MACIEJ SZPUNAR
apresentadas em 20 de outubro de 2022 ( 1 ) ( i )
Processo C‑365/21
MR
sendo interveniente:
Generalstaatsanwaltschaft Bamberg
[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberlandesgericht Bamberg (Tribunal Regional Superior de Bamberg, Alemanha)]
«Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen — Artigo 54.o — Reserva relativa à aplicação do princípio ne bis in idem — Artigo 55.o — Crime contra a segurança do Estado ou de outros interesses igualmente essenciais — Declarações nacionais — Compatibilidade com os artigos 50.o e 52.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia»
I. Introdução
1. |
O Tribunal de Justiça tem sido repetidamente confrontado com questões relativas ao princípio ne bis in idem constante do artigo 54.o da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen (a seguir «CAAS») ( 2 ), tendo sido confrontado apenas uma vez em relação à compatibilidade das declarações que restringem este princípio, com base no artigo 55.o da CAAS. Nesse processo anterior, o Tribunal de Justiça não teve de se pronunciar sobre uma questão formulada a este respeito, na medida em que a sua resposta a outra questão no mesmo processo dispensou uma decisão sobre a validade de uma declaração ( 3 ). O presente processo proporciona ao Tribunal de Justiça a oportunidade para clarificar tal questão. |
II. Quadro jurídico
A. Direito da União
1. CAAS
2. |
O título III da CAAS relativo à «Polícia e segurança» abrange, nomeadamente, o capítulo 3, intitulado «Aplicação do princípio ne bis in idem», que contém os artigos 54.o e 55.o desta convenção. O artigo 54.o da CAAS prevê: «Aquele que tenha sido definitivamente julgado por um tribunal de uma parte contratante não pode, pelos mesmos factos, ser submetido a uma ação judicial intentada por uma outra parte contratante, desde que, em caso de condenação, a sanção tenha sido cumprida ou esteja atualmente em curso de execução ou não possa já ser executada, segundo a legislação da parte contratante em que a decisão de condenação foi proferida.» |
3. |
O artigo 55.o da CAAS tem a seguinte redação: «1. Uma parte contratante pode, no momento da ratificação, aceitação ou aprovação da presente convenção, declarar que não está vinculada pelo artigo 54.o num ou mais dos seguintes casos:
2. Uma parte contratante, que tenha feito uma declaração relativa à exceção referida na alínea b) do n.o 1, especificará as categorias de crimes às quais esta exceção pode ser aplicada. 3. Uma parte contratante pode, a qualquer momento, retirar essa declaração relativa a uma ou mais das exceções referidas no n.o 1. 4. As exceções que foram objeto de uma declaração nos termos do n.o 1 não são aplicáveis quando a parte contratante em causa tenha, pelos mesmos factos, solicitado o procedimento judicial a outra parte contratante ou concedido a extradição da pessoa em causa.» |
4. |
Nos termos do artigo 56.o da CAAS: «Se uma nova ação judicial for intentada por uma parte contratante contra uma pessoa que tenha sido definitivamente julgada pelos mesmos factos por um tribunal de uma outra parte contratante, será descontado na sanção que venha a ser eventualmente imposta qualquer período de privação de liberdade cumprido no território desta última parte contratante por esses factos. Serão igualmente tidas em conta, na medida em que as legislações nacionais o permitam, sanções diferentes das privativas de liberdade que tenham já sido cumpridas.» |
5. |
A CAAS foi incorporada no direito da União pelo Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia, anexo ao Tratado da União Europeia e ao Tratado que institui a Comunidade Europeia pelo Tratado de Amesterdão ( 4 ). Posteriormente, o Protocolo (n.o 19) relativo ao acervo de Schengen integrado no âmbito da União Europeia foi anexado ao Tratado de Lisboa [a seguir «Protocolo (n.o 19)»] ( 5 ). |
6. |
Nos termos do artigo 7.o do Protocolo (n.o 19) ( 6 ): «Para efeitos das negociações de adesão de novos Estados‑Membros à União Europeia, o acervo de Schengen e as demais medidas adotadas pelas instituições no seu âmbito de aplicação entendem‑se como sendo um acervo que deve ser aceite na totalidade por todos os Estados candidatos à adesão.» |
2. Decisão‑Quadro 2008/841/JAI
7. |
Nos termos do artigo 2.o da Decisão‑Quadro 2008/841/JAI do Conselho, de 24 de outubro de 2008, relativa à luta contra a criminalidade organizada ( 7 ), sob a epígrafe «Infrações relativas à participação em organização criminosa», «[c]ada Estado‑Membro toma as medidas necessárias para garantir que um ou ambos os tipos de conduta a seguir indicados relacionados com uma organização criminosa sejam considerados infração: a) [a] conduta de quem, intencionalmente e com conhecimento quer dos objetivos e da atividade geral da organização criminosa, quer da intenção da organização de cometer a infração em causa, participar ativamente na atividade criminosa da organização, incluindo o fornecimento de informações ou de meios materiais, o recrutamento de novos participantes e qualquer forma de financiamento das atividades da organização, tendo conhecimento de que tal participação contribuirá para a realização da atividade criminosa da organização; b) [a] conduta de quem tiver estabelecido, com uma ou mais pessoas, um acordo destinado a levar a cabo uma atividade que, se for executada, configura a prática de uma infração a que se refere o artigo 1.o, mesmo que essa pessoa não participe na execução efetiva de tal atividade». |
B. Direito alemão
8. |
Ao ratificar a CAAS, a República Federal da Alemanha formulou uma «reserva» ( 8 ) a respeito do artigo 54.o da CAAS, ao abrigo do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da mesma (BGBl. 1994 II, p. 631), prevendo, nomeadamente, que a República Federal da Alemanha não está vinculada pelo artigo 54.o da CAAS quando os factos a que se refere a sentença estrangeira constituam a infração prevista no § 129 do Strafgesetzbuch (Código Penal alemão, a seguir «StGB»). |
9. |
O § 129 do StGB, sob a epígrafe «Formação de associações criminosas», na versão aplicável aos factos no processo principal, tem a seguinte redação: «1) Aquele que constituir ou for membro de uma associação cujo objetivo ou atividade consista na prática de infrações puníveis com uma pena máxima de prisão de pelo menos dois anos é punido com pena de prisão até cinco anos ou com multa. Quem apoiar uma associação deste tipo ou recrutar membros ou apoiantes para a mesma é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa. 2) Uma associação é uma organização estruturada de mais de duas pessoas, destinada a durar no tempo, com o objetivo de prosseguir um interesse comum superior e que é independente do modo como tenham sido definidas as funções dos membros, da continuidade da adesão e das características da sua estrutura. […] 5) Nos casos particularmente graves referidos no ponto 1, primeiro período, é aplicável uma pena de prisão de seis meses a cinco anos. Um caso particularmente grave ocorre, em geral, quando o autor da infração é um dos líderes ou das pessoas que estão por detrás da organização […]» |
