ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

16 de julho de 2020 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Proteção dos consumidores — Diretiva 93/13/CEE — Artigos 6.o e 7.o — Contratos celebrados com os consumidores — Empréstimos hipotecários — Cláusulas abusivas — Cláusula que faz recair sobre o mutuário a totalidade das despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca — Efeitos da declaração de nulidade das referidas cláusulas — Poderes do juiz nacional perante uma cláusula qualificada de “abusiva” — Repartição das despesas — Aplicação de disposições nacionais de natureza supletiva — Artigo 3.o, n.o 1 — Apreciação do caráter abusivo das cláusulas contratuais — Artigo 4.o, n.o 2 — Exclusão das cláusulas relativas ao objeto principal do contrato ou à adequação do preço ou da remuneração — Requisito — Artigo 5.o — Obrigação de redação clara e compreensível das cláusulas contratuais — Despesas — Prescrição — Princípio da efetividade»

Nos processos apensos C‑224/19 e C‑259/19,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentados pelo Juzgado de Primera Instancia n.o 17 de Palma de Mallorca (Tribunal de Primeira Instância n.o 17 de Palma de Maiorca, Espanha) (C‑224/19) e pelo Juzgado de Primera Instancia e Instrucción de Ceuta (Tribunal de Primeira Instância e de Instrução de Ceuta, Espanha) (C‑259/19), por Decisões de 12 de março de 2019 e de 13 de março de 2019, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 14 de março de 2019 e em 27 de março de 2019 respetivamente, nos processos

CY

contra

Caixabank SA (C‑224/19),

e

LG,

PK

contra

Banco Bilbao Vizcaya Argentaria SA (C‑259/19),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente de secção, S. Rodin (relator), D. Šváby, K. Jürimäe e N. Piçarra, juízes,

advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de CY, por N. Martínez Blanco, abogado,

em representação da Caixabank A, por J. Gutiérrez de Cabiedes Hidalgo de Caviedes, abogado,

em representação de LG, por R. Salamanca Sánchez, abogado, e M. Cruz Ruiz Reina, procuradora,

em representação do Banco Bilbao Vizcaya Argentaria SA, por C. Fernández Vicién, J. Capell Navarro e A. Picón Franco, abogados,

em representação do Governo espanhol, por L. Aguilera Ruiz e M. J. García‑Valdecasas Dorrego, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por J. Baquero Cruz e N. Ruiz García, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação dos artigos 3.o a 8.o da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores (JO 1993, L 95, p. 29).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de dois litígios que opõem, por um lado, CY à Caixabank SA e, por outro, LG e PK ao Banco Bilbao Vizcaya Argentaria SA, relativamente a cláusulas abusivas existentes em contratos de mútuo com garantias hipotecárias.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Os considerandos décimo sexto, décimo nono, vigésimo e vigésimo quarto da Diretiva 93/13 enunciam:

«Considerando que a apreciação, segundo os critérios gerais estabelecidos, do caráter abusivo das cláusulas, nomeadamente nas atividades profissionais de caráter público que forneçam serviços coletivos que tenham em conta a solidariedade entre os utentes, necessita de ser completada por um instrumento de avaliação global dos diversos interesses implicados; que tal consiste na exigência de boa‑fé; que, na apreciação da boa‑fé, é necessário dar especial atenção à força das posições de negociação das partes, à questão de saber se o consumidor foi de alguma forma incentivado a manifestar o seu acordo com a cláusula e se os bens ou serviços foram vendidos ou fornecidos por especial encomenda do consumidor; que a exigência de boa‑fé pode ser satisfeita pelo profissional, tratando de forma leal e equitativa com a outra parte, cujos legítimos interesses deve ter em conta;

[…]

Considerando que, para efeitos da presente diretiva, a apreciação do caráter abusivo de uma cláusula não deve incidir sobre cláusulas que descrevam o objeto principal do contrato ou a relação qualidade/preço do fornecimento ou de prestação; que o objeto principal do contrato e a relação qualidade/preço podem todavia ser considerados na apreciação do caráter abusivo de outras cláusulas; […]

Considerando que os contratos devem ser redigidos em termos claros e compreensíveis, que o consumidor deve efetivamente ter a oportunidade de tomar conhecimento de todas as cláusulas e que, em caso de dúvida, deve prevalecer a interpretação mais favorável ao consumidor;

[…]

Considerando que as autoridades judiciárias e órgãos administrativos dos Estados‑Membros devem dispor de meios adequados e eficazes para pôr termo à aplicação das cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores.»

4

O artigo 1.o da Diretiva 93/13 enuncia:

«1.   A presente diretiva tem por objetivo a aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros relativas às cláusulas abusivas em contratos celebrados entre profissionais e consumidores.

2.   As disposições da presente diretiva não se aplicam às cláusulas contratuais decorrentes de disposições legislativas ou regulamentares imperativas, bem como das disposições ou dos princípios previstos nas convenções internacionais de que os Estados‑Membros ou a Comunidade sejam parte, nomeadamente no domínio dos transportes.»

5

Nos termos do artigo 3.o, n.os 1 e 2, da mesma diretiva:

«1.   Uma cláusula contratual que não tenha sido objeto de negociação individual é considerada abusiva quando, a despeito da exigência de boa‑fé, der origem a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato.

2.   Considera‑se que uma cláusula não foi objeto de negociação individual sempre que a mesma tenha sido redigida previamente e, consequentemente, o consumidor não tenha podido influir no seu conteúdo, em especial no âmbito de um contrato de adesão.

[…]»

6

O artigo 4.o, n.o 2, da referida diretiva dispõe:

«A avaliação do caráter abusivo das cláusulas não incide nem sobre a definição do objeto principal do contrato nem sobre a adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os bens ou serviços a fornecer em contrapartida, por outro, desde que essas cláusulas se encontrem redigidas de maneira clara e compreensível.»

7

O artigo 5.o da mesma diretiva prevê:

«No caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. […]»

8

O artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 prevê:

«Os Estados‑Membros estipularão que, nas condições fixadas pelos respetivos direitos nacionais, as cláusulas abusivas constantes de um contrato celebrado com um consumidor por um profissional não vinculem o consumidor e que o contrato continue a vincular as partes nos mesmos termos, se puder subsistir sem as cláusulas abusivas.»

9

O artigo 7.o, n.o 1, desta diretiva tem a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros providenciarão para que, no interesse dos consumidores e dos profissionais concorrentes, existam meios adequados e eficazes para pôr termo à utilização de cláusulas abusivas nos contratos celebrados entre profissionais e consumidores.»

10

Nos termos do artigo 8.o da referida diretiva:

«Os Estados‑Membros podem adotar ou manter, no domínio regido pela presente diretiva, disposições mais rigorosas, compatíveis com o Tratado, para garantir um nível de proteção mais elevado para o consumidor.»

Direito espanhol

Decreto Real 1426/1989

11

A sexta regra do anexo II do Real Decreto 1426/1989, por el que se aprueba el arancel de los notarios (Decreto Real 1426/1989, que aprova os honorários dos notários), de 17 de novembro de 1989 (BOE n.o 285 de 28 de novembro de 1989, p. 37169), na versão em vigor à data dos factos do processo principal, dispõe:

«[A obrigação de pagamento dos direitos incumbe à] parte que tenha requerido a intervenção ou os serviços do notário e, sendo o caso, àqueles que tenham a qualidade de interessados segundo as normas de direito material e fiscal […]»

Decreto Real 1427/1989

12

A oitava regra do anexo II do Real Decreto 1427/1989, por el que se aprueba el arancel de los registradores de la propiedad (Real Decreto 1427/1989, que aprova os Honorários dos Conservadores do Registo Predial), de 17 de novembro (BOE n.o 285 de 28 de novembro de 1989, p. 37171), na versão em vigor à data dos factos do processo principal, impõe a obrigação [de pagamento dos honorários do conservador do registo] «aos beneficiários da inscrição ou registo imediato do direito, sendo também exigíveis […] ao requerente do serviço em causa ou ao beneficiário da inscrição do direito ou do requerimento de certificação.»

