ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

6 de outubro de 2021 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Direito institucional — Estatuto Único do Deputado Europeu — Deputados ao Parlamento Europeu eleitos em circunscrições italianas — Alteração dos direitos à pensão — Ato lesivo — Posição provisória — Efeitos jurídicos autónomos»

No processo C‑431/20 P,

que tem por objeto um recurso de um despacho do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 12 de setembro de 2020,

Carlo Tognoli, residente em Milão (Itália),

Emma Allione, residente em Milão,

Luigi Alberto Colajanni, residente em Palermo (Itália),

Claudio Martelli, residente em Roma (Itália),

Luciana Sbarbati, residente em Chiaravalle (Itália),

Carla Dimatore, na qualidade de herdeira de Mario Rigo, residente em Noale (Itália),

Roberto Speciale, residente em Bogliasco (Itália),

Loris Torbesi, na qualidade de herdeiro de Eugenio Melandri, residente em Roma,

Luciano Pettinari, residente em Roma,

Pietro Di Prima, residente em Palermo,

Carla Barbarella, residente em Magione (Itália),

Carlo Alberto Graziani, residente em Fiesole (Itália),

Giorgio Rossetti, residente em Trieste (Itália),

Giacomo Porrazzini, residente em Terni (Itália),

Guido Podestà, residente em Vila Real de Santo António (Portugal),

Roberto Barzanti, residente em Siena (Itália),

Rita Medici, residente em Bolonha (Itália),

representados por M. Merola, avvocato,

Aldo Arroni, residente em Milão,

Franco Malerba, residente em Issy‑les‑Moulineaux (França),

Roberto Mezzaroma, residente em Roma,

representados por M. Merola e L. Florio, avvocati,

recorrentes,

sendo a outra parte no processo:

Parlamento Europeu, representado por S. Alves e S. Seyr, na qualidade de agentes,

recorrido em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, L. Bay Larsen (relator), C. Toader, M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,

advogado‑geral: J. Richard de la Tour,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 15 de julho de 2021,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, Carlo Tognoli e o. pedem a anulação do Despacho do Tribunal Geral da União Europeia de 3 de julho de 2020, Tognoli e o./Parlamento (T‑395/19, T‑396/19, T‑405/19, T‑408/19, T‑419/19, T‑423/19, T‑424/19, T‑428/19, T‑433/19, T‑437/19, T‑443/19, T‑455/19, T‑458/19 a T‑462/19, T‑464/19, T‑469/19 e T‑477/19, não publicado, a seguir «despacho recorrido», EU:T:2020:302), pelo qual este declarou manifestamente inadmissíveis os seus recursos de anulação das Notas de 11 de abril de 2019 elaboradas pelo chefe da Unidade «Remunerações e Direitos Sociais dos Deputados» da Direção‑Geral de Finanças do Parlamento Europeu e relativas à adaptação do montante das pensões de que beneficiam, na sequência da entrada em vigor, em 1 de janeiro de 2019, da Decisão n.o 14/2018 do Ufficio di Presidenza della Camera dei deputati (Gabinete da Presidência da Câmara dos Deputados, Itália) (a seguir «notas controvertidas»).

Antecedentes do litígio

2

Os recorrentes são antigos deputados ao Parlamento Europeu, eleitos em Itália, ou cônjuges sobrevivos de antigos deputados desta instituição. Cada um deles beneficia, respetivamente, de uma pensão de reforma ou de uma pensão de sobrevivência.

3

Em 12 de julho de 2018, o Gabinete da Presidência da Câmara dos Deputados decidiu recalcular, segundo o sistema contributivo, o montante das pensões dos antigos membros dessa Câmara, relativas aos anos de mandato exercidos até 31 de dezembro de 2011 (a seguir «Decisão n.o 14/2018»).