III. Matéria de facto, tramitação processual e questões prejudiciais
10. |
A Generalstaatsanwaltschaft Bamberg/Zentralstelle Cybercrime Bayern (Procuradoria‑Geral da República de Bamberg/Departamento Central de Combate ao Cibercrime da Baviera, Alemanha) abriu, entre outros, um inquérito, incluindo contra MR, um cidadão israelita, por suspeita de formação de uma associação criminosa e de burla em matéria de investimentos. |
11. |
Em 8 de dezembro de 2020, o juiz de instrução do Amtsgericht Bamberg (Tribunal de Primeira Instância de Bamberg, Alemanha) decretou a prisão preventiva de MR (mandado de detenção nacional). Esta medida tinha como fundamento o risco de fuga. O juiz de instrução do Amtsgericht Bamberg (Tribunal de Primeira Instância de Bamberg) considerou que havia motivos sérios para presumir a existência de um concurso de crimes, a saber, formação de uma associação criminosa e burla comercial em associação criminosa na aceção do § 129, n.o 1 e n.o 5, primeiro e segundo períodos, § 263, n.o 1, n.o 3, segundo período, ponto 1, e n.o 5, § 25, n.o 2, e § 53 do StGB. Em 11 de dezembro de 2020, este órgão jurisdicional emitiu um mandado de detenção europeu com base no mandado de detenção nacional. |
12. |
MR já tinha sido anteriormente condenado, por sentença transitada em julgado do Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena, Áustria), de 1 de setembro de 2020, a uma pena de prisão de quatro anos por burla comercial agravada e branqueamento de capitais. MR cumpriu parte da pena de prisão de quatro anos que lhe foi decretada pelo Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena) em 1 de setembro de 2020. Foi posto em liberdade condicional a partir de 29 de janeiro de 2021 pelo período remanescente da sua pena de prisão. |
13. |
Todavia, nessa data, na sequência de um despacho do Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena) de 29 de janeiro de 2021, MR foi sujeito a prisão preventiva na Áustria em execução do mandado de detenção europeu emitido pelo juiz de instrução do Amtsgericht Bamberg (Tribunal de Primeira Instância de Bamberg), tendo ficado preso até 18 de maio de 2021. Desde então, MR encontra‑se num centro de detenção de imigrantes enquanto aguarda afastamento (para Israel). Segundo informações não oficiais, poderá já ter chegado a Israel. |
14. |
MR interpôs recurso contra o mandado de detenção nacional e contra o mandado de detenção europeu emitido com base nesse mandado nacional. Por Despacho de 8 de março de 2021, o Landgericht Bamberg (Tribunal Regional de Bamberg, Alemanha) negou provimento aos recursos. Este órgão jurisdicional considerou que a condenação de MR pelo Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena) respeitava apenas à prática de factos que constituem burla contra vítimas na Áustria. Atualmente, MR é objeto de uma ação penal pela prática do crime de burla contra vítimas na Alemanha. Uma vez que estes dois recursos não dizem respeito às mesmas vítimas, não constituem a mesma infração na aceção do artigo 54.o da CAAS e do artigo 50.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»). A título subsidiário, o Landgericht Bamberg (Tribunal Regional de Bamberg) remeteu para o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, uma vez que, no caso em apreço, MR é alvo de uma ação penal pela prática de um crime ao abrigo do § 129 do StGB, relativamente ao qual a República Federal da Alemanha formulou uma reserva quando ratificou a CAAS. |
15. |
Em seguida, MR interpôs recurso do referido despacho do Landgericht Bamberg (Tribunal Regional de Bamberg). Este recurso encontra‑se pendente no órgão jurisdicional de reenvio, que pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie a título prejudicial para efeitos da sua decisão. |
16. |
O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se existe algum obstáculo ao exercício da ação penal ao abrigo do direito da União. Nesse caso, o mandado de detenção nacional deve ser anulado e, por conseguinte, o mandado de detenção europeu deixaria de ter fundamento. |
17. |
Para determinar se existe um obstáculo ao exercício da ação penal, é necessário perceber se o mandado de detenção alemão e o mandado de detenção europeu foram emitidos com o intuito de instaurar um processo contra MR por factos em relação aos quais já foi acusado e condenado pelas autoridades austríacas. |
18. |
Tal depende dos factos em que se baseou o mandado de detenção nacional alemão e dos factos que fundamentaram a Sentença do Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena). |
19. |
No mandado de detenção nacional, MR é acusado de ter criado e mantido, com os seus cúmplices, uma rede de empresas de cybertrading em que os supostos agentes contratados para angariação e apoio de clientes [conversion agents («agentes de conversão») e retention agents («agentes de retenção»)] propunham, em conformidade com um plano de ação, investimentos que prometiam recompensas financeiras a investidores de boa‑fé (clientes) em vários países europeus, entre os quais a Alemanha e a Áustria, a partir de centros de atendimento telefónico situados no exterior, incluindo na Bulgária. Deste modo, os agentes incitavam os investidores a efetuarem pagamentos que eram cobrados diretamente como produto do crime. Foi utilizado um software especial para convencer os investidores de que tinham perdido o seu investimento. O lucro do produto do crime, após dedução dos custos de pessoal e dos custos não relacionados com o pessoal dos centros de atendimento telefónico e seus funcionários (incluindo os agentes), foi transferido para MR e respetivos cúmplices através de subterfúgios que serviram para ocultar o fluxo de dinheiro. O papel de MR e dos seus cúmplices consistia em organizar a operação que era um pressuposto dos atos individuais de burla cometidos pelos agentes contra as respetivas vítimas. Assim, MR desempenhava exclusivamente funções de gestão, enquanto os agentes dos centros de atendimento telefónico, agrupados por departamentos com base na língua materna das partes lesadas (no caso da Alemanha e da Áustria, no chamado «German Desk»), atuavam sob a direção de chefes de departamento. Segundo as conclusões do órgão jurisdicional de reenvio, os factos imputados a MR e que estiveram na base do mandado de detenção nacional alemão e da decisão de condenação proferida pelo Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena) são os mesmos. |
20. |
