CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

TAMARA ĆAPETA

apresentadas em 16 de fevereiro de 2023 ( 1 )

Processo C‑488/21

GV

contra

Chief Appeals Officer,

Social Welfare Appeals Office,

Minister for Employment Affairs and Social Protection,

Irlanda,

Attorney General

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Court of Appeal (Tribunal de Recurso, Irlanda)]

«Reenvio prejudicial — Livre circulação de pessoas — Membro da família dependente de um trabalhador da União — Direito de residência no território do Estado‑Membro e direito a prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo — Círculo de beneficiários — Direito de residência do ascendente direto sujeito ao requisito de que continue a estar dependente — Sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado‑Membro em causa — Igualdade de tratamento dos membros da família do trabalhador móvel da União»

I. Introdução

1.

Ao abrigo do direito da União, alguns membros da família, incluindo os progenitores dependentes, podem reunir‑se com um trabalhador móvel da União no Estado‑Membro em que este vive e trabalha. Se esse progenitor pedir prestações sociais no Estado‑Membro de acolhimento, perde o direito de residência baseado no direito da União? Podem os Estados‑Membros tratar esse progenitor como uma sobrecarga não razoável para os seus regimes de segurança social? Além disso, o que significa, antes de mais, o facto de um progenitor estar dependentes de um trabalhador móvel da União?

2.

Estas são, no essencial, as principais questões suscitadas pelo pedido de decisão prejudicial apresentado ao Tribunal de Justiça pela Court of Appeal (Tribunal de Recurso, Irlanda).

3.

Embora o Tribunal de Justiça tenha tido várias ocasiões para esclarecer quais os direitos de que beneficiam os parentes dependentes ao abrigo do direito da União e em que circunstâncias esses direitos se constituem, a maioria desses processos dizia respeito a descendentes diretos ( 2 ) ou cônjuges ( 3 ) dependentes. Por conseguinte, o presente processo proporciona ao Tribunal de Justiça uma oportunidade para desenvolver a interpretação dos direitos dos ascendentes diretos dependentes dos trabalhadores móveis da União.

II. Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

4.

GV é nacional romena e mãe de AC, cidadã romena que reside e trabalha na Irlanda. AC foi igualmente naturalizada cidadã irlandesa. GV reuniu‑se com a sua filha na Irlanda em 2017, onde reside desde então. É ponto assente que reside legalmente na Irlanda na qualidade de ascendente dependente de um trabalhador móvel da União.

5.

GV residiu na Irlanda em diferentes ocasiões, incluindo entre 2009 e 2011, após o que regressou à Roménia. No período de 2011 a 2016, deslocou‑se entre a Irlanda, a Roménia e a Espanha, onde vive a sua outra filha. GV está separada do marido há 15 anos e, durante este período, tem dependido financeiramente de AC, que periodicamente lhe envia dinheiro.

6.

Durante o ano de 2017, sofreu alterações degenerativas na sua artrite. Em 28 de setembro de 2017, GV apresentou um pedido de subsídio de invalidez ao abrigo do Social Welfare Consolidation Act 2005 (Lei Consolidada de 2005 relativa à Assistência Social), conforme alterado.

7.

O órgão jurisdicional de reenvio explica que o subsídio de invalidez que GV pede tem por objetivo a proteção contra a pobreza. Constitui uma prestação de assistência social proveniente do orçamento geral, sem que a pessoa em causa tenha de efetuar contribuições para a segurança social. Por outras palavras, a prestação é financiada pela tributação geral. O subsídio de invalidez é qualificado como «prestação pecuniária especial de caráter não contributivo» na aceção do Regulamento n.o 883/2004 ( 4 ). Por conseguinte, só pode ser pedido no Estado‑Membro de residência ( 5 ), o que significa que GV não poderia pedir tal prestação no Estado da sua nacionalidade, dado que reside na Irlanda.

8.

Parece resultar da decisão de reenvio que, para ser elegível para o subsídio de invalidez na Irlanda, o interessado deve preencher certos requisitos relativos a idade, invalidez e recursos. Em particular, este subsídio só pode ser concedido a pessoas que não tenham atingido a idade geral da reforma ( 6 ). Os outros critérios de elegibilidade incluem critérios médicos e uma condição de recursos. Esta condição inclui quaisquer rendimentos que uma pessoa receba de um membro da família.

9.

Ainda mais especificamente, o direito irlandês proíbe o pagamento do subsídio de invalidez a uma pessoa que não reside habitualmente na Irlanda ( 7 ). Uma das condições da residência habitual é que uma pessoa beneficie de um direito de residência neste Estado‑Membro.

10.

Por Decisão de 27 de fevereiro de 2018, o pedido de GV foi indeferido. Foi negado provimento ao recurso interposto contra essa decisão em 12 de fevereiro de 2019. Em ambas as ocasiões, o fundamento da improcedência foi que GV não tinha um direito de residência na Irlanda.

11.

Na sequência de um pedido apresentado em nome de GV por uma organização não governamental, a Decisão de 12 de fevereiro de 2019 que negou provimento ao recurso foi revista.

12.

Por Decisão de 2 de julho de 2019, o Appeals Officer (Funcionário encarregado dos recursos) concluiu que GV, na qualidade de ascendente direto dependente de um cidadão da União empregado na Irlanda, beneficiava de um direito de residência, mas não podia beneficiar de assistência social.

13.

Foi apresentado ao Chief Appeals Officer (diretor do Gabinete de Recursos, Irlanda) (primeiro demandado em primeira instância e recorrente no órgão jurisdicional de reenvio) um pedido de revisão dessa decisão, que confirmou, por Decisão de 23 de julho de 2019, que GV não tinha direito ao subsídio de invalidez. Tal foi justificado pelo argumento de que, ao abrigo do direito irlandês que transpôs a Diretiva Cidadania ( 8 ), GV tinha‑se tornado uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança nacional.

14.

O direito irlandês relevante é, como explicado pelo órgão jurisdicional de reenvio, o European Communities (Free Movement of Persons) Regulations 2015 (S.I. n.o 548 de 2015) [Regulamento de 2015 relativo às Comunidades Europeias (livre circulação de pessoas)] (a seguir «Regulamento de 2015»). O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de 2015 prevê a conservação do direito de residência na Irlanda da seguinte forma:

«Qualquer pessoa que resida no Estado ao abrigo dos artigos 6.o ( 9 ), 9.o ou 10.o tem o direito de continuar a residir no Estado desde que cumpra as disposições pertinentes do regulamento em causa e não se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado.»

15.

GV apresentou um pedido de fiscalização judicial da Decisão de 23 de julho de 2019 na High Court (Tribunal Superior, Irlanda). Por Sentença de 29 de maio de 2020, esse tribunal anulou a decisão impugnada. Considerou que o direito irlandês, na medida em que subordina o direito de residência de um membro da família de um cidadão da União à condição de esse membro da família não se tornar uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado, era incompatível com a Diretiva Cidadania. Assim, de acordo com o mesmo tribunal, quando se demonstra, à data em que o membro da família se reúne com o trabalhador da União, que o membro da família está depende desse trabalhador, não se exige que esse membro da família continue a estar dependente do trabalhador da União para continuar a beneficiar de um direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento.

16.

O Chief Appeals Officer e o Minister for Employment Affairs and Social Protection (Ministro do Emprego e Assuntos Sociais, Irlanda) interpuseram recurso dessa decisão na Court of Appeal (Tribunal de Recurso), o órgão jurisdicional de reenvio no presente processo.

17.

Por um lado, de acordo com o Minister for Employment Affairs and Social Protection, a definição de «membro da família» constante do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva Cidadania inclui a exigência de o membro da família em causa continuar dependente do cidadão da União enquanto for invocado o direito de residência derivado. Assim, quando a relação de dependência cessa, esse membro da família deixa de poder beneficiar desse direito de residência. Caso fosse atribuído o subsídio de invalidez a GV, a sua dependência em relação à sua filha deixaria de existir, pelo que GV deixaria de beneficiar de um direito de residência derivado em conformidade com a referida diretiva.

18.

Por outro lado, GV sustenta, no essencial, que o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de 2015, ao impor aos membros da família de um cidadão da União a condição relativa à «sobrecarga não razoável», quando tal condição não está contida no artigo 7.o da Diretiva Cidadania, é uma disposição inválida. Segundo GV, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao conceito de «dependência» confirma a sua posição. Alega ainda que o argumento apresentado pelo Minister for Employment Affairs and Social Protection é contrário ao seu direito à igualdade de tratamento previsto no artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania.

19.

Tendo dúvidas quanto à conformidade do direito irlandês com a Diretiva Cidadania, a Court of Appeal (Tribunal de Recurso) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O direito de residência derivado de um ascendente direto de um trabalhador cidadão da União, nos termos do artigo 7.o, n.o 2, da [Diretiva Cidadania], está sujeito à contínua dependência desse ascendente em relação ao trabalhador?

2)

A [Diretiva Cidadania] opõe‑se a que um Estado‑Membro de acolhimento limite o acesso a uma prestação de assistência social por parte de um membro da família de um trabalhador cidadão da União que beneficia de um direito de residência derivado por estar a cargo desse trabalhador, quando o acesso a tal prestação significa que já não está a cargo desse trabalhador?

3)

A [Diretiva Cidadania] opõe‑se a que um Estado‑Membro de acolhimento limite o acesso a uma prestação de assistência social por parte de um membro da família de um trabalhador cidadão da União que beneficia de um direito de residência derivado por estar a cargo desse trabalhador, com o fundamento de que o pagamento da prestação fará com que o membro da família em causa se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado?»

20.

Foram apresentadas observações escritas ao Tribunal de Justiça por GV, pelo Chief Appeals Officer, pelo Social Welfare Appeals Office (Gabinete dos Recursos em matéria de Proteção Social, Irlanda), pelo Minister for Employment Affairs and Social Protection, pelo Attorney General (Procurador Geral, Irlanda) (a seguir «demandados»), pelos Governos checo, dinamarquês e alemão, pela Irlanda e pela Comissão Europeia. Foi realizada uma audiência em 18 de outubro de 2022, na qual GV, os demandados, os Governos checo, dinamarquês e alemão, a Irlanda e a Comissão apresentaram alegações orais.

III. Direito da União relevante

A. Diretiva Cidadania

21.

O artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania prevê que, para efeitos da mesma diretiva:

«[…] entende‑se por […] “Membro da família”:

a)

O cônjuge;

b)

O parceiro com quem um cidadão da União contraiu uma parceria registada com base na legislação de um Estado‑Membro, se a legislação do Estado‑Membro de acolhimento considerar as parcerias registadas como equiparadas ao casamento, e nas condições estabelecidas na legislação aplicável do Estado‑Membro de acolhimento;

c)

Os descendentes diretos com menos de 21 anos de idade ou que estejam a cargo, assim como os do cônjuge ou do parceiro na aceção da alínea b);

d)

Os ascendentes diretos que estejam a cargo, assim como os do cônjuge ou do parceiro na aceção da alínea b).»

22.

O artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania dispõe o seguinte:

«Qualquer cidadão da União tem o direito de residir no território de outro Estado‑Membro por período superior a três meses, desde que:

a)

Exerça uma atividade assalariada ou não assalariada no Estado‑Membro de acolhimento; ou

b)

Disponha de recursos suficientes para si próprio e para os membros da sua família, a fim de não se tornar uma sobrecarga para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento durante o período de residência, e de uma cobertura extensa de seguro de doença no Estado‑Membro de acolhimento; ou

c)

[E]steja inscrito num estabelecimento de ensino público ou privado, reconhecido ou financiado por um Estado‑Membro de acolhimento com base na sua legislação ou prática administrativa, com o objetivo principal de frequentar um curso, inclusive de formação profissional, e

Disponha de uma cobertura extensa de seguro de doença no Estado‑Membro de acolhimento, e garanta à autoridade nacional competente, por meio de declaração ou outros meios à sua escolha, que dispõe de recursos financeiros suficientes para si próprio e para os membros da sua família a fim de evitar tornar‑se uma sobrecarga para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento durante o período de residência; ou

d)

Seja membro da família que acompanha ou se reúne a um cidadão da União que preencha as condições a que se referem as alíneas a), b) ou c).»

23.

O artigo 24.o da Diretiva Cidadania estabelece:

«1.   Sob reserva das disposições específicas previstas expressamente no Tratado e no direito secundário, todos os cidadãos da União que, nos termos da presente diretiva, residam no território do Estado‑Membro de acolhimento beneficiam de igualdade de tratamento em relação aos nacionais desse Estado‑Membro, no âmbito de aplicação do Tratado. O benefício desse direito é extensível aos membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro e tenham direito de residência ou direito de residência permanente.

2.   Em derrogação do n.o 1, o Estado‑Membro de acolhimento pode não conceder o direito a prestações de assistência social durante os primeiros três meses de residência ou, quando pertinente, o período mais prolongado previsto na alínea b) do n.o 4 do artigo 14.o, assim como, antes de adquirido o direito de residência permanente, pode não conceder ajuda de subsistência, incluindo a formação profissional, constituída por bolsas de estudo ou empréstimos estudantis, a pessoas que não sejam trabalhadores assalariados ou trabalhadores não assalariados, que não conservem este estatuto ou que não sejam membros das famílias dos mesmos.»

B. Regulamento Trabalhadores

24.

O artigo 7.o do Regulamento Trabalhadores ( 10 ) prevê, na parte pertinente:

«1.   O trabalhador nacional de um Estado‑Membro não pode ser sujeito no território de outro Estado‑Membro, em razão da sua nacionalidade, a um tratamento diferente daquele que é concedido aos trabalhadores nacionais no que respeita a todas as condições de emprego e de trabalho, nomeadamente em matéria de remuneração, de despedimento e de reintegração profissional ou de reemprego, se ficar desempregado.

2.   O trabalhador referido no n.o 1 beneficia das mesmas vantagens sociais e fiscais que os trabalhadores nacionais.

[…].»

IV. Análise

A. Questões preliminares

25.

Uma questão, discutida pelos participantes no presente processo, foi que a Diretiva Cidadania, cuja interpretação foi pedida pelo órgão jurisdicional de reenvio, não é aplicável como tal aos factos do caso em apreço. Embora concorde com argumentação os argumentos dos participantes a este respeito, darei uma breve explicação sobre a razão pela qual a interpretação da Diretiva Cidadania é, no entanto, importante para o órgão jurisdicional de reenvio.

26.

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania, esta diretiva aplica‑se a todos os cidadãos da União que se desloquem ou residam num Estado‑Membro que não aquele de que são nacionais, bem como aos membros das suas famílias que os acompanhem ou que a eles se reúnam.

27.

Esta diretiva não regula, portanto, os direitos derivados dos membros da família de um cidadão da União num Estado‑Membro do qual esse cidadão é nacional.

28.

Dado que AC adquiriu a cidadania irlandesa, a Diretiva Cidadania deixou de se aplicar aos direitos de que a sua mãe beneficia na Irlanda a partir do momento da naturalização de AC.

29.

No entanto, mesmo que a Diretiva Cidadania não seja em si mesma aplicável à situação que conduziu ao litígio no presente processo, o Tribunal de Justiça já considerou que é aplicável «por analogia» a situações semelhantes ( 11 ).

30.

O direito de residência derivado de um membro da família de um cidadão da União pode constituir‑se diretamente com base no artigo 21.o, n.o 1, TFUE. Como o Tribunal de Justiça esclareceu, a circunstância de um nacional de um Estado‑Membro que entrou e reside noutro Estado‑Membro adquirir, em seguida, a nacionalidade deste último Estado‑Membro não pode implicar a privação do direito de ter uma vida familiar normal nesse Estado, conforme garantido pelo direito da União ( 12 ).

31.

A fim de evitar uma situação em que os cidadãos da União que exerceram o seu direito de livre circulação e se integraram na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento a ponto de adquirirem a nacionalidade desse Estado sejam tratados, no que respeita à sua vida familiar, de forma menos favorável do que os cidadãos da União que também exerceram os seus direitos de circulação mas que conservaram apenas a nacionalidade do seu Estado de origem, a Diretiva Cidadania estabelece o conteúdo mínimo dos direitos derivados dos membros da família dos cidadãos naturalizados.

32.

A Diretiva Cidadania esclarece, assim, a interpretação do artigo 21.o, n.o 1, TFUE, que é aplicável no caso em apreço, especificando o seu conteúdo mínimo.

33.

A interpretação da Diretiva Cidadania dada pelo Tribunal de Justiça será útil para o órgão jurisdicional de reenvio, a fim de apreciar se, com a sua decisão, o Chief Appeals Officer violou os direitos de que AC e GV beneficiam por força do artigo 21.o, n.o 1, TFUE. O Tribunal de Justiça pode, por conseguinte, responder às questões prejudiciais relacionadas com a interpretação da Diretiva Cidadania.

34.

Além disso, considero que o Regulamento Trabalhadores é também indiretamente aplicável ao litígio no processo principal. Esclarece o conteúdo mínimo do direito fundamental de livre circulação dos trabalhadores móveis da União que adquiriram, por naturalização, a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento para o qual se deslocaram ( 13 ). O facto de o órgão jurisdicional de reenvio ter limitado as suas questões à interpretação da Diretiva Cidadania não obsta a que o Tribunal de Justiça lhe forneça todos os elementos de interpretação do direito da União que lhe possam ser úteis para chegar a uma decisão ( 14 ).

35.

Por essa razão, proporei uma interpretação do artigo 45.o, n.o 2, TFUE, tomando em consideração o Regulamento Trabalhadores na medida em que o considero útil para o caso em apreço, especialmente para a apreciação da terceira questão prejudicial. Por conseguinte, proporei também ao Tribunal de Justiça como reformular essa questão, a fim de fornecer uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio.

B. Quanto ao mérito

36.

O principal motivo do presente processo é o Regulamento de 2015, uma medida legislativa pela qual a Irlanda transpôs a Diretiva Cidadania para o seu direito interno. Este ato transpõe quase literalmente as definições dos membros da família ( 15 ), bem como as regras sobre o direito de residência dos membros da família ( 16 ), tal como estão regulamentados na Diretiva Cidadania.

37.

O Regulamento de 2015 rege também a conservação do direito de residência, incluindo dos membros da família. O artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento de 2015 (v. n.o 14 das presentes conclusões) condiciona, no essencial, a conservação do direito de residência dos ascendentes diretos a dois requisitos: em primeiro lugar, que o ascendente direto dependa do cidadão móvel da União ( 17 ) e, em segundo lugar, que esse ascendente não se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado.

38.

Se o ascendente direto não beneficiar de um direito de residência na Irlanda, não é elegível para efeitos do subsídio de invalidez. Ambos os argumentos, o facto de deixar de estar dependente e de ser uma sobrecarga do regime de segurança social, foram invocados nas diferentes decisões de indeferimento do pedido de subsídio de invalidez de GV.

39.

Com as suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende determinar se alguma dessas duas condições para conservação do direito de residência na Irlanda é permitida pelo direito da União.

40.

Para responder a estas questões, procederei da seguinte forma: analisarei as questões pela ordem em que foram colocadas. Contudo, a primeira questão suscita necessariamente outra questão, que também é relevante para a resposta à segunda questão: o que implica a dependência? Depois de apresentar a minha posição sobre a primeira questão, tratarei, por conseguinte, desta problemática adicional, antes de abordar a segunda e a terceira questões.

1.   Primeira questão: A dependência é um requisito contínuo para o direito de residência?

41.

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende essencialmente determinar se, ao abrigo do artigo 21.o, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania ( 18 ), basta que o ascendente estivesse dependente no momento em que se reuniu com o trabalhador móvel da União no Estado de acolhimento, ou se esta dependência é um requisito contínuo para a existência do direito de residência derivado nesse Estado.

42.

A este respeito, GV e a Comissão alegam que a dependência só tem de existir no momento em que o progenitor se reúne com o trabalhador móvel no Estado de acolhimento. Para fundamentar esta posição, invocam os Acórdãos Jia ( 19 ) e Reyes ( 20 ). Nesses processos, o Tribunal de Justiça confirmou que a dependência de um membro da família em relação a um cidadão da União que exerceu o seu direito de circulação (ou em relação ao cônjuge do cidadão da União que exerceu esse direito) tinha de existir no país de origem antes de adquirir o direito de residência no Estado de acolhimento ( 21 ).

43.

Os demandados e os outros governos intervenientes alegam, pelo contrário, que GV só pode beneficiar do direito de residência derivado enquanto estiver dependente da sua filha. Assim, a dependência é um requisito contínuo ao abrigo do artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania, e cessa se lhe for atribuído o subsídio de invalidez pelas autoridades irlandesas.

44.

Nos processos que deram origem aos Acórdãos Jia e Reyes, invocados pela demandante no processo principal, o Tribunal de Justiça foi convidado a pronunciar‑se sobre a legalidade das condições para a obtenção de uma autorização de residência aquando da chegada ao Estado de acolhimento. As condições para a conservação de um direito de residência não eram objeto de nenhum desses processos. Além disso, ao contrário desses dois processos, em que foram recusadas autorizações de residência aos requerentes, no caso em apreço, GV já beneficia de um direito de residência na Irlanda. Por conseguinte, as conclusões do Tribunal de Justiça nos Acórdãos Jia e Reyes não resolvem a situação no caso apreço.

45.

Esses dois processos não obstam, portanto, à conclusão de que a dependência, como base para um direito de residência derivado, tem de existir durante o período de permanência do progenitor no Estado de acolhimento, como alegado pelos recorridos e pelos governos intervenientes.

46.

Estou inclinado a aceitar esta última posição.

47.

O direito de residência derivado não é, indiscutivelmente, um direito autónomo de que beneficiam os ascendentes diretos. Beneficiam desse direito, numa leitura conjugada do artigo 7.o, n.o 1, alínea d), e do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva Cidadania, porque são ascendentes diretos dependentes. Tal direito de residência difere do direito de residência direto que essa pessoa também pode adquirir ( 22 ), pelo facto de estar relacionado e depender do exercício do direito de livre circulação de um cidadão móvel da União, no caso em apreço, enquanto trabalhador. Por conseguinte, parece‑me lógico que a dependência em relação a esse cidadão da União deve continuar depois de um membro direto da sua família se reunir com esse cidadão no Estado de acolhimento.

48.

Além disso, o artigo 14.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania, que regula a conservação do direito de residência, torna claro que os membros da família conservam os direitos previstos no artigo 7.o da mesma enquanto preencherem as condições estabelecidas nesta disposição. Uma vez que esta disposição se refere aos membros da família como definidos no artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania, tal pode ser entendido no sentido de que implica que os direitos de residência existem enquanto persistir a situação de dependência.

