:2018:734, n.o 59 e jurisprudência referida).

74

Todavia, quando o direito à negociação coletiva proclamado no artigo 28.o da Carta dos Direitos Fundamentais for abrangido pelas disposições do direito da União, o mesmo deve, no âmbito de aplicação do referido direito, ser exercido em conformidade com este (Acórdão de 19 de setembro de 2018, Bedi, C‑312/17, EU:C:2018:734, n.o 69 e jurisprudência referida).

75

Embora os parceiros sociais gozem, como foi recordado no n.o 73 do presente acórdão, de uma ampla margem de apreciação no âmbito da negociação e da celebração de convenções coletivas, esta margem de apreciação está, por conseguinte, circunscrita à obrigação de assegurar o respeito do direito da União.

76

Daqui resulta que, como se concluiu na resposta à terceira questão, embora as disposições da Diretiva 2008/104 não imponham aos Estados‑Membros a adoção de uma regulamentação específica destinada a garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários, na aceção do artigo 5.o, n.o 3, desta diretiva, não deixa de ser certo que os Estados‑Membros, incluindo os seus órgãos jurisdicionais, devem garantir que as convenções coletivas que autorizam diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego asseguram, nomeadamente, a proteção geral dos trabalhadores em conformidade com o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104.

77

A fim de assegurar a plena eficácia da Diretiva 2008/104, como salientou o advogado‑geral no n.o 79 das suas conclusões, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se as convenções coletivas que, por força do artigo 5.o, n.o 3, desta diretiva, derrogam o princípio da igualdade de tratamento, garantem adequadamente a proteção geral dos trabalhadores temporários concedendo‑lhes, em contrapartida, vantagens compensatórias para qualquer derrogação ao referido princípio da igualdade de tratamento.

78

Não obstante a margem de apreciação de que gozam os parceiros sociais para negociar e celebrar convenções coletivas, o juiz nacional é obrigado a fazer tudo o que for da sua competência para assegurar a compatibilidade das convenções coletivas com as exigências decorrentes do artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104.

79

Atentas as considerações precedentes, há que responder à quinta questão que o artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104 deve ser interpretado no sentido de que as convenções coletivas que, ao abrigo desta disposição, autorizam diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários devem poder ser objeto de uma fiscalização jurisdicional efetiva a fim de que seja verificado o respeito, pelos parceiros sociais, do seu dever de garantir a proteção geral desses trabalhadores.

Quanto às despesas

80

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

1)

O artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa ao trabalho temporário,

deve ser interpretado no sentido de que:

esta disposição não exige, ao referir o conceito de «proteção geral dos trabalhadores temporários», que se tenha em consideração um nível de proteção específico dos trabalhadores temporários que vá além do estabelecido para os trabalhadores em geral, pelo direito nacional e pelo direito da União em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego. Todavia, quando, através de uma convenção coletiva, os parceiros sociais autorizarem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários, essa convenção coletiva deve, a fim de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários em causa, conceder a estes últimos vantagens em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego suscetíveis de compensar a diferença de tratamento suportada.

 

2)

O artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104

deve ser interpretado no sentido de que:

o respeito do dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários deve ser apreciado em concreto, comparando, a respeito de uma dada função, as condições fundamentais de trabalho e emprego aplicáveis aos trabalhadores recrutados diretamente pelo utilizador com as aplicáveis aos trabalhadores temporários, para que seja possível determinar se as vantagens compensatórias concedidas em relação às referidas condições fundamentais permitem mitigar os efeitos da diferença de tratamento suportada.

 

3)

O artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104

deve ser interpretado no sentido de que:

o dever de garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários não exige que o trabalhador temporário em causa esteja vinculado à empresa de trabalho temporário através de um contrato de trabalho por tempo indeterminado.

 

4)

O artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104

deve ser interpretado no sentido de que:

o legislador nacional não é obrigado a prever as condições e os critérios destinados a garantir a proteção geral dos trabalhadores temporários, na aceção desta disposição, quando o Estado‑Membro em causa concede aos parceiros sociais a possibilidade de manterem ou celebrarem convenções coletivas que autorizem diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos referidos trabalhadores.

 

5)

O artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2008/104

deve ser interpretado no sentido de que:

as convenções coletivas que, ao abrigo desta disposição, autorizam diferenças de tratamento em matéria de condições fundamentais de trabalho e emprego em detrimento dos trabalhadores temporários devem poder ser objeto de uma fiscalização jurisdicional efetiva a fim de que seja verificado o respeito, pelos parceiros sociais, do seu dever de garantir a proteção geral desses trabalhadores.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.