ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

24 de março de 2022 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Impostos especiais de consumo — Diretiva 92/12/CE — Artigo 4.o — Circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo — Requisitos — Artigos 6.o e 20.o — Introdução no consumo de produtos — Falsificação do documento administrativo de acompanhamento — Infração ou irregularidade cometida no decurso da circulação de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo ao abrigo de um regime de suspensão do imposto — Saída irregular de produtos de um regime de suspensão — Destinatário que não tem conhecimento da circulação — Fraude cometida por um terceiro — Artigo 13.o, alínea a), e artigo 15.o, n.o 3 — Garantia obrigatória em matéria de circulação — Alcance»

No processo C‑711/20,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa), por Decisão de 16 de dezembro de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 31 de dezembro de 2020, no processo

Generální ředitelství cel

contra

TanQuid Polska sp. z o.o.,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: I. Jarukaitis, presidente de secção, M. Ilešič (relator) e Z. Csehi, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da TanQuid Polska sp. z o.o., por R. Halíček, advokát,

em representação do Governo checo, por M. Smolek, O. Serdula e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por M. Salyková e C. Perrin, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo (JO 1992, L 76, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 94/74/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994 (JO 1994, L 365, p. 46) (a seguir «Diretiva 92/12»), em conjugação com os artigos 13.o, 15.o e 16.o da mesma.

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Generální ředitelství cel (Direção‑Geral das Alfândegas, República Checa) à TanQuid Polska sp. z o.o. (a seguir «TanQuid»), sociedade com sede na Polónia, a respeito da cobrança do imposto especial de consumo por violação do regime de suspensão no decurso da circulação de óleos minerais.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 92/12

3

A Diretiva 92/12 foi revogada e substituída, com efeitos a partir de 1 de abril de 2010, pela Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE (JO 2009, L 9, p. 12). Todavia, tendo em conta a data dos factos do litígio no processo principal, o presente reenvio prejudicial é analisado à luz da Diretiva 92/12.

4

O quarto, décimo e décimo terceiro considerandos da Diretiva 92/12 enunciam:

«[…] para garantir o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno, a exigibilidade dos impostos especiais de consumo deve ser idêntica em todos os Estados‑Membros;

[…]

[…] a passagem do território de um Estado‑Membro para outro não pode originar controlos suscetíveis de criar obstáculos à livre circulação intracomunitária; […] as restrições inerentes à exigibilidade impõem, contudo, o conhecimento dos movimentos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo; […] é pois necessário prever um documento de acompanhamento para esses produtos;

[…]

[…] a este título, convém antes de mais que cada remessa possa ser facilmente identificada; […] a sua situação deve poder ser imediatamente conhecida no que respeita à dívida fiscal; […] é, pois, necessário prever para o efeito um documento de acompanhamento, o qual poderá ser de caráter administrativo ou comercial; […] o documento comercial deverá incluir os elementos indispensáveis constantes do documento administrativo».

5

O artigo 1.o, n.o 1, desta diretiva prevê:

«A presente diretiva estabelece o regime dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo e outros impostos indiretos que incidem direta ou indiretamente sobre o consumo desses produtos, com exclusão do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e dos impostos estabelecidos pela [União Europeia].»

6

Em conformidade com o seu artigo 3.o, n.o 1, a referida diretiva é aplicável, a nível da União Europeia, nomeadamente aos óleos minerais.

7

O artigo 4.o da mesma diretiva tem a seguinte redação:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

a)

Depositário autorizado: a pessoa singular ou coletiva autorizada pelas autoridades competentes de um Estado‑Membro a, no exercício da sua profissão, produzir, transformar, deter, receber e expedir, num entreposto fiscal, produtos sujeitos ao imposto especial de consumo em regime de suspensão do imposto;

b)

Entreposto fiscal: todo e qualquer local onde sejam produzidas, transformadas, detidas, recebidas ou expedidas pelo depositário autorizado, no exercício da sua profissão, em regime de suspensão do imposto especial de consumo, mercadorias sujeitas ao referido imposto, sob certas condições fixadas pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em que se situa esse entreposto fiscal;

c)

Regime de suspensão: regime fiscal aplicável à produção, transformação, detenção e circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo;

d)

Operador registado: a pessoa singular ou coletiva que não tem a qualidade de depositário autorizado, autorizada pelas autoridades competentes de um Estado‑Membro a receber, no exercício da sua profissão, produtos sujeitos ao imposto especial de consumo em regime de suspensão do referido imposto provenientes de outro Estado‑Membro. Esse operador não pode contudo deter nem expedir os produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo;

[…]»

8

O artigo 5.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 92/12 dispõe:

«Os produtos referidos no n.o 1 do artigo 3.o ficam sujeitos ao imposto especial de consumo no momento da sua produção no território da [União] […] ou da sua importação nesse território.»