LCGC

13

O artigo 7.o da Ley 7/1998, sobre condiciones generales de la contratación (Lei 7/1998, relativa às Condições Contratuais Gerais), de 13 de abril de 1998 (BOE n.o 89, de 14 de abril de 1998, p. 12304), na versão aplicável à data de assinatura dos contratos em causa no processo principal (a seguir «LCGC»), prevê:

«Não serão incluídas no contrato as seguintes condições gerais:

a)

Aquelas de que o consumidor não tenha efetivamente tido a oportunidade de tomar conhecimento antes da celebração do contrato ou que não tenham sido assinadas, se for caso disso, nos termos do artigo 5.o;

b)

As condições ilegíveis, ambíguas, obscuras e incompreensíveis, exceto, no caso destas últimas, quando o aderente as tenha expressamente aceitado por escrito e quando respeitem a regulamentação específica relativa à transparência das cláusulas contratuais nesse domínio.»

14

O artigo 8.o da LCGC enuncia:

«1.   São nulas de pleno direito as condições gerais que, em prejuízo do aderente, contrariem as disposições da presente lei ou qualquer outra norma imperativa ou proibitiva, exceto se estas estabelecerem outra sanção.

2.   Em especial, são nulas as condições gerais abusivas nos contratos celebrados com um consumidor […]»

Decreto‑Lei Real 6/2000

15

O artigo 40 do Real‑Decreto Ley 6/2000, de Medidas Urgentes de Intensificación de la Competencia en Mercados de Bienes y Servicios (Decreto‑Lei Real 6/2000, que estabelece Medidas Urgentes de Intensificação da Concorrência nos Mercados de Bens e Serviços), de 23 de junho de 2000 (BOE n.o 151 de 24 de junho de 2000, p. 22440), na versão em vigor à data de assinatura dos contratos em causa no processo principal, dispõe:

«[A]s instituições de crédito e outras instituições financeiras indicam expressamente […] o direito de que dispõe o mutuário de designar, de comum acordo com o mutuante, a pessoa ou entidade que procederá à avaliação do imóvel objeto da hipoteca […]»

Decreto Legislativo Real 1/2007

16

O Real Decreto Legislativo 1/2007, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios y otras leyes complementarias (Decreto Legislativo Real 1/2007, que aprova o texto reformulado da Lei Geral de Defesa dos Consumidores e Utentes e outras leis complementares), de 16 de novembro de 2007 (BOE n.o 287, de 30 de novembro de 2007, p. 49181), dispõe, no artigo 8.o, com a epígrafe «Direitos fundamentais dos consumidores e utentes»:

«Constituem direitos fundamentais dos consumidores e utentes:

[…]

b)

A proteção dos seus legítimos interesses económicos e sociais, designadamente contra as práticas comerciais desleais e a inclusão de cláusulas abusivas nos contratos.

[…]

d)

A informação exata sobre os diferentes bens ou serviços e a educação e divulgação para facilitar o conhecimento relativo à sua adequada utilização, consumo ou fruição. […]»

17

O artigo 60.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Informação pré‑contratual», tem a seguinte redação:

«1.   Antes de o consumidor ou utente ficar vinculado por um contrato ou proposta do mesmo tipo, o empresário deverá fornecer‑lhe, de maneira clara e compreensível, exceto se resultar evidente do contexto, a informação relevante, verdadeira e suficiente sobre as características principais do contrato, designadamente sobre as suas condições jurídicas e económicas.

2.   São relevantes os deveres de informação sobre os bens ou serviços previstos pela presente disposição e quaisquer outros que sejam aplicáveis, bem como:

a)

As características principais dos bens ou serviços, na medida adequada ao meio de comunicação utilizado e ao bem ou serviço em causa;

[…]

c)

O preço, incluindo todos os impostos e taxas. Se, devido à natureza dos bens ou serviços, o preço não puder ser razoavelmente calculado de forma antecipada, a maneira como o preço é calculado, bem como, se for o caso, todos os custos suplementares de transporte, entrega e postais ou, quando esses custos não puderem ser razoavelmente calculados de forma antecipada, a indicação de que os mesmos podem ser suportados pelo consumidor.

Em toda a informação prestada ao consumidor ou utente sobre o preço dos bens ou serviços, incluindo a publicidade, é comunicado o preço total, discriminando, se for o caso, o montante dos suplementos ou reduções aplicáveis, o montante das despesas repercutidas no consumidor ou utente, e as despesas suplementares relativas a serviços acessórios, financiamento, utilização de diferentes meios de pagamento ou outras condições de pagamento semelhantes. […]»

18

O artigo 80.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Requisitos aplicáveis às cláusulas não negociadas individualmente», dispõe:

«1.   As cláusulas que não tenham sido objeto de negociação individual nos contratos celebrados com os consumidores e utentes […] devem respeitar os seguintes requisitos:

a)

Precisão, clareza e simplicidade na redação, que permita uma compreensão direta […];

b)

Acessibilidade e legibilidade, de modo que permita ao consumidor e utente o conhecimento, anterior à celebração do contrato, relativamente à sua existência e conteúdo. […];

c)

Boa‑fé e justo equilíbrio entre os direitos e as obrigações das partes, o que, em qualquer dos casos, exclui a utilização de cláusulas abusivas. […]»

19

O artigo 82.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Conceito de cláusula abusiva», enuncia:

«1.   Consideram‑se abusivas todas as cláusulas não negociadas individualmente e todas as práticas não expressamente acordadas e que, contra os ditames da boa‑fé, criem em detrimento do consumidor e do utente um desequilíbrio significativo entre os direitos e as obrigações das partes decorrentes do contrato.

2.   […] Se o profissional sustentar que uma determinada cláusula foi objeto de negociação individual, caber‑lhe‑á o ónus da prova.

3.   O caráter abusivo de uma cláusula é avaliado tendo em conta a natureza dos bens ou serviços objeto do contrato e mediante consideração de todas as circunstâncias que rodeiam a sua celebração, bem como de todas as outras cláusulas do contrato, ou de outro contrato de que este dependa. […]»

20

Nos termos do artigo 83.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Nulidade das cláusulas abusivas e subsistência do contrato»:

«As cláusulas abusivas são nulas de pleno direito e consideram‑se não escritas. Para tal, após audição das partes, o juiz declara a nulidade das cláusulas abusivas incluídas no contrato; no entanto, o contrato continua a vincular as partes nos mesmos termos, caso possa subsistir sem as cláusulas abusivas.»

21

O artigo 87.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Cláusulas abusivas por falta de reciprocidade», prevê, no n.o 5:

«Consideram‑se abusivas as cláusulas que, em detrimento do consumidor ou do utente, determinem falta de reciprocidade no contrato, contrária à boa‑fé, e, designadamente:

[…]

5.   […] qualquer outra estipulação que preveja um pagamento por produtos ou serviços não efetivamente utilizados ou consumidos. […]»

22

O artigo 89.o do Decreto Legislativo Real 1/2007, com a epígrafe «Cláusulas abusivas que afetam a conclusão e a execução do contrato», dispõe:

«São sempre consideradas cláusulas abusivas:

[…]

4.   A imposição ao consumidor ou ao utente de bens ou serviços complementares ou acessórios não solicitados.

5.   Os aumentos de preço para serviços acessórios […] que não correspondam a prestações suplementares suscetíveis de ser aceites ou recusadas […]»

Lei 2/2009

23

A Ley 2/2009, por la que se regula la contratación con los consumidores de préstamos o créditos hipotecarios y de servicios de intermediación para la celebración de contratos de préstamo o crédito (Lei 2/2009, que regula a Celebração, com os Consumidores, de Contratos de Mútuo ou de Crédito Hipotecário e de Contratos de Prestação de Serviços de Mediação para a Celebração de Contratos de Mútuo ou de Crédito), de 31 de março de 2009 (BOE n.o 79, de 1 de abril de 2009, p. 30843), no artigo 5.o, n.o 1, com a epígrafe «Obrigações de transparência em matéria de preços», dispõe:

«As empresas estabelecem livremente as suas tarifas de comissões, de condições e de despesas que podem ser repercutidas nos consumidores, sem quaisquer restrições além das respeitantes a cláusulas abusivas constantes da presente lei, […] e do [Decreto Legislativo Real 1/2007].

As tarifas respeitantes às comissões ou compensações e às despesas que podem ser cobradas, incluindo as atividades de consultoria, indicam as situações a que são aplicáveis e, se for o caso, a frequência da aplicação. As comissões, compensações ou despesas repercutidas no cliente devem corresponder a serviços efetivamente prestados ou a custos suportados. Os serviços não expressamente aceites ou pedidos pelo cliente não dão lugar a qualquer comissão ou despesa.»