O órgão jurisdicional de reenvio precisa que, segundo o direito alemão, não existe nenhum obstáculo ao exercício da ação penal. Esclarece ainda que não subscreve o entendimento do Landgericht Bamberg (Tribunal Regional de Bamberg), segundo o qual a identidade dos factos está automaticamente excluída dado que as vítimas eram diferentes [o mandado de detenção nacional refere‑se aos prejuízos financeiros sofridos na Alemanha e às vítimas alemãs, ao passo que a Sentença do Landesgericht Wien (Tribunal Regional de Viena) tem por objeto os prejuízos sofridos na Áustria e as vítimas austríacas]. Além disso, contrariamente ao Landgericht Bamberg (Tribunal Regional de Bamberg), o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à existência ou não de obstáculos ao exercício da ação penal ao abrigo do direito da União. |
21. |
Uma vez que não há obstáculos ao exercício da ação penal de acordo com o direito nacional, a única questão que se coloca é a de saber se existe algum obstáculo processual decorrente do princípio ne bis in idem consagrado no artigo 54.o da CAAS e no artigo 50.o da Carta. Caso se verifique tal obstáculo, é necessário esclarecer se o artigo 54.o da CAAS continua a ser relevante no caso em apreço. Com efeito, este artigo não é aplicável se o artigo 55.o da CAAS e a declaração feita pela República Federal da Alemanha ao abrigo deste artigo por ocasião da ratificação da CAAS continuarem válidos. |
22. |
Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a declaração feita a respeito do § 129 do StGB pela República Federal da Alemanha aquando da ratificação da CAAS é compatível com o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS nesse contexto (ou seja, quando a associação criminosa se dedica exclusivamente ao crime contra o património, mas não prossegue, além disso, objetivos políticos, ideológicos, religiosos ou filosóficos). |
23. |
Nestas circunstâncias, o Oberlandesgericht Bamberg (Tribunal Regional Superior de Bamberg, Alemanha), por Despacho de 4 de junho de 2021 que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de junho de 2021, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
|
24. |
Foram apresentadas observações escritas por MR, pelos Governos austríaco, francês e alemão e pela Comissão Europeia. Estas partes e a Generalstaatsanwaltschaft Bamberg apresentaram alegações na audiência de 7 de julho de 2022. |
IV. Análise
A. Quanto à primeira questão
25. |
Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se uma declaração baseada no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS é compatível com o artigo 50.o e com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta. |
26. |
Tal implica uma breve qualificação e categorização do artigo 54.o e do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS no quadro jurídico da União. |
1. Artigo 54.o da CAAS
27. |
O artigo 54.o da CAAS consagra o princípio ne bis in idem ao declarar que aquele que tenha sido definitivamente julgado por um tribunal de uma parte contratante ( 9 ) não pode, pelos mesmos factos, ser submetido a uma ação judicial intentada por uma outra parte contratante, desde que, em caso de condenação, a sanção tenha sido cumprida ou esteja atualmente em curso de execução ou não possa já ser executada, segundo a legislação da parte contratante em que a decisão de condenação foi proferida. |
28. |
O princípio ne bis in idem constitui um direito fundamental presente em todas as ordens jurídicas assentes no Estado de Direito. Desde a sua criação, serviu para proteger a pessoa da arbitrariedade que consistiria em julgá‑la várias vezes pelo mesmo facto com base em qualificações diferentes ( 10 ). Num espaço de liberdade, segurança e justiça marcado pela supressão das fronteiras internas, adquiriu «uma outra finalidade» ( 11 ), concretamente, a de assegurar a liberdade de circulação. Num sentido mais lato, também se enquadra no princípio da confiança mútua entre os Estados‑Membros: se as autoridades do Estado‑Membro A condenaram ou absolveram uma pessoa no âmbito de um processo penal, as autoridades do Estado‑Membro B devem confiar na decisão do litígio e ser impedidas de instaurar um novo processo. Nesta situação, como é comum noutros domínios do direito da União, o princípio da territorialidade inerente a qualquer sistema nacional de justiça penal é posto em causa pelo espaço de liberdade, segurança e justiça. |
29. |
O Tribunal de Justiça declarou, neste sentido, no seu primeiro acórdão relativo ao princípio ne bis in idem no âmbito da CAAS — que foi, aliás, o primeiro acórdão sobre a interpretação da CAAS ( 12 ) — que o princípio ne bis in idem, consagrado no artigo 54.o da CAAS, independentemente de ser aplicado a procedimentos de extinção da ação penal que prevejam ou não a intervenção de um órgão jurisdicional ou a existência de sentenças, implica necessariamente que exista uma confiança mútua dos Estados‑Membros nos respetivos sistemas de justiça penal e que cada um aceite a aplicação do direito penal em vigor noutros Estados‑Membros, ainda que a aplicação do seu direito nacional leve a uma solução diferente ( 13 ). |
30. |
No que diz respeito à compatibilidade do artigo 54.o da CAAS com a Carta, o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão Spasic ( 14 ) que, embora se deva considerar que uma disposição como o artigo 54.o da CAAS respeita o conteúdo essencial do princípio ne bis in idem consagrado no artigo 50.o da Carta ( 15 ), a questão de saber se a restrição decorrente da condição de execução prevista no artigo 54.o da CAAS é proporcionada deve ser apreciada em conformidade com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta. O Tribunal de Justiça chegou à conclusão de que a restrição é proporcionada ( 16 ). |
31. |
Na mesma linha, as anotações não vinculativas, mas elucidativas ( 17 ), relativas à Carta, no que diz respeito ao artigo 50.o, mencionam expressamente o artigo 54.o da CAAS entre as disposições abrangidas pela cláusula horizontal do artigo 52.o, n.o 1, da Carta ( 18 ). |
2. Artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS — declarações sobre exceções ao princípio ne bis in idem
a) Observações gerais
32. |
O artigo 55.o, n.o 1, da CAAS prevê várias exceções ao princípio ne bis in idem, permitindo que as partes contratantes declarem que não estão vinculadas pelo artigo 54.o da CAAS em determinadas circunstâncias. Esta disposição prevê assim que uma parte contratante pode, no momento da ratificação, aceitação ou aprovação da CAAS, declarar que não está vinculada pelo artigo 54.o num ou mais dos seguintes casos: a) quando os factos a que se refere a sentença estrangeira tenham ocorrido, no todo, ou em parte, no seu território; neste último caso, esta exceção não é, todavia, aplicável se estes factos ocorreram em parte no território da parte contratante em que a sentença foi proferida; b) quando os factos a que se refere a sentença estrangeira constituam crime contra a segurança do Estado ou de outros interesses igualmente essenciais desta parte contratante, e c) quando os factos a que se refere a sentença estrangeira tenham sido praticados por um funcionário desta parte contratante em violação dos deveres do seu cargo. |
33. |