4

Através de um comentário inserido nas folhas de pagamento da pensão dos recorrentes de janeiro de 2019, o Parlamento advertiu‑os de que o montante das suas pensões poderia ser revisto, em execução da Decisão n.o 14/2018, e que esse novo cálculo poderia eventualmente dar origem à recuperação dos montantes indevidamente pagos.

5

Por nota não datada do chefe da Unidade «Remunerações e Direitos Sociais dos Deputados» da Direção‑Geral de Finanças do Parlamento, em anexo às folhas de pagamento da pensão dos recorrentes de fevereiro de 2019, o Parlamento informou‑os, em primeiro lugar, de que o seu Serviço Jurídico tinha confirmado a aplicabilidade automática da Decisão n.o 14/2018 à sua situação. Esta nota especificava, em seguida, que, logo que o Parlamento recebesse as informações necessárias da Camera dei deputati (Câmara dos Deputados, Itália), notificaria os recorrentes da nova fixação dos seus direitos à pensão e procederia à recuperação do eventual excedente nos doze meses seguintes. Por último, esta nota informava os recorrentes de que a fixação definitiva dos seus direitos à pensão seria determinada por um ato formal do qual seria possível apresentar uma reclamação ou interpor um recurso de anulação com base no artigo 263.o TFUE.

6

Em seguida, através das notas controvertidas, esse chefe de unidade comunicou aos recorrentes que o montante das suas pensões seria adaptado até ao limite da redução do montante das pensões análogas pagas em Itália aos antigos deputados nacionais em aplicação da Decisão n.o 14/2018. Essas notas especificavam igualmente que o montante das pensões dos recorrentes seria adaptado a partir do mês de abril de 2019 em aplicação dos projetos de fixação dos novos direitos à pensão transmitidos em anexo às referidas notas. Por outro lado, as mesmas notas concediam aos recorrentes um prazo de 30 dias, a contar da receção das mesmas, para apresentarem as suas observações. Na falta de apresentação dessas observações no prazo fixado, considerar‑se‑ia que as notas controvertidas produzem efeitos definitivos que implicariam, nomeadamente, a restituição dos montantes indevidamente recebidos nos meses de janeiro a março de 2019.

7

Por mensagens de correio eletrónico enviadas entre 13 de maio e 4 de junho de 2019, os recorrentes transmitiram as suas observações ao serviço competente do Parlamento. Por mensagens de correio eletrónico enviadas entre 22 de maio e 24 de junho de 2019, o Parlamento acusou a receção dessas observações e informou os recorrentes de que lhes seria dada uma resposta após análise dos seus argumentos.

8

Posteriormente à interposição do recurso no Tribunal Geral, por cartas de 20 de junho (processo T‑396/19), de 8 de julho (processos T‑405/19, T‑408/19, T‑443/19 e T‑464/19), de 15 de julho (processos T‑419/19, T‑433/19, T‑455/19, T‑458/19 a T‑462/19, T‑469/19 e T‑477/19) e de 23 de julho de 2019 (processos T‑395/19, T‑423/19, T‑424/19 e T‑428/19), o chefe da Unidade «Remunerações e Direitos Sociais dos Deputados» da Direção‑Geral de Finanças do Parlamento indicou que as observações transmitidas pelos recorrentes não continham elementos suscetíveis de justificar uma revisão da posição do Parlamento, tal como expressa nas notas controvertidas, e que, por conseguinte, os direitos à pensão e o plano de recuperação do indevido, conforme recalculados e comunicados em anexo a essas notas, se tinham tornado definitivos.

9

Devido às especificidades da situação de Eugenio Melandri, que tinha solicitado a aplicação de uma derrogação baseada no nível dos seus rendimentos, o Parlamento não se pronunciou definitivamente sobre a sua situação à data do despacho recorrido.

Recursos no Tribunal Geral e despacho recorrido

10

Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral entre 28 de junho e 8 de julho de 2019, os recorrentes interpuseram recursos de anulação das notas controvertidas.

