ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)

5 de março de 2020 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — União Económica e Monetária — União Bancária — Recuperação e resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento — Mecanismo Único de Resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento (MUR) — Conselho Único de Resolução (CUR) — Fundo Único de Resolução (FUR) — Fixação da contribuição ex ante para o exercício de 2016 — Recurso de anulação — Prazo de recurso — Extemporaneidade — Exceção de ilegalidade — Inadmissibilidade manifesta»

No processo C‑69/19 P,

que tem por objeto um recurso de um despacho do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 29 de janeiro de 2019,

Credito Fondiario SpA, com sede em Roma (Itália), representada inicialmente por F. Sciaudone, S. Frazzani, A. Neri e F. Iacovone, avvocati, e em seguida por F. Sciaudone, A. Neri e F. Iacovone, avvocati,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Conselho Único de Resolução (CUR), representado por H. Ehlers, na qualidade de agente, assistida por S. Ianc, B. Meyring, T. Klupsch e S. Schelo, Rechtsanwälte, e por M. Caccialanza e A. Villani, avvocati,

recorrido em primeira instância,

República Italiana, representada por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por P. Gentili, avvocato dello Stato,

Comissão Europeia, representada por V. Di Bucci, K.‑P. Wojcik e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),

composto por: L. S. Rossi, presidente de secção, J. Malenovský e N. Wahl (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, a Credito Fondiario SpA pede a anulação do Despacho do Tribunal Geral da União Europeia de 19 de novembro de 2018, Credito Fondiario/CUR (T‑661/16, não publicado, a seguir «despacho recorrido», EU:T:2018:806), que negou provimento ao recurso que interpôs, por um lado, para a anulação da Decisão do Conselho Único de Resolução (CUR), tomada na sessão executiva de 15 de abril de 2016 sobre as contribuições ex ante de 2016 para o Fundo Único de Resolução (FUR) (SRB/ES/SRF/2016/06) (a seguir «primeira decisão controvertida»), e da decisão do CUR, tomada na sessão executiva de 20 de maio de 2016, sobre o ajustamento das contribuições ex ante de 2016 para o FUR, que complementa a primeira decisão controvertida (SRB/ES/SRF/2016/13) (a seguir «segunda decisão controvertida» e, em conjunto com a primeira decisão controvertida, «decisões controvertidas»), na parte em que lhe dizem respeito, e, por outro, para a declaração de ilegalidade do artigo 5.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento Delegado (UE) 2015/63 da Comissão, de 21 de outubro de 2014, que complementa a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no que se refere às contribuições ex ante para os mecanismos de financiamento da resolução (JO 2015, L 11, p. 44), e do respetivo anexo I ou, se for o caso, da totalidade desse regulamento delegado.

Quadro jurídico

2

O artigo 54.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1), prevê:

«O CUR em sessão executiva:

a)

Elabora todas as decisões a adotar pelo CUR em sessão plenária;

b)

Toma todas as decisões para efeitos da aplicação do presente regulamento, salvo disposto em contrário no presente regulamento.»

3

O artigo 70.o do Regulamento n.o 806/2014, sob a epígrafe «Contribuições ex ante», estabelece, no seu n.o 2:

«Todos os anos, o CUR, após consulta do BCE ou da autoridade nacional competente, e em estreita cooperação com as autoridades nacionais de resolução, calcula as contribuições individuais para garantir que as contribuições devidas por todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes não excedem 12,5 % do nível‑alvo.

Cada ano, o cálculo das contribuições de instituições individuais deve ter por base:

a)

Uma contribuição fixa, calculada proporcionalmente com base no montante do passivo, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao passivo total, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, das instituições autorizadas no território dos Estados‑Membros participantes; e

b)

Uma contribuição adaptada ao risco, que deve ser feita com base nos critérios estabelecidos no artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59/UE, tendo em conta o princípio da proporcionalidade, sem criar distorções entre estruturas do setor bancário dos Estados‑Membros.

A relação entre a contribuição fixa e as contribuições adaptadas ao risco deve ter em conta uma distribuição equilibrada das contribuições entre os diferentes tipos de bancos.

Em qualquer caso, o montante agregado das contribuições individuais de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes, calculadas nos termos das alíneas a) e b), não pode exceder, anualmente, 12,5 % do nível‑alvo.»