49.

Por último, é precisamente o facto de um ascendente direto estar dependente do seu filho ou filha que justifica o direito do primeiro a estar presente no Estado de acolhimento. Como explicado pelo Tribunal de Justiça, a Diretiva Cidadania tem por objetivo facilitar e reforçar o exercício do direito fundamental de circulação ( 23 ). O direito de residência derivado de um ascendente direto contribui, assim, para o exercício do direito de circulação do trabalhador móvel da União.

50.

Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão do órgão jurisdicional de reenvio que o artigo 21.o, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea d), e pelo artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania, deve ser interpretado no sentido de que a condição de dependência do ascendente direto em relação a um trabalhador móvel da União é exigida enquanto o direito de residência desse ascendente derivar do direito de livre circulação exercido por esse trabalhador móvel da União.

51.

No entanto, saber se um pedido de subsídio de invalidez significa que a situação de dependência cessou é uma questão diferente. Esta questão exige, em primeiro lugar, uma interpretação do conceito de dependência.

2.   Conceito de «dependência»

52.

Uma leitura conjugada do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), e do artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania torna claro que só os ascendentes diretos que estejam dependentes gozam do direito de residência derivado ( 24 ).

53.

Contudo, a Diretiva Cidadania não esclarece mais aprofundadamente o conceito de «dependência» dos ascendentes diretos ( 25 ). Com efeito, as diferentes versões linguísticas do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), desta diretiva divergem. Para citar apenas algumas, a versão inglesa utiliza o termo «dependente», a versão francesa a expressão «à charge», a versão alemã «Unterhalt gewährt wird», a versão italiana «a carico», a versão croata «uzdržavanici», a versão neerlandesa «te hunnen laste», a versão polaca «utrzymaniu» e a versão romena «în întreținere».

54.

Embora pareça que algumas dessas versões linguísticas sugerem apenas dependência financeira ou material, há razões para questionar se a referida diretiva se refere apenas a esse tipo de dependência. Por outras palavras, uma pessoa só é dependente, para efeitos da referida diretiva, quando necessita de apoio financeiro de outra pessoa? Em alternativa, a dependência inclui também outras necessidades, como a necessidade de apoio físico ou afetivo?

55.

Os trabalhos preparatórios da Diretiva Cidadania não parecem proporcionar uma resposta. A definição de membros da família que consta do artigo 2.o, n.o 2, da referida diretiva resulta da transferência para este ato legislativo da disposição substancialmente idêntica do artigo 10.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (CEE) n.o 1612/68 ( 26 ). Esta disposição referia‑se aos «ascendentes […] que se encontrem a seu cargo» ( 27 ), mas a razão pela qual esta qualificação foi utilizada não foi explicada, nem no ato nem na jurisprudência relativa ao mesmo. Na proposta inicial da Comissão a respeito da Diretiva da Cidadania, o artigo 2.o, n.o 2, alínea d), não continha essa qualificação e referia‑se simplesmente a «ascendentes diretos» ( 28 ). Contudo, durante o processo legislativo, a redação conforme figurava no Regulamento n.o 1612/68 foi retomada, incluindo novamente a expressão «que estejam a cargo» ( 29 ). As razões subjacentes a esta alteração não resultam de forma evidente dos documentos preparatórios, pelo que só se pode especular sobre a intenção legislativa.

56.

Os demandados no processo principal, bem como os governos intervenientes entendem o conceito de dependência no sentido de que está relacionado apenas com a dependência financeira. Consequentemente, alegam que GV deixará de estar dependente da sua filha se lhe for concedido o subsídio de invalidez. Ficará então, segundo se afirma, dependente do Estado e não da sua filha.

57.

Com efeito, nos processos em matéria de direitos de residência derivados dos membros diretos da família, o Tribunal de Justiça confirmou que a necessidade de apoio financeiro significa que a pessoa está dependente na aceção da Diretiva da Cidadania ( 30 ). No entanto, nesses processos, não foi pedido ao Tribunal de Justiça que esclarecesse o conceito de dependência. Simplificando, a situação factual em causa em cada um desses processos constituía uma forma de dependência desse tipo ( 31 ).

58.

Por conseguinte, essa jurisprudência não pode ser entendida no sentido de que estabelece que apenas a dependência financeira é relevante para efeitos de ser elegível para os direitos de residência derivados ao abrigo da Diretiva Cidadania. No meu entendimento, várias razões levam a uma conclusão diferente, que a dependência na aceção da Diretiva da Cidadania é um conceito mais amplo, que também inclui as necessidades afetivas e físicas.

59.

Em primeiro lugar, na minha opinião, a dependência material ou financeira é a razão menos importante para permitir que um trabalhador móvel da União traga os seus progenitores para o Estado de acolhimento em que vive e trabalha. Se tudo o que estiver em causa for apoio financeiro, esse apoio poderá também ser prestado aos progenitores que permaneçam nos seus países de origem. Não é necessário trazê‑los para o Estado de acolhimento para lhes prestar alojamento ou apoio financeiro para alimentação ou vestuário. Poderia até ser mais barato prestar tal apoio no país de origem dos progenitores, onde os custos de vida poderão ser inferiores aos do Estado de acolhimento. Pelo contrário, oferecer apoio afetivo e físico a um progenitor é, na maioria dos casos, impossível se o progenitor não viver próximo dos seus filhos.

60.

Em segundo lugar, resulta claramente dos documentos preparatórios da Diretiva Cidadania que a razão subjacente ao reconhecimento dos direitos derivados dos membros da família era permitir o gozo efetivo do direito à vida familiar ( 32 ). Esse direito fundamental, reconhecido pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») ( 33 ), abrange a existência de relações afetivas entre os membros da família ( 34 ).

61.

Em terceiro lugar, uma interpretação tão ampla do conceito de «dependência» é coerente com o objetivo da Diretiva Cidadania de contribuir para o direito de circulação dos trabalhadores móveis da União. Se GV precisasse da companhia e dos cuidados da sua filha, mas não pudesse reunir‑se com ela no Estado‑Membro em que a sua filha vive e trabalha, seria (pelo menos até inventarmos o teletransporte) provável que a filha se visse obrigada a deixar o Estado de acolhimento para se reunir com a mãe no Estado de origem desta ( 35 ). Isso representaria um obstáculo ao direito de AC de circular e residir livremente no território dos Estados‑Membros. Um trabalhador móvel da União, filho de um progenitor nacional de um país terceiro que tem necessidade desse tipo de apoio, poderia ver‑se obrigado a deixar o território da União Europeia.

62.

Sobre este aspeto específico, a jurisprudência do Tribunal de Justiça confirma que o direito da União reconhece a importância de assegurar a proteção da vida familiar dos nacionais dos Estados‑Membros, a fim de eliminar os obstáculos ao exercício das liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado ( 36 ).

63.

Por último, há indicações na jurisprudência de que o Tribunal de Justiça entende o conceito de dependência, para efeitos da Diretiva Cidadania, em sentido mais lato do que apenas em termos de necessidades financeiras. Antes de mais, o Tribunal de Justiça considerou que o artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania deveria ser objeto de uma interpretação lata ( 37 ).

64.

Além disso, a jurisprudência recente relacionada com o artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania, que diz respeito aos membros da família mais distantes, reconheceu um entendimento mais lato do conceito de dependência ( 38 ). Apesar dos direitos mais limitados que o artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania concede aos membros da família em comparação com o direito de residência automático concedido aos membros da família abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva Cidadania, não há razão para entender o conceito de «dependência» de forma diferente ao longo desta diretiva nem, com efeito, nos vários atos jurídicos que regulam os direitos dos membros da família dos trabalhadores móveis da União ( 39 ).

65.

Pelas razões acima expostas, proponho que o Tribunal de Justiça adote um conceito lato de dependência, que existe sempre que uma pessoa necessita do apoio material, financeiro, físico ou afetivo de um membro da família. Por conseguinte, mesmo que GV deixasse de necessitar do apoio financeiro da sua filha, poderia ainda assim preencher o requisito de dependência em que se baseia o direito de residência derivado.

3.   Segunda questão: Pode o acesso a prestações sociais pôr termo ao direito de residência derivado do ascendente dependente de um trabalhador móvel da União?

66.

Como explicado pelo órgão jurisdicional de reenvio, o direito irlandês opõe‑se ao pagamento do subsídio de invalidez a uma pessoa que não tenha a sua residência habitual nesse Estado. A residência habitual só pode existir se a pessoa tiver o direito de residir na Irlanda. Aos cidadãos irlandeses não pode, em resultado do direito internacional, ser recusada residência legal na Irlanda. Contudo, os nacionais de outros países têm de ter um fundamento jurídico reconhecido pelo direito irlandês que possam invocar para beneficiar de um direito de residência. Um desses fundamentos jurídicos é o artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania.

67.

Foi esta situação jurídica que deu origem à segunda questão do órgão jurisdicional de reenvio. Com esta questão, esse órgão jurisdicional pergunta, no essencial, se o artigo 21, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pela Diretiva Cidadania, deve ser interpretado no sentido de que o pagamento de um subsídio de invalidez ao ascendente direto de um trabalhador cidadão da União faz cessar a dependência do ascendente em relação ao trabalhador e, portanto, põe termo ao seu direito de residência derivado.

68.

Se o Tribunal de Justiça aceitar a minha proposta de resposta à primeira questão — que a dependência tem de ser contínua para servir de justificação para o direito de residência de um ascendente direto fundamentado no artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania —, resulta daí que a cessação da dependência de um ascendente direto em relação ao cidadão móvel da União põe termo ao direito de residência derivado desse ascendente com base nesta disposição.

69.

Contudo, isto não significa que a apresentação de um pedido de uma prestação social ponha termo à dependência do ascendente direto em relação ao cidadão móvel da União.

70.

Em primeiro lugar, e na medida em que o Tribunal de Justiça aceite a minha proposta e interprete o conceito de dependência de forma lata, a concessão do subsídio de invalidez pode cobrir a dependência financeira (ou pelo menos a parte dela), mas é pouco provável que atenda a outras necessidades de apoio dos ascendentes ( 40 ). As autoridades estatais irlandesas dificilmente poderiam substituir os cuidados e o apoio afetivo prestados por um filho.

71.

Assim, mesmo que o Estado‑Membro de acolhimento cubra parte, ou mesmo a totalidade, dos custos financeiros do progenitor que vive nesse Estado, esse progenitor continuará a estar dependente do cidadão móvel da União de quem derivam os seus direitos de residência, se continuar a necessitar de apoio material, afetivo ou físico.

72.

Em segundo lugar, mesmo que o facto de estar dependente signifique apenas a necessidade de apoio material ou financeiro, o pedido de subsídio de invalidez não pode levar automaticamente à conclusão de que o direito de residência com base na Diretiva Cidadania terminaria se o subsídio fosse concedido.

73.

Como sugerido pela Comissão, tal conclusão resultaria num círculo vicioso infinito, que não pode ser permitido: conduziria ao cenário em que, uma vez atribuída uma prestação social a um membro da família, o seu direito de residência termina, obstando, por sua vez, à possibilidade de lhe ser atribuída uma prestação social. Contudo, sem essa prestação social, o membro da família volta a estar dependente do cidadão móvel da União, o que significa que beneficia de um direito de residência derivado e preenche uma condição prévia para pedir a prestação social. E assim por diante, ad infinitum.