11

Em 16, 19 e 24 de setembro de 2019, o Parlamento, por requerimentos separados, suscitou a inadmissibilidade desses recursos.

12

Entre 19 de setembro e 4 de outubro de 2019, os recorrentes, com exceção de Emma Allione e E. Melandri, apresentaram articulados de adaptação das respetivas petições.

13

Em 15 de janeiro de 2020, o Tribunal Geral decidiu efetuar o exame conjunto dos recursos de anulação interpostos, respetivamente, pelos recorrentes.

14

Através do despacho recorrido, adotado em aplicação do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, este negou provimento aos recursos interpostos pelos recorrentes por serem manifestamente inadmissíveis.

15

O Tribunal Geral considerou, antes de mais, no n.o 57 do despacho recorrido, que as notas controvertidas não constituíam atos lesivos e, portanto, não poderiam ser objeto de um recurso de anulação na aceção do artigo 263.o TFUE. Consequentemente, no n.o 63 do despacho recorrido, julgou manifestamente inadmissível o pedido dos recorrentes de anulação dessas notas.

16

Para justificar esta apreciação, especificou, em primeiro lugar, nos n.os 51 a 53 do despacho recorrido, que a circunstância de o novo método de cálculo das pensões ser aplicável desde abril de 2019 não era suficiente para demonstrar que o Parlamento tinha tomado uma posição definitiva a esse respeito. Por um lado, as notas controvertidas apresentavam‑se expressamente como projetos. Por outro lado, essas notas especificavam que apenas se tornariam definitivas na falta de observações formuladas pelos seus destinatários no prazo de 30 dias a contar da sua receção. Ora, os recorrentes tinham apresentado, nesse prazo, tais observações.

17

Em segundo lugar, o Tribunal Geral considerou, nos n.os 56 e 60 do despacho recorrido, que as posteriores cartas do Parlamento, referidas no n.o 8 do presente acórdão, constituíam tomadas de posição definitivas dessa instituição em relação aos recorrentes, e não podiam ser analisadas como atos puramente confirmativos das notas controvertidas.

18

Em terceiro lugar, decidiu, nos n.os 61 e 62 do despacho recorrido, que a circunstância de as notas controvertidas não especificarem o prazo no qual o Parlamento responderia às observações dos recorrentes era irrelevante, tal como as alegações relativas à falta de fundamentação e à violação do princípio da proporcionalidade.

19

Em seguida, nos n.os 66 e 67 do despacho recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedente o pedido dos recorrentes de anulação das decisões expressas nas cartas mencionadas no n.o 8 do presente acórdão. A este respeito, considerou que os articulados de adaptação apresentados pelos recorrentes eram manifestamente inadmissíveis, uma vez que uma parte apenas pode adaptar os pedidos e fundamentos do seu recurso inicial quando este último era ele próprio admissível à data da sua apresentação.

20

Por último, no n.o 74 do despacho recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedente o pedido dos recorrentes de que o Parlamento fosse condenado no pagamento dos montantes indevidamente retidos, na medida em que esse pedido era manifestamente inadmissível.

Pedidos das partes

21

Com o presente recurso, os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o despacho recorrido;

remeter o processo ao Tribunal Geral; e

condenar o Parlamento nas despesas do presente recurso e reservar para final a decisão quanto às despesas do processo no Tribunal Geral.

22

O Parlamento conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento ao recurso; e

condenar os recorrentes nas despesas do presente recurso.

Quanto ao presente recurso

Argumentos das partes

23

Os recorrentes invocam três fundamentos do seu recurso, relativos, respetivamente, a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral quanto à apreciação do caráter impugnável das notas controvertidas, a um erro na interpretação do artigo 86.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, bem como à violação do princípio do contraditório e a um erro na interpretação do artigo 126.o deste Regulamento de Processo. O segundo e terceiro fundamentos são apresentados a título subsidiário.