LEC

24

O artigo 394.o da Ley de Enjuiciamiento Civil (Lei 1/2000, que aprova o Código de Processo Civil), de 7 de janeiro de 2000 (BOE n.o 7, de 8 de janeiro de 2000, p. 575), na versão em vigor à data da assinatura dos contratos em causa no processo principal (a seguir «LEC»), dispõe:

«1.   Nos processos declarativos, as despesas na primeira instância são suportadas pela parte que ficou totalmente vencida, exceto se o tribunal decidir fundamentadamente que o processo suscitava sérias dúvidas quanto à matéria de facto ou de direito.

[…]

2.   Se os pedidos forem julgados parcialmente procedentes ou improcedentes, cada uma das partes pagará as suas próprias custas e metade das custas comuns, exceto se existirem fundamentos para condenar uma das partes por litigância de má‑fé.

[…]»

Código Civil

25

O artigo 1303.o do Código Civil tem a seguinte redação:

«Declarada a nulidade de uma obrigação, as partes contratantes devem restituir reciprocamente o que tiver sido objeto do contrato e os respetivos frutos, bem como o preço, acrescido de juros, sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes.»

26

Nos termos do artigo 1964.o, n.o 2, do Código Civil:

«As ações pessoais não sujeitas a um prazo específico prescrevem no prazo de cinco anos a contar da data em que a obrigação se considera aplicável. O prazo das obrigações continuadas de ação ou omissão tem início em cada incumprimento dessas obrigações.»

27

O artigo 1969.o do Código Civil determina:

«Na falta de disposição em contrário, o prazo de prescrição de quaisquer tipos de ações é calculado a partir do dia em que estas possam ser intentadas.»

Decreto relativo a taxas de juro, regras de atuação, prestação de informações a clientes e publicidade das instituições de crédito

28

O capítulo 1 da Orden sobre tipos de interés y comisiones, normas de actuación, información a clientes y publicidad de las Entidades de crédito (Decreto relativo a Taxas de Juro, Regras de Atuação, Prestação de Informações a Clientes e Publicidade das Instituições de Crédito), de 12 de dezembro de 1989 (BOE n.o 303 de 19 de dezembro de 1989, p. 39289), na versão em vigor à data da assinatura dos contratos em causa no processo principal, tem a seguinte redação:

«Quinto. As instituições de crédito fixam livremente as comissões cobradas pelas operações ou serviços que prestam.

[…]

Não podem ser cobradas comissões ou despesas por serviços não expressamente aceites ou pedidos pelo cliente. As comissões ou despesas repercutidas no cliente devem corresponder a serviços efetivamente prestados ou a despesas efetuadas.»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑224/19

29

Em 16 de maio de 2000, CY celebrou com a instituição financeira Caixabank um contrato de mútuo hipotecário, por ato notarial, no montante inicial de 81136,63 euros, que previa também o pagamento de juros variáveis.

30

A quarta cláusula do mesmo contrato exige que o mutuário pague uma «comissão de abertura». Esta cláusula dispõe:

«São estabelecidas as seguintes comissões a pagar à [Caixabank] pelo mutuário:

A) — Comissão de abertura sobre a totalidade do capital mutuado, a pagar de uma única vez na [celebração] do presente ato: um por cento, ou seja, um montante de cento e trinta e cinco mil pesetas espanholas (135000) equivalentes a 811,37 euros.»

31

A quinta cláusula do referido contrato impõe ao mutuário o pagamento de todas as despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca. Esta cláusula tem a seguinte redação:

«O mutuário suporta o pagamento das despesas de avaliação do imóvel hipotecado [;] de todas as outras despesas e impostos decorrentes do presente ato notarial, dos atos e contratos formalizados neste ato e da sua inscrição no Registro de la Propiedad (registo predial) [;] de todas as outras despesas e impostos resultantes dos atos necessários para que o presente documento e o do seu cancelamento sejam inscritos no Registo Predial, incluindo todas as outras despesas e impostos resultantes dos comprovativos da receção, total ou parcial, dos montantes mutuados, bem como dos honorários de advogado e de procurador em caso de reclamação judicial, mesmo que a sua intervenção não seja obrigatória.»

32

Em 22 de março de 2018, CY intentou uma ação perante o Juzgado de Primera Instancia n.o 17 de Palma de Mallorca (Tribunal de Primeira Instância n.o 17 de Palma de Maiorca, Espanha), pedindo, com base na legislação em matéria de proteção do consumidor, a declaração da nulidade, em razão do seu caráter abusivo, da quarta e da quinta cláusulas do contrato em causa (a seguir «cláusulas controvertidas»), bem como o reembolso da totalidade dos montantes pagos em aplicação destas cláusulas. Por seu lado, a Caixabank invocou a plena validade das cláusulas controvertidas. No âmbito deste processo, CY considerou necessário o órgão jurisdicional nacional submeter ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais respeitantes às referidas cláusulas controvertidas.

33

No que respeita à cláusula relativa às despesas da hipoteca, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que a jurisprudência espanhola considera, maioritariamente, esse tipo de cláusulas como sendo abusivas e, consequentemente, nulas. No entanto, este órgão jurisdicional observa que, no que respeita aos efeitos dessa nulidade, os tribunais espanhóis chegaram a decisões diferentes e contraditórias que colocam os consumidores e as instituições financeiras numa situação de insegurança jurídica. A este respeito, o referido órgão jurisdicional dá conta de diversas práticas jurisprudenciais que considera «moder[adoras]» dos efeitos de restituição da declaração de nulidade, ao colocar a questão de saber se são compatíveis com o artigo 6.o, n.o l, lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13.

34

No que respeita à cláusula que exige uma comissão de abertura, o Juzgado de Primera Instancia n.o 17 de Palma de Mallorca (Tribunal de Primeira Instância n.o 17 de Palma de Maiorca) assinala o consenso dos tribunais de recurso quanto ao seu caráter abusivo e à sua nulidade, em razão do facto de a referida comissão não corresponder a uma despesa real ou efetiva. No entanto, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) contrariou recentemente esta orientação jurisprudencial ao considerar que a comissão de abertura, enquanto parte do objeto principal de um contrato de mútuo, devia estar excluída da fiscalização do seu caráter abusivo nos termos do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13. O órgão jurisdicional de reenvio questiona a justeza deste raciocínio do Tribunal Supremo (Supremo Tribunal) e pergunta‑se igualmente se a resposta a esta questão é influenciada pelo facto de o Reino de Espanha não ter transposto o referido artigo 4.o da Diretiva 93/13 para o direito espanhol para garantir um nível de proteção mais elevado ao consumidor, em conformidade com o artigo 8.o da referida diretiva.

35

Nestas condições, o Juzgado de Primera Instancia n.o 17 de Palma de Mallorca (Tribunal de Primeira Instância n.o 17 de Palma de Maiorca) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, a declaração de nulidade, com fundamento no seu caráter abusivo, de uma cláusula que imputa a totalidade das despesas de registo, novação ou cancelamento de um mútuo com garantia hipotecária ao mutuário, pode ser moderada, atenuando os seus efeitos de restituição após a sua declaração de nulidade com fundamento no seu caráter abusivo?

2)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 uma jurisprudência nacional que estabelece que, após a declaração de nulidade da cláusula que imputa a totalidade das despesas de registo, novação ou cancelamento de um mútuo com garantia hipotecária ao mutuário, as despesas notariais e de prestação de serviços administrativos devem ser repartidas [em partes iguais] entre o mutuante e o mutuário, pode ser considerada uma moderação judicial da declaração de nulidade de uma cláusula abusiva sendo, por conseguinte, contrária ao princípio da não vinculação constante desse artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13?

3)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 uma jurisprudência nacional que estabelece que, após a declaração de nulidade da cláusula que imputa a totalidade das despesas de registo, novação ou cancelamento de um mútuo com garantia hipotecária ao mutuário, deve ser também imputado a [este] o pagamento das despesas de avaliação do imóvel e do imposto que incide sobre a constituição da hipoteca decorrentes da registo do mútuo, constitui uma violação do princípio segundo o qual o consumidor não está vinculado por uma cláusula abusiva declarada nula? A atribuição ao mutuário do ónus da prova de que não lhe foi permitido apresentar a sua própria avaliação do imóvel é contrária ao artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva 93/13?