Nos termos do artigo 139.o, n.o 1, da CAAS, os instrumentos de ratificação, aprovação ou aceitação devem ser depositados junto do Governo do Grão‑Ducado do Luxemburgo, o qual notificará o depósito a todas as partes contratantes. |
34. |
Na sequência da integração do acervo de Schengen na ordem jurídica da União pelo Tratado de Amesterdão, a CAAS constitui um ato de direito da União. |
35. |
Antes de mais, importa sublinhar que, no que respeita à natureza jurídica de tais declarações, estas não devem ser entendidas como «reservas» na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados ( 19 ). Isto resulta não só do facto de, na sequência da integração do acervo de Schengen na ordem jurídica da União, a CAAS ser considerada um ato da União que, por definição, não deixa margem à formulação de uma «reserva» ao abrigo da Convenção de Viena, mas também do artigo 137.o da CAAS, que apenas prevê «reservas» no âmbito do artigo 60.o da CAAS ( 20 ). Por conseguinte, deve utilizar‑se o termo «declaração» em vez de «reserva» ( 21 ). Tal declaração deve ser analisada unicamente na perspetiva do direito da União, não sendo adequado recorrer, nesse contexto, ao direito internacional público geral. |
b) Compatibilidade com o artigo 50.o e com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta
36. |
Coloca‑se em seguida a questão — e é sobre este aspeto que o órgão jurisdicional de reenvio pede orientação — de saber se uma declaração baseada, em particular, no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS é compatível com a Carta, mais precisamente, com os seus artigos 50.o e 52.o, n.o 1. Esta exceção encontra‑se abrangida pelo âmbito de aplicação da Carta ( 22 ), conforme está expressamente previsto na CAAS, que é um ato do (atual) direito da União e que permite aos Estados‑Membros restringirem um direito fundamental, estando os mesmos sujeitos à obrigação de notificar essa restrição. |
37. |
O Tribunal de Justiça ainda não se pronunciou sobre a questão da compatibilidade das exceções previstas no artigo 55.o da CAAS com normas jurídicas hierarquicamente superiores. No Acórdão Kossowski ( 23 ), recusou pronunciar‑se sobre a questão de saber se as declarações feitas nos termos do artigo 55.o, n.o 1, alínea a), da CAAS, isto é, no sentido de que um Estado‑Membro não está vinculado pelo artigo 54.o da CAAS quando os factos a que se refere a sentença estrangeira tenham ocorrido, no todo, ou em parte, no seu próprio território ( 24 ), continuam em vigor após a integração do acervo de Schengen na ordem jurídica da União, uma vez que nesse processo já não havia necessidade de responder a essa questão, tendo em conta a resposta do Tribunal de Justiça a outra questão. Todavia, o advogado‑geral Y. Bot considerou, após uma análise aprofundada, que a exceção constante do artigo 55.o, n.o 1, alínea a), «não respeita o conteúdo essencial do princípio ne bis in idem conforme enunciado no artigo 50.o da Carta» ( 25 ). Voltarei às conclusões do advogado‑geral Y. Bot a seguir ( 26 ). |
38. |
Em princípio, são permitidas exceções ao princípio consagrado no artigo 50.o da Carta, desde que preencham os requisitos do seu artigo 52.o, n.o 1 ( 27 ). Por conseguinte, em conformidade com o Acórdão Spasic, já referido, há que verificar se a exceção prevista no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS cumpre o critério do artigo 52.o, n.o 1, da Carta. |
39. |
Nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades. Na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros. |
1) Restrição
40. |
Uma declaração com base no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS constitui indubitavelmente uma restrição do direito fundamental ao ne bis in idem, uma vez que o próprio objetivo da referida disposição é restringir este direito fundamental em determinadas circunstâncias. |
2) Prevista por lei
41. |
Na medida em que a possibilidade de fazer declarações e, portanto, de prever restrições ao princípio ne bis in idem figura no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, aqui em análise, poder‑se‑ia, à primeira vista, supor que tal está previsto por lei, conforme exigido pelo artigo 52.o, n.o 1, da Carta. |
42. |
No entanto, diria que a questão jurídica não é tão simples como pode parecer à primeira vista. Com efeito, a questão de saber se o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS continua a ser aplicável está indissociavelmente ligada à questão de saber se as declarações feitas com base nesse fundamento são aplicáveis. Por outras palavras, na impossibilidade de invocar uma declaração, o mecanismo estabelecido pelo artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS deixa de ser aplicável no seu todo. |
43. |
Conforme o Governo austríaco salienta, com razão, nas suas observações escritas, para cumprir o critério da previsão legal, a lei deve, em primeiro lugar, ser suficientemente acessível, o que significa que o interessado deve poder dispor de informações bastantes, nas circunstâncias do caso, sobre as normas jurídicas aplicáveis a um determinado caso e deve estar em condições de prever as consequências passíveis de decorrer de determinado ato e, em segundo lugar, deve ser formulada com uma precisão suficiente para permitir ao interessado regular a sua conduta ( 28 ). |
44. |
O artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS parece, a priori, preencher os critérios supramencionados: está formulado em termos inequívocos e permite a qualquer pessoa verificar que os Estados‑Membros podem prever exceções ao princípio ne bis in idem para salvaguardar a segurança do Estado ou outros interesses igualmente essenciais. No entanto, os órgãos jurisdicionais de alguns Estados‑Membros (Itália ( 29 ) e Grécia ( 30 )) parecem ter dúvidas quanto à validade das declarações dos respetivos Estados‑Membros ao abrigo do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS. No seu entender, as declarações já não são válidas uma vez que não há que aplicar o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS. |
45. |
Quanto às declarações dos Estados‑Membros baseadas nesta disposição, há que realçar outro aspeto. |
46. |
A título preliminar, na sequência da integração da CAAS na ordem jurídica da União, é difícil compreender de que modo se poderá manter o artigo 139.o da CAAS, segundo o qual os instrumentos de ratificação, aprovação ou aceitação devem ser depositados junto do Governo do Grão‑Ducado do Luxemburgo, o qual notificará o depósito a todas as partes contratantes. A publicação de exceções a um direito fundamental, garantido pela Carta, numa situação em que a possibilidade de adotar exceções está prevista por um ato de direito da União, não pode ser da competência do governo de um Estado‑Membro, devendo ser efetuada a nível da União, preferencialmente no Jornal Oficial. Com efeito, o facto de as declarações não terem sido publicadas pela União Europeia (no Jornal Oficial ou noutro meio) dificulta a tarefa de determinar com precisão as partes contratantes que fizeram essas declarações. |