24

Tendo em conta a argumentação que desenvolvem com os seus fundamentos, deve considerar‑se que os recorrentes pedem a anulação do despacho recorrido na medida em que, através deste último, o Tribunal Geral julgou improcedentes os seus pedidos de anulação das notas controvertidas, bem como das decisões expressas nas cartas mencionadas no n.o 8 do presente acórdão.

25

Com o seu primeiro fundamento, os recorrentes alegam que as notas controvertidas constituem atos recorríveis.

26

Segundo os recorrentes, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o critério essencial para determinar se um ato é recorrível reside nos seus efeitos jurídicos e não no seu caráter definitivo. Assim, os atos de natureza provisória foram considerados recorríveis porque produziam tais efeitos.

27

Os recorrentes sustentam, a este respeito, que as notas controvertidas produziram efeitos a partir de abril de 2019. Além disso, essas notas causaram um grave prejuízo aos recorrentes, que não podia ser integralmente reparado a posteriori. Acresce que a natureza provisória dessas notas não se baseia numa base jurídica identificada.

28

Os recorrentes alegam igualmente, a título exaustivo, que nenhum elemento claro lhes permitia concluir que as notas controvertidas seriam seguidas de decisões que não fossem puramente confirmativas. Consideram que o caráter confirmativo destas resulta, aliás, das respostas do Parlamento às observações que apresentaram, tendo‑se o Parlamento declarado incompetente para conhecer dos argumentos apresentados nessas observações.

29

Segundo os recorrentes, é igualmente ilógico considerar que a natureza das notas controvertidas pode variar consoante sejam ou não apresentadas observações. Com efeito, no primeiro caso, a apresentação de observações tem por único efeito alterar a data em que o ato se torna definitivo, mas esse ato continua a ser idêntico. No segundo caso, o ato em causa torna‑se um ato definitivo sem que nenhum elemento suplementar seja necessário.

30

O Parlamento sustenta que a redução do montante das pensões dos recorrentes tinha caráter provisório e que podia ter sido revista com base nas observações apresentadas por estes últimos, sem que a falta de base jurídica fosse pertinente a este respeito. Este caráter provisório resulta claramente da redação das notas controvertidas e da faculdade de que os recorrentes dispunham de apresentarem observações antes de essas notas se tornarem definitivas, faculdade que os recorrentes exerceram corretamente. A posição definitiva do Parlamento só foi adotada posteriormente.

31

Os recorrentes fazem uma leitura parcial da jurisprudência do Tribunal de Justiça, da qual resulta que o critério decisivo para qualificar uma decisão intermédia como ato recorrível é o facto de o recurso interposto da decisão final não ser suscetível de assegurar uma proteção jurisdicional suficiente. Ora, no caso em apreço, o exercício de um recurso da decisão finalmente adotada pelo Parlamento era suscetível de garantir essa proteção.

32

Por outro lado, as decisões finais adotadas pelo Parlamento não são puramente confirmativas, uma vez que assentam numa análise dos argumentos apresentados pelos recorrentes nas suas observações. A falta de indicação de um prazo de resposta às observações nas notas controvertidas é, neste contexto, indiferente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

33

Como salientou o Tribunal Geral no n.o 49 do despacho recorrido, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que são consideradas «atos recorríveis», na aceção do artigo 263.o TFUE, todas as disposições adotadas pelas instituições, seja qual for a sua forma, que visem produzir efeitos jurídicos vinculativos (Acórdãos de 20 de fevereiro de 2018, Bélgica/Comissão, C‑16/16 P, EU:C:2018:79, n.o 31, e de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 46 e jurisprudência referida).

34

Para determinar se o ato impugnado produz tais efeitos, importa atender à substância desse ato e apreciar esses efeitos em função de critérios objetivos, tais como o conteúdo do referido ato, tendo em conta, se for caso disso, o contexto da adoção deste último, bem como os poderes da instituição que dele é autora (Acórdãos de 20 de fevereiro de 2018, Bélgica/Comissão, C‑16/16 P, EU:C:2018:79, n.o 32, e de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 47 e jurisprudência referida).