4)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 é contrária à referida diretiva uma jurisprudência nacional que estabelece que, após a declaração de nulidade da cláusula que imputa a totalidade das despesas de constituição, novação ou cancelamento de um mútuo com garantia hipotecária ao mutuário, a cláusula pode continuar a produzir efeitos para o mutuário quando realiza novações modificativas ou cancela a hipoteca, no sentido de que tem de continuar a suportar as despesas decorrentes dessa modificação ou cancelamento da hipoteca? A imputação dessas despesas ao mutuário constitui uma violação do princípio segundo o qual uma cláusula abusiva declarada nula não vincula o consumidor?

5)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o l, [da Diretiva 93/13,] lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, da [mesma], uma jurisprudência nacional que exclui parcialmente o efeito de restituição da declaração de nulidade com fundamento no caráter abusivo da cláusula que imputa ao mutuário a totalidade das despesas de registo, novação ou cancelamento de um mútuo com garantia hipotecária, seria contrária ao efeito dissuasivo em relação ao empresário, previsto no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13?

6)

Uma jurisprudência nacional que modera os efeitos de restituição após a declaração de nulidade de uma cláusula que imputa ao mutuário a totalidade das despesas de registo, novação ou cancelamento, com base no interesse do mutuário, pode ser considerada contrária aos princípios da não moderação das cláusulas declaradas nulas, estabelecido na jurisprudência do [Tribunal de Justiça], e da não vinculação, previsto no artigo 6.o da Diretiva 93/13?

7)

[Nos termos do] artigo 3.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 93/13, uma jurisprudência nacional que estabelece que a cláusula denominada comissão de abertura satisfaz automaticamente o critério da transparência pode constituir uma violação do princípio da inversão do ónus da prova estabelecido no artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva, uma vez que o profissional não tem de provar que forneceu informação prévia nem que a mesma foi objeto de negociação individual?

8)

Uma jurisprudência nacional que considera que um consumidor deve conhecer por sua iniciativa que a cobrança de uma comissão de abertura constitui uma prática habitual das instituições financeiras e que, por conseguinte, não é necessário que o mutuante tenha de produzir prova para demonstrar que a cláusula foi negociada individualmente deve ser considerada contrária ao artigo 3.o da Diretiva 93/13 e à jurisprudência do [Tribunal de Justiça da União Europeia]? Ou, pelo contrário, em qualquer caso, o mutuante deve provar que tal cláusula foi negociada individualmente?

9)

Devem os artigos 3.o e 4.o da Diretiva 93/13 e a jurisprudência do [Tribunal de Justiça da União Europeia] ser interpretados no sentido de que pode ser contrária à referida diretiva uma jurisprudência nacional que estabelece que a cláusula denominada comissão de abertura não pode ser analisada quanto ao seu caráter abusivo, em aplicação do artigo 4.o, n.o 2, por dizer respeito à definição do objeto principal do contrato? Ou, pelo contrário, deve considerar‑se que tal comissão de abertura não faz parte do preço do contrato mas [constitui] uma retribuição acessória e, consequentemente, deve estar sujeita a uma fiscalização da sua transparência e/ou do seu conteúdo por parte do juiz nacional a fim de verificar o seu caráter abusivo segundo o direito nacional?

10)

Deve o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13, não transposto para o ordenamento jurídico espanhol pela [Lei 7/1998, de 13 de abril, relativa às Condições Contratuais Gerais,] ser interpretado no sentido de que é contrário ao artigo 8.o da Diretiva 93/13 que um órgão jurisdicional espanhol invoque e aplique o artigo 4.o, n.o 2, da referida diretiva, quando essa disposição não foi transposta para o ordenamento jurídico espanhol por vontade do legislador, que pretendeu um nível de proteção completo relativamente a todas as cláusulas que o profissional possa incluir num contrato celebrado com os consumidores, mesmo as que dizem respeito ao objeto principal do contrato, ainda que estejam redigidas de maneira clara e compreensível, se se considerar que uma cláusula denominada comissão de abertura constitui o objeto principal do contrato de mútuo?

11)

[Nos termos do] artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, a cláusula denominada comissão de abertura, quando não tenha sido negociada individualmente e a instituição financeira não demonstre que corresponde a serviços efetivamente prestados e a despesas em que tenha incorrido, causa um desequilíbrio significativo entre os direitos e as obrigações das partes do contrato, deve ser declarada nula pelo juiz nacional?

12)

[Nos termos do] artigo 6.o, n.o 1, [da Diretiva 93/13,] lido em conjugação com o artigo 7.o, n.o 1, [da mesma], a condenação do profissional nas despesas, resultante de um processo em que são intentadas por um consumidor ações de nulidade de cláusulas abusivas de um contrato celebrado com o profissional, e é proferida pelos tribunais a referida declaração de nulidade, com fundamento no caráter abusivo de tais cláusulas, deve ser uma consequência do princípio da não vinculação e do princípio do efeito dissuasivo relativamente ao profissional, quando essas ações de nulidade forem julgadas procedentes pelo juiz nacional, independentemente da restituição concreta de quantias determinada pela decisão, quando entende, adicionalmente, que o pedido principal consiste na declaração de nulidade da cláusula e que a restituição de quantias constitui apenas um pedido acessório inerente ao anterior?

13)

Devem os princípios da não vinculação e do efeito dissuasivo da Diretiva 93/13 (artigos 6.o, n.o 1, e 7.o, n.o 1) ser interpretados no sentido de que os efeitos de restituição decorrentes de uma declaração de nulidade de uma cláusula inserida num contrato celebrado entre um consumidor e um profissional, com fundamento no seu caráter abusivo, podem ser limitados no tempo acolhendo a exceção de prescrição da ação de restituição, embora a ação de declaração de nulidade absoluta que declare o caráter abusivo da cláusula seja imprescritível em conformidade com a legislação nacional?»

Processo C‑259/19

36

Em 1 de julho de 2011, LG e PK celebraram com a instituição financeira Banco Bilbao Vizcaya Argentaria um contrato de mútuo hipotecário que incluía uma cláusula que, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, estipulava que todas as despesas de formalização e de extinção da hipoteca eram suportadas pelo mutuário.

37

Os demandantes intentaram uma ação perante o Juzgado de Primera Instancia e Instrucción de Ceuta (Tribunal de Primeira Instância e de Instrução de Ceuta, Espanha), pedindo a declaração da nulidade da referida cláusula, em razão do seu caráter abusivo.

38

Dado que os fundamentos são, em substância, análogos aos do pedido de decisão prejudicial no processo C‑224/19, le Juzgado de Primera Instancia e Instrucción de Ceuta (Tribunal de Primeira Instância e de Instrução de Ceuta) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Em conformidade com a Diretiva 93/13 […], em especial os seus artigos 6.o, n.o 1, e 7.o, n.o 1, e a fim de garantir a proteção dos consumidores e utentes e a jurisprudência [da União] que a desenvolve, é compatível com o direito da União que o Tribunal Supremo [(Supremo Tribunal)] tenha estabelecido, nos seus Acórdãos 44 a 49 de [23 de janeiro de 2019], como critério inequívoco que, nos contratos de crédito hipotecário celebrados com os consumidores, é abusiva a cláusula que não tenha sido objeto de negociação individual e que estipule que todos os encargos relativos à operação de crédito hipotecário se devem repercutir na pessoa do mutuário, sendo as diferentes rubricas constantes dessa cláusula abusiva declarada nula distribuídas entre a instituição bancária proponente e o consumidor mutuário, a fim de limitar a restituição das quantias indevidamente pagas em aplicação da legislação nacional?

2)

E, em conformidade com a Diretiva 93/13 […], em especial os seus artigos 6.o, n.o 1, e 7.o, n.o 1, e a fim de garantir a proteção dos consumidores e utentes e a jurisprudência [da União] que a desenvolve, é compatível com o direito da União que o Tribunal Supremo proceda a uma interpretação integradora de uma cláusula nula, porque abusiva, se a supressão desta e os efeitos dela decorrentes não afetarem a subsistência do contrato de mútuo com garantia hipotecária?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à admissibilidade

Quanto à admissibilidade da segunda à quarta questões no processo C‑224/19

39

O Governo espanhol alega a incompetência do Tribunal de Justiça para conhecer da segunda à quarta questões prejudiciais no processo C‑224/19, com o fundamento de que estas têm por objeto a questão de saber a quem incumbe o pagamento de determinadas despesas nos termos da legislação nacional em vigor, o que constitui uma questão de interpretação e aplicação do direito nacional, excluída, enquanto tal, do poder de apreciação do Tribunal de Justiça segundo jurisprudência constante (Acórdão de 21 de outubro de 2010, Padawan, C‑467/08, EU:C:2010:620, n.o 22).