9

O artigo 6.o desta diretiva prevê:

«1.   O imposto especial de consumo é exigível no momento da introdução no consumo ou da constatação das faltas que devem ser sujeitas ao imposto especial de consumo em conformidade com o n.o 3 do artigo 14.o

Considera‑se como introdução no consumo de produtos sujeitos ao imposto especial de consumo:

a)

Toda e qualquer saída, mesmo irregular, de um regime de suspensão;

[…]

2.   As condições de exigibilidade e a taxa do imposto especial de consumo a aplicar são as que estiverem em vigor na data de exigibilidade no Estado‑Membro em que se efetuar a introdução no consumo ou a constatação das faltas. O imposto especial de consumo será percebido e cobrado segundo as regras estabelecidas por cada Estado‑Membro, entendendo‑se que os Estados‑Membros aplicarão as mesmas regras de perceção e cobrança aos produtos nacionais e aos produtos provenientes dos outros Estados‑Membros.»

10

Por força do artigo 13.o, alínea a), da Diretiva 92/12, o depositário autorizado deve cumprir a obrigação de prestar uma eventual garantia em matéria de produção, transformação e detenção, assim como uma garantia obrigatória em matéria de circulação, sob reserva do disposto no artigo 15.o, n.o 3, da mesma, cujos requisitos são fixados pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em que o entreposto fiscal está autorizado.

11

Nos termos do artigo 15.o desta diretiva:

«1.   […] [A] circulação em regime de suspensão dos produtos sujeitos ao imposto especial de consumo deve efetuar‑se entre entrepostos fiscais.

[…]

3.   Os riscos inerentes à circulação [na União] serão cobertos pela garantia prestada pelo depositário autorizado expedidor tal como prevista no artigo 13.o ou, se for o caso, por uma garantia solidariamente prestada pelo expedidor e pelo transportador. As autoridades competentes dos Estados‑Membros podem permitir que o transportador ou o proprietário dos produtos prestem uma garantia em substituição da prestada pelo depositário autorizado expedidor. Se necessário, os Estados‑Membros podem exigir uma garantia ao destinatário.

[…]

As modalidades da garantia serão fixadas pelos Estados‑Membros. A garantia deve ser válida em toda a [União].

4.   Sem prejuízo do artigo 20.o, a responsabilidade do depositário autorizado expedidor e, eventualmente, do transportador só poderá ser libertada quando se provar que o destinatário assumiu a responsabilidade dos produtos, nomeadamente através do documento de acompanhamento referido no artigo 18.o, nas condições fixadas no artigo 19.o

[…]»

12

Em conformidade com o artigo 16.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da referida diretiva:

«Em derrogação do n.o 1 do artigo 15.o, o destinatário pode ser um operador profissional que não possua a qualidade de depositário autorizado. Este operador pode, no exercício da sua profissão, receber em regime de suspensão do imposto produtos sujeitos a imposto especial de consumo provenientes de outros Estados‑Membros. No entanto não pode deter nem expedir esses produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo.»

13

O artigo 16.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 92/12 fixa as obrigações a que o operador profissional que não possua a qualidade de depositário autorizado deve cumprir consoante esteja, respetivamente, registado ou não registado junto das autoridades fiscais do seu Estado‑Membro.

14

Nos termos do artigo 18.o, n.o 1, desta diretiva:

«[…] [T]odos os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que circulem em regime de suspensão entre os Estados‑Membros […] devem ser acompanhados de um documento emitido pelo expedidor. Este documento pode ser um documento administrativo ou um documento comercial. […]».

15

O artigo 19.o, n.os 1 a 3, da referida diretiva dispõe:

«1.   As autoridades fiscais dos Estados‑Membros serão informadas pelos operadores das remessas expedidas e recebidas por meio do documento ou de uma referência ao documento referido no artigo 18.o Este documento será emitido em quatro exemplares:

um exemplar a conservar pelo expedidor,

um exemplar para o destinatário,

um exemplar para ser reenviado ao expedidor para apuramento,

um exemplar destinado às autoridades competentes do Estado‑Membro de destino.

As autoridades competentes de cada Estado‑Membro de expedição podem prever a utilização de uma cópia suplementar do documento destinada às autoridades competentes do Estado‑Membro de partida.

[…]

O Estado‑Membro de destino poderá estipular que o exemplar destinado a reenvio ao expedidor, para apuramento, seja autenticado ou visado pelas autoridades nacionais competentes. […]

[…]

2.   Sempre que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo circulem em regime de suspensão, com destino a um depositário autorizado ou a um operador registado ou não registado, o destinatário deve enviar ao expedidor, para efeitos de apuramento, o mais tardar até ao dia 15 do mês seguinte ao da receção, um exemplar do documento administrativo de acompanhamento ou uma cópia do documento comercial devidamente anotada.

Não obstante, os Estados‑Membros de partida podem prever que seja imediatamente enviada por telecópia ao expedidor uma cópia da folha destinada a reenvio, a fim de permitir libertar rapidamente a garantia. Mantém‑se a obrigação estipulada na primeira frase de devolver o original.