4

O artigo 5.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/81 do Conselho, de 19 de dezembro de 2014, que especifica condições de aplicação uniformes do Regulamento n.o 806/2014 (JO 2015, L 15, p. 1), dispõe:

«1.   O CUR comunica às autoridades nacionais de resolução competentes as suas decisões sobre o cálculo das contribuições anuais das instituições autorizadas nos respetivos territórios.

2.   Após receber a comunicação a que se refere o n.o 1, cada autoridade nacional de resolução notifica cada instituição autorizada no seu Estado‑Membro da decisão do CUR sobre o cálculo da contribuição anual devida por essa instituição.»

5

Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63:

«As contribuições referidas no artigo 103.o, n.o 2, da Diretiva 2014/59/UE são calculadas excluindo os seguintes passivos:

[…]

f)

No caso das instituições que concedem empréstimos de fomento, os passivos da instituição intermediária perante o banco de fomento original ou outro banco de fomento, ou outra instituição intermediária, e os passivos do banco de fomento perante as respetivas partes financiadoras na medida em que o montante desses passivos corresponda aos empréstimos de fomento dessa instituição.»

Antecedentes do litígio

6

Os antecedentes do litígio foram expostos nos n.os 1 a 10 do despacho recorrido e podem, para efeitos do presente processo, ser resumidos da seguinte forma.

7

Com a primeira decisão controvertida, o CUR, na sessão executiva de 15 de abril de 2016, aprovou as contribuições ex ante de 2016 para o FUR. Esta decisão foi notificada às autoridades nacionais de resolução (a seguir «ANR») responsáveis pela cobrança das contribuições individuais junto dos bancos em causa nos respetivos territórios.

8

Nesse contexto, a Banca d’Italia (Banco de Itália), na qualidade de autoridade nacional de resolução italiana, informou a recorrente, através do Comunicado n.o 585762/16, de 3 de maio de 2016, recebido na mesma data, de que o CUR tinha adotado a sua contribuição ex ante de 2016 para o FUR e indicou‑lhe o respetivo montante.

9

Com a segunda decisão controvertida, o CUR, na sessão executiva de 20 de maio de 2016, fez um ajustamento das contribuições ex ante de 2016 para o FUR e aumentou a contribuição da recorrente.

10

Essa segunda decisão foi também notificada às ANR e, através do Comunicado n.o 709489/16, de 27 de maio de 2016, recebido em 30 de maio de 2016, o Banco de Itália informou a recorrente da necessidade de pagar o montante do aumento assim decidido.

11

A recorrente solicitou explicações ao Banco de Itália sobre o método de cálculo e as razões para o montante da sua contribuição.

12

Em 15 de junho de 2016, a recorrente informou o Banco de Itália e o CUR de que havia interposto um recurso no Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio, Itália) pedindo, após serem concedidas medidas provisórias, a anulação dos Comunicados n.os 585762/16 e 709489/16 do Banco de Itália. No âmbito deste processo, o Banco de Itália anexou à contestação que apresentou em 8 de julho de 2016 as decisões controvertidas.

13

Por Despacho de 14 de julho de 2016, o Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio) indeferiu o pedido de medidas provisórias da recorrente.

Recurso para o Tribunal Geral e despacho recorrido

14

A recorrente interpôs o recurso mencionado no n.o 1 do presente acórdão por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 19 de setembro de 2016.

15

A recorrente invoca sete fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, à falta de notificação das decisões controvertidas; o segundo, à falta de fundamentação dessas decisões e à violação do princípio do contraditório; o terceiro, à aplicação incorreta do artigo 5.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento Delegado 2015/63; o quarto, à violação dos artigos 4.o, n.o 1, e 6.o do mesmo regulamento delegado; o quinto, à violação dos artigos 20.o e 21.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia; o sexto, à violação dos princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica; e, o sétimo, à violação do artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

16

No despacho recorrido, proferido com base no artigo 126.o do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral, sem se pronunciar sobre os fundamentos invocados pela recorrente, julgou o recurso manifestamente inadmissível e condenou‑a nas despesas.

Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

17

A recorrente pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o despacho recorrido e remeter o processo ao Tribunal Geral;

condenar o CUR nas despesas de ambas as instâncias; e,

a título subsidiário, anular o despacho recorrido na parte em que o Tribunal Geral a condenou a suportar as despesas efetuadas pelo CUR, e decidir, com base na equidade, sobre as despesas do processo em primeira instância.

18

O CUR pede que o Tribunal de Justiça se digne:

declarar o recurso parcialmente inadmissível e, em todo o caso, improcedente; e

condenar a recorrente nas despesas deste processo e do processo tramitado no Tribunal Geral.

19

A República Italiana pede que o Tribunal de Justiça se digne conceder provimento ao recurso e anular o despacho recorrido.

20

A Comissão Europeia pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento ao recurso no que respeita à admissibilidade do recurso interposto em primeira instância contra a primeira decisão controvertida;

decidir conforme for de direito quanto à admissibilidade do recurso interposto em primeira instância contra a segunda decisão controvertida; e,

no caso de ser negado provimento ao recurso, condenar a recorrente nas despesas do presente processo e nas do processo em primeira instância.

Quanto ao presente recurso

21

A recorrente invoca cinco fundamentos de recurso. O primeiro fundamento é relativo a um erro na qualificação jurídica dos factos quanto à data em que a recorrente tomou conhecimento das decisões controvertidas e a um erro na qualificação jurídica dos factos quanto à apreciação da falta de razoabilidade do prazo em que a recorrente atuou. O segundo fundamento é relativo a um erro de direito na interpretação e aplicação da jurisprudência relativa ao prazo razoável em que, na falta de publicação ou notificação do ato a impugnar, o interessado deve solicitar que este lhe seja comunicado. O terceiro fundamento é relativo à violação do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral e dos direitos de defesa da recorrente. O quarto fundamento assenta num erro de direito na apreciação do pedido apresentado com base no artigo 277.o TFUE. Por último, o quinto fundamento, invocado a título subsidiário para o caso de o Tribunal de Justiça negar provimento ao recurso, tem por objeto a anulação do despacho recorrido na parte em que o Tribunal Geral condenou a recorrente a suportar as suas próprias despesas e as despesas do CUR.

Quanto ao primeiro e segundo fundamentos

Argumentos das partes

22

Com o primeiro e segundo fundamentos, que devem ser apreciados em conjunto, a recorrente, apoiada em substância pela República Italiana, alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação e aplicação da jurisprudência relativa ao prazo razoável em que, na falta de publicação ou notificação do ato a impugnar, o interessado deve solicitar que este lhe seja comunicado, bem como a existência de dois erros na qualificação jurídica dos factos.

23

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral, ao basear‑se em elementos errados, cometeu um erro na qualificação jurídica dos factos quanto à data em que a recorrente tomou conhecimento da existência das decisões controvertidas. Além disso, uma vez que o Tribunal Geral não indicou o motivo pelo qual a «estreita cooperação» entre o CUR e as ANR era irrelevante a este respeito, o despacho recorrido está insuficientemente fundamentado.

24

Em segundo lugar, a jurisprudência referida pelo Tribunal Geral quanto ao prazo razoável em que, na falta de publicação ou notificação do ato a impugnar, o interessado deve solicitar que este lhe seja comunicado é desprovida de pertinência e o Tribunal Geral cometeu um erro na qualificação jurídica dos factos ao considerar que a recorrente não atuou no prazo razoável para solicitar a comunicação das decisões controvertidas.

25

O CUR invoca a inadmissibilidade do primeiro e segundo fundamentos pelo facto de a recorrente apresentar os mesmos argumentos para sustentar esses fundamentos e contesta as conclusões factuais do Tribunal Geral sem que invoque qualquer desvirtuamento dos factos ou da prova.

26

O CUR alega que, em todo o caso, esses fundamentos são improcedentes. Com efeito, além do facto de o Tribunal Geral não ter cometido um erro ao declarar que a recorrente tinha tomado conhecimento da existência das decisões controvertidas através dos Comunicados do Banco de Itália n.os 585762/16 e 709489/16, o despacho recorrido está, a este respeito, suficientemente fundamentado e a recorrente não alega ter pedido a comunicação dessas decisões ou realizado diligências específicas para o efeito.