40

A este respeito, cumpre salientar que, segundo aquela jurisprudência, no âmbito de um reenvio prejudicial, incumbe ao Tribunal de Justiça ter em conta o contexto factual e regulamentar no qual se inserem as questões prejudiciais, tal como definido pela decisão de reenvio. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não é competente para conhecer da questão de saber se a interpretação dada às normas nacionais pelo órgão jurisdicional de reenvio é correta.

41

Em contrapartida, como as questões colocadas são relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 21 de outubro de 2010, Padawan, C‑467/08, EU:C:2010:620, n.o 21 e jurisprudência referida).

42

Ora, resulta claramente da segunda à quarta questões, que o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se sobre a interpretação do artigo 3.o, n.o 2, e do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13. Mais especificamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se se estas disposições devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma determinada jurisprudência nacional. Daqui decorre que o Tribunal de Justiça não é, em momento algum, chamado a interpretar o direito nacional.

43

Resulta do que antecede que a segunda a quarta questões no processo C‑224/19 são admissíveis.

Quanto à admissibilidade da décima segunda questão no processo C‑224/19

44

A Caixabank contesta a admissibilidade da décima segunda questão apresentada no processo C‑224/19 e a competência do Tribunal de Justiça para lhe responder, alegando, por um lado, que o órgão jurisdicional de reenvio não indicou os elementos úteis para responder à referida questão, concretamente as normas nacionais relativas à condenação nas despesas e a medida em que essas normas podem prejudicar os direitos dos consumidores garantidos pela Diretiva 93/13 e, por outro, que as normas nacionais relativas às despesas são da competência dos Estados‑Membros.

45

Ora, embora o órgão jurisdicional de reenvio efetivamente não tenha indicado a disposição do direito espanhol que regula a repartição das despesas no processo principal, o Governo espanhol indicou, nas suas observações escritas, que se trata do artigo 394.o da LEC, cuja redação facultou, de modo que o Tribunal de Justiça dispõe dos elementos necessários para se pronunciar sobre a décima segunda questão no processo C‑224/19. Além disso, uma vez que esta questão não tem por objeto a interpretação ou a aplicação do artigo 394.o da LEC, mas, em substância, a questão de saber se o artigo 6.o, n.o 1, ou o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que se opõem à aplicação de uma disposição como o artigo 394.o da LEC nas circunstâncias do litígio no processo principal relativo ao processo C‑224/19, o Tribunal de Justiça é competente para lhe responder.

Quanto ao mérito

46

A título preliminar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao órgão jurisdicional nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular as questões que lhe são submetidas (Acórdão de 7 de agosto de 2018, Smith, C‑122/17, EU:C:2018:631, n.o 34).

47

Além disso, a circunstância de um órgão jurisdicional nacional ter, num plano formal, formulado o seu pedido prejudicial com base em certas disposições do direito da União não obsta a que o Tribunal de Justiça forneça a esse órgão jurisdicional todos os elementos de interpretação que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe foi submetido, quer esse órgão jurisdicional lhes tenha ou não feito referência no enunciado das suas questões. A este respeito, cabe ao Tribunal de Justiça extrair do conjunto dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional nacional, designadamente da fundamentação da decisão de reenvio, os elementos do direito da União que requerem uma interpretação, tendo em conta o objeto do litígio (Acórdão de 29 de setembro de 2016, Essent Belgium, C‑492/14, EU:C:2016:732, n.o 43 e jurisprudência referida).

48

Convém agrupar as quinze questões prejudiciais submetidas nos dois processos apensos em cinco temas, a saber, o primeiro, relativo à cláusula respeitante às despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca, o segundo, relativo à cláusula que exige uma comissão de abertura, o terceiro, relativo ao eventual desequilíbrio significativo entre os direitos e as obrigações das partes resultante da referida cláusula, o quarto, relativo à limitação no tempo dos efeitos da declaração da nulidade de uma cláusula abusiva, e o quinto, relativo ao regime nacional de repartição das despesas no âmbito das ações de declaração da nulidade das cláusulas abusivas.

Quanto à primeira a sexta questões no processo C‑224/19 e às duas questões no processo C‑259/19, relativas aos efeitos da nulidade da cláusula que estabelece as despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca

49

Com estas questões, os órgãos jurisdicionais de reenvio perguntam, em substância, se o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que, em caso de nulidade de uma cláusula contratual abusiva que exija o pagamento da totalidade das despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca pelo consumidor, o juiz nacional recuse a restituição ao consumidor dos montantes pagos em aplicação da referida cláusula.

50

A este respeito, importa salientar que, segundo jurisprudência constante, depois de uma cláusula ser declarada abusiva e, consequentemente, nula, incumbe ao juiz nacional, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, abster‑se de aplicar a referida cláusula para que a mesma não produza efeitos vinculativos para o consumidor, salvo se este último a isso se opuser (v., designadamente, Acórdãos de 14 de junho de 2012, Banco Español de Crédito, C‑618/10, EU:C:2012:349, n.o 65; e de 26 de março de 2019, Abanca Corporación Bancaria e Bankia, C‑70/17 e C‑179/17, EU:C:2019:250, n.o 52 e jurisprudência referida).

51

Daqui resulta que não deve ser conferida ao juiz nacional a faculdade de modificar o conteúdo das cláusulas abusivas, pois isso poderia contribuir para eliminar o efeito dissuasivo exercido sobre os profissionais pela pura e simples não aplicação relativamente ao consumidor dessas cláusulas abusivas (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o., C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980, n.o 60).

52

Uma cláusula contratual declarada abusiva deve, pois, ser considerada, em princípio, como nunca tendo existido, pelo que não pode produzir efeitos relativamente ao consumidor. Assim, a declaração judicial do caráter abusivo de tal cláusula deve, em princípio, ter por consequência o restabelecimento da situação de direito e de facto em que o consumidor estaria se a referida cláusula não existisse (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o., C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980, n.o 61).

53

Assim, o Tribunal de Justiça já considerou que o juiz nacional devia retirar todas as consequências que, segundo o direito nacional, decorrem do reconhecimento do caráter abusivo da cláusula em questão, para se certificar de que o consumidor não está vinculado pela mesma (Acórdão de 30 de maio de 2013, Asbeek Brusse e de Man Garabito, C‑488/11, EU:C:2013:341, n.o 49). Em particular, a obrigação que incumbe ao juiz nacional de afastar uma cláusula contratual abusiva que impõe o pagamento de quantias que se revelam indevidas implica, em princípio, um correspondente efeito de restituição relativamente a essas mesmas quantias (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o., C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980, n.o 62).

54

Recordado o que antecede, importa igualmente salientar que o facto de uma cláusula contratual considerada abusiva ser tratada como nunca tendo existido pode justificar a aplicação das eventuais disposições do direito nacional que regulam a repartição das despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca na falta de acordo entre as partes. No entanto, embora essas disposições ponham a cargo do mutuário a totalidade ou parte das referidas despesas, nem o artigo 6.o, n.o 1, nem o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 se opõem a que seja recusada a restituição, ao consumidor, da parte das referidas despesas que ele próprio deve suportar.

55

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira a sexta questões no processo C‑224/19 e às duas questões no processo C‑259/19 que o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que, em caso de nulidade de uma cláusula contratual abusiva que exija o pagamento da totalidade das despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca pelo consumidor, o juiz nacional recuse a restituição ao consumidor dos montantes pagos em aplicação da referida cláusula, a menos que as disposições do direito nacional aplicáveis na falta da referida cláusula imponham ao consumidor o pagamento da totalidade ou de parte dessas despesas.

Quanto à sétima a décima questões no processo C‑224/19, relativas à fiscalização do caráter abusivo e da transparência da cláusula que exige o pagamento de uma comissão de abertura

56

Com estas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 3.o, 4.o, n.o 2, e 5.o da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma jurisprudência nacional que exclui a apreciação do caráter abusivo de uma cláusula contratual que exige ao consumidor o pagamento de uma comissão de abertura com o fundamento de que a mesma é um elemento do preço do contrato nos termos do artigo 4.o, n.o 2, da diretiva, considerando que tal cláusula, em si, respeita a exigência de transparência consagrada por esta última disposição.

57

No caso em apreço, há que observar, a título preliminar, que o órgão jurisdicional de reenvio apresentou a sétima à décima questões partindo do pressuposto de que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 não foi transposto para a ordem jurídica espanhola.

58

No entanto, para responder às questões prejudiciais no presente processo, não é necessário conhecer da transposição efetiva do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 para a ordem jurídica espanhola (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 3 de março de 2020, Gómez del Moral Guasch, C‑125/18, EU:C:2020:138, n.o 42).

59

Com efeito, por um lado, importa recordar que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13, conjugado com o artigo 8.o da mesma, permite, no entanto, aos Estados‑Membros que prevejam, na legislação que transpõe esta diretiva, que «a avaliação do caráter abusivo» não respeita às cláusulas referidas nesta disposição, desde que as mesmas estejam redigidas de forma clara e compreensível (v., neste sentido, Acórdãos de 3 de junho de 2010, Caja de Ahorros y Monte de Piedad de Madrid, C‑484/08, EU:C:2010:309, n.o 32; de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai, C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 41; e de 3 de março de 2020, Gómez del Moral Guasch, C‑125/18, EU:C:2020:138, n.o 45).

60

Mais especificamente, o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 limita‑se a enunciar que «[a] avaliação do caráter abusivo das cláusulas não incide nem sobre a definição do objeto principal do contrato nem sobre a adequação entre o preço e a remuneração, por um lado, e os bens ou serviços a fornecer em contrapartida, por outro, desde que essas cláusulas se encontrem redigidas de maneira clara e compreensível».

61

Assim, no processo principal, a fiscalização do caráter abusivo da cláusula que exige o pagamento de uma comissão de abertura pelo consumidor só poderia ser limitada em conformidade com o referido artigo 4.o, n.o 2, se a mesma cláusula incidisse sobre um dos dois assuntos supramencionados.

62

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que as cláusulas contratuais abrangidas pelo conceito de «objeto principal do contrato» devem ser entendidas como as que fixam as prestações essenciais deste contrato e que, como tais, o caracterizam. Em contrapartida, as cláusulas que revestem caráter acessório relativamente às que definem a própria essência da relação contratual não podem estar abrangidas pelo referido conceito (Acórdãos de 20 de setembro de 2017, Andriciuc e o., C‑186/16, EU:C:2017:703, n.os 35 e 36 e jurisprudência referida; e de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 32).

63

Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, tendo em conta a natureza, a economia geral e as estipulações do contrato de mútuo em causa, bem como o contexto jurídico e factual em que este se inscreve, se a cláusula em questão constitui um elemento essencial do contrato de mútuo hipotecário em causa no processo principal (v., por analogia, Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 33 e jurisprudência referida).

64

No entanto, para orientar o juiz nacional na sua apreciação, é útil precisar que o alcance exato dos conceitos de «objeto principal» e de «preço», na aceção do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13, não pode ser determinado através do conceito de «custo total do crédito para o consumidor», na aceção do artigo 3.o, alínea g), da Diretiva 2008/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, relativa a contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 87/102/CEE do Conselho (JO 2008, L 133, p. 66) (Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Matei, C‑143/13, EU:C:2015:127, n.o 47). Assim, o facto de uma comissão de abertura estar incluída no custo total de um mútuo hipotecário não pode determinar que aquela seja uma prestação essencial deste.

65

Além disso, resulta dos termos do artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 que a segunda categoria de cláusulas cujo caráter eventualmente abusivo não pode ser objeto de avaliação tem alcance reduzido, uma vez que abrange apenas a adequação do preço ou da remuneração previstos aos serviços ou aos bens a fornecer em contrapartida, explicando‑se esta exclusão pelo facto de não haver uma tabela ou um critério jurídico que possa enquadrar e orientar a fiscalização dessa adequação. As cláusulas relativas à contrapartida devida pelo consumidor ao mutuante ou que têm incidência no preço efetivo que aquele tem de pagar a este último não se integram, em princípio, nesta segunda categoria de cláusulas, salvo no que respeita à questão de saber se o montante da contrapartida ou do preço estipulado no contrato é adequado ao serviço prestado em troca pelo mutuante (Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.os 34 e 35 e jurisprudência referida).

66

Por outro lado, o Tribunal de Justiça sublinhou que a exigência de redação clara e compreensível que figura no artigo 5.o da Diretiva 93/13 se aplica, em todo o caso, incluindo quando uma cláusula está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 4.o, n.o 2, da referida diretiva e mesmo que o Estado‑Membro em causa não tenha transposto essa disposição. Esta exigência não pode ficar reduzida apenas ao caráter compreensível de uma cláusula contratual nos planos formal e gramatical (Acórdão de 3 de março de 2020, Gómez del Moral Guasch, C‑125/18, EU:C:2020:138, n.o 46).

67

Pelo contrário, dado que o sistema de proteção estabelecido pela Diretiva 93/13 assenta na ideia de que o consumidor se encontra numa situação de inferioridade relativamente ao profissional, no que respeita, designadamente, ao nível de informação, a referida exigência deve ser entendida de maneira extensiva, no sentido de que exige não só que a cláusula em questão seja gramaticalmente inteligível para o consumidor mas igualmente que o contrato exponha com transparência o funcionamento concreto do mecanismo a que a cláusula em questão se reporta, bem como, se for o caso, a relação entre esse mecanismo e o estabelecido noutras cláusulas, de modo que esse consumidor esteja em condições de avaliar, com base em critérios precisos e inteligíveis, as consequências económicas que daí decorrem para ele (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai, C‑26/13, EU:C:2014:282, n.os 70 a 73; de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 37; e de 3 de março de 2020, Gómez del Moral Guasch, C‑125/18, EU:C:2020:138, n.o 43).

68

O órgão jurisdicional de reenvio deve apreciar o caráter claro e compreensível da cláusula em questão no processo principal à luz do conjunto de elementos factuais pertinentes, entre os quais a publicidade e a informação facultadas pelo mutuante no âmbito da negociação de um contrato de mútuo, e tendo em conta o nível de atenção que se pode esperar de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de abril de 2014, Kásler e Káslerné Rábai, C‑26/13, EU:C:2014:282, n.o 74; de 26 de fevereiro de 2015, Matei, C‑143/13, EU:C:2015:127, n.o 75; de 20 de setembro de 2017, Andriciuc e o., C‑186/16, EU:C:2017:703, n.os 46 e 47; e de 3 de março de 2020, Gómez del Moral Guasch, C‑125/18, EU:C:2020:138, n.o 46).

69

Daqui decorre que o artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 93/13 e o artigo 5.o da mesma se opõem a uma jurisprudência segundo a qual uma cláusula contratual é considerada, em si mesma, transparente, sem necessidade de uma análise como a descrita no número anterior.

70

Nestas condições, cabe ao órgão jurisdicional nacional, quando toma em consideração todas as circunstâncias que rodeiam a celebração do contrato, verificar se a instituição financeira comunicou ao consumidor os elementos suficientes para que este último tome conhecimento do conteúdo e do funcionamento da cláusula que lhe impõe o pagamento de uma comissão de abertura, bem como a sua função no contrato de mútuo. Deste modo, o consumidor terá acesso aos motivos que justificam a remuneração correspondente à referida comissão (v., por analogia, Acórdão de 26 de fevereiro de 2015, Matei, C‑143/13, EU:C:2015:127, n.o 77), podendo assim avaliar o alcance do seu compromisso e, em especial, o custo total do referido contrato.