[…]

3.   O regime de suspensão, tal como definido na alínea c) do artigo 4.o, é apurado pela colocação dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo numa das situações referidas no n.o 2 do artigo 5.o, e em conformidade com esse número, após receção pelo expedidor do exemplar de reenvio do documento administrativo de acompanhamento ou de uma cópia do documento comercial devidamente anotados no que se refere a essa colocação.»

16

O artigo 20.o da mesma diretiva enuncia:

«1.   Sempre que, no decurso da circulação, seja cometida uma irregularidade ou uma infração que torne exigível o imposto especial de consumo, este deverá ser cobrado no Estado‑Membro em que tiver sido cometida a irregularidade ou a infração, junto da pessoa singular ou coletiva que se constituiu garante do pagamento do imposto especial de consumo, em conformidade com o n.o 3 do artigo 15.o, sem prejuízo do recurso a ações penais.

Sempre que a cobrança do imposto se efetuar num Estado‑Membro que não o de partida, o Estado‑Membro que procede à cobrança informará as autoridades competentes do país de partida.

2.   Sempre que, no decurso da circulação, for verificada uma infração ou uma irregularidade sem que seja possível determinar o lugar onde foi cometida, considerar‑se‑á que foi cometida no Estado‑Membro em que foi verificada.

3.   Sem prejuízo do disposto no n.o 2 do artigo 6.o, sempre que os produtos sujeitos ao imposto especial de consumo não chegarem ao destino e não for possível determinar o local da infração ou da irregularidade, considera‑se que essa infração ou irregularidade foi cometida no Estado‑Membro de partida, o qual procederá à cobrança do imposto especial de consumo à taxa em vigor à data da expedição dos produtos, salvo se, num prazo de quatro meses a partir da data de expedição dos produtos, forem apresentadas às autoridades competentes provas por estas consideradas suficientes da regularidade da operação ou do local onde a infração ou a irregularidade foi efetivamente cometida. Os Estados‑Membros tomarão as medidas necessárias para fazer face a eventuais infrações ou irregularidades e para impor sanções eficazes.

4.   Se, num prazo de três anos a contar da data de emissão do documento de acompanhamento, se vier a determinar o Estado‑Membro onde a infração ou a irregularidade foi efetivamente cometida, esse Estado‑Membro procederá à cobrança do imposto à taxa em vigor à data de expedição das mercadorias. Neste caso, desde que seja feita prova da cobrança, o imposto especial de consumo inicialmente cobrado será reembolsado.»

Regulamento n.o 2719/92

17

O artigo 1.o do Regulamento (CEE) n.o 2719/92 da Comissão, de 11 de setembro de 1992, relativo ao documento administrativo de acompanhamento dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que circulem em regime de suspensão (JO 1992, L 276, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CEE) n.o 2225/93 da Comissão, de 27 de julho de 1993 (JO 1993, L 198, p. 5) (a seguir «Regulamento n.o 2719/92»), prevê:

«O modelo constante do anexo I será utilizado como documento administrativo de acompanhamento dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, nos termos do n.o 1 do artigo 3.o da Diretiva 92/12/CEE, que circulem em regime de suspensão. As instruções em matéria de preenchimento e de procedimento constam do verso do exemplar n.o 1 do formulário.»

18

Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, deste regulamento, um documento de caráter comercial pode substituir o documento administrativo desde que contenha as mesmas informações que as que devem constar do documento administrativo.

Direito checo

19

Nos termos do artigo 25.o, n.o 1, alínea a), da zákon č. 353/2003 Sb., o spotřebních daních (Lei n.o 353/2003, Relativa ao Imposto Especial de Consumo), na sua versão aplicável aos factos no processo principal (a seguir «Lei do Imposto Especial de Consumo»), os produtos regulamentados só podem circular em regime de suspensão do imposto especial de consumo entre os Estados‑Membros ao abrigo de um documento de acompanhamento, se os produtos regulamentados forem transportados a partir de um entreposto fiscal situado noutro Estado‑Membro, com destino a um operador de um entreposto fiscal, a um destinatário autorizado ou a um representante fiscal, aos quais tenha sido emitida uma autorização para o território fiscal da República Checa.

20

Por força do artigo 26.o, n.o 1, da Lei do Imposto Especial de Consumo, os produtos regulamentados só podem circular em regime de suspensão do imposto especial de consumo ao abrigo de um documento de acompanhamento, salvo quando a presente lei disponha em sentido diferente.

21

Em conformidade com o artigo 28.o, n.o 1, da Lei do Imposto Especial de Consumo, em princípio, há uma infração ao regime de suspensão do imposto especial de consumo durante o transporte se o transporte dos produtos regulamentados, com destino a um entreposto fiscal, a um destinatário autorizado, a um local de entrega direta, a um local de exportação, a uma pessoa referida no artigo 11.o, n.o 1, alíneas d) ou e), ou a um destinatário em conformidade com a Diretiva 92/12 noutro Estado‑Membro, não for concluído no prazo fixado.