47. |
Existe uma absoluta falta de acessibilidade e previsibilidade, conforme exigido pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, relativamente à existência e, sendo caso disso, à publicação das exceções adotadas pelos Estados‑Membros. Tal deve‑se ao facto de não ser claro, tanto para os Estados‑Membros como para os titulares de direitos fundamentais, se o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS ainda é aplicável. |
48. |
É seguro afirmar que oito Estados‑Membros ( 31 ) (então «partes contratantes») (Dinamarca, Alemanha, Grécia, França, Itália, Áustria, Finlândia e Suécia) fizeram declarações ao abrigo do artigo 55.o, n.o 1, da CAAS antes da integração do acervo de Schengen na ordem jurídica da União ( 32 ). No entanto, a declaração francesa nunca chegou ao depositário (o Governo luxemburguês) ( 33 ). Além disso, não há provas de que a Itália tenha notificado o depositário. Mais ainda, não consta que tenham sido feitas declarações pelos Estados‑Membros após a integração do acervo de Schengen na ordem jurídica da União ( 34 ). Os Tratados de Adesão de 2003, 2005 e 2012 estabeleciam, assim, que as disposições do Protocolo (n.o 19), e os atos nele baseados ou de algum modo com ele relacionados, são vinculativos e aplicáveis aos novos Estados‑Membros a contar da data de adesão ( 35 ). Contudo, não há indicações quanto à possibilidade de esses Estados‑Membros apresentarem declarações, o prazo para o fazer e a obrigação de as depositarem junto do depositário ou de as publicarem. Isto gera um estado de incerteza considerável. |
49. |
Uma vez que nenhuma das declarações foi publicada a nível da União, não considero que o requisito da acessibilidade esteja preenchido. Não é razoável esperar que os interessados eventualmente afetados por essas declarações se informem junto de cada Estado, como o Governo francês sugeriu durante a audiência. |
50. |
Tendo em conta o que acabo de descrever, tenho sérias dificuldades em considerar que as declarações dos oito Estados‑Membros continuem a ser válidas. A situação afigura‑se demasiado obscura e confusa para poder proporcionar segurança quanto à base jurídica da restrição ( 36 ). |
51. |
Consequentemente, considero que as declarações feitas com base no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS não estão em conformidade com o requisito do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, segundo o qual uma restrição deve ser prevista por lei. Uma vez que essas declarações estão, conforme ilustrado acima, indissociavelmente ligadas ao artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, o mecanismo desta disposição é afetado no seu todo e já não pode ser aplicado pelos órgãos jurisdicionais nacionais. |
3) O conteúdo essencial do ne bis in idem
52. |
Quanto à questão de saber se o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), «respeita o conteúdo essencial» do direito fundamental de ne bis in idem, importa sublinhar que o Tribunal de Justiça declarou, no que respeita à condição de execução constante do artigo 54.o da CAAS, que a referida condição «não põe em causa o princípio ne bis in idem enquanto tal» ( 37 ). No entanto, a exceção constante do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, como as restantes previstas pelo artigo 55.o, n.o 1, da CAAS, põe efetivamente em causa este princípio enquanto tal, uma vez que um Estado‑Membro pode declarar que não está vinculado de modo algum pelo referido princípio, em determinadas situações. Conforme alega MR nas suas observações escritas, contrariamente à condição de execução do artigo 54.o da CAAS, que visa impedir a evasão da pena, a exceção prevista no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS permite o exercício de uma nova ação penal e consequente condenação e execução de uma sentença, não obstante ter havido uma condenação definitiva que já foi cumprida. Isto é manifestamente contrário à própria finalidade do princípio ne bis in idem ( 38 ). |
53. |
Além disso, gostaria de citar o advogado‑geral Y. Bot, que salientou, a este respeito, a importância particular do espaço de liberdade, segurança e justiça como dimensão complementar ao mercado interno, que engloba «um quadro jurídico que integra os direitos individuais dos cidadãos da União» ( 39 ), ajudando assim a dar uma «dimensão concreta» ao conceito de cidadania da União ( 40 ). Sublinhou igualmente a importância fundamental do princípio do reconhecimento mútuo (e da confiança mútua) em relação ao princípio ne bis in idem ( 41 ). Em substância, sustentou que a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 54.o da CAAS já permite que vários tipos de infrações sejam tidos em consideração; uma aplicação adicional da cláusula de territorialidade não teria suficientemente em conta o princípio ne bis in idem. |
54. |
Devo admitir que não só concordo com este raciocínio, como também considero que pode ser transposto para a situação do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS. As exceções constantes do artigo 55.o, n.o 1, alíneas a) e b), da CAAS referem‑se ao princípio da territorialidade subjacente ao direito penal: enquanto no caso da alínea a), um Estado pretende declarar‑se competente em matéria penal quando os factos tiverem sido cometidos no seu território, no caso da alínea b), pretende exercer a sua competência penal relativamente a crimes contra a segurança do Estado e outros interesses igualmente essenciais que salvaguarda. Por conseguinte, o raciocínio desenvolvido pelo advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski aplica‑se mutatis mutandis ao presente processo. |
55. |
O espaço de liberdade, segurança e justiça percorreu um longo caminho desde a adoção da CAAS. Em particular, com o desenvolvimento progressivo dos princípios da confiança e do reconhecimento mútuos e a entrada em vigor da Carta, as exceções previstas no artigo 55.o, n.o 1, da CAAS parecem‑me redundantes. Convém ainda recordar que o princípio da confiança mútua foi decisivo para que o Tribunal de Justiça considerasse que o Projeto de Acordo de Adesão à CEDH não era compatível com os Tratados ( 42 ). Neste contexto, dificilmente se justificaria a admissão de exceções como a que está em causa, que é manifestamente contrária ao referido princípio ( 43 ). |
4) Conclusão
56. |
Por todas as razões acima expostas, considero que as declarações já não são aplicáveis. Não estão previstas por lei e, além disso, o artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS não respeita o conteúdo essencial do princípio ne bis in idem. As declarações devem ser afastadas. |
57. |
Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão no sentido de que as declarações feitas com base no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS não são compatíveis com os artigos 50.o e 52.o, n.o 1, da Carta. As disposições referidas nessas declarações não podem ser aplicadas no âmbito de processos judiciais. |