35

Há igualmente que recordar que, como salientou, em substância, o Tribunal Geral no n.o 50 do despacho recorrido, as medidas intermédias cujo objetivo seja preparar a decisão final, no âmbito de um processo que compreende várias fases, não constituem, em princípio, atos que possam ser objeto de recurso de anulação (v., neste sentido, Acórdão de 3 de junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.o 43 e jurisprudência referida).

36

Esses atos intermédios são, em primeiro lugar, atos que exprimem uma opinião provisória da instituição em causa (Acórdão de 3 de junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.o 44 e jurisprudência referida).

37

Ora, o Tribunal Geral declarou, nos n.os 51 a 55 do despacho recorrido, que as notas controvertidas não fixavam a posição definitiva do Parlamento, uma vez que a posição adotada nessas notas poderia ser alterada para ter em conta os elementos contidos nas observações dos recorrentes.

38

A este respeito, o argumento apresentado pelos recorrentes, segundo o qual as notas controvertidas eram desprovidas de caráter provisório, pelo facto de o Parlamento ter finalmente considerado que não era competente para conhecer dos argumentos apresentados nessas observações, não pode ser acolhido.

39

Por um lado, ao considerar que não lhe competia decidir sobre a legalidade da Decisão n.o 14/2018, o Parlamento pronunciou‑se sobre a pertinência das observações apresentadas pelos recorrentes e, portanto, reavaliou as suas decisões iniciais à luz dessas observações.

40

Por outro lado, a qualificação como ato preparatório das notas controvertidas não pode, em todo o caso, depender da fundamentação de decisões adotadas posteriormente pelo Parlamento.

41

No entanto, a constatação de que um ato de uma instituição constitui uma medida intermédia que não exprime a posição final de uma instituição não é suficiente para demonstrar, de forma sistemática, que esse ato não constitui um «ato recorrível» na aceção do artigo 263.o TFUE.

42

Resulta, assim, da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um ato intermédio que produz efeitos jurídicos autónomos é suscetível de ser objeto de recurso de anulação na medida em que não se pode sanar a ilegalidade associada a esse ato no âmbito de um recurso da decisão final de que este constitui uma fase de elaboração (Acórdão de 3 de junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.o 46 e jurisprudência referida).

43

Por conseguinte, quando a contestação da legalidade de um ato intermédio no âmbito desse recurso não seja suscetível de assegurar uma tutela jurisdicional efetiva ao recorrente contra os efeitos desse ato, este deve poder ser objeto de um recurso de anulação com fundamento no artigo 263.o TFUE (v., neste sentido, Acórdãos de 9 de outubro de 2001, Itália/Comissão, C‑400/99, EU:C:2001:528, n.o 63; de 13 de outubro de 2011, Deutsche Post e Alemanha/Comissão, C‑463/10 P e C‑475/10 P, EU:C:2011:656, n.o 56; e de 3 de junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.o 48).

44

No caso em apreço, importa sublinhar que, como declarou o Tribunal Geral no n.o 51 do despacho recorrido e como alegam os recorrentes no seu recurso, as notas controvertidas implicavam uma redução imediata do montante das pensões dos recorrentes, a partir de abril de 2019, uma vez que a aplicação dessa redução não está suspensa enquanto se aguarda o resultado do processo conduzido pelo Parlamento.

45

Daqui resulta que as notas controvertidas produziram, enquanto tais, efeitos jurídicos autónomos na situação patrimonial dos recorrentes.

46

Tais efeitos não podem ser equiparados aos efeitos processuais dos atos que exprimem uma posição provisória da Comissão Europeia ou aos efeitos de tais atos que foram reconhecidos como não prejudicando os interesses das pessoas em causa, que o Tribunal de Justiça considerou insuscetíveis de implicar a admissibilidade de um recurso de anulação interposto contra tais atos (v., neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.os 17 e 18).