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

22

Em 5 de janeiro de 2010, os agentes da Celní úřad Náchod (Estância Aduaneira de Náchod, República Checa) procederam à inspeção de três camiões‑cisterna que, segundo os documentos de acompanhamento apresentados, transportavam óleos minerais a partir de um entreposto fiscal situado no território polaco e explorado pela TanQuid, e com destino à EKOL GAS PB s. r. o. (a seguir «EKOL GAS»), sociedade comercial de direito checo. Durante a inspeção, verificaram que as informações contidas nesses documentos de acompanhamento eram falsas. Em seguida, a EKOL GAS negou ter tido qualquer contacto comercial com a TanQuid.

23

Em resposta a um pedido de informações proveniente da Autoridade Aduaneira checa, a Autoridade Aduaneira polaca forneceu‑lhe 38 documentos de acompanhamento com anexos, dos quais resultava que outras quantidades de óleos minerais tinham pretensamente sido expedidas para a EKOL GAS.

24

Além disso, verificou‑se que esses documentos de acompanhamento não tinham sido apresentados na estância aduaneira com vista à verificação da exatidão e da validade dos dados e que os carimbos da estância aduaneira checa que certificam os 35 documentos de acompanhamento foram falsificados.

25

Por último, com base no extrato de operações dos pórticos de portagens rodoviárias, foi demonstrado que os óleos minerais tinham sido transportados com destino a uma pessoa desconhecida e descarregados em Žďár nad Sázavou (República Checa). A este respeito, a polícia checa deu início a um processo penal por atuação fraudulenta de terceiros, mas este inquérito foi arquivado por razões processuais.

26

Em 3 de março de 2016, a Celní úřad pro Jihočeský kraj (Estância Aduaneira da região da Boémia Meridional, República Checa) emitiu, com base num relatório de inspeção tributária de 11 de janeiro de 2016, vários avisos de liquidação dos impostos especiais de consumo para os óleos minerais, fixando a obrigação tributária a cargo da TanQuid no montante total de 10207850 coroas checas (CZK) (cerca de 420000 euros).

27

Uma vez que a Direção‑Geral das Alfândegas indeferiu as reclamações administrativas desses avisos de liquidação, a TanQuid intentou uma ação para a anulação das decisões de indeferimento no Krajský soud v Českých Budějovicích (Tribunal Regional de České Budějovice, República Checa).

28

Por Acórdão de 12 de setembro de 2018, esse órgão jurisdicional anulou as decisões de indeferimento com o fundamento, por um lado, de que, devido às fraudes cometidas, não tinha havido, no território checo, circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo e que, por outro, as entregas em causa no processo principal não estavam cobertas por uma garantia, uma vez que a garantia prestada dizia exclusivamente respeito à circulação entre entrepostos fiscais. O referido órgão jurisdicional considerou a saída dos óleos minerais do entreposto fiscal da TanQuid como sendo uma introdução em livre prática.

29

A Direção‑Geral das Alfândegas interpôs recurso de cassação no Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo, República Checa).

30

O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se os requisitos formais e materiais para iniciar a circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo estão preenchidos quando, por um lado, através de um comportamento fraudulento, terceiros se tenham feito passar pelo destinatário autorizado estabelecido noutro Estado‑Membro e, por outro, a garantia prestada para efeitos dessa circulação não tem o alcance exigido.

31

Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio salienta, por um lado, que, no caso de pessoas que se apresentam como agindo em nome de um operador registado (destinatário), não dispondo de nenhuma autorização válida para esse efeito, o operador registado não tem conhecimento do facto de que os produtos devem circular em relação a si em regime de suspensão do imposto especial de consumo. Assim, à semelhança do que decidiu o Krajský soud v Českých Budějovicích (Tribunal Regional de České Budějovice), pode considerar‑se que esta situação é análoga àquela em que o destinatário dos produtos regulamentados em causa, conforme declarado nos documentos de acompanhamento, não dispõe da autorização aplicável. Sob este ponto de vista, a saída dos óleos minerais em causa no processo principal do entreposto fiscal da TanQuid deve ser vista como uma introdução em livre prática.

32

No entanto, por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que é o depositário autorizado quem inicia a circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo, dado que é ele quem preenche a parte A do documento administrativo de acompanhamento. Além disso, o depositário autorizado, na medida em que é objetivamente responsável por todas as infrações ou irregularidades cometidas no decurso da circulação, é devedor dos impostos especiais de consumo no local em que foi cometida a infração ou a irregularidade, uma vez que o destinatário só está envolvido na operação no final da mesma. Por conseguinte, a participação do destinatário não é necessária para que a circulação se inicie.