71

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à sétima a décima questões que o artigo 3.o, o artigo 4.o, n.o 2, e o artigo 5.o da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que as cláusulas contratuais abrangidas pelo conceito de «objeto principal do contrato» devem ser entendidas como as que fixam as prestações essenciais desse contrato e que, como tais, o caracterizam. Em contrapartida, as cláusulas que revestem caráter acessório relativamente às que definem a própria essência da relação contratual não podem estar abrangidas pelo referido conceito. O facto de uma comissão de abertura estar incluída no custo total de um mútuo hipotecário não pode determinar que aquela seja uma prestação essencial deste. Em qualquer hipótese, um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro é obrigado a fiscalizar o caráter claro e compreensível de uma cláusula contratual relativa ao objeto principal do contrato, independentemente da transposição do artigo 4.o, n.o 2, desta diretiva para a ordem jurídica desse Estado‑Membro.

Quanto à décima primeira questão, relativa a um eventual desequilíbrio significativo entre os direitos e as obrigações das partes resultante de uma cláusula que exige o pagamento de uma comissão de abertura

72

Com a décima primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio, no processo C‑224/19, pergunta, em substância, se o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que uma cláusula de um contrato de mútuo celebrado entre um consumidor e uma instituição financeira que exige ao consumidor o pagamento de uma comissão de abertura, dá origem a um desequilíbrio significativo, em detrimento do consumidor, entre os direitos e as obrigações das partes decorrentes do contrato, a despeito da exigência de boa‑fé, quando a instituição financeira não demonstre que a referida comissão corresponde a serviços efetivamente prestados e a despesas em que tenha incorrido.

73

A este respeito, importa recordar desde já que, segundo jurisprudência constante, a competência do Tribunal de Justiça abrange a interpretação do conceito de «cláusula abusiva», referido no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, assim como os critérios que o órgão jurisdicional nacional pode ou deve aplicar na apreciação de uma cláusula contratual à luz das disposições desta diretiva, sendo certo que cabe ao referido órgão jurisdicional pronunciar‑se, tendo em conta aqueles critérios, sobre a qualificação concreta de uma cláusula contratual particular em função das circunstâncias próprias do caso em apreço. Conclui‑se daqui que o Tribunal de Justiça se deve limitar a fornecer ao órgão jurisdicional de reenvio as indicações que este deve ter em conta para avaliar o caráter abusivo da cláusula em causa (Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 47 e jurisprudência referida).

74

No que respeita à questão de saber se a exigência de boa‑fé, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, é respeitada, importa observar que, tendo em conta o seu décimo sexto considerando, o juiz nacional deve verificar, para o efeito, se o profissional, ao tratar de forma leal e equitativa com o consumidor, podia razoavelmente esperar que ele aceitaria essa cláusula, na sequência de uma negociação individual (Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 50).

75

No que respeita à existência de um eventual desequilíbrio significativo, o Tribunal de Justiça declarou que o mesmo pode resultar simplesmente de uma lesão suficientemente grave da situação jurídica na qual o consumidor, enquanto parte no contrato em causa, é colocado por força das disposições nacionais aplicáveis, seja ela sob a forma de uma restrição do conteúdo dos direitos que, segundo essas disposições, para ele resultam desse contrato, ou de um entrave ao exercício dos mesmos, ou ainda do facto de lhe ser imposta uma obrigação suplementar, não prevista pelas regras nacionais (Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 51).

76

Por outro lado, resulta do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 que o caráter abusivo de uma cláusula poderá ser avaliado em função da natureza dos bens ou dos serviços que sejam objeto do contrato e mediante consideração de todas as circunstâncias que, no momento em que aquele foi celebrado, rodearam a sua celebração, bem como de todas as outras cláusulas do contrato, ou de outro contrato de que este dependa (Acórdão de 3 de outubro de 2019, Kiss e CIB Bank, C‑621/17, EU:C:2019:820, n.o 52).

77

Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio avaliar o caráter eventualmente abusivo da cláusula em questão no processo principal à luz desses critérios.

78

A este respeito, deve ter‑se em conta que, conforme decorre das indicações do órgão jurisdicional de reenvio, segundo a Lei 2/2009, as comissões ou despesas repercutidas no cliente devem corresponder a serviços efetivamente prestados ou a custos suportados. Daqui decorre que uma cláusula que tinha por efeito isentar o profissional da obrigação de demonstrar que esses requisitos estão preenchidos relativamente a uma comissão de abertura, poderia, sem prejuízo de uma verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio à luz do conjunto das cláusulas do contrato, afetar desfavoravelmente a posição jurídica do consumidor e, consequentemente, dar origem a um desequilíbrio significativo, em detrimento deste, a despeito da exigência de boa‑fé.

79

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à décima primeira questão no processo C‑224/19 que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que uma cláusula de um contrato de mútuo celebrado entre um consumidor e uma instituição financeira, que exige ao consumidor o pagamento de uma comissão de abertura, é suscetível de dar origem a um desequilíbrio significativo, em detrimento do consumidor, entre os direitos e as obrigações das partes decorrentes do contrato, a despeito da exigência de boa‑fé, quando a instituição financeira não demonstre que a referida comissão corresponde a serviços efetivamente prestados e a despesas em que incorreu, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

Quanto à décima terceira questão no processo C‑224/19, relativa à limitação dos efeitos da declaração da nulidade de uma cláusula abusiva através da fixação de um prazo de prescrição

80

Com a décima terceira questão apresentada no processo C‑224/19, que deve ser analisada antes da décima segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma jurisprudência nacional que prevê que a propositura da ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula contratual abusiva esteja subordinada a um prazo de prescrição, apesar de, por força da legislação nacional, a ação de declaração da nulidade absoluta de uma cláusula contratual abusiva não ser passível de prescrição.

81

A este respeito, importa recordar que a proteção que a Diretiva 93/13 garante aos consumidores se opõe a uma regulamentação interna que impede o juiz nacional de, findo o prazo de caducidade, conhecer do caráter abusivo de uma cláusula inserida num contrato celebrado entre um profissional e um consumidor (Acórdão de 21 de novembro de 2002, Cofidis, C‑473/00, EU:C:2002:705, n.o 38).

82

No entanto, o Tribunal de Justiça já reconheceu que a proteção do consumidor não é absoluta (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o., C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980, n.o 68) e que a fixação de prazos razoáveis de recurso, sob pena de caducidade por razões de segurança jurídica, é compatível com o direito da União (Acórdãos de 6 de outubro de 2009, Asturcom Telecomunicaciones, C‑40/08, EU:C:2009:615, n.o 41; e de 21 de dezembro de 2016, Gutiérrez Naranjo e o., C‑154/15, C‑307/15 e C‑308/15, EU:C:2016:980, n.o 69).

83

A este respeito, saliente‑se que, na falta de regulamentação da União na matéria, as modalidades de execução da proteção dos consumidores prevista no artigo 6.o, n.o 1, e no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, dependem da ordem jurídica interna dos Estados‑Membros, por força do princípio da autonomia processual destes últimos. Todavia, essas modalidades não devem ser menos favoráveis do que as que regulam situações análogas de natureza interna (princípio da equivalência) nem ser concebidas por forma a tornarem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípio da efetividade) (v., neste sentido, designadamente, Acórdão de 26 de outubro de 2006, Mostaza Claro, C‑168/05, EU:C:2006:675, n.o 24 e jurisprudência referida).

84

Daqui decorre que o direito da União não se opõe a uma legislação nacional que, embora prevendo a não prescrição da ação de declaração da nulidade de uma cláusula abusiva constante de um contrato celebrado entre um profissional e um consumidor, subordina a um prazo de prescrição a ação destinada a invocar os efeitos de restituição da referida declaração, sob reserva da observância dos princípios da equivalência e da efetividade.

85

No que respeita, mais especificamente, à observância do princípio da efetividade, o Tribunal de Justiça já declarou que cada caso em que se coloca a questão de saber se uma disposição processual nacional torna impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União deve ser apreciado tendo em conta o lugar que essa disposição ocupa em todo o processo, a tramitação deste e as suas particularidades, perante as várias instâncias nacionais. Nesta perspetiva, há que tomar em consideração, sendo caso disso, os princípios que estão na base do sistema jurisdicional nacional, como a proteção dos direitos de defesa, o princípio da segurança jurídica e a boa marcha do processo (Acórdão de 26 de junho de 2019, Addiko Bank, C‑407/18, EU:C:2019:537, n.o 48 e jurisprudência referida).

86

No processo principal, o órgão jurisdicional de reenvio refere que está em causa a aplicação eventual do prazo de prescrição de cinco anos previsto no artigo 1964.o, n.o 2, do Código Civil à ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula abusiva de um contrato hipotecário.