74.

A forma de sair de um círculo vicioso tão absurdo é fechá‑lo num determinado momento. O estatuto de um membro da família dependente de um trabalhador deve, por conseguinte, ser apreciado separadamente da concessão de um determinado subsídio.

75.

O Tribunal de Justiça já aceitou tal abordagem no Acórdão Lebon, que apreciou o direito de uma filha dependente de um cidadão móvel da União de pedir um subsídio social belga, denominado minimex.

76.

Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que «um pedido de minimex apresentado por um membro da família do trabalhador migrante a cargo deste último não poderá afetar essa qualidade de membro da família a cargo. Decidir de outra forma redundaria, com efeito, em admitir que a concessão do minimex poderia fazer perder ao interessado a sua qualidade de membro da família a cargo e justificar, por conseguinte, quer a supressão do minimex, quer a própria perda do direito de permanência. Uma tal solução, na prática, impediria o membro da família a cargo de pedir o minimex e atentaria, por isso, contra a igualdade de tratamento reconhecida ao trabalhador migrante. Convirá, por isso, apreciar a qualidade de membro da família a cargo, abstraindo da concessão do minimex ( 41 )». Embora o Acórdão Lebon dissesse respeito a um descendente direto, não há razão para que a mesma lógica não deva ser aplicada aos ascendentes diretos ( 42 ).

77.

Assim, mesmo que a dependência seja entendida como a mera necessidade de apoio financeiro (o que é, a meu ver, uma interpretação demasiado restrita deste conceito), a concessão de apoio financeiro por parte do Estado‑Membro não põe termo à dependência da pessoa que beneficia do apoio.

78.

O facto de ser elegível para o subsídio de invalidez (para cuja concessão, por força do direito irlandês, devem estar preenchidas determinadas condições médicas e financeiras) confirma, em vez de negar, a situação de dependência. Com efeito, se as autoridades estatais não apoiassem o membro da família a cargo, o principal prestador de cuidados, um trabalhador móvel da União, teria de cobrir os custos de apoio associados.

79.

Por conseguinte, a concessão de uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo, como o subsídio de invalidez, não pode afetar a situação de dependência do requerente.

80.

Para acrescentar um argumento suplementar à conclusão acima referida, importa observar que nem a alínea a) nem a alínea d) do artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania contêm o requisito de o trabalhador ou o membro da sua família serem autossuficientes para não se tornarem uma sobrecarga para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento ( 43 ). Apenas o artigo 7.o, n.o 1, alíneas b) e c), desta diretiva impõe a autossuficiência como condição para obter um direito de residência. Voltarei a este ponto quando discutir o argumento de que um membro da família pode tornar‑se uma sobrecarga para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento ( 44 ).

81.

Além disso, como sustentado pela Comissão Europeia, as medidas tomadas por um membro da família dependente para reforçar a sua autonomia no Estado‑Membro de acolhimento não o deveriam de maneira nenhuma privar de um direito de residência.

82.

Caso contrário, isso significaria que apenas as pessoas que não necessitam de um subsídio especial de caráter não contributivo seriam elegíveis para este subsídio. A lei não deve ser interpretada de uma forma que conduza a um resultado tão absurdo ( 45 ).

83.

Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão do órgão jurisdicional de reenvio explicando que o artigo 21.o, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea d), e pelo artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania, deve ser interpretado no sentido de que um pedido de uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo apresentado pelo ascendente direto de um cidadão móvel da União não põe termo à dependência desse parente em relação ao trabalhador e, por conseguinte, não altera o seu direito de residência derivado.

4.   Terceira questão: O direito à igualdade de tratamento e as preocupações orçamentais dos Estados‑Membros

84.

Conforme explicado no início ( 46 ), o direito irlandês prevê que um ascendente direto pode conservar um direito de residência derivado sob duas condições: (1) se estiver dependente do cidadão móvel da União e (2) se não constituir uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado. Assim, mesmo que o ascendente continue a estar dependente, perderá o seu direito de residência se se tornar uma sobrecarga não razoável.

85.

Com este fundamento, o Chief Appeals Officer, na decisão objeto de recurso no órgão jurisdicional de reenvio, considerou que, embora GV tenha um direito de residência, não tem direito a pedir o subsídio de invalidez, porque isso faria com que se tornasse uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social e acarretaria a perda do seu direito de residência.

86.

Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura, no essencial, determinar se o direito da União se opõe à limitação do acesso ao subsídio de invalidez no Estado de acolhimento por parte de um ascendente direto de um trabalhador móvel da União, com o fundamento de que o pagamento dessa prestação fará com que o membro da família em causa se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado.

87.

Importa recordar, antes de mais, que o direito da União não concede um direito à segurança social aos cidadãos móveis da União e aos membros das suas famílias. A organização do estado‑providência encontra‑se, em princípio, na esfera de competências mantida pelos Estados‑Membros. Essas competências incluem a escolha dos tipos de prestações de segurança social, bem como as condições para se tornar beneficiário.

88.

Por conseguinte, a questão não é se GV tem direito ao subsídio de invalidez. Esta é uma questão do direito irlandês. No entanto, o direito da União intervém através do princípio da igualdade de tratamento em razão da nacionalidade ( 47 ). Proíbe que os Estados‑Membros tratem os nacionais de outros Estados‑Membros de maneira discriminatória em relação aos seus próprios nacionais. Mesmo que possa ser aplicado diretamente com base no Tratado, o princípio da igualdade de tratamento em razão da nacionalidade encontra a sua expressão específica em diferentes atos do direito derivado da União, incluindo no artigo 24.o da Diretiva Cidadania e no artigo 7.o do Regulamento Trabalhadores.

89.

Consequentemente, GV pode pedir acesso ao benefício do subsídio de invalidez invocando o princípio da igualdade de tratamento. Se os cidadãos irlandeses têm acesso a tal subsídio, ela também deve ter acesso ao mesmo.

90.

No caso em apreço, defendo que existem duas pessoas cujo direito à igualdade de tratamento poderá servir de fundamento ao direito de GV a pedir o subsídio de invalidez.

91.

A primeira pessoa é a própria GV: enquanto ascendente direta dependente de um cidadão móvel da União, deve, ao abrigo do artigo 24.o da Diretiva Cidadania, ser tratada da mesma forma que os cidadãos irlandeses no que diz respeito ao seu acesso ao subsídio de invalidez.

92.

A segunda pessoa é a sua filha, AC. Ao ser recusado à sua mãe dependente o acesso ao subsídio de invalidez, AC fica numa posição menos vantajosa do que aquela de que beneficiam os trabalhadores irlandeses cujo progenitor dependente pode pedir o subsídio de invalidez. A proibição de discriminação de AC pode basear‑se não só no seu estatuto de cidadã da União que reside no Estado de acolhimento ao abrigo do artigo 7.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva Cidadania, mas também, como sugerido pela Comissão, no seu estatuto de trabalhador que exerceu o seu direito à livre circulação ao abrigo do artigo 45.o TFUE, lido à luz do Regulamento Trabalhadores. Este regulamento enuncia, no seu artigo 7.o, o princípio da igualdade de tratamento.

93.

O órgão jurisdicional de reenvio sublinhou, na sua decisão de reenvio e no contexto da presente questão, que o principal cuidador no caso em apreço é um trabalhador móvel. Portanto, a eventual discriminação contra esse trabalhador não pode ser ignorada no presente processo.

94.

Consequentemente, proponho que o Tribunal de Justiça tenha em consideração ambas as perspetivas.

95.

Analisarei primeiro de que forma o pedido de subsídio de invalidez de GV se pode basear indiretamente no direito de AC à igualdade de tratamento (a) e, por conseguinte, de que forma se pode basear diretamente no seu próprio direito à igualdade de tratamento, conforme previsto na Diretiva Cidadania (b) ( 48 ). Em seguida, apreciarei se tais direitos podem ser limitados com base na preocupação de que, ao receber prestações sociais, um ascendente se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado de acolhimento (c).

a)   Igualdade de tratamento de AC como fundamento para o pedido de subsídio de invalidez de GV

96.

Na minha opinião, o direito de GV de pedir o subsídio de invalidez pode resultar do direito à igualdade de tratamento de que AC beneficia enquanto trabalhadora que exerceu o seu direito à livre circulação.

97.

O artigo 45.o, n.o 2, TFUE prevê que a livre circulação dos trabalhadores «implica a abolição de toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade, entre os trabalhadores dos Estados‑Membros, no que diz respeito ao emprego, à remuneração e demais condições de trabalho».

98.

Pode o tratamento diferenciado do progenitor do trabalhador móvel da União em relação aos progenitores dos trabalhadores que são nacionais do Estado de acolhimento ser entendido como uma discriminação proibida pelo artigo 45.o, n.o 2, TFUE?

99.

Esta disposição do Tratado foi posteriormente aplicada e clarificada pelo Regulamento Trabalhadores. O artigo 7.o, n.o 2, deste regulamento prevê que um trabalhador que seja cidadão da União «beneficia das mesmas vantagens sociais e fiscais que os trabalhadores nacionais» noutro Estado‑Membro ( 49 ).

100.

Isto suscita a questão de saber se uma prestação social recebida pelo progenitor de um trabalhador pode ser considerada uma vantagem social da qual esse trabalhador beneficia.

101.

Esta questão deve ser respondida afirmativamente pelas razões que passo a expor. Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça adotou um entendimento lato do conceito de «vantagem social» que consta do Regulamento Trabalhadores ( 50 ). Abrange «todas as vantagens que, ligadas ou não a um contrato de trabalho, são geralmente reconhecidas aos trabalhadores nacionais, em razão principalmente da sua qualidade objetiva de trabalhadores ou pelo simples facto de residirem no território nacional, e cujo alargamento aos trabalhadores nacionais de outros Estados‑Membros se afigura assim apto a facilitar a sua mobilidade no interior da União e, por conseguinte, a sua integração no Estado‑Membro de acolhimento» ( 51 ).

102.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça já confirmou que este conceito pode incluir uma prestação social, como um subsídio de invalidez ( 52 ). Confirmou igualmente que o termo «vantagens sociais» na aceção do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores pode aplicar‑se a prestações que, ao mesmo tempo, sejam abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 883/2004, como o subsídio de invalidez em causa no presente processo ( 53 ).

103.

Em segundo lugar, o termo «vantagem social» do trabalhador também inclui uma prestação social, como o subsídio de invalidez, quando é concedida ao progenitor de um trabalhador e não ao próprio trabalhador.

104.

Inicialmente o Tribunal de Justiça limitou o termo «vantagens sociais» no sentido de abranger apenas as prestações concedidas aos próprios trabalhadores ( 54 ), mas a jurisprudência mudou depois do Acórdão Lebon. Decorre desse acórdão que uma prestação concedida a um descendente direto pode constituir uma «vantagem social» do trabalhador se esse descendente estiver dependente do trabalhador ( 55 ).

105.

Na minha opinião, o mesmo é aplicável aos ascendentes dependentes. GV depende de AC. O que ela não obtiver da segurança social pública será necessariamente providenciado por AC. Por outras palavras, se GV receber o subsídio de invalidez, esse pagamento também facilitará a situação de AC ( 56 ). Se, pelo contrário, as autoridades irlandesas recusarem tal assistência à sua mãe, AC ficará numa posição de desvantagem em comparação com os trabalhadores irlandeses que se encontram numa situação semelhante.