33

Assim, a questão de saber se o destinatário dos produtos tem, ou não, conhecimento da operação é irrelevante no que respeita ao início da circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo. Do mesmo modo, é indiferente a constatação posterior de que terceiros se apresentaram de maneira ilegítima como pessoas agindo em nome de um operador registado. Neste contexto, as autoridades aduaneiras apenas estão obrigadas a verificar se a circulação é realizada entre operadores autorizados e se foi prestada uma garantia para os impostos especiais de consumo.

34

Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à natureza e ao objetivo da garantia prestada para garantir o pagamento do imposto especial de consumo no momento da circulação dos produtos em regime de suspensão desses impostos. Este tende a considerar que, desde que a prestação da garantia tenha sido indicada nos documentos de acompanhamento para efeitos da circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo para um destinatário autorizado identificado, as autoridades aduaneiras de outro Estado‑Membro não podem examinar o motivo da garantia nem proceder ao exame material da autenticidade dos dados contidos nos documentos de acompanhamento.

35

Ora, no caso em apreço, a garantia, formalmente prestada para efeitos da circulação entre os entrepostos fiscais, mencionava, como tipo de obrigações tributárias por si abrangidas, a saída do entreposto de produtos sujeitos a imposto especial de consumo em regime de suspensão do imposto especial de consumo. Além disso, esta garantia tinha sido prestada para garantir a circulação dos produtos regulamentados em regime de suspensão do imposto especial de consumo, a partir do entreposto fiscal da TanQuid e com destino à EKOL GAS, um operador registado.

36

Nestas circunstâncias, o Nejvyšší správní soud (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Os produtos sujeitos a imposto especial de consumo circulam em regime de suspensão do imposto, na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva [92/12], quando a estância aduaneira de um Estado‑Membro autorizou a circulação desses produtos, em regime de suspensão, entre um entreposto fiscal e um operador registado estabelecido noutro Estado‑Membro, sem que estivessem objetivamente reunidas as condições para a circulação dos referidos produtos em regime de suspensão, por ter sido posteriormente demonstrado, no decurso do processo, que o operador registado não tinha conhecimento da circulação desses produtos devido a uma fraude cometida por terceiros?

2)

A prestação de uma garantia relativa ao imposto especial de consumo, na aceção do artigo 15.o, n.o 3, da Diretiva [92/12], para fins diferentes da circulação de produtos em regime de suspensão do imposto, entre um entreposto fiscal e um operador registado estabelecido noutro Estado‑Membro, obsta a que a circulação em regime de suspensão seja regularmente iniciada, quando a prestação da garantia tiver sido mencionada pelo operador registado nos documentos de acompanhamento com vista à circulação de produtos em regime de suspensão e confirmada pela autoridade aduaneira de um Estado‑Membro?»

Quanto às questões prejudiciais

37

Com as suas duas questões, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva 92/12 deve ser interpretada no sentido de que uma expedição, por um depositário autorizado, de produtos sujeitos a imposto especial de consumo, ao abrigo de um documento de acompanhamento e de uma garantia obrigatória, constitui uma circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo, na aceção do artigo 4.o, alínea c), desta diretiva, numa situação em que, devido a um comportamento fraudulento de terceiros, o destinatário indicado nesse documento de acompanhamento e nessa garantia não tem conhecimento de que esses produtos lhe são enviados.

38

Por outro lado, esse órgão jurisdicional pretende igualmente saber se o facto de a garantia obrigatória prestada pelo depositário autorizado para efeitos dessa expedição especificar o nome do destinatário autorizado, mas não a sua qualidade de operador registado para efeitos de aplicação do artigo 15.o ou do artigo 16.o da Diretiva 92/12 tem impacto no caráter regular dessa circulação.

39

A título preliminar, há que recordar que a Diretiva 92/12 visa estabelecer um certo número de regras no que respeita à detenção, circulação e controlos dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo, como os óleos minerais referidos no artigo 3.o, n.o 1, da mesma, com vista, nomeadamente, como resulta do seu quarto considerando, a assegurar que a exigibilidade dos impostos especiais de consumo seja idêntica em todos os Estados‑Membros. Em princípio, esta harmonização permite afastar a dupla tributação nas relações entre Estados‑Membros (Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 44 e jurisprudência referida).

40

O facto tributável, na aceção da Diretiva 92/12, é constituído, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1 da mesma, pela produção, no território da União, dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo ou pela sua importação nesse território (Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 46 e jurisprudência referida).

41

Em contrapartida, por força do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 92/12, o imposto especial de consumo é exigível, nomeadamente, no momento da introdução no consumo dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo. Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, segundo parágrafo, alínea a), desta diretiva, este conceito engloba igualmente toda a saída, mesmo irregular, de um regime de suspensão, definido no artigo 4.o, alínea c), da referida diretiva (Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 47 e jurisprudência referida).