27

Por outro lado, o Tribunal Geral recordou corretamente a jurisprudência relativa ao prazo razoável em que o interessado deve solicitar a comunicação do ato a impugnar, mas não a aplicou ao caso concreto, não tendo, por conseguinte, cometido qualquer erro a esse respeito.

28

A Comissão apoia o CUR, mas, quanto ao mérito, remete para a apreciação do Tribunal Geral no que diz respeito à segunda decisão controvertida.

Apreciação do Tribunal de Justiça

29

No que respeita à admissibilidade do primeiro e segundo fundamentos, deve salientar‑se, por um lado, que a recorrente invoca argumentos autónomos em que baseia o erro de direito invocado. Por outro lado, não contesta as conclusões factuais do Tribunal Geral no que respeita às datas relevantes, mas alega, em substância, que essas datas não podiam ter sido consideradas pelo mesmo Tribunal como sendo aquelas em que tomou conhecimento da existência das decisões controvertidas para efeitos do artigo 263.o TFUE. Por conseguinte, alega dois erros cometidos pelo Tribunal Geral na qualificação jurídica dos factos, a qual configura uma questão de direito que pode ser suscitada no âmbito de um recurso de uma decisão do Tribunal Geral e que pode ser objeto da fiscalização por parte do Tribunal de Justiça (v. Acórdãos de 1 de junho de 1994, Comissão/Brazzelli Lualdi e o., C‑136/92 P, EU:C:1994:211, n.o 49; e de 23 de novembro de 2017, Bionorica e Diapharm/Comissão, C‑596/15 P e C‑597/15 P, EU:C:2017:886, n.o 55 e jurisprudência referida).

30

Daí resulta que o primeiro e segundo fundamentos são admissíveis.

31

Quanto ao mérito, importa recordar que, para declarar a inadmissibilidade manifesta de um recurso interposto ao abrigo do artigo 263.o TFUE para a anulação das decisões controvertidas, o Tribunal Geral, após ter afirmado que essas decisões não tinham sido publicadas nem notificadas à recorrente, que não era sua destinatária, declarou que, num caso como este, segundo a jurisprudência, o prazo de recurso só se inicia a partir do momento em que o interessado tomou conhecimento exato do conteúdo e dos fundamentos do ato em causa, desde que solicite o texto integral do ato num prazo razoável. Neste contexto, o Tribunal Geral considerou que a recorrente tinha tomado conhecimento da existência das decisões controvertidas, respetivamente em 3 e 30 de maio de 2016, através dos Comunicados do Banco de Itália n.os 585762/16 e 709489/16, e que não tinha solicitado que essas decisões lhe fossem comunicadas, muito menos num prazo razoável. Uma vez que a recorrente não invocou nem demonstrou a existência de um caso fortuito ou de força maior que permitisse derrogar o prazo de interposição de recurso, o Tribunal Geral entendeu que o recurso interposto em 19 de setembro de 2016 ao abrigo do artigo 263.o TFUE era manifestamente extemporâneo e devia ser julgado manifestamente inadmissível.

32

Em primeiro lugar, para determinar se o Tribunal Geral cometeu um erro na qualificação jurídica dos factos quanto às datas em que a recorrente tomou conhecimento da existência das decisões controvertidas, importa recordar que o mesmo Tribunal se baseou, nos n.os 38 e 39 do despacho recorrido, em dois elementos.

33

Assim, por um lado, o Tribunal Geral assinalou que os documentos e os questionários recebidos pela recorrente para que fornecesse os dados que permitiam calcular a sua contribuição individual para o FUR indicavam a base legal aplicável e informavam‑na de que tal contribuição foi calculada pelo CUR. Por outro lado, o Tribunal Geral fez referência aos Comunicados n.os 585762/16 e 709489/16 do Banco de Itália, levados ao conhecimento da recorrente em 3 e 30 de maio de 2016, respetivamente, que indicavam que a sua contribuição, calculada pelo CUR, se destinava ao FUR.

34

Ora, o Tribunal Geral podia, sem cometer um erro, inferir juridicamente desses comunicados, enviados à recorrente quando esta já tinha recebido e preenchido os documentos e questionários necessários para o cálculo da sua contribuição individual pelo CUR, que aquela tinha tomado conhecimento da existência das decisões controvertidas em 3 e 30 de maio de 2016, respetivamente.