106.

Para apreciar se fica numa posição de desvantagem, AC deve ser comparada a trabalhadores que sejam nacionais irlandeses. Esses trabalhadores podem também ter progenitores que são cidadãos da União, mas não irlandeses, a quem poderiam ser recusadas prestações por invalidez se residissem nesse Estado há menos de cinco anos ( 57 ). No entanto, na maioria das situações, os progenitores dos trabalhadores irlandeses serão também nacionais irlandeses e, portanto, terão direito a pedir o subsídio de invalidez. A este respeito, a discriminação de AC resultante do facto de a sua mãe não poder pedir o subsídio de invalidez pode ser qualificada de discriminação indireta em relação às vantagens sociais de que beneficiam os trabalhadores nacionais.

107.

Por último, uma linha jurisprudencial constante confirma que os membros da família dependentes são os beneficiários indiretos da igualdade de tratamento conferida aos trabalhadores móveis da União na aceção do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores ( 58 ). O Tribunal de Justiça já incluiu os ascendentes diretos no grupo desses beneficiários indiretos ( 59 ).

108.

Mesmo que sejam apenas beneficiários indiretos do direito do trabalhador à igualdade de tratamento, os parentes dependentes podem pedir prestações sociais em seu próprio nome ( 60 ). Assim, não procedem os argumentos apresentados pelos demandados e pelos governos dos Estados‑Membros intervenientes no sentido de que o direito de AC à igualdade de tratamento não é pertinente, visto que GV submeteu o pedido em seu próprio nome.

109.

A interpretação sugerida para o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores favorece a livre circulação dos trabalhadores, na medida em que, como declarou recentemente o Tribunal de Justiça, permite criar condições ótimas para a integração dos membros da família dos trabalhadores da União que fizeram uso dessa liberdade e exerceram uma atividade profissional no Estado‑Membro de acolhimento ( 61 ).

110.

Para concluir, os ascendentes diretos dependentes de um trabalhador móvel da União obtêm, assim, o direito de pedir prestações, que podem ser consideradas uma vantagem social para o trabalhador da União do qual estão dependentes, com base no artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores.

111.

Por conseguinte, atendendo à situação de dependência de GV em relação a AC, GV pode invocar o artigo 45.o, n.o 2, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores para pedir, como beneficiária indireta do direito à igualdade de tratamento da sua filha, uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo, como o subsídio de invalidez em causa no presente processo.

112.

Assim, a livre circulação dos trabalhadores e o Regulamento Trabalhadores já contêm uma resposta para o litígio submetido ao órgão jurisdicional de reenvio. Contudo, irei agora analisar a possibilidade de responder à questão desse órgão jurisdicional no que respeita à Diretiva da Cidadania.

b)   Igualdade de tratamento de GV como fundamento de um direito a pedir o subsídio de invalidez

113.

O artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania estabelece que todos os cidadãos da União que, nos termos desta diretiva, residam no território do Estado‑Membro de acolhimento beneficiam de igualdade de tratamento em relação aos nacionais desse Estado‑Membro, no âmbito de aplicação do Tratado.

114.

A jurisprudência clarificou que um cidadão da União pode reclamar uma igualdade de tratamento com os nacionais do Estado‑Membro de acolhimento se a sua residência no território do Estado‑Membro de acolhimento respeitar as condições da Diretiva Cidadania ( 62 ).

115.

Como GV é a ascendente dependente de um trabalhador móvel da União, conforme explicado na primeira parte das presentes conclusões, preenche as condições da Diretiva Cidadania, pelo que beneficia de um direito de residência derivado na Irlanda. Consequentemente, tem direito à igualdade de tratamento.

116.

O direito de GV à igualdade de tratamento ao abrigo do Regulamento Trabalhadores é um direito derivado baseado no direito direto da sua filha à igualdade de tratamento. No entanto, GV beneficia do seu próprio direito direto à igualdade de tratamento ao abrigo do artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva da Cidadania. A partir do momento em que é titular de um direito de residência derivado, adquire o seu próprio direito direto a ser tratada da mesma forma que os cidadãos irlandeses. Assim, deveria ter direito a pedir o subsídio de invalidez nas mesmas condições que os cidadãos irlandeses.

117.

Contudo, os demandados no processo principal, a Irlanda e os Governos checo, dinamarquês e alemão consideram que um Estado‑Membro não é obrigado a conceder tal subsídio se o requerente se tornar uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social.

c)   A questão da «sobrecarga não razoável»

118.

A alegação de que GV pode representar uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado («argumento da sobrecarga não razoável») foi utilizada no presente processo para expressar três tipos diferentes de preocupações. A primeira tem a ver com o efeito restritivo que a concessão de acesso às prestações sociais pode ter sobre as escolhas dos Estados‑Membros em matéria de política de assistência social. A segunda tem a ver com solidariedade. A terceira, relacionada com as anteriores, diz respeito ao receio do chamado turismo social. Analisarei sucessivamente os três tipos de preocupações, antes de concluir que não podem ser invocados argumentos baseados nestas preocupações para limitar o direito de GV à igualdade de tratamento, quer enquanto direito indireto baseado no direito direto da sua filha a ser tratada da mesma forma na qualidade de trabalhador móvel, quer enquanto direito direto próprio à igualdade de tratamento, que GV adquiriu através do seu direito de residência derivado.

1) Sobrecarga não razoável como preocupação para os regimes de segurança social

119.

É indiscutível que as preocupações quanto à sustentabilidade das políticas sociais nacionais devem ser levadas a sério.

120.

Em matéria de livre circulação dos trabalhadores, o Tribunal de Justiça reconheceu que «considerações de ordem orçamental [podem] estar na base das opções de política social de um Estado‑Membro e influenciar a natureza ou o alcance das medidas de proteção social que pretenda adotar ( 63 )». No entanto, o Tribunal de Justiça excluiu que tais considerações possam justificar a discriminação contra os trabalhadores migrantes da União ( 64 ).

121.

Na medida em que o argumento da sobrecarga não razoável não pode ser utilizado como justificação para limitar os direitos à igualdade de tratamento dos trabalhadores móveis da União, também não pode ser utilizado para limitar o direito derivado à igualdade de tratamento do ascendente dependente desse trabalhador, cujo direito a pedir prestações sociais constitui uma vantagem social para o trabalhador em causa.

122.

A Irlanda não pode, por conseguinte, considerar GV uma sobrecarga não razoável para o seu regime de segurança social quando o seu pedido de subsídio de invalidez é analisado com base no direito da sua filha a ser tratada da mesma forma que os trabalhadores nacionais.

123.

A resposta é, a meu ver, a mesma se a situação jurídica de GV for apreciada enquanto ascendente direto de um trabalhador móvel da União que beneficia de um direito direto à igualdade de tratamento ao abrigo do artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania, com base no seu direito de residência derivado ao abrigo do artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da mesma diretiva.

124.

Passo a explicar: o direito primário concede direitos de livre circulação (que incluem o direito de residência e o direito à igualdade de tratamento) a todos os cidadãos da União, mas permite que estes direitos sejam sujeitos a condições estabelecidas no direito derivado da União ou no direito nacional. A Diretiva Cidadania estabelece o quadro que fixa as condições aceitáveis aos direitos de livre circulação. Reconhecendo as preocupações dos Estados‑Membros, previu que poderão ser impostas condições aos direitos de residência dos cidadãos da União a fim de evitar que estes se tornem uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento ( 65 ). Por conseguinte, permitiu que os Estados‑Membros limitem os direitos de residência de certas categorias de cidadãos (mas não de outras) expressamente previstas, ao permitir o argumento da sobrecarga não razoável como justificação.

125.

Contudo, isto só é possível em situações expressamente definidas e apenas em relação a certos grupos de cidadãos da União que não sejam economicamente ativos. Tais situações dizem respeito, em primeiro lugar, aos cidadãos cujos direitos de circulação se baseiam no pressuposto de que dispõem de recursos suficientes para si próprios e para os membros das suas famílias [artigo 7.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva Cidadania] e aos estudantes [artigo 7.o, n.o 1, alínea c), da mesma diretiva]. Fora dessas situações, o argumento da sobrecarga não razoável não pode ser invocado.

126.

Irei mais longe e acrescentarei que, mesmo quando se trata das limitações dos direitos de residência de categorias de cidadãos expressamente identificadas, tais limitações não podem ser automáticas. Apesar de algumas críticas doutrinárias dirigidas à clareza da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativamente a tais limitações ( 66 ), parece‑me claro que o Estado que pretenda invocar tal argumento terá primeiro de demonstrar a existência de ameaças sistémicas ao seu regime de segurança social ( 67 ) e ainda que essas ameaças justificam a limitação do direito de uma pessoa específica num caso concreto. Assim, ao optar por invocar o argumento da sobrecarga não razoável permitido pela legislação da União, os Estados‑Membros devem ainda observar o princípio da proporcionalidade ( 68 ).

127.

Todas as pessoas que beneficiam de um direito de residência com base na Diretiva Cidadania devem ser tratadas pelo Estado de acolhimento da mesma forma que os seus próprios nacionais. As únicas derrogações a este princípio estão expressamente previstas no artigo 24.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania. Sendo uma derrogação ao princípio da igualdade de tratamento, esta disposição deve ser interpretada de maneira estrita ( 69 ).

128.

Os ascendentes diretos dos trabalhadores móveis da União não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 24.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania.

129.

Para sintetizar, os direitos de residência dos ascendentes diretos dependentes não podem ser limitados com a justificação de que constituem uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social de um Estado, nem o direito à igualdade de tratamento que decorre do direito de residência pode ser limitado com base em nenhum fundamento.

130.

Este é, em meu entender, o resultado do consenso legislativo a nível da União sobre o equilíbrio aceitável entre os interesses da livre circulação e as preocupações relativas aos regimes de assistência social dos Estados‑Membros. As preocupações legítimas dos Estados‑Membros relativamente aos seus regimes de segurança social foram, como declarado pela Comissão, tidas em consideração durante o processo legislativo que conduziu à adoção da Diretiva Cidadania.

131.

O resultado desse consenso legislativo é a situação atual em que nem os trabalhadores móveis da União nem os seus ascendentes diretos dependentes podem ser considerados uma sobrecarga não razoável pelo Estado de acolhimento. Por outras palavras, tais membros da família constituem uma sobrecarga (não) razoável da mesma forma que os nacionais desse Estado constituem uma sobrecarga (não) razoável.

132.

A este respeito, os Estados‑Membros são livres de organizar os seus regimes de segurança social da maneira que considerarem adequada. Podem escolher que tipo de subsídios irão oferecer, ou decidir retirar um subsídio existente ou diminuir o seu montante. Contudo, ao fazerem essas escolhas, os Estados‑Membros devem incluir os membros da família dependentes dos trabalhadores móveis da União residentes no seu país como fatores que influenciam as suas decisões políticas.

133.

Consequentemente, a Irlanda não pode considerar GV uma sobrecarga não razoável para o seu regime de segurança social quando o seu pedido de subsídio de invalidez é analisado com base no seu direito direto à igualdade de tratamento que resulta do seu direito de residência derivado.