42

Tal regime é caracterizado pelo facto de os impostos especiais de consumo respeitantes aos produtos abrangidos por este regime ainda não serem exigíveis, apesar de já ter ocorrido o facto gerador do imposto. Consequentemente, no que se refere aos produtos sujeitos a imposto especial de consumo, esse regime adia a exigibilidade do mesmo até que o requisito de exigibilidade, à semelhança do que é descrito no número anterior, esteja preenchido (Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 49 e jurisprudência referida).

43

Ora, tendo em conta o papel central que o legislador da União lhe confere no âmbito do regime de suspensão em conformidade com a Diretiva 92/12, o depositário é, em princípio, responsável pela totalidade dos riscos inerentes a esse regime, nomeadamente quando, durante a circulação desses produtos, tiver sido cometida uma irregularidade ou uma infração que desencadeie a exigibilidade dos impostos especiais de consumo. Esta responsabilidade é, além disso, objetiva, e assenta, não na culpa provada ou presumida do depositário, mas na sua participação numa atividade económica (v., neste sentido, Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 52 e jurisprudência referida).

44

Por conseguinte, no sistema da Diretiva 92/12, a responsabilidade do depositário autorizado expedidor não pode ser eventualmente substituída pela do proprietário dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo.

45

No que respeita, mais especificamente, à circulação em regime de suspensão de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, a Diretiva 92/12 prevê vários requisitos que a expedição desses produtos deve preencher para que, no momento dessa circulação, o depositário autorizado expedidor possa continuar a beneficiar desse regime.

46

Em primeiro lugar, por força do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 92/12, a circulação em regime de suspensão dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo deve efetuar‑se, em princípio, entre os entrepostos fiscais, tal como definidos no artigo 4.o, alínea b), desta diretiva e explorados pelos depositários autorizados, na aceção do artigo 4.o, alínea a), da mesma.

47

Em conformidade com o artigo 16.o, n.os 1 e 2, da referida diretiva, essa circulação é igualmente possível, a título derrogatório, com destino a um operador registado, estando este definido, no artigo 4.o, alínea d), da mesma diretiva, como sendo a pessoa singular ou coletiva que não tem a qualidade de depositário autorizado, mas que é autorizada pelas autoridades competentes de um Estado‑Membro a receber, no exercício da sua profissão, produtos sujeitos a imposto especial de consumo em regime de suspensão do referido imposto provenientes de outro Estado‑Membro.

48

Quando, durante a circulação dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo, tiver sido cometida ou constatada uma irregularidade ou uma infração que desencadeie a exigibilidade do imposto especial de consumo, incluindo em caso de fraude, o depositário autorizado continua a ser responsável pelo pagamento dos impostos especiais de consumo (v., neste sentido, Acórdão de 24 de fevereiro de 2021, Silcompa, C‑95/19, EU:C:2021:128, n.o 52 e jurisprudência referida).

49

Com efeito, nos termos do artigo 15.o, n.o 4, da Diretiva 92/12, a responsabilidade do depositário autorizado expedidor só poderá ser libertada quando se provar que o destinatário assumiu a responsabilidade dos produtos, nomeadamente através do documento de acompanhamento referido no artigo 18.o desta diretiva e em conformidade com os requisitos fixados no artigo 19.o da mesma.

50

Quando, como parece ser o caso em apreço, uma fraude cometida por terceiros for a causa principal da expedição de produtos sujeitos a imposto especial de consumo pelo depositário autorizado, o momento do início da circulação em regime de suspensão pode coincidir com a prática de uma irregularidade ou de uma infração que desencadeie a introdução no consumo desses produtos e a exigibilidade do imposto especial de consumo.

51

No caso de, no decurso da circulação, ter sido cometida uma irregularidade ou uma infração que desencadeie a exigibilidade do imposto especial de consumo, o artigo 20.o, n.o 1, da Diretiva 92/12 designa, a título principal, o Estado‑Membro do local em que a irregularidade ou a infração tenha sido cometida como aquele em que o imposto especial de consumo é devido.

52

No entanto, o Estado‑Membro em que essa infração ou irregularidade é verificada pode tornar‑se competente, por força do artigo 20.o, n.o 2, da Diretiva 92/12, para cobrar o imposto especial de consumo, mesmo que a referida infração ou irregularidade não tenha sido cometida nesse Estado‑Membro, se não for possível determinar o local em que esta foi cometida.

53

Por conseguinte, a expedição, por um depositário autorizado, de produtos sujeitos a impostos especiais de consumo pode constituir uma circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo, na aceção do artigo 4.o, alínea c), da Diretiva 92/12, não obstante o facto de, devido a um comportamento fraudulento de terceiros, o presumível destinatário não ter conhecimento de que esses produtos lhe são enviados, enquanto esse facto ou outra irregularidade ou infração não tiverem sido declarados pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em causa.

54

Em segundo lugar, o artigo 15.o, n.o 3, da Diretiva 92/12 enuncia, no seu primeiro parágrafo, que os riscos inerentes à circulação no interior da União são normalmente cobertos pela garantia obrigatória prestada pelo depositário autorizado expedidor, tal como prevista no artigo 13.o da mesma, ou, se for caso disso, por uma garantia solidariamente prestada pelo expedidor e pelo transportador. Resulta de uma leitura conjugada do artigo 13.o, alínea a) e do artigo 15.o, n.o 3, terceiro parágrafo, desta diretiva, que os requisitos e as modalidades desta garantia são fixados pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em que o entreposto fiscal está autorizado e que a referida garantia deve ser válida em toda a União.

55

Além disso, a referida garantia deve cobrir o período entre o momento da saída do entreposto fiscal e o do apuramento, uma vez que esta só pode ser levantada, em conformidade com o artigo 19.o, n.o 2, desta diretiva, no momento em que o expedidor recebe um exemplar do documento administrativo de acompanhamento ou uma cópia do documento comercial devidamente anotada enviada pelo destinatário para efeitos de apuramento.

56

O artigo 15.o, n.o 3, primeiro parágrafo, da Diretiva 92/12 prevê que as autoridades competentes dos Estados‑Membros podem permitir que o transportador ou o proprietário dos produtos prestem uma garantia em substituição da prestada pelo depositário autorizado expedidor e que, se for caso disso, os Estados‑Membros podem igualmente exigir uma garantia ao destinatário.

57

Além disso, resulta do modelo do documento administrativo de acompanhamento, que figura no anexo I do Regulamento n.o 2719/92, que deve ser mencionada, na casa n.o 10 desse documento, intitulada «Garantia», a «parte ou as partes que constituem a garantia», utilizando, consoante os casos referidos no artigo 15.o, n.o 3, da Diretiva 92/12, a designação «expedidor», «transportador» ou «destinatário». Não é necessária informação mais detalhada.

58

Em contrapartida, não resulta da Diretiva 92/12 que as autoridades competentes do Estado‑Membro de partida devem verificar o conteúdo da garantia antes do início da circulação dos produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo ou que, neste contexto, devem concordar com essa circulação, uma vez que tais diligências podem criar substancialmente obstáculos à livre circulação das mercadorias sujeitas a imposto especial de consumo na União.

59

Daqui resulta que a fiscalização que cabe às autoridades competentes do Estado‑Membro de partida efetuar deve ser limitada à fiscalização da existência formal dessa garantia.

60

É certo que a inobservância de requisitos ou de modalidades fixadas pelos Estados‑Membros ou pelas suas autoridades competentes pode constituir uma irregularidade ou uma infração, na aceção do artigo 20.o da Diretiva 92/12.

61

No entanto, há que constatar que, com exceção dos requisitos, recordados nos n.os 54 e 55 do presente acórdão, relativos à cobertura, pela garantia, dos riscos inerentes à circulação na União, bem como a um determinado alcance territorial e temporal dessa garantia, não está previsto nenhum outro requisito relativamente à garantia para que uma mercadoria seja validamente admitida a circular em regime de suspensão dos impostos especiais de consumo previsto pela Diretiva 92/12.

62

Assim, eventuais imprecisões na garantia, como o facto de o nome do destinatário, um operador registado, ter sido corretamente indicado, mas as cláusulas desta garantia apenas se referirem à circulação entre entrepostos fiscais, na aceção do artigo 15.o da Diretiva 92/12, não podem ter impacto na existência de uma circulação entre um depositário autorizado e um operador registado, na aceção do artigo 16.o da mesma.

63

Em terceiro lugar, o artigo 18.o, n.o 1, da Diretiva 92/12 prevê que todos os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo que circulem em regime de suspensão entre os diferentes Estados‑Membros devem ser acompanhados de um documento emitido pelo expedidor, podendo esse documento ser, quer um documento administrativo, quer um documento comercial, cuja forma e o conteúdo são definidos pelo Regulamento n.o 2719/92.

64

No que respeita ao artigo 19.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 92/12, este refere que as autoridades fiscais dos Estados‑Membros são informadas pelos operadores das remessas expedidas e recebidas através desse documento ou de uma referência ao mesmo, e especifica que esse documento é emitido em quatro exemplares, a saber, um exemplar a conservar pelo expedidor, um exemplar para o destinatário, um exemplar para ser reenviado ao expedidor para apuramento e um exemplar destinado às autoridades competentes do Estado‑Membro de destino.

65

Quanto ao artigo 19.o, n.o 2, da referida diretiva, este estabelece que, sempre que os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo circulem em regime de suspensão com destino a um depositário autorizado ou a um operador registado ou não registado, o destinatário deve enviar ao expedidor, para efeitos de apuramento, o mais tardar até ao dia 15 do mês seguinte ao da receção, um exemplar do documento administrativo de acompanhamento ou uma cópia do documento comercial devidamente anotada.