35

Esta apreciação não é posta em causa pelos argumentos da recorrente.

36

Em primeiro lugar, a circunstância de a recorrente só ter tido pleno conhecimento dos fundamentos das decisões controvertidas em 8 de julho de 2016, ou seja, quando o Banco de Itália, no âmbito do processo instaurado pela recorrente no Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio), apresentou a sua contestação, à qual as referidas decisões estavam anexadas, não implica de modo algum que a recorrente desconhecesse a existência dessas decisões antes dessa data.

37

Em segundo lugar, é indiferente que o Banco de Itália, nos Comunicados n.os 585762/16 e 709489/16, não tenha indicado com precisão as datas em que as decisões controvertidas foram adotadas nem mencionado a regulamentação da União aplicável e a base legal correta. Com efeito, não só estas circunstâncias não dizem respeito à tomada de conhecimento pela recorrente da existência das decisões controvertidas como, sobretudo, não impedem que a recorrente tenha podido ter conhecimento da existência dessas decisões através dos elementos mencionados pelo Tribunal Geral nos n.os 38 e 39 do despacho recorrido.

38

Em terceiro lugar, uma vez que, no n.o 30 do despacho recorrido, o Tribunal Geral estatuiu que o CUR era o autor das decisões controvertidas sem chegar a qualquer conclusão quanto à data em que a recorrente tomou conhecimento dessas decisões, a falta de fundamentação alegada pela recorrente é desprovida de pertinência para a qualificação jurídica dos factos.

39

Daí resulta que o Tribunal Geral retirou corretamente as consequências das suas próprias conclusões de facto e não cometeu nenhum erro na qualificação jurídica dos factos ao considerar que a recorrente tinha tomado conhecimento da existência das decisões controvertidas em 3 e 30 de maio de 2016.

40

Em segundo lugar, a recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu, por um lado, um erro de direito ao interpretar e aplicar incorretamente a jurisprudência relativa ao prazo razoável em que, na falta de publicação ou notificação do ato a impugnar, o interessado deve solicitar que este lhe seja comunicado e, por outro, cometeu um erro na qualificação jurídica dos factos ao considerar que a recorrente não tinha solicitado a comunicação das decisões controvertidas num prazo razoável.

41

A este respeito, basta notar que o Tribunal Geral não baseou a inadmissibilidade do recurso de anulação no facto de a recorrente não ter solicitado a comunicação das decisões controvertidas num prazo razoável e, por conseguinte, não aplicou essa jurisprudência. Com efeito, no n.o 47 do despacho recorrido, o Tribunal Geral salientou que, após ter tomado conhecimento da existência dessas decisões, a recorrente não solicitou que lhe fossem comunicadas.

42

Daí resulta que o Tribunal Geral não podia ter cometido quaisquer erros à luz dessa jurisprudência.

43

Nessas circunstâncias, o primeiro e segundo fundamentos de recurso devem ser julgados improcedentes.

Quanto ao terceiro fundamento

Argumentos das partes

44

Com o terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral e dos seus direitos de defesa, a recorrente contesta o caráter manifesto da inadmissibilidade do seu recurso em primeira instância e acrescenta que lhe foi negado provimento sem que tivesse podido tomar posição sobre a inadmissibilidade, a qual, além disso, não tinha sido invocada pelo CUR.

45

O CUR duvida da admissibilidade deste fundamento e considera que, em todo o caso, é improcedente. A Comissão alega que o referido fundamento é inoperante.

Apreciação do Tribunal de Justiça

46

No que respeita à admissibilidade do terceiro fundamento, deve realçar‑se, por um lado, que a recorrente apresentou argumentos circunstanciados sobre o caráter não manifesto da inadmissibilidade do seu recurso em primeira instância e a violação dos seus direitos de defesa e, por outro, que a questão de saber se o Tribunal Geral violou o artigo 126.o do seu Regulamento de Processo é uma questão de direito sujeita à fiscalização do Tribunal de Justiça (v., por analogia, Acórdão de 1 de julho de 1999, Alexopoulou/Comissão, C‑155/98 P, EU:C:1999:345, n.os 9 a 15; v., neste sentido, Acórdão de 6 de junho de 2018, Apcoa Parking Holdings/EUIPO, C‑32/17 P, não publicado, EU:C:2018:396, n.os 21 a 24).

