ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Décima Secção)
29 de junho de 2022 ( *1 )
«Instrumento de assistência à pré‑adesão — Inquérito do OLAF — Decisão da Comissão que aplica uma sanção administrativa — Exclusão dos procedimentos de adjudicação de contratos e de concessão de subvenções financiadas pelo orçamento geral da União por um período de quatro anos — Inscrição na base de dados do sistema de deteção precoce e de exclusão — Regulamento Financeiro — Competência de plena jurisdição — Proporcionalidade da sanção»
No processo T‑609/20,
LA International Cooperation Srl, com sede em Milão (Itália), representada por B. O’Connor e M. Hommé, advogados,
recorrente,
contra
Comissão Europeia, representada por R. Pethke, na qualidade de agente,
recorrida,
O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção),
composto por: A. Kornezov, presidente, E. Buttigieg e G. Hesse (relator), juízes,
secretário: E. Coulon,
vistos os autos,
visto não terem as partes requerido a marcação de audiência no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo sido decidido, nos termos do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso prescindindo da fase oral do processo,
profere o presente
Acórdão ( 1 )
[omissis]
Questão de direito
[omissis]
Quanto ao caráter adequado da sanção
151 |
A recorrente alega que a sua boa cooperação no inquérito do OLAF deveria ter sido tomada em consideração pela instância para efeitos de determinação da sanção adequada a aplicar no caso. Acrescenta que, em conformidade com o direito italiano, adotou em abril de 2016 um modelo de organização, de gestão e de controlo acompanhado de um código de ética e de um sistema disciplinar correspondente. Além disso, demitiu A e B das suas funções em 2019. |
152 |
A Comissão alega que, por força das suas obrigações contratuais e do artigo 5.o do Regulamento (Euratom, CE) n.o 2185/96 do Conselho de 11 de novembro de 1996 relativo às inspeções e verificações no local efetuadas pela Comissão para proteger os interesses financeiros das Comunidades Europeias contra a fraude e outras irregularidades (JO 1996, L 292, p. 2), a recorrente era obrigada a cooperar e a permitir o acesso às suas instalações a fim de facilitar as inspeções e as verificações do OLAF por sua conta. O argumento da recorrente de que a sua boa cooperação deveria ter tido incidência na apreciação da sanção adequada feita pela instância deve, em seu entender, ser rejeitado. A Comissão precisa que a instância teve acesso aos relatórios que davam conta das inspeções no local, nos quais se mencionava que a recorrente e os seus representantes tinham cooperado com o OLAF. |
153 |
A título preliminar, há que lembrar que, relativamente aos factos anteriores a 1 de janeiro de 2016, a Comissão referiu, na decisão recorrida, que o artigo 133.o‑A, n.o 2, alínea b), do seu Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento n.o 1605/2002 (JO 2002, L 357, p. 1), conforme alterado, e o artigo 145.o, n.o 1, do seu Regulamento Delegado (UE) n.o 1268/2012, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 (JO 2012, L 362, p. 1), antes da sua alteração pelo seu Regulamento Delegado (UE) 2015/2462, de 30 de outubro de 2015 (JO 2015, L 342, p. 7), dispunha que a duração máxima de exclusão de uma entidade era cinco anos. |
154 |
Pelos factos cometidos após 1 de janeiro de 2016, a Comissão referiu que o artigo 106.o, n.o 14, alínea c), do Regulamento n.o 966/2012, conforme alterado pelo Regulamento 2015/1929, previa que a duração da exclusão não podia exceder três anos nos casos de falta profissional grave referidos no artigo 106.o, n.o 1, alínea c), do referido regulamento e cinco anos nos casos de corrupção previstos no artigo 106.o, n.o 1, alínea d), do mesmo regulamento. |
155 |
Neste contexto, a Comissão excluiu a recorrente com base na qualificação jurídica preliminar do seu comportamento, tendo em conta os factos apurados e as constatações que figuram na recomendação emitida pela instância, em conformidade com o artigo 106.o, n.o 2, do Regulamento n.o 966/2012, conforme alterado pelo Regulamento 2015/1929. Considerou que a gravidade do comportamento ilícito, o caráter doloso desse comportamento, a sua duração e os elevados montantes em jogo justificavam uma exclusão de quatro anos. |
156 |
A este respeito, o Tribunal Geral refere que o artigo 133.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 2342/2002, conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 478/2007, da Comissão, de 23 de abril de 2007 (JO L 111, p. 13), e o artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento n.o 966/2012, conforme alterado pelo Regulamento 2015/1929, exigem que a entidade adjudicante que exclui um operador económico respeite o princípio da proporcionalidade. Em especial, o referido artigo 106.o, n.o 3, prevê que a decisão da entidade adjudicante deve ter em conta, nomeadamente, a gravidade da situação, incluindo o impacto sobre os interesses financeiros e a reputação da União, o tempo decorrido desde a verificação da conduta em causa, a sua duração e a sua eventual repetição, o dolo ou o grau de negligência, ou qualquer outra circunstância atenuante, como a cooperação do operador económico com a autoridade competente em causa e a sua contribuição para o inquérito, conforme atestadas pela entidade adjudicante. |