87

Uma vez que os prazos de prescrição de três anos (Acórdão de 15 de abril de 2010, Barth, C‑542/08, EU:C:2010:193, n.o 28) ou de dois anos (Acórdão de 15 de dezembro de 2011, Banca Antoniana Popolare Veneta, C‑427/10, EU:C:2011:844, n.o 25) foram considerados na jurisprudência do Tribunal de Justiça como conformes ao princípio da efetividade, cumpre considerar que um prazo de prescrição de cinco anos aplicável à ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula abusiva, não se mostra, em princípio sem prejuízo da apreciação, pelo órgão jurisdicional de reenvio, dos elementos mencionados no n.o 85 do presente acórdão, como suscetível de tornar impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela Diretiva 93/13.

88

O órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se igualmente, em substância, sobre o caráter compatível com o princípio da efetividade, lido em conjugação com o princípio da segurança jurídica, de uma jurisprudência nacional segundo a qual o prazo de prescrição de cinco anos para a propositura de uma ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula contratual abusiva começa a contar a partir da data da celebração do contrato que contém a referida cláusula.

89

Decorre da decisão de reenvio que o referido prazo, previsto no artigo 1964.o, n.o 2, do Código Civil, parece correr a partir da celebração de um contrato de mútuo hipotecário contendo uma cláusula abusiva, o que, no entanto, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

90

A este respeito, cumpre ter em conta que é possível que os consumidores ignorem o caráter abusivo de uma cláusula constante de um contrato de mútuo hipotecário ou não se apercebam do alcance dos seus direitos decorrentes da Diretiva 93/13 (v., neste sentido, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Profi Credit Polska, C‑176/17, EU:C:2018:711, n.o 69).

91

No entanto, a aplicação de um prazo de prescrição de cinco anos que começa a correr a partir da celebração do contrato, uma vez que implica que o consumidor só pode pedir a restituição dos pagamentos efetuados em execução de uma cláusula contratual julgada abusiva durante os primeiros cinco anos após a assinatura do contrato, independentemente da questão de saber se tinha ou podia razoavelmente ter conhecimento do caráter abusivo da referida cláusula, pode tornar excessivamente difícil o exercício dos direitos desse consumidor conferidos pela Diretiva 93/13 e, consequentemente, desrespeitar o princípio da efetividade lido em conjugação com o princípio da segurança jurídica.

92

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à décima terceira questão apresentada no processo C‑224/19 que o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que a propositura da ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula contratual abusiva esteja subordinada a um prazo de prescrição, desde que o início desse prazo e a sua duração não tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício do direito do consumidor de pedir tal restituição.

Quanto à décima segunda questão no processo C‑224/19, relativa à compatibilidade do regime jurídico de repartição das despesas com a Diretiva 93/13

93

Com a décima segunda questão apresentada no processo C‑224/19, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a um regime que permite que uma parte das despesas processuais recaia sobre o consumidor, segundo o nível dos montantes indevidamente pagos que lhe são restituídos na sequência da declaração da nulidade de uma cláusula contratual fundada no seu caráter abusivo.

94

Com efeito, resulta dos elementos dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a aplicação do artigo 394.o da LEC pode ter por efeito a não condenação do profissional na totalidade das despesas quando for julgada totalmente procedente a ação de declaração da nulidade de uma cláusula contratual abusiva intentada por um consumidor, mas a ação para a restituição de montantes pagos por força desta cláusula for julgada apenas parcialmente procedente.

95

A este respeito, decorre da jurisprudência mencionada no n.o 83 do presente acórdão que a repartição das despesas de um processo judicial nos tribunais nacionais está abrangida pela autonomia processual dos Estados‑Membros, sem prejuízo da observância dos princípios da equivalência e da efetividade.

96

Assim, há que salientar que nada nos autos submetidos ao Tribunal de Justiça permite concluir que o referido regime se aplica de forma diferente consoante o direito em causa é conferido pelo direito da União ou pelo direito interno. No entanto, é necessário conhecer da questão de saber se é compatível com o princípio da efetividade o facto de fazer recair sobre o consumidor as despesas de um processo segundo os montantes que lhe são restituídos, apesar de este ter obtido ganho de causa no que respeita ao caráter abusivo da cláusula contestada.

97

A questão da observância do princípio da efetividade deve ser apreciada à luz dos elementos recordados no n.o 85 do presente acórdão.

98

No caso em apreço, a Diretiva 93/13 confere ao consumidor o direito de se dirigir aos tribunais para pedir a declaração do caráter abusivo de uma cláusula contratual e impedir a sua aplicação. No entanto, fazer depender a repartição das despesas do referido processo unicamente dos montantes indevidamente pagos e cuja restituição é ordenada, pode dissuadir o consumidor de exercer o referido direito, tendo em conta os custos que uma ação judicial implica (v., neste sentido, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Profi Credit Polska, C‑176/17, EU:C:2018:711, n.o 69).

99

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à décima segunda questão apresentada no processo C‑224/19 que o artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, bem como o princípio da efetividade, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a um regime que permite que uma parte das despesas processuais recaia sobre o consumidor, segundo o nível dos montantes indevidamente pagos que lhe são restituídos na sequência da declaração da nulidade de uma cláusula contratual fundada no seu caráter abusivo, tendo em conta que tal regime cria um obstáculo substancial suscetível de desencorajar os consumidores de exercerem o seu direito a uma fiscalização jurisdicional efetiva do caráter potencialmente abusivo de cláusulas contratuais conforme conferido pela Diretiva 93/13.

Quanto às despesas

100

Revestindo o processo, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

 

1)

O artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13/CEE do Conselho, de 5 de abril de 1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que, em caso de nulidade de uma cláusula contratual abusiva que exija o pagamento da totalidade das despesas de constituição e de cancelamento da hipoteca pelo consumidor, o juiz nacional recuse a restituição ao consumidor dos montantes pagos em aplicação da referida cláusula, a menos que as disposições do direito nacional aplicáveis na falta da referida cláusula imponham ao consumidor o pagamento da totalidade ou de parte dessas despesas.

 

2)

O artigo 3.o, o artigo 4.o, n.o 2, e o artigo 5.o da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que as cláusulas contratuais abrangidas pelo conceito de «objeto principal do contrato» devem ser entendidas como as que fixam as prestações essenciais desse contrato e que, como tais, o caracterizam. Em contrapartida, as cláusulas que revestem caráter acessório relativamente às que definem a própria essência da relação contratual não podem estar abrangidas pelo referido conceito. O facto de uma comissão de abertura estar incluída no custo total de um mútuo hipotecário não pode determinar que aquela seja uma prestação essencial deste. Em qualquer hipótese, um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro é obrigado a fiscalizar o caráter claro e compreensível de uma cláusula contratual relativa ao objeto principal do contrato, independentemente da transposição do artigo 4.o, n.o 2, desta diretiva para a ordem jurídica desse Estado‑Membro.

 

3)

O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 deve ser interpretado no sentido de que uma cláusula de um contrato de mútuo celebrado entre um consumidor e uma instituição financeira, que exige ao consumidor o pagamento de uma comissão de abertura, é suscetível de dar origem a um desequilíbrio significativo, em detrimento do consumidor, entre os direitos e as obrigações das partes decorrentes do contrato, a despeito da exigência de boa‑fé, quando a instituição financeira não demonstre que a referida comissão corresponde a serviços efetivamente prestados e a despesas em que incorreu, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 

4)

O artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que a propositura da ação destinada a invocar os efeitos de restituição da declaração de nulidade de uma cláusula contratual abusiva esteja subordinada a um prazo de prescrição, desde que o início desse prazo e a sua duração não tornem impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício do direito do consumidor de pedir tal restituição.

 

5)

O artigo 6.o, n.o 1, e o artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 93/13, bem como o princípio da efetividade, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a um regime que permite que uma parte das despesas processuais recaia sobre o consumidor, segundo o nível dos montantes indevidamente pagos que lhe são restituídos na sequência da declaração da nulidade de uma cláusula contratual fundada no seu caráter abusivo, tendo em conta que tal regime cria um obstáculo substancial suscetível de desencorajar os consumidores de exercerem o seu direito a uma fiscalização jurisdicional efetiva do caráter potencialmente abusivo de cláusulas contratuais conforme conferido pela Diretiva 93/13.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.