47

Daqui resulta que este fundamento é admissível.

48

Quanto ao mérito, no que diz respeito, em primeiro lugar, à alegada violação do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, importa salientar que, quando se considere suficientemente esclarecido pelos elementos dos autos, o Tribunal Geral pode decidir, a todo o tempo, por despacho fundamentado com base nessa disposição (v., neste sentido, Despacho de 29 de outubro de 2004, Ripa di Meana/Parlamento, C‑360/02 P, EU:C:2004:690, n.o 35).

49

Importa igualmente salientar que a inadmissibilidade manifesta no quadro da aplicação do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral pode ser evidente não só no sentido de que é detetada numa fase precoce do processo à luz, nomeadamente, da petição inicial mas também no sentido de que não suscita dúvidas, tendo em conta, em especial, a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça.

50

Ora, no presente caso, impõe‑se constatar que, para declarar o recurso manifestamente inadmissível, o Tribunal Geral se baseou, nos n.os 36 e 51 do despacho recorrido, em jurisprudência constante.

51

A este respeito, o argumento da recorrente de que a inadmissibilidade do recurso em primeira instância, em razão da sua extemporaneidade, não tinha caráter manifesto, na medida em que não resultou da violação do prazo de dois meses para a interposição do recurso, mas da apreciação sobre a razoabilidade do prazo em que o interessado deve solicitar a comunicação do ato impugnado, não merece acolhimento.

52

Com efeito, resulta claramente do n.o 47 do despacho recorrido que, não tendo a recorrente solicitado que as decisões controvertidas lhe fossem comunicadas, o Tribunal Geral não apreciou a razoabilidade do prazo no caso concreto.

53

Por outro lado, contrariamente ao que alega a recorrente, a circunstância de o processo ter sido instruído pelo Tribunal Geral, de este ter deferido os pedidos de intervenção e de ter determinado medidas de organização do processo e medidas de instrução não o impedia de proferir uma decisão de inadmissibilidade manifesta com base no artigo 126.o do seu Regulamento de Processo. Em especial, o recurso a essas medidas, que têm por objetivo, nomeadamente, permitir a preparação dos processos para julgamento e a respetiva tramitação, não é suscetível, só por si, de obstar à adoção de um despacho com esse fundamento (v., neste sentido, Acórdão de 19 de janeiro de 2006, AIT/Comissão, C‑547/03 P, EU:C:2006:46, n.os 28 a 30).

54

Por último, sendo a admissibilidade do recurso um fundamento de ordem pública a ser conhecido oficiosamente pelo Tribunal Geral, a prolação de um despacho nos termos do artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral não está sujeita à contestação da admissibilidade do recurso pelo recorrido. Assim, no caso em apreço, é indiferente, para apreciar o caráter manifesto da inadmissibilidade, que o CUR, recorrido no recurso interposto no Tribunal Geral, não tenha alegado a extemporaneidade do recurso (v., neste sentido, Despacho de 17 de julho de 2014, Melkveebedrijf Overenk e o./Comissão, C‑643/13 P, não publicado, EU:C:2014:2118, n.o 38).

55

Consequentemente, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao considerar o recurso manifestamente inadmissível, na aceção do artigo 126.o do seu Regulamento de Processo.

56

Em segundo lugar, no que respeita à alegada violação dos direitos de defesa da recorrente, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, a aplicação do procedimento previsto no artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, em si mesma, não lesa o direito a um processo judicial regular e efetivo, uma vez que essa disposição só é aplicável aos processos em que o recurso esteja manifestamente votado ao insucesso (v., por analogia, Acórdão de 19 de fevereiro de 2009, Gorostiaga Atxalandabaso/Parlamento, C‑308/07 P, EU:C:2009:103, n.o 36 e jurisprudência referida).

57

Ora, resulta dos n.os 43 e 55 do presente acórdão que o Tribunal Geral não cometeu qualquer erro ao concluir pela inadmissibilidade manifesta do recurso. Por conseguinte, a argumentação da recorrente segundo a qual, por um lado, a prolação de um despacho com base no artigo 126.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral resultou numa violação dos seus direitos de defesa e, por outro, o artigo 129.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral constