Processos apensos T‑30/19 e T‑72/19

China Rubber Industry Association (CRIA)
e
China Chamber of Commerce of Metals, Minerals & Chemicals Importers & Exporters (CCCMC)

contra

Comissão Europeia

Acórdão do Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) de 4 de maio de 2022

«Dumping — Subvenções — Importações de determinados pneumáticos, novos ou recauchutados, de borracha, do tipo utilizado em autocarros ou camiões, com um índice de carga superior a 121 e originários da China — Direito antidumping definitivo — Direito de compensação definitivo — Recurso de anulação — Legitimidade — Afetação direta — Afetação individual — Ato regulamentar que não necessita de medidas de execução — Interesse em agir — Prejuízo para a indústria da União — Exame objetivo — Nexo de causalidade — Cálculo da subcotação dos preços e da margem de prejuízo — Comparação equitativa dos preços — Preços de importação forjados — Preços faturados aos primeiros compradores independentes — Diferença no estádio de comercialização — Apreciações económicas complexas — Intensidade da fiscalização jurisdicional — Indicadores de prejuízo — Ponderação dos dados — Acesso aos dados não confidenciais dos inquéritos — Direitos de defesa»

  1. Recurso de anulação — Pessoas singulares ou coletivas — Atos que lhes dizem direta e individualmente respeito — Afetação individual — Critérios — Regulamentos que instituem direitos antidumping e direitos de compensação — Recurso de um exportador do produto atingido por esses direitos, mencionado expressamente nos regulamentos — Admissibilidade

    (Artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE; Regulamento da Comissão 2018/1579; Regulamento da Comissão 2018/1690)

    (cf. n.os 44, 47, 49, 50, 74)

  2. Recurso de anulação — Pessoas singulares ou coletivas — Atos que lhes dizem direta e individualmente respeito — Recurso de uma associação profissional de defesa e de representação dos seus membros — Admissibilidade — Requisitos

    (Artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE)

    (cf. n.o 45)

  3. Recurso de anulação — Pessoas singulares ou coletivas — Conceito de ato regulamentar na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE — Qualquer ato de alcance geral com exceção dos atos legislativos — Regulamentos que instituem direitos antidumping e direitos de compensação — Inclusão — Regulamentos que carecem de medidas de execução em relação a terceiros importadores não em relação a produtores‑exportadores — Recurso interposto por empresas produtoras e exportadoras — Admissibilidade

    (Artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE)

    (cf. n.os 56, 57, 65‑70)

  4. Recurso de anulação — Pessoas singulares ou coletivas — Atos que lhes dizem direta e individualmente respeito — Afetação direta — Critérios — Regulamentos que instituem direitos antidumping e direitos de compensação — Afetação direta dos produtores‑exportadores do produto em questão

    (Artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE)

    (cf. n.os 58‑64)

  5. Política comercial comum — Defesa contra as práticas de dumping — Poder de apreciação das instituições — Fiscalização jurisdicional — Limites

    (cf. n.os 102, 103, 115)

  6. Política comercial comum — Defesa contra as práticas de dumping — Prejuízo — Estabelecimento do nexo de causalidade — Obrigações das instituições — Cálculo da subcotação do preço das importações em causa — Obrigação de comparação equitativa entre o preço do produto em questão e o preço do produto similar da indústria da União — Comparação efetuada entre preços obtidos em estádios de comercialização diferentes — Violação — Consequência — Anulação dos regulamentos que instituem direitos antidumping e direitos de compensação — Requisitos

    (Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho 2016/1036, artigo 3.o, n.os 2 e 3; Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho 2016/1037, artigo 8.o, n.os 1 e 2)

    (cf. n.os 114, 116‑155, 164‑171, 173‑176, 179, 180, 184‑192, 194‑200)

  7. Política comercial comum — Defesa contra as práticas de dumping — Inquérito — Respeito dos direitos de defesa — Obrigação das instituições de assegurar a informação das empresas em questão e de respeitar a confidencialidade das informações conciliando essas obrigações — Violação da obrigação de informação — Requisitos — Recusa de fornecer informações suscetíveis de revestir utilidade para a defesa da empresa

    (Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho 2016/1036, artigos 6.°, n.o 7, 19.° e 20.°; Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho 2016/1037, artigos 11.°, n.o 7, 20.° e 30.°)

    (cf. n.os 236‑271)

Resumo

Na sequência de várias denúncias que lhe foram apresentadas, a Comissão Europeia adotou, no termo de um inquérito, dois regulamentos de execução ( 1 ) (a seguir «regulamentos impugnados») que instituem, respetivamente, um direito definitivo e um direito de compensação definitivo sobre as importações na União de determinados pneumáticos novos ou recauchutados, em borracha, do tipo utilizado para os autocarros ou camiões, com um índice de carga superior a 121 (a seguir «produto em questão»), originário da República Popular da China.

As associações China Rubber Industry Association (CRIA) e China Chamber of Commerce of Metals, Minerals & Chemicals Importers & Exporters (CCCMC, a seguir «recorrentes»), agindo por conta de certos dos seus membros, interpuseram dois recursos destinados a obter a anulação parcial dos regulamentos impugnados.

Ao conceder provimento a esses recursos, o Tribunal reconhece, pela primeira vez, a legitimidade de produtores‑exportadores não nominalmente identificados em regulamentos antidumping e antissubvenções visados por um recurso de anulação. Além disso, aplica e precisa a jurisprudência relativa à obrigação que incumbe à Comissão de proceder, quando do cálculo da subcotação do preço das importações que são objeto de inquéritos antidumping e antissubvenções, a uma comparação equitativa entre preços que se situam no mesmo estádio de comercialização com vista a avaliar a existência de um prejuízo sofrido pela indústria da União devido a essas importações.

Apreciação do Tribunal Geral

No que diz respeito, antes de mais, à admissibilidade do recurso, o Tribunal declara que as recorrentes, enquanto associações representativas, têm legitimidade, com fundamento no artigo 263.o, quarto parágrafo, terceiro segmento de frase, TFUE, para agir contra os direitos antidumping e de compensação definitivos instituídos sobre as importações dos produtos fabricados pelas sociedades Weifang Yuelong Rubber e Hefei Wanli Tire (a seguir «sociedades em causa»), mesmo que estas últimas não estejam nominalmente identificadas nos regulamentos impugnados.

A este propósito, o Tribunal Geral recorda que, para que um recurso seja admissível ao abrigo da referida disposição, três requisitos cumulativos devem estar preenchidos: o ato impugnado deve, em primeiro lugar, ter caráter regulamentar, em segundo lugar, afetar diretamente a recorrente e, em terceiro lugar, não necessitar de medidas de execução.

Quanto aos regulamentos impugnados, o Tribunal Geral observa, em primeiro lugar, que são atos regulamentares na medida em que, por um lado, apresentam alcance geral e, por outro, não foram adotados segundo um processo legislativo ordinário ou especial.

Em segundo lugar, esses regulamentos afetam diretamente as sociedades em causa enquanto produtores‑exportadores do produto em questão, na medida em que instituem direitos antidumping ou de compensação definitivos sobre as importações dos produtos fabricados por «todas as outras empresas» que neles não estejam nominalmente identificadas, entre as quais as sociedades em causa, produzindo assim efeitos na sua situação jurídica.

Em terceiro e último lugar, o Tribunal Geral confirma que os referidos regulamentos não necessitam de medidas de execução em relação às sociedades em causa. Com efeito, embora seja verdade que existem medidas de execução em relação aos importadores, que revestem a forma de atos das autoridades nacionais que fixam o montante dos direitos antidumping e de compensação com vista à sua cobrança não existem, em contrapartida, medidas de execução em relação aos produtores‑exportadores.

No que respeita, em seguida, ao mérito do processo, as recorrentes tinham apresentado vários fundamentos relativos a diversas violações do regulamento antidumping de base ( 2 ) e do regulamento antissubvenções de base ( 3 ), um dos quais relativo a erros cometidos pela Comissão na determinação dos efeitos sobre o preço e do nível de eliminação do prejuízo sofrido pela indústria da União.

A este propósito, o Tribunal Geral recorda que a obrigação de proceder a um exame objetivo da existência do prejuízo sofrido pela indústria da União devido às importações que são objeto de dumping ou de subvenções, prevista, respetivamente, no artigo 3.o, n.o 2, do regulamento antidumping de base e no artigo 8.o, n.o 1, do regulamento antissubvenções de base, impõe que se proceda a uma comparação equitativa e, portanto, na mesma fase de comercialização, entre o preço do produto em questão e o preço do produto similar da indústria da União quando das vendas efetuadas no território da União.

Ora, resulta da instrução do processo que, perante o mesmo modelo de comercialização caracterizado pelo recurso a entidades de venda coligadas, a Comissão tratou diferentemente as vendas dos produtores da União e as dos produtores exportadores chineses, ao considerar, no que diz respeito aos primeiros, preços de revenda aos primeiros compradores independentes e, no que diz respeito aos segundos, preços de venda forjados ao nível fronteira da União. Nestas circunstâncias, e visto não estar demonstrado que as entidades de venda coligadas, respetivamente, com os exportadores de venda chineses e com os produtores da União desempenham papéis económicos diferentes, o Tribunal Geral declara uma violação do artigo 3.o, n.o 2, do regulamento antidumping de base e do artigo 8.o, n.o 1, do regulamento antissubvenções de base, na medida em que a Comissão tinha calculado a subcotação comparando os preços do produto em questão em fases de comercialização diferentes.

Por fim, o Tribunal Geral observa que o erro constatado no cálculo da subcotação do preço é suscetível do pôr em causa a legalidade dos regulamentos impugnados. Com efeito, esse erro teve incidência, por um lado, na análise da Comissão relativa à existência de um prejuízo e de um nexo de causalidade e, por outro, nos seus cálculos relativos ao montante dos direitos antidumping e de compensação definitivos. Por conseguinte, o Tribunal Geral considera que há que anular os regulamentos impugnados, na medida em que dizem respeito às sociedades em causa.


( 1 ) Regulamento de Execução (UE) 2018/1579, que institui um direito antidumping definitivo e estabelece a cobrança definitiva do direito provisório instituído sobre as importações de determinados pneumáticos, novos ou recauchutados, de borracha, dos tipos utilizados em autocarros ou camiões, com um índice de carga superior a 121, originários da República Popular da China, e que revoga o Regulamento de Execução (UE) 2018/163 (JO 2018, L 263, p. 3), e Regulamento de execução (UE) 2018/1690, que institui direitos de compensação definitivos sobre as importações de determinados pneumáticos, novos ou recauchutados, de borracha, dos tipos utilizados em autocarros ou camiões, com um índice de carga superior a 121, originários da República Popular da China, e que altera o Regulamento antidumping definitivo (JO 2018, L 283, p. 1).

( 2 ) Regulamento (UE) 2016/1036 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2016, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping dos países não membros da União Europeia (JO 2016, L 176, p. 21).

( 3 ) Regulamento (UE) 2016/1037 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2016, relativo à defesa contra as importações que são objeto de subvenções de países não membros da União Europeia (JO 2016, L 176, p. 55).