157 |
De acordo com o artigo 108.o, n.o 11, do Regulamento n.o 966/2012, conforme alterado pelo Regulamento 2015/1929, o Tribunal Geral «tem competência de plena jurisdição para rever uma decisão em que a entidade adjudicante exclui um operador económico e/ou impõe uma sanção financeira, podendo, nomeadamente, reduzir ou aumentar a duração da exclusão e/ou anular, reduzir ou aumentar a sanção financeira imposta». Para além da simples fiscalização da legalidade, que apenas permite negar provimento ao recurso de anulação ou anular o ato recorrido, essa competência de plena jurisdição habilita o Tribunal Geral a alterar o ato recorrido, mesmo que este não seja anulado, tendo em conta todas as circunstâncias de facto, a fim de, por exemplo, alterar a duração da exclusão. Nestas condições, o Tribunal pode, sendo caso disso, fazer apreciações diferentes das da Comissão na decisão recorrida no que respeita à duração da exclusão. |
158 |
No caso, a argumentação da recorrente em que alega que a boa cooperação que mostrou durante a investigação e as medidas de reorganização que adotou deveriam ter tido incidência na apreciação da sanção adequada que lhe devia ser aplicada deve ser interpretada no sentido de que convida o Tribunal Geral a apreciar, no exercício do seu poder de plena jurisdição, a duração da exclusão tendo em conta as circunstâncias atenuantes invocadas. |
159 |
No âmbito da sua competência de plena jurisdição, o Tribunal Geral observa que a recorrente praticou os atos de corrupção e de falta profissional grave acima expostos nos n.os 121 a 123, 126, 127 e 129 a 134. Esses factos são muito graves pela sua própria natureza, uma vez que o comportamento da recorrente teve por objeto subornar funcionários da Administração Pública da República da Macedónia do Norte a fim de obter uma vantagem concorrencial sobre os outros proponentes. Há que observar que a recorrente tentou intencionalmente corromper funcionários da Administração Pública da República da Macedónia do Norte. Esse comportamento durou um pouco mais de quatro anos, durante os quais várias pessoas internas e externas à recorrente estiveram envolvidas. |
160 |
Há que ter igualmente em conta a gravidade da incidência destes factos nos interesses financeiros da União, uma vez que dizem respeito a um montante superior a 1700000 EUR. |
161 |
Seguidamente, no que respeita aos elementos invocados pela recorrente, é verdade que os relatórios que dão conta das inspeções no local referem a sua «muito boa» e a sua «completa» cooperação nessas inspeções. Todavia, também é verdade que, como sustenta a Comissão, a recorrente tinha a obrigação legal de cooperar com o OLAF. De qualquer modo, há que observar que, no caso, o comportamento da recorrente no momento da investigação só pode ter uma fraca incidência sobre o grau de gravidade da sanção tendo em conta a gravidade dos factos em causa. |
162 |
Quanto ao modelo organizacional adotado pela recorrente em 2016, o Tribunal Geral faz suas as apreciações feitas pela Comissão a esse respeito na decisão recorrida. Com efeito, por um lado, esse modelo foi adotado em abril de 2016, mas não fez cessar o comportamento ilícito da demandante, que continuou até janeiro de 2017. Por outro lado, embora esse novo modelo possa eventualmente ter um efeito no comportamento futuro da recorrente, não o teve durante o período pertinente. Do mesmo modo, o afastamento de A e de B em 2019 só poderá ter efeitos no comportamento futuro da recorrente. Por conseguinte, o Tribunal Geral considera que não há que tê‑lo em conta. |
163 |
Por último, pode sublinhar‑se que a duração máxima de exclusão prevista pelo legislador era, antes de 1 de janeiro de 2016, de cinco anos para as faltas profissionais graves e, após 1 de janeiro de 2016, de três anos para as faltas profissionais graves e de cinco anos pelos crimes de corrupção. Ora, no caso, o Tribunal Geral já acima observou, nos n.os 121 a 123, 126, 127 e 129 a 134, que o comportamento da recorrente tanto era constitutivo de factos de falta profissional grave como de factos constitutivos de corrupção. |
164 |
Em face de todas as considerações e circunstâncias acima enumeradas, há que considerar que uma exclusão com uma duração de quatro anos é adequada e proporcionada no caso presente. [omissis] |
Pelos fundamentos expostos, O TRIBUNAL GERAL (Décima Secção) decide: |
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Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 29 de junho de 2022. |
( *1 ) Língua do processo: inglês.
( 1 ) Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.