66

Neste contexto, em conformidade com o artigo 19.o, n.o 1, quarto parágrafo, da mesma diretiva, o Estado‑Membro de destino pode estipular que o exemplar destinado a reenvio ao expedidor, para apuramento, seja autenticado ou visado pelas suas próprias autoridades, faculdade que a República Checa parece ter utilizado, como resulta do n.o 24 do presente acórdão.

67

Ora, há que constatar que a Diretiva 92/12 não exige semelhante formalidade por parte das autoridades competentes do Estado‑Membro de partida para que se inicie uma circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo. Com efeito, como resulta do décimo e décimo terceiro considerandos da mesma, o documento de acompanhamento deve servir apenas para permitir conhecer os movimentos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo e identificar facilmente cada remessa para poder determinar imediatamente a sua situação no que respeita à dívida fiscal.

68

A este respeito, em conformidade com o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, desta diretiva, as autoridades competentes de cada Estado‑Membro de expedição têm apenas a faculdade, não a obrigação, de prever a utilização de uma cópia suplementar do documento destinada às autoridades competentes do Estado‑Membro de partida.

69

Por conseguinte, mesmo no caso em que a formalidade referida no n.o 66 do presente acórdão seja exigida pelas autoridades competentes do Estado‑Membro de partida, se for caso disso, ao abrigo do direito nacional, esta pode servir, quando muito, para impedir ou constatar eventuais irregularidades ou infrações numa fase precoce do procedimento de circulação em regime de suspensão dos produtos sujeitos a imposto especial de consumo. Em contrapartida, a omissão pelas autoridades competentes do Estado‑Membro de partida de constatar, nessa fase, uma irregularidade ou uma infração não tem nenhum impacto sobre a responsabilidade do depositário autorizado expedidor, tal como descrito nos n.os 43 e 48 do presente acórdão, mesmo que, posteriormente, surjam inexatidões no documento de acompanhamento autenticado ou visado por estas.

70

Em todo o caso, exigir uma fiscalização mais aprofundada nesta fase, destinada a verificar a exatidão das informações que figuram no documento de acompanhamento, iria contra um dos objetivos da Diretiva 92/12, que é contribuir para a livre circulação de mercadorias sujeitas a imposto especial de consumo, uma vez que essa fiscalização aprofundada é suscetível de criar obstáculos a tal circulação.

71

Por conseguinte, para que haja circulação na aceção desta diretiva, basta, em princípio, que o depositário autorizado expedidor tenha cumprido as formalidades necessárias relativas à emissão de um documento de acompanhamento e procedido à prestação da garantia obrigatória e que os produtos sujeitos a imposto especial de consumo tenham saído do entreposto fiscal, ainda que formalmente, com destino a uma pessoa autorizada na aceção dos artigos 15.o e 16.o da referida diretiva.

72

Nestas circunstâncias, importa responder às questões submetidas que a Diretiva 92/12 deve ser interpretada no sentido de que uma expedição, por um depositário autorizado, de produtos sujeitos a imposto especial de consumo, ao abrigo de um documento de acompanhamento e de uma garantia obrigatória, constitui uma circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo, na aceção do artigo 4.o, alínea c), da mesma, não obstante o facto de, devido a um comportamento fraudulento de terceiros, o destinatário indicado nesse documento de acompanhamento e nessa garantia não ter conhecimento de que esses produtos lhe são enviados, enquanto esse facto ou outra irregularidade ou infração não tiverem sido declarados pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em causa. A circunstância de a garantia obrigatória prestada pelo depositário autorizado para efeitos dessa expedição especificar o nome do destinatário autorizado, mas não a sua qualidade de operador registado, não tem impacto no caráter regular dessa circulação.

Quanto às despesas

73

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

A Diretiva 92/12/CEE do Conselho, de 25 de fevereiro de 1992, relativa ao regime geral, à detenção, à circulação e aos controlos dos produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, conforme alterada pela Diretiva 94/74/CE do Conselho, de 22 de dezembro de 1994, deve ser interpretada no sentido de que uma expedição, por um depositário autorizado, de produtos sujeitos a imposto especial de consumo, ao abrigo de um documento de acompanhamento e de uma garantia obrigatória, constitui uma circulação de produtos em regime de suspensão do imposto especial de consumo, na aceção do artigo 4.o, alínea c), da mesma, não obstante o facto de, devido a um comportamento fraudulento de terceiros, o destinatário indicado nesse documento de acompanhamento e nessa garantia não ter conhecimento de que esses produtos lhe são enviados, enquanto esse facto ou outra irregularidade ou infração não tiverem sido declarados pelas autoridades competentes do Estado‑Membro em causa.

 

A circunstância de a garantia obrigatória prestada pelo depositário autorizado para efeitos dessa expedição especificar o nome do destinatário autorizado, mas não a sua qualidade de operador registado, não tem impacto no caráter regular dessa circulação.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: checo.