B. Quanto à segunda questão
58. |
Tendo em conta a minha análise da primeira questão, não há que analisar a segunda questão. Consequentemente, a apreciação que se segue é efetuada a título de exaustividade, caso o Tribunal de Justiça chegue a uma conclusão diferente no que respeita à primeira questão. |
59. |
Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende essencialmente saber se os artigos 54.o e 55.o da CAAS e os artigos 50.o e 52.o da Carta se opõem a uma interpretação segundo a qual a declaração feita nos termos do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS também abrange as associações criminosas que se dedicam exclusivamente ao crime contra o património e que, além disso, não prosseguem objetivos políticos, ideológicos, religiosos ou filosóficos e também não tentam exercer influência sobre a política, os meios de comunicação social, a Administração Pública, o poder judicial ou a economia por meios ilícitos. |
60. |
A este respeito, saliento que o conceito de «segurança do Estado» foi escolhido pelas partes contratantes no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS. Este conceito aparece igualmente no artigo 4.o, n.o 2, TUE, que prevê que a União deve respeitar as funções essenciais dos Estados‑Membros, nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional. Essa disposição especifica que, em especial, a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado‑Membro ( 44 ). |
61. |
O Tribunal de Justiça teve o cuidado de distinguir as exceções em matéria de «segurança nacional» das exceções comuns de «segurança pública» justificadas por razões de ordem pública, que são, sobretudo, relevantes no domínio do mercado interno ( 45 ). Declarou que a segurança nacional corresponde ao interesse primordial de proteger as funções essenciais do Estado e os interesses fundamentais da sociedade e inclui a prevenção e a repressão de atividades suscetíveis de desestabilizar gravemente as estruturas constitucionais, políticas, económicas ou sociais fundamentais de um país, em especial de ameaçar diretamente a sociedade, a população ou o Estado enquanto tal, como, nomeadamente, as atividades terroristas ( 46 ). O objetivo de salvaguarda da segurança nacional vai além dos objetivos de luta contra a criminalidade em geral, incluindo grave, e de salvaguarda da segurança pública. Com efeito, as ameaças à segurança nacional distinguem‑se, pela sua natureza e particular gravidade, do risco geral de ocorrência de tensões ou de perturbações, ainda que graves, à segurança pública. O objetivo de salvaguarda da segurança nacional é, por conseguinte, suscetível de justificar medidas que incluem ingerências nos direitos fundamentais mais graves do que aquelas que esses outros objetivos poderiam justificar ( 47 ). |
62. |
Em conformidade com a declaração da República Federal da Alemanha, feita nos termos do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, este Estado não está vinculado pelo artigo 54.o da CAAS no que se refere a várias infrações penais, incluindo o § 129 do StGB. Nos termos desta disposição, é punível a constituição ou o apoio a uma associação cujo objetivo ou atividade consiste na prática de infrações. Desde a transposição, pela Alemanha, da Decisão‑Quadro 2008/841 ( 48 ), «organização» foi definida, ao abrigo da referida disposição, como «uma associação estruturada de mais de duas pessoas, destinada a durar no tempo, com o objetivo de prosseguir um interesse comum superior e que é independente do modo como tenham sido definidas as funções dos seus membros, da continuidade da adesão e das características da sua estrutura». |
63. |
É pacífico, tanto na jurisprudência como na doutrina alemãs, que esta disposição, que tem como objetivo proteger a ordem pública (ordre public) ( 49 ), visa o perigo abstrato e a elevada «intensidade criminal» ( 50 ) inerentes à constituição de uma associação criminosa. Isto determina a aplicação de sanções penais numa fase em que (outros) crimes se encontram tipicamente na sua fase preparatória. |
64. |
O § 129 do StGB proíbe atividades criminosas para além do alcance bastante restrito da salvaguarda da segurança do Estado. Com efeito, esta disposição abrange a constituição de uma associação com o objetivo de exercer qualquer outra atividade criminosa. O caso em apreço é um bom exemplo disso: MR e os respetivos cúmplices dedicaram‑se à prática de crimes contra o património, principalmente burlas. Não foi prosseguido ou aplicado outro objetivo. Não há indícios de que a segurança da Alemanha tenha sido posta em causa nessa situação. Com efeito, o ato de burlar um número considerável de pessoas não é comparável ao ato de desestabilizar os princípios basilares da República Federal da Alemanha ( 51 ). |
65. |
Por conseguinte, proponho que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão no sentido de que os artigos 54.o e 55.o da CAAS e os artigos 50.o e 52.o da Carta se opõem a uma interpretação segundo a qual a declaração feita nos termos do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS também abrange as associações criminosas que se dedicam exclusivamente ao crime contra o património e, além disso, não prosseguem objetivos políticos, ideológicos, religiosos ou filosóficos e também não tentam exercer influência sobre a política, os meios de comunicação social, a Administração Pública, o poder judicial ou a economia por meios ilícitos. |
V. Conclusão
66. |
À luz de todas as considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas pelo Oberlandesgericht Bamberg (Tribunal Regional Superior de Bamberg, Alemanha) do seguinte modo: As declarações feitas com base no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, não são compatíveis com o artigo 50.o nem com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. As disposições referidas nestas declarações não podem ser aplicadas no âmbito de processos judiciais. |
( 1 ) Língua original: inglês.
( i ) Na sequência de uma verificação de texto por parte da Unidade Portuguesa, o cabeçalho foi objeto de uma alteração de ordem linguística, posteriormente à sua disponibilização em linha.
( 2 ) Convenção de 14 de junho de 1985 entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns (JO 2000, L 239, p. 19).
( 3 ) V. Acórdão de 29 de junho de 2016, Kossowski (C‑486/14, EU:C:2016:483, n.o 55).
( 4 ) JO 1997, C 340, p. 93.
( 5 ) JO 2010, C 83, p. 290.
( 6 ) Que reproduz textualmente as disposições previstas no Protocolo anexo ao Tratado de Amesterdão.
( 7 ) JO 2008, L 300, p. 42.
( 8 ) Em língua alemã: «Vorbehalt».
( 9 ) O facto de a CAAS recorrer à expressão «parte contratante» em vez de «Estado‑Membro» deve‑se à sua natureza intergovernamental.
( 10 ) V. Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 36).
( 11 ) Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 38).