2) A sobrecarga não razoável como uma questão de solidariedade

134.

A segunda forma de entender o argumento da sobrecarga não razoável é em termos de solidariedade, vista como disponibilidade para participar na repartição dos encargos. Esta solidariedade baseia‑se geralmente na pertença a uma comunidade, seja ela nacional, profissional, familiar ou europeia ( 70 ), o que permite a exclusão daqueles que não são membros da comunidade, dado que a repartição de encargos com eles é considerada não razoável ( 71 ).

135.

A este respeito, os demandados alegam que os ascendentes diretos dependentes só devem ser elegíveis para prestações sociais, como o subsídio de invalidez, quando adquirem o direito de residência permanente, mas não durante os primeiros cinco anos da sua permanência no Estado de acolhimento. Segundo os mesmos, isso reflete‑se na estrutura da Diretiva Cidadania, que distingue entre permanências de curta duração no país até três meses ( 72 ), permanências superiores a três meses ( 73 ) e, por último, o direito de residência permanente, que pode ser adquirido após cinco anos de permanência no Estado de acolhimento ( 74 ). Na opinião dos demandados, durante os primeiros cinco anos, os membros da família devem continuar a ser da responsabilidade dos trabalhadores móveis da União com os quais se reuniram no Estado de acolhimento e não devem exigir que os contribuintes desse Estado suportarem os custos associados a esses membros da família.

136.

Com efeito, a Diretiva Cidadania reconhece um sistema gradual de direitos baseado na duração da permanência no Estado de acolhimento ( 75 ). Contudo, isto não reflete a gradação da solidariedade. Esta diretiva não prevê que os direitos dos parentes diretos que dependem do cidadão móvel da União possam ser limitados após os três meses da sua permanência no Estado de acolhimento ( 76 ).

137.

Tratar os ascendentes diretos de forma igual no que diz respeito ao seu acesso às prestações sociais favorece efetivamente a sua própria integração progressiva na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento ( 77 ).

138.

A Diretiva Cidadania, bem como o Regulamento Trabalhadores refletem, assim, «uma determinada solidariedade financeira dos nacionais desse Estado‑Membro com os dos outros Estados‑Membros», que o Tribunal de Justiça reconheceu no seu Acórdão pioneiro proferido no processo Grzelczyk ( 78 ).

139.

Finalmente, não se deve esquecer que, nos termos do artigo 70.o, n.o 4, do Regulamento n.o 883/2004, uma prestação como o subsídio de invalidez só pode ser pedida no Estado‑Membro de residência (v. n.o 7 das presentes conclusões). Por outras palavras, se esse tipo de prestação especial de caráter não contributivo existisse na Roménia, GV não poderia pedi‑la a esse Estado, uma vez que reside na Irlanda.

140.

A Irlanda não pode, por conseguinte, considerar GV uma sobrecarga não razoável para o seu regime de segurança social porque não fazia parte da sua sociedade durante o tempo suficiente para merecer solidariedade.

3) Sobrecarga não razoável e turismo social

141.

Por último, tenho de abordar uma preocupação adicional manifestada pelos governos dos Estados‑Membros que intervieram no presente processo, mas que também está presente na vida política da União, bem como na doutrina jurídica. Está relacionada com o receio do chamado «turismo social». Os Estados‑Membros, especialmente os que têm níveis de proteção social mais elevados, manifestaram a sua preocupação relativamente aos cidadãos da União que optam por se deslocar para esses países apenas para beneficiarem dos seus regimes de segurança social ( 79 ). Esta prática, considerada frequentemente um abuso dos direitos de livre circulação, foi abordada no Acórdão Dano ( 80 ). Nesse processo, foi declarado que os cidadãos da União economicamente inativos que exerceram o seu direito de livre circulação com o único objetivo de receberem o benefício do apoio social no Estado de acolhimento não podem beneficiar da igualdade de tratamento ao abrigo da Diretiva Cidadania ( 81 ).

142.

Pode tal abuso ocorrer quando o cidadão economicamente inativo obtém os seus direitos de residência e à igualdade de tratamento com base na circulação de um trabalhador móvel da União, que é um cidadão economicamente ativo? Poder‑se‑ia imaginar uma situação em que um cidadão da União decidiu ser um trabalhador assalariado (ou tornar‑se um trabalhador não assalariado) num Estado‑Membro diferente do seu Estado‑Membro de origem unicamente para permitir que o(s) seu(s) ascendente(s) direto(s) peça(m) assistência social no Estado de acolhimento. Mesmo num cenário tão improvável ( 82 ), o cidadão da União de cujo direito deriva o estatuto de beneficiário do parente direto dependente seria um trabalhador assalariado no Estado de acolhimento. A deslocação de um cidadão para outro Estado‑Membro com o objetivo de trabalhar não pode ser considerada um abuso, mas sim o exercício de um direito fundamental baseado no Tratado. Se uma pessoa entra no Estado de acolhimento apenas como pessoa à procura de emprego, o artigo 24.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania permite que o Estado‑Membro exclua essa pessoa, bem como os membros da sua família, do direito a certas prestações de assistência social, mas não necessariamente a todas as prestações, como as prestações da segurança social ( 83 ). Contudo, quando os direitos dos membros da família se baseiam nos direitos de um trabalhador móvel da União, não vejo como se pode alegar que esse trabalhador se deslocou com o único objetivo de receber assistência social.

143.

Mesmo que não o possa imaginar, não posso excluir totalmente a possibilidade de abuso. O artigo 35.o da Diretiva Cidadania, que foi adotada especificamente para prevenir o risco de abusos, e o Acórdão Dano poderiam ser utilizados em tais situações, a fim de evitar a concretização de esses riscos.

144.

A situação no caso em apreço não parece suscitar tais preocupações. AC trabalha e reside na Irlanda há um longo período de tempo. Estabeleceu fortes laços com a sociedade irlandesa, o que resulta de forma evidente do facto de ter obtido a nacionalidade irlandesa em 17 de julho de 2015 ( 84 ). É difícil acreditar que tudo isto foi planeado com a única finalidade de trazer a sua mãe para a Irlanda para pedir uma prestação social ( 85 ).

145.

Os argumentos acima expostos, considerados em conjunto ou separadamente, levam a concluir que, quando estão reunidas as condições relativas à igualdade de tratamento ( 86 ), o conceito de sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado‑Membro não constitui um fundamento legal para um Estado‑Membro recusar o acesso a prestações pecuniárias especiais de caráter não contributivo aos ascendentes diretos dependentes de trabalhadores móveis da União.

146.

Consequentemente, considero que o artigo 45.o, n.o 2, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores, e o artigo 21.o, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que limita o acesso a uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo a um ascendente direto de um trabalhador móvel da União que beneficia de um direito de residência derivado por estar dependente desse trabalhador e que reside legalmente há mais de três meses no Estado de residência, com o fundamento de que o pagamento dessa prestação fará com que o membro da família em causa se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social desse Estado.

V. Conclusão

147.

Tendo em conta o acima exposto, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais submetidas pela Court of Appeal (Tribunal de Recurso, Irlanda) do seguinte modo:

1)

O artigo 21.o TFUE, conforme concretizado pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea d), e pelo artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE,

deve ser interpretado no sentido de que:

a condição de dependência do ascendente direto em relação a um trabalhador móvel da União é exigida enquanto o direito de residência desse ascendente derivar do direito de livre circulação exercido por esse trabalhador móvel da União.

2)

O artigo 21.o TFUE, conforme concretizado pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea d), e pelo artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva 2004/38,

deve ser interpretado do seguinte modo:

um pedido de uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo apresentado pelo ascendente direto de um cidadão móvel da União não põe termo à dependência desse parente em relação ao trabalhador e, por conseguinte, não altera o seu direito de residência derivado.

3)

O artigo 45.o, n.o 2, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União, e o artigo 21.o, n.o 1, TFUE, conforme concretizado pelo artigo 24.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38,

devem ser interpretados no sentido de que:

se opõem a uma legislação nacional que limita o acesso a uma prestação pecuniária especial de caráter não contributivo a um ascendente direto de um trabalhador móvel da União que beneficia de um direito de residência derivado por estar dependente desse trabalhador e que reside legalmente há mais de três meses no Estado de residência, com o fundamento de que o pagamento dessa prestação fará com que o membro da família em causa se torne uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social desse Estado.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) V., por exemplo, Acórdãos de 18 de junho de 1987, Lebon (316/85, EU:C:1987:302; a seguir «Acórdão Lebon»); de 26 de fevereiro de 1992, Bernini (C‑3/90, EU:C:1992:89); de 8 de junho de 1999, Meeusen (C‑337/97, EU:C:1999:284); de 17 de setembro de 2002, Baumbast e R (C‑413/99, EU:C:2002:493); de 8 de maio de 2013, Alarape e Tijani (C‑529/11, EU:C:2013:290); de 20 de junho de 2013, Giersch e o. (C‑20/12, EU:C:2013:411); de 16 de janeiro de 2014, Reyes (C‑423/12, EU:C:2014:16; a seguir «Acórdão Reyes»); de 15 de dezembro de 2016, Depesme e o. (C‑401/15 a C‑403/15, EU:C:2016:955; a seguir «Acórdão Depesme»); e de 26 de março de 2019, SM (Menor colocado em kafala argelina) (C‑129/18, EU:C:2019:248).

( 3 ) V., por exemplo, Acórdãos de 17 de abril de 1986, Reed (59/85, EU:C:1986:157); de 30 de março de 2006, Mattern e Cikotic (C‑10/05, EU:C:2006:220); de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449); de 12 de março de 2014, O. e B. (C‑456/12, EU:C:2014:135); de 16 de julho de 2015, Singh e o. (C‑218/14, EU:C:2015:476); de 30 de junho de 2016, NA (C‑115/15, EU:C:2016:487); de 14 de novembro de 2017, Lounes (C‑165/16, EU:C:2017:862; a seguir «Acórdão Lounes»); de 5 de junho de 2018, Coman e o. (C‑673/16, EU:C:2018:385); e de 12 de julho de 2018, Banger (C‑89/17, EU:C:2018:570).

( 4 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social (JO 2004, L 166, p. 1). Nos termos do artigo 70.o, n.o 2, do referido regulamento, tais prestações têm três características principais: 1) destinam‑se a garantir meios de subsistência às pessoas que não podem garantir elas próprias esses meios; 2) não são financiadas através de contribuições, mas através de receitas fiscais; 3) são mencionadas no anexo X do Regulamento n.o 883/2004.

( 5 ) V. artigo 70.o, n.o 4, do Regulamento n.o 883/2004.

( 6 ) V. section 210, n.o 1, alínea a), do Social Welfare Consolidation Act 2005.

( 7 ) V. section 210, n.o 9, do Social Welfare Consolidation Act 2005.

( 8 ) Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77; a seguir «Diretiva Cidadania»).

( 9 ) O artigo 6.o do Regulamento de 2015 diz respeito ao direito de residência por períodos superiores a três meses. Transpõe o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania, incluindo a alínea d) do mesmo, para o direito irlandês.

( 10 ) Regulamento (UE) n.o 492/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2011, relativo à livre circulação dos trabalhadores na União (JO 2011, L 141, p. 1; a seguir «Regulamento Trabalhadores»).

( 11 ) V., neste sentido, Acórdão Lounes, n.o 61 e jurisprudência referida.

( 12 ) Acórdão Lounes, n.os 52 e 53.