47

O facto, salientado pelo Tribunal Geral no n.o 56 do despacho recorrido, de resultar das notas controvertidas que o Parlamento apenas procedeu à recuperação dos montantes recebidos nos meses de janeiro a março de 2019 na falta de observações apresentadas pelos recorrentes no prazo de 30 dias após a receção dessas notas não é suscetível de pôr em causa o caráter imediato dos efeitos jurídicos produzidos pelas referidas notas.

48

Além disso, embora as notas controvertidas previssem que o Parlamento devia adotar uma posição final após a receção das observações emitidas pelos recorrentes, é pacífico que a adoção de tal posição não estava sujeita a um prazo.

49

Os efeitos jurídicos autónomos das notas controvertidas podiam, por conseguinte, perdurar durante um período potencialmente longo, cujo termo não é a priori definido.

50

Resulta, aliás, do despacho recorrido e das informações fornecidas pelo Parlamento que, no caso de um dos recorrentes, a tomada de posição definitiva desta instituição só ocorreu oito meses depois de ter recebido a nota que lhe dizia respeito.

51

Nestas condições, uma vez que a redução duradoura do montante de uma pensão é suscetível de ter consequências potencialmente irreversíveis na situação da pessoa em causa, os recorrentes deviam dispor da faculdade de interpor um recurso efetivo das notas controvertidas e de obstar, assim, à redução da sua pensão (v., por analogia, Acórdãos de 30 de junho de 1992, Itália/Comissão, C‑47/91, EU:C:1992:284, n.o 28, e de 9 de outubro de 2001, Itália/Comissão, C‑400/99, EU:C:2001:528, n.o 63).

52

Daqui decorre que o exercício de um recurso de anulação das decisões finais que o Parlamento devia adotar após a receção das observações dos recorrentes não era suscetível de lhes assegurar uma tutela jurisdicional efetiva.

53

A faculdade de que dispõem as pessoas em causa, na falta de resposta do Parlamento às observações que apresentaram, de intentar uma ação por omissão contra este também não é suscetível de lhes garantir uma tutela jurisdicional efetiva.

54

É certo que o Parlamento é obrigado a responder a essas observações num prazo razoável (v., neste sentido, Acórdão de 28 de fevereiro de 2013, Reapreciação Arango Jaramillo e o./BEI, C‑334/12 RX‑II, EU:C:2013:134, n.o 28) e as pessoas em causa dispõem, por conseguinte, do direito de intentar uma ação por omissão se essa instituição não respeitar essa obrigação.

55

Além disso, o Tribunal de Justiça já declarou que a possibilidade de intentar uma ação por omissão pode ser suficiente para excluir a perpetuação de um estado de inação da Comissão na sequência da adoção de uma medida intermédia adotada por essa instituição (v., neste sentido, Acórdão de 18 de março de 1997, Guérin automobiles/Comissão, C‑282/95 P, EU:C:1997:159, n.o 38).

56

Todavia, estas considerações não podem ser determinantes no caso em apreço, uma vez que, por um lado, uma ação por omissão intentada contra o Parlamento não seria suscetível de pôr em causa os efeitos jurídicos autónomos das notas controvertidas e, por outro, os prazos necessários para permitir o exame de tal ação e, sendo caso disso, de um recurso de anulação seriam excessivos num contexto em que essas notas conduzem imediatamente a uma redução do montante das pensões pagas a pessoas singulares.

57

À luz destes elementos, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, no n.o 57 do despacho recorrido, que a natureza provisória das notas controvertidas permitia considerar que estas não constituíam atos lesivos e, portanto, que não podiam ser objeto de um recurso de anulação com base no artigo 263.o TFUE.

58

Por conseguinte, há que julgar procedente o primeiro fundamento e anular o despacho recorrido na medida em que julgou improcedente o pedido dos recorrentes de anulação das notas controvertidas.

59

Daqui resulta igualmente que o despacho recorrido deve ser anulado na medida em que julgou improcedente o pedido dos recorrentes de anulação das decisões expressas nas cartas mencionadas no n.o 8 do presente acórdão, uma vez que a improcedência deste pedido se baseia exclusivamente na inadmissibilidade do pedido dos recorrentes de anulação das notas controvertidas.

60

Nestas condições, não é necessário examinar o segundo e terceiro fundamentos, na medida em que estes não são, em todo o caso, suscetíveis de conduzir a uma anulação mais ampla do despacho recorrido.

Quanto aos recursos no Tribunal Geral

61

Em conformidade com o disposto no artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral, pode decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado, ou remeter o processo ao Tribunal Geral, para julgamento.

62

Em primeiro lugar, uma vez que o Parlamento apenas sustentou, através das exceções de inadmissibilidade suscitadas no Tribunal Geral, que os recursos de anulação interpostos pelos recorrentes eram inadmissíveis pelo facto de as notas controvertidas constituírem atos preparatórios, cumpre, pelas razões enunciadas nos n.os 41 a 57 do presente acórdão, rejeitar estas exceções de inadmissibilidade.

63

Em segundo lugar, uma vez que as apreciações do Tribunal Geral incidiram exclusivamente sobre a admissibilidade dos recursos e uma vez que este os julgou manifestamente inadmissíveis sem dar início à fase oral, o Tribunal de Justiça não dispõe dos elementos necessários para decidir definitivamente sobre os referidos recursos.

64

Por conseguinte, há que remeter os processos ao Tribunal Geral para que este se pronuncie sobre os pedidos dos recorrentes de anulação das notas controvertidas e das decisões expressas nas cartas mencionadas no n.o 8 do presente acórdão.

Quanto às despesas

65

Tendo os processos sido remetidos ao Tribunal Geral, importa reservar para final a decisão quanto às despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

 

1)

O Despacho do Tribunal Geral da União Europeia de 3 de julho de 2020, Tognoli e o./Parlamento (T‑395/19, T‑396/19, T‑405/19, T‑408/19, T‑419/19, T‑423/19, T‑424/19, T‑428/19, T‑433/19, T‑437/19, T‑443/19, T‑455/19, T‑458/19 a T‑462/19, T‑464/19, T‑469/19 e T‑477/19, não publicado, EU:T:2020:302), é anulado na medida em que julgou improcedentes os pedidos apresentados por Carlo Tognoli e o. de anulação das Notas de 11 de abril de 2019, elaboradas pelo chefe de Unidade «Remunerações e Direitos Sociais dos Deputados» da Direção‑Geral de Finanças do Parlamento Europeu e relativas à adaptação do montante das pensões de que beneficiam, na sequência da entrada em vigor, em 1 de janeiro de 2019, da Decisão n.o 14/2018 do Ufficio di Presidenza della Camera dei deputati (Gabinete da Presidência da Câmara dos Deputados, Itália), bem como das Decisões do Parlamento Europeu expressas nas cartas de 20 de junho (processo T‑396/19), de 8 de julho (processos T‑405/19, T‑408/19, T‑443/19 e T‑464/19), de 15 de julho (processos T‑419/19, T‑433/19, T‑455/19, T‑458/19 a T‑462/19, T‑469/19 e T‑477/19) e de 23 de julho de 2019 (processos T‑395/19, T‑423/19, T‑424/19 e T‑428/19).

 

2)

As exceções de inadmissibilidade suscitadas pelo Parlamento Europeu no Tribunal Geral da União Europeia são rejeitadas.

 

3)

Os processos são remetidos ao Tribunal Geral da União Europeia para que este decida sobre os pedidos apresentados por Carlo Tognoli e o. de anulação dessas notas e dessas decisões.

 

4)

Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.