( 12 ) A competência do Tribunal de Justiça baseava‑se então no antigo artigo 35.o UE. V., também, Conclusões do advogado‑geral D. Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Gözütok e Brügge (C‑187/01 e C‑385/01, EU:C:2002:516, n.o 2).
( 13 ) V. Acórdão de 11 de fevereiro de 2003, Gözütok e Brügge (C‑187/01 e C‑385/01, EU:C:2003:87, n.o 33).
( 14 ) V. Acórdão de 27 de maio de 2014 (C‑129/14 PPU, EU:C:2014:586).
( 15 ) V. Acórdão de 27 de maio de 2014, Spasic (C‑129/14 PPU, EU:C:2014:586, n.o 59).
( 16 ) V. Acórdão de 27 de maio de 2014, Spasic (C‑129/14 PPU, EU:C:2014:586, n.o 59 e segs).
( 17 ) Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, terceiro parágrafo, TUE e do artigo 52.o, n.o 7, da Carta, as anotações foram elaboradas para orientar a interpretação da Carta e devem ser tidas em devida conta pelos órgãos jurisdicionais da União e dos Estados‑Membros.
( 18 ) V. «Anotação ad ao artigo 50.o — Direito a não ser julgado ou punido penalmente mais do que uma vez pelo mesmo delito», constante das Anotações relativas à Carta dos Direitos Fundamentais (JO 2007, C 303, p. 17): «Nos termos do artigo 50.o, a regra “non bis in idem” não se aplica apenas entre os órgãos jurisdicionais de um mesmo Estado, mas também entre os órgãos jurisdicionais de vários Estados‑Membros. Tal corresponde ao acervo do direito da União: ver os artigos 54.o a 58.o da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen e o Acórdão do Tribunal de Justiça, de 11 de fevereiro de 2003 [Gözütok e Brügge, processos C‑187/01 e C‑385/01, EU:C:2003:87 (Colet., 2003, p. I‑1345)], o artigo 7.o da Convenção relativa à Proteção dos Interesses Financeiros da Comunidade e o artigo 10.o da Convenção relativa à Luta contra a Corrupção. As exceções bem delimitadas pelas quais estas convenções permitem aos Estados‑Membros derrogar à regra “non bis in idem” são abrangidas pela cláusula horizontal do n.o 1 do artigo 52.o, relativa às restrições. No que diz respeito às situações visadas pelo artigo 4.o do Protocolo n.o 7, a saber, a aplicação do princípio no interior de um mesmo Estado‑Membro, o direito garantido tem o mesmo sentido e âmbito que o direito correspondente da [Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (CEDH)]».
( 19 ) Assinada em Viena, em 23 de maio de 1969. Entrou em vigor em 27 de janeiro de 1980. V. Recueil des traités des Nations unies, vol. 1155, p. 331. Nos termos dessa disposição, «reserva» designa uma declaração unilateral, qualquer que seja o seu conteúdo ou a sua denominação, feita por um Estado quando assina, ratifica, aceita ou aprova um tratado ou a ele adere, pela qual visa excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado na sua aplicação a esse Estado.
( 20 ) Nos termos do artigo 60.o da CAAS, nas relações entre duas partes contratantes das quais uma não é parte na Convenção Europeia De Extradição, de 13 de setembro de 1957, as disposições da referida convenção são aplicáveis, tendo em conta as reservas e declarações depositadas, quer aquando da ratificação da referida convenção, quer, relativamente às partes contratantes que não são parte na convenção, aquando da ratificação, aprovação ou aceitação da Convenção.
( 21 ) Note‑se que a Alemanha, no seu ato adotado com fundamento no artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, refere‑se a «reserva» («Vorbehalt») em vez de «declaração».
( 22 ) V. artigo 51.o, n.o 1, da Carta.
( 23 ) V. Acórdão de 29 de junho de 2016 (C‑486/14, EU:C:2016:483).
( 24 ) Neste último caso (isto é, quando os factos a que se refere a sentença estrangeira tenham ocorrido em parte no seu próprio território), a exceção não se aplica se os factos tiverem ocorrido em parte no território da parte contratante em que a sentença foi proferida.
( 25 ) V. Conclusões no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 68).
( 26 ) V. n.o 55 das presentes conclusões.
( 27 ) A este respeito, não subscrevo o argumento invocado por MR, segundo o qual o direito constante do artigo 50.o da Carta não admite restrições.
( 28 ) V., neste sentido, TEDH, 26 de abril de 1979, The Sunday Times c. Reino Unido (CE:ECHR:1979:0426JUD000653874, § 49), e 29 de março de 2010, Medvedyev e o. c. França (CE:ECHR:2010:0329JUD000339403, §§ 93 e segs).
( 29 ) Por Sentença de 6 de julho de 2011 (Walz, RG 12396/927), o Tribunale di Milano (Tribunal de Primeira Instância de Milão, Itália) decidiu que a declaração italiana é inaplicável a partir do momento em que a CAAS foi integrada, pelo Tratado de Amesterdão, no direito da União. Este órgão jurisdicional considera que, na medida em que esta integração não dizia respeito a declarações feitas pelos Estados‑Membros, essas declarações, na falta de renovação expressa, devem ser consideradas como tendo deixado de produzir efeitos. Sublinha ainda que, na União Europeia, que tem como objetivo desenvolver um espaço liberdade, segurança e justiça no âmbito do qual a livre circulação de pessoas é garantida, o princípio ne bis in idem deve ser aplicado de modo particularmente amplo, a fim de evitar que uma pessoa, no exercício do seu direito à livre circulação, seja submetida a uma ação judicial pelos mesmos factos no território de vários Estados‑Membros, o que impossibilitaria derrogações ao princípio ne bis in idem, como as constantes do artigo 55.o, n.o 1, da CAAS.
( 30 ) Por Acórdão 1/2011 de 9 de junho de 2011, a secção penal do Areios Pagos (Tribunal de Cassação, Grécia) considerou que a declaração feita pela Grécia já não era válida, juntamente com as declarações formuladas pelos outros Estados‑Membros. A restrição prevista na declaração grega não constituía uma restrição necessária ao abrigo do artigo 52.o, n.o 1, da Carta e não cumpria efetivamente os objetivos de interesse geral: dada a identidade dos valores e das tradições jurídicas dos Estados‑Membros, o exercício da ação penal e a imposição de uma sanção penal para efeitos dessa infração não são necessários e não podem ser considerados um objetivo de interesse geral reconhecido pela União.