( 13 ) O Regulamento Trabalhadores regula, nomeadamente, a igualdade de tratamento de um trabalhador, que é nacional de um Estado‑Membro, mas trabalha noutro Estado‑Membro, diferente do seu Estado de nacionalidade. Tal como a Diretiva Cidadania, não se aplica, portanto, aos direitos dos trabalhadores no Estado da sua nacionalidade. Assim, não pode regular os direitos de AC, que tem nacionalidade irlandesa, na Irlanda. No entanto, pela mesma lógica, conforme explicada em relação à Diretiva Cidadania, os direitos de uma pessoa que exerceu o seu direito de livre circulação para obter um emprego num Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro da sua nacionalidade original, que decorrem diretamente do artigo 45.o e do artigo 21.o, n.o 1, TFUE, não podem ser limitados apenas porque essa pessoa adquiriu também a nacionalidade do Estado‑Membro de acolhimento.

( 14 ) V., por exemplo, o Acórdãos de 5 de maio de 2011, McCarthy (C‑434/09, EU:C:2011:277, n.o 24), e de 20 de outubro de 2022, Digi (C‑77/21, não publicado, EU:C:2022:805, n.o 50 e jurisprudência referida).

( 15 ) V. artigo 3.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento de 2015 que define os membros da família elegíveis da mesma forma que (quase palavra por palavra) o artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania.

( 16 ) V. artigo 6.o, n.o 3, alínea a), do Regulamento de 2015, que transpõe o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva Cidadania, relativo ao direito de residência por qualquer período superior a três meses.

( 17 ) Impõe essa obrigação estabelecendo que uma pessoa conserva um direito de residência desde que cumpra as disposições pertinentes em que se baseia a residência, entre as quais a disposição que transpõe o artigo 7.o, n.o 1, alínea d), da Diretiva Cidadania.

( 18 ) Todos os participantes que apresentaram observações escritas ao Tribunal de Justiça concordam que, uma vez que o litígio no processo principal diz respeito a um cidadão da União e não a um nacional de um país terceiro, a referência ao artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania deve ser considerada um erro de escrita e a questão deve ser entendida no sentido de que se refere ao artigo 7.o, n.o 1, alínea d), desta diretiva.

( 19 ) Acórdão de 9 de janeiro de 2007, Jia (C‑1/05, EU:C:2007:1; a seguir Acórdão Jia, n.o 37).

( 20 ) Acórdão Reyes, n.o 30 e jurisprudência referida.

( 21 ) O Acórdão Jia dizia respeito a um pedido de autorização de residência apresentado pelos progenitores, nacionais de um país terceiro, do cônjuge de uma cidadã da União que exercia o seu direito de livre circulação. O Acórdão Reyes respeitava a um pedido de autorização de residência apresentado pela descendente, nacional de um país terceiro, do cônjuge de um cidadão da União que exercia o seu direito de livre circulação.

( 22 ) Essa mesma pessoa pode adquirir o direito de residência direto, por oposição ao direito de residência derivado baseado na dependência, através de outras disposições da Diretiva Cidadania. Por exemplo, tal pode ocorrer após cinco anos de residência no Estado de acolhimento (artigo 16.o desta diretiva), ou se esse membro da família se tornar economicamente ativo ao exercer uma atividade como trabalhador assalariado ou não assalariado no Estado de acolhimento [artigo 7.o, n.o 1, alínea a), da mesma diretiva].

( 23 ) Acórdão de 26 de março de 2019, SM (Menor colocado em kafala argelina) (C‑129/18, EU:C:2019:248, n.o 53 e jurisprudência referida).

( 24 ) O mesmo se aplica também aos descendentes diretos.

( 25 ) Quanto aos descendentes diretos, a Diretiva Cidadania [artigo 2.o, n.o 2, alínea c)] considera automaticamente que estão dependentes se tiverem menos de 21 anos de idade, mas permite a possibilidade de continuarem a estar dependentes depois de atingirem esta idade.

( 26 ) Regulamento do Conselho, de 15 de outubro de 1968, relativo à livre circulação dos trabalhadores na Comunidade (JO 1968, L 257, p. 2; EE 05 F1 p. 77).

( 27 ) O sublinhado é meu.

( 28 ) Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito à livre circulação e residência dos cidadãos da União e membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, COM (2001) 257 final (JO 2001, C 270 E, p. 150).

( 29 ) Posição Comum (CE) n.o 6/2004, de 5 de dezembro de 2003, adotada pelo Conselho, deliberando nos termos do artigo 251.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, tendo em vista a adoção de uma diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, C 54 E, p. 12). O artigo 2.o, n.o 2, alínea d), dessa versão do texto passou a referir «ascendentes diretos que estejam a cargo», sem qualquer explicação adicional.

( 30 ) A maioria desses processos dizia respeito a descendentes diretos. Por exemplo, o processo Lebon dizia respeito à filha de um trabalhador móvel da União, que era ela própria cidadã da União. O processo Reyes respeitava à filha (nacional de um país terceiro) de um cidadão móvel da União. O processo Depesme dizia respeito aos filhos dos cônjuges ou dos parceiros reconhecidos de vários trabalhadores fronteiriços móveis. A exceção é o processo Jia, que respeitava a progenitores dependentes.

( 31 ) A única questão relacionada com o conceito «dependência» que o Tribunal de Justiça esclareceu expressamente nesses processos foi que o estatuto de membro da família dependente resulta de uma situação de facto. V., neste sentido, Acórdão Lebon, n.o 22, Acórdão Jia, n.o 35, e Acórdão Depesme, n.o 58.

( 32 ) V., a este respeito, Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito à livre circulação e residência dos cidadãos da União e membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, p. 150, n.o 2.4. V., também, Meduna, M., Stockwell, N., Geyer, F., Adamo, C., Nemitz, P., «Institutional Report», Neergaard, U., Jacqueson, C. e Holst‑Christensen, N. (eds.) Union Citizenship, Development, Impact and Challenges, The XXVI FIDE Congress in Copenhague, 2014, Congress Publications, Copenhaga, 2014, vol. 2, p. 247.

( 33 ) Artigo 7.o da Carta.

( 34 ) V., a este respeito, Acórdão do TEDH de 4 de março de 2013, Butt c. Noruega (CE:ECHR:2012:1204JUD004701709, nomeadamente § 76), no qual esse tribunal decidiu com base no artigo 8.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que corresponde ao artigo 7.o da Carta.

( 35 ) V., por analogia, Acórdão de 8 de março de 2011, Ruiz Zambrano (C‑34/09, EU:C:2011:124, n.os 42 e 43), no qual, embora numa situação em que não está em causa a circulação, foi reconhecido o direito de residência de um progenitor porque, caso contrário, o filho, um cidadão estático da União, ver‑se‑ia obrigado a abandonar o território da União. V., também, mais recentemente, Acórdão de 5 de maio de 2022, Subdelegación del Gobierno en Toledo (Residência de um membro da família ‑ Recursos insuficientes) (C‑451/19 e C‑532/19, EU:C:2022:354, n.o 45), baseado numa lógica semelhante.

( 36 ) V., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 2002, Carpenter (C‑60/00, EU:C:2002:434, n.o 38), e de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449, n.o 56 e jurisprudência referida).

( 37 ) V., por exemplo, Acórdão Reyes, n.o 23, ou Acórdão de 26 de março de 2019, SM (Menor colocado em kafala argelina) (C‑129/18, EU:C:2019:248, n.o 53 e jurisprudência referida).

( 38 ) Acórdão de 15 de setembro de 2022, Minister for Justice and Equality (Nacional de um país terceiro primo de um cidadão da União) (C‑22/21, EU:C:2022:683, n.os 23 e 27). As necessidades de apoio que foram tidas em consideração, diferentes da necessidade de apoio financeiro, estavam relacionadas com problemas de saúde ou eram vínculos pessoais estreitos e estáveis, resultantes, por exemplo, de se viver em comunhão de habitação.

( 39 ) A Diretiva 2014/54/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa a medidas destinadas a facilitar o exercício dos direitos conferidos aos trabalhadores no contexto da livre circulação de trabalhadores (JO 2014, L 128, p. 8), prevê, no considerando 1, que a expressão «membros das suas famílias» deverá ser entendida como tendo o mesmo significado, para efeitos do Regulamento Trabalhadores, que a expressão definida no artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva Cidadania. Tal foi posteriormente confirmado no Acórdão Depesme (n.os 51 a 55) e no Acórdão de 2 de abril de 2020, Caisse pour l’avenir des enfants (Filho do cônjuge de um trabalhador fronteiriço) (C‑802/18, EU:C:2020:269, n.o 51).

( 40 ) Com efeito, na audiência, os Estados‑Membros intervenientes admitiram que, independentemente do pagamento do subsídio de invalidez, as dimensões física, material e afetiva da dependência entre AC e GV persistiriam.

( 41 ) Acórdão Lebon, n.o 20.

( 42 ) Para as referências relevantes, v. jurisprudência referida no n.o 107 das presentes conclusões.

( 43 ) Este argumento foi também apresentado pelo juiz Garrett Simons [High Court (Tribunal Superior)] na sentença proferida em primeira instância no processo principal. O juiz G. Simons considerou que «[n]ão há nenhum requisito, por força do artigo 7.o, n.o 1, alíneas a) ou d) [da referida diretiva], de autossuficiência no caso de um trabalhador e do membro da família a seu cargo». Acórdão de 29 de maio de 2020, High Court (Tribunal Superior, Irlanda), GV/Chief Appeals Officer, Social Welfare Appeals Office, [2020] IEHC 258, n.o 76.

( 44 ) Sobre esta matéria, v. n.os 118 e seguintes das presentes conclusões.

( 45 ) V., por exemplo, MacCormick, N., Rhetoric and the Rule of Law: A Theory of Legal Reasoning, Oxford University Press, Oxford, 2005, p. 138.

( 46 ) V., supra, n.o 37 das presentes conclusões.

( 47 ) Esta proibição de discriminação em razão da nacionalidade é um dos pilares do direito da União. Está atualmente expressa no artigo 18.o TFUE e faz parte de todas as disposições do Tratado sobre as liberdades fundamentais. Encontra‑se igualmente replicada no artigo 21.o, n.o 2, da Carta.

( 48 ) Escolhi esta ordem porque, desde a introdução da cidadania da União nos Tratados, a livre circulação dos trabalhadores pode ser entendida como a sua expressão específica. Como explicado pelo Tribunal de Justiça, «o artigo 21.o, n.o 1, TFUE, que enuncia de modo geral o direito de qualquer cidadão da União de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros, encontra expressão específica no artigo 45.o TFUE, relativo à liberdade de circulação dos trabalhadores […]». Acórdão de 11 de novembro de 2021, MH e ILA (Direitos à pensão em caso de insolvência) (C‑168/20, EU:C:2021:907, n.o 61 e jurisprudência referida).

( 49 ) O artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento Trabalhadores correspondia anteriormente ao artigo 7.o, n.o 2, do seu antecessor, o Regulamento n.o 1612/68. Assim, a jurisprudência relativa a este regulamento é pertinente para entendermos o conceito de «vantagem social» que consta do regulamento em vigor. Neste sentido, v. Acórdão de 6 de outubro de 2020, Jobcenter Krefeld (C‑181/19, EU:C:2020:794, n.o 34).