( 31 ) Além destes Estados‑Membros, fizeram declarações a Noruega, o Liechtenstein, a Suíça e o Reino Unido.
( 32 ) Isto resulta de uma leitura articulada das fontes disponíveis. V. Gölly, S., «NE BIS IN IDEM». Das unionsrechtliche Doppelverfolgungsverbot, Viena, 2017, pp. 102‑151, em especial p. 113; Schomburg, W., Wahl, T., in Schomburg, W., Lagodny, O., Gleß, S., Hackner, T., Internationale Rechtshilfe in Strafsachen, 6.a ed., C.H. Beck, Munique, 2020, artigo 55.o, ponto 1a; Commission Staff Working Document, Annex to the Green Paper on conflicts of jurisdiction and the principle of ne bis in idem in criminal proceedings [COM(2005)696 final], SEC(2005) 1767, Bruxelas, 23 de dezembro de 2005, p. 47; Nota da Presidência do Conselho ao Comité do artigo 36.o, «Declarations by Member States pursuant to Article 55 of the Schengen Convention», Bruxelas, 1 de junho de 2006, 10061/06 (COPEN 61, COMIX 514, p. 2).
( 33 ) Facto reconhecido pelo Governo francês durante a audiência no Tribunal de Justiça.
( 34 ) O artigo 8.o do Protocolo que integra o acervo de Schengen no quadro da União Europeia, anexo ao Tratado de Amesterdão, estipula essencialmente que o acervo de Schengen deve ser aceite na íntegra por todos os Estados candidatos à adesão.
( 35 ) V., a título exemplificativo, artigo 3.o do Ato relativo às condições de adesão da República Checa, da República da Estónia, da República de Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 2003, L 236, p. 33).
( 36 ) Além disso, ao manter a exceção do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS, estaríamos numa situação mais desfavorável do que no caso de uma aplicação à la carte do direito da União: tal equivaleria a recusar «privilégios» aos Estados‑Membros que aderiram à União mais tarde do que outros.
( 37 ) V. Acórdão de 27 de maio de 2014, Spasic (C‑129/14 PPU, EU:C:2014:586, n.o 58).
( 38 ) Trata‑se, evidentemente, de uma situação diferente da do Acórdão de 22 de março de 2022, bpost (C‑117/20, EU:C:2022:202, n.o 43), em que o Tribunal de Justiça considerou que a possibilidade de cumular procedimentos e sanções respeita o conteúdo essencial do artigo 50.o da Carta, se a regulamentação nacional não permitir instaurar procedimentos e sancionar os mesmos factos pela mesma infração ou instaurar procedimentos com o mesmo objetivo, mas prever apenas a possibilidade de um cúmulo de procedimentos e sanções ao abrigo de regulamentações diferentes.
( 39 ) V. Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 44).
( 40 ) V. Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 44).
( 41 ) V. Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo Kossowski (C‑486/14, EU:C:2015:812, n.o 43).
( 42 ) V. Parecer 2/13 (Adesão da União Europeia à CEDH), de 18 de dezembro de 2014 (EU:C:2014:2454, n.os 168, 191 a 194 e 258).
( 43 ) De modo semelhante, a doutrina salientou igualmente que as restrições introduzidas pelo artigo 55.o da CAAS ao princípio ne bis in idem foram substituídas pelo desenvolvimento da cooperação penal entre os Estados‑Membros, razão pela qual deve ser dada preferência à liberdade do indivíduo em causa, e não ao Estado que invoca uma exceção. V., para este efeito, Schomburg, W., Wahl, T., Internationale Rechtshilfe in Strafsachen, 6.a ed., C.H. Beck, Munique, 2020, artigo 55.o, n.o 11, em que se afirma também, de forma clara e incisiva, que o reconhecimento mútuo não é um conceito unívoco que visa satisfazer o libido puniendi dos Estados‑Membros, podendo também ser aplicado em benefício dos indivíduos.
( 44 ) Note‑se de passagem que noutras versões linguísticas da CAAS não há paralelismo entre a terminologia do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS (em francês, sûreté de l'État; em alemão, Sicherheit) e o artigo 4.o, n.o 2, TUE (em francês, sécurité nationale; em alemão, nationale Sicherheit). Não obstante, não atribuo nenhuma importância normativa a estes pequenos desvios semânticos.
( 45 ) V., por exemplo, artigos 36.o, 45.o, n.o 3, 52.o e 65.o, n.o 1, alínea b), TFUE ou artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2002/58/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de julho de 2002, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no setor das comunicações eletrónicas (Diretiva relativa à privacidade e às comunicações eletrónicas) (JO 2002, L 201, p. 37).
( 46 ) V. Acórdão de 6 de outubro de 2020, La Quadrature du Net e o. (C‑511/18, C‑512/18 e C‑520/18, EU:C:2020:791, n.o 135). V., igualmente, Acórdão de 20 de setembro de 2022, SpaceNet e Telekom Deutschland (C‑793/19 e C‑794/19, EU:C:2022:702, n.o 92).
( 47 ) V. Acórdão de 6 de outubro de 2020, La Quadrature du Net e o. (C‑511/18, C‑512/18 e C‑520/18, EU:C:2020:791, n.o 136).
( 48 ) V. Vierundfünfzigstes Gesetz zur Änderung des Strafgesetzbuches — Umsetzung des Rahmenbeschlusses 2008/841/JI des Rates vom 24. Oktober 2008 zur Bekämpfung der organisierten Kriminalität (Lei n.o 54 que altera o Código Penal — Implementação da Decisão‑Quadro 2008/841/JAI do Conselho, de 24 de outubro de 2008, relativa à luta contra a criminalidade organizada), de 17 de julho de 2017, (BGBl. 2017 I, p. 2440).
( 49 ) V., por exemplo, Heger, M., in Lackner, K., Kühl, K., Heger, M., Strafgesetzbuch. Kommentar, 29.a ed., C.H. Beck, Munique, 2018, § 129, n.o 1.
( 50 ) V. Schäfer, J., Anstötz, St., in Erb, V., Schäfer, J., Münchener Kommentar zum Strafgesetzbuch, Band 3, 4.a ed., C.H. Beck, Munique, 2021, § 129, n.o 2.
( 51 ) Além disso, nada indica que as atividades de MR tenham perturbado o sistema financeiro alemão como um todo. Com efeito, na audiência, a Comissão pareceu sugerir que uma ameaça à existência do sistema financeiro de um Estado‑Membro era equivalente a um interesse como a segurança do Estado ao abrigo do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), da CAAS.