( 50 ) Acórdão de 30 de setembro de 1975, Cristini (32/75, EU:C:1975:120, n.o 12).

( 51 ) Acórdão de 6 de outubro de 2020, Jobcenter Krefeld (C‑181/19, EU:C:2020:794, n.o 41 e jurisprudência referida). Esta é uma frase constante reiterada na jurisprudência do Tribunal de Justiça desde o Acórdão de 31 de maio de 1979, Even e ONPTS (207/78, EU:C:1979:144, n.o 22).

( 52 ) Acórdãos de 27 de maio de 1993, Schmid (C‑310/91, EU:C:1993:221, n.o 18), e de 5 de maio de 2011, Comissão/Alemanha (C‑206/10, EU:C:2011:283, n.o 34).

( 53 ) Acórdão de 27 de maio de 1993, Schmid, C‑310/91, EU:C:1993:221, n.o 17.

( 54 ) Acórdão de 11 de abril de 1973, Michel S. (76/72, EU:C:1973:46, n.o 9).

( 55 ) Nesse processo, porém, o Tribunal de Justiça concluiu o contrário, isto é, que a prestação em causa não constituía uma vantagem para o trabalhador, porque o progenitor do requerente já não estava a sustentar o seu descendente. V. Acórdão Lebon, n.o 13.

( 56 ) Spaventa, E.(ed.), Rennuy, N., Minderhoud, P., The legal status and rights of the family members of EU mobile workers, Comissão Europeia, Direção‑Geral do Emprego, dos Assuntos Sociais e da Inclusão, Direção E ‑ Mobilidade Laboral e Assuntos Internacionais, Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, 2022, p. 17.

( 57 ) Essa é, de facto, a situação de AC após a sua naturalização. No entanto, pode haver também nacionais irlandeses que adquiriram essa nacionalidade pelo nascimento, mas cujos progenitores não são nacionais irlandeses.

( 58 ) Em relação a um descendente dependente de um trabalhador migrante, v. Lebon, n.o 12, e Acórdãos de 26 de fevereiro de 1992, Bernini (C‑3/90, EU:C:1992:89, n.o 26), e de 2 de abril de 2020, PF e o. (C‑830/18, EU:C:2020:275, n.o 26). Em relação ao cônjuge de um trabalhador migrante, v. Acórdão de 10 de setembro de 2009, Comissão/Alemanha (C‑269/07, EU:C:2009:527, n.o 65).

( 59 ) Acórdãos de 12 de julho de 1984, Castelli (261/83, EU:C:1984:280, n.o 10); de 6 de junho de 1985, Frascogna (157/84, EU:C:1985:243, n.o 23); e de 9 de julho de 1987, Frascogna (256/86, EU:C:1987:359, n.o 6).

( 60 ) Acórdão Lebon, n.o 13.

( 61 ) Acórdão de 6 de outubro de 2020, Jobcenter Krefeld (C‑181/19, EU:C:2020:794, n.o 51 e jurisprudência referida).

( 62 ) Acórdão de 11 de novembro de 2014, Dano (C‑333/13, EU:C:2014:2358, n.o 69).

( 63 ) Acórdão de 14 de junho de 2012, Comissão/Países Baixos (C‑542/09, EU:C:2012:346, n.o 57).

( 64 ) Ibidem. V., também, Acórdãos de 20 de junho de 2013, Giersch e o. (C‑20/12, EU:C:2013:411, n.os 51 e 52), e de 24 de outubro de 2013, Thiele Meneses (C‑220/12, EU:C:2013:683, n.o 43).

( 65 ) Considerando 10 da Diretiva Cidadania.

( 66 ) V., por exemplo, Verschueren, H., «Free Movement or Benefit Tourism: The Unreasonable Burden of Brey», European Journal of Migration and Law, vol. 16, 2014, pp. 147‑179; Thym, D., «The Elusive Limits of Solidarity: Residence Rights of and Social Benefits for Economicically Inactive Union Citizens», CML Rev vol. 52, 2015, pp. 17‑50, p. 28.

( 67 ) Para que tal argumento seja tomado em consideração como uma possível justificação dos limites impostos aos direitos de circulação, o Estado‑Membro que invoca o argumento da sobrecarga não razoável deve sustentar que existe uma verdadeira ameaça para o seu regime de segurança social, apresentando dados sérios e convergentes a esse respeito. V., por exemplo, Acórdão de 13 de abril de 2010, Bressol e o. (C‑73/08, EU:C:2010:181, n.o 71). V., também, Conclusões da advogada‑geral E. Sharpston nos processos apensos Prinz (C‑523/11 e C‑585/11, EU:C:2013:90, n.os 61 a 64).

( 68 ) V. e comparar, Dougan, M., «The constitutional dimension to the case‑law on Union citizenship», E.L.Rev., vol. 31(5), 2006, pp. 613‑641.

( 69 ) Acórdão de 1 de agosto de 2022, Familienkasse Niedersachsen‑Bremen (C‑411/20, EU:C:2022:602, n.o 50 e jurisprudência referida).

( 70 ) Supiot, A. La solidarité, Enquête sur un principe juridique, Odile Jacob, Paris, 2015, p. 12; De Witte, F., Justice in the EU, The Emergence of Transnational Solidarity, OUP, Oxford University Press, 2015, capítulo 4 (defendendo especificamente uma abordagem comunitária quando se trata de prestações mínimas de subsistência, como as prestações especiais de caráter não contributivo, pp. 151‑155).

( 71 ) Tal entendimento do argumento da sobrecarga não razoável pode, na minha opinião, explicar a jurisprudência que reconheceu como justificada a exigência de uma ligação real ou de um certo grau de integração na sociedade do Estado de acolhimento para a aquisição de direitos de residência e para os correspondentes pedidos à segurança social. V., por exemplo, em relação a pessoas à procura de emprego, Acórdãos de 11 de julho de 2002, D’Hoop (C‑224/98, EU:C:2002:432, n.o 39); de 23 de março de 2004, Collins (C‑138/02, EU:C:2004:172, n.os 67 a 69); e de 4 de junho de 2009, Vatsouras e Koupatantze (C‑22/08 e C‑23/08, EU:C:2009:344, n.os 38 e 39). Em relação a estudantes, v., por exemplo, Acórdãos de 15 de março de 2005, Bidar (C‑209/03, EU:C:2005:169, n.os 62 e 63); de 23 de outubro de 2007, Morgan e Bucher (C‑11/06 e C‑12/06, EU:C:2007:626, n.os 43 e 44); de 18 de novembro de 2008, Förster (C‑158/07, EU:C:2008:630, n.o 54); de 18 de julho de 2013, Prinz e Seeberger (C‑523/11 e C‑585/11, EU:C:2013:524, n.os 36 e 37); e de 24 de outubro de 2013, Thiele Meneses (C‑220/12, EU:C:2013:683, n.os 35 e 36); ou de 26 de fevereiro de 2015, Martens (C‑359/13, EU:C:2015:118, n.os 36 a 39).

( 72 ) Artigo 6.o da Diretiva Cidadania.

( 73 ) Artigo 7.o da Diretiva Cidadania.

( 74 ) Capítulo IV da Diretiva Cidadania.

( 75 ) Este sistema reproduz, de facto, no essencial, as fases e condições do estatuto de residência estabelecidas nos vários instrumentos do direito da União e na jurisprudência anteriores a essa diretiva. Pertencer a uma determinada comunidade pode, assim, culminar no direito de residência permanente. Acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 38), de 1 de agosto de 2022, Familienkasse Niedersachsen‑Bremen (C‑411/20, EU:C:2022:602, n.o 30).

( 76 ) Mesmo durante esse período, a possibilidade de exclusão abrange apenas as prestações especiais pecuniárias de caráter não contributivo e não outros subsídios da segurança social. Sobre esta matéria, v. Acórdão de 1 de agosto de 2022, Familienkasse Niedersachsen‑Bremen (C‑411/20, EU:C:2022:602, n.o 53).

( 77 ) V., por exemplo, Acórdão Lounes, n.o 56.

( 78 ) Acórdão de 20 de setembro de 2001, Grzelczyk (C‑184/99, EU:C:2001:458, n.o 44). Sobre o princípio da solidariedade e regimes sociais, v., Acórdão de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre (C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63).

( 79 ) Por exemplo, em maio de 2013, os ministros de quatro Estados‑Membros, a República da Áustria, a República Federal da Alemanha, o Reino dos Países Baixos e Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte) queixaram‑se da «fraude e abuso sistemático relacionados com a liberdade de circulação». V., por exemplo, Blauberger, M. e Schmidt, S. K., «Welfare migration? Free movement of EU citizens and access to social benefits», Research and Politics, outubro‑dezembro de 2014, pp. 1 a 7. V., também, Pascouau, Y., «Strong attack against the freedom of movement of EU citizens: Turning back the clock», Comentário na página Internet do Centro de Política Europeia de 30/4/2013.

( 80 ) Acórdão de 11 de novembro de 2014, Dano (C‑333/13, EU:C:2014:2358).

( 81 ) V., neste sentido, a interpretação do Acórdão de 11 de novembro de 2014, Dano (C‑333/13, EU:C:2014:2358), no Acórdão de 6 de outubro de 2020, Jobcenter Krefeld (C‑181/19, EU:C:2020:794, n.o 68).

( 82 ) Um estudo encomendado pela Comissão em 2016 não encontrou nenhum fundamento que permita considerar que a motivação dos cidadãos da União para se deslocarem está relacionada com prestações. V., por exemplo, «A fact finding analysis on the impact on the Member States’ social security systems of the rights of non‑active intra‑EU migrants to special non‑contributory cash benefits and healthcare granted on the basis of residence», Relatório final apresentado pela ICF GHK em associação com a Milieu Ltd., DG Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão através do contrato‑quadro da DG Justiça, 2013. V., também, Mantu, S. e Minderhoud, P., «Exploring the limits of social solidarity: welfare tourism and EU citizenship»; UNIO ‑ EU Law Journal, vol. 2(2), 2016, pp. 4‑19.

( 83 ) Acórdão de 1 de agosto de 2022, Familienkasse Niedersachsen‑Bremen (C‑411/20, EU:C:2022:602, n.o 53).

( 84 ) Tal como os advogados da demandante deixaram claro na audiência. De acordo com a Irish Nationality and Citizenship Act 1956 (Lei Irlandesa relativa à Nacionalidade e à Cidadania de 1956), na sua versão alterada e consolidada, é esta a lista dos critérios que um adulto, não casado e residente no EEE teria de preencher para ser naturalizado (section 15 da referida lei): a) ter mais de 18 anos de idade; b) ser honrado; c) ter residido continuamente no Estado por um período de um ano imediatamente antes da data do pedido e, durante os oito anos imediatamente anteriores a esse período, ter residido no Estado durante um total de quatro anos; d) ter a intenção, de boa‑fé, continuar a residir no Estado após a naturalização; e e) estar disposto a participar numa cerimónia de cidadania e a prestar uma declaração de lealdade.

( 85 ) Relativamente a um debate sobre a influência dos factos na origem dos processos em que o Tribunal de Justiça é convidado a decidir, v. Davies, G., «Has the Court changed, or have the cases? The deservingness of litigants as an element in Court of Justice citizenship adjudication»Journal of European Public Policy, vol. 25, 2018, pp. 1442‑1460.

( 86 ) O que corresponde, no essencial, a quando as condições de residência estão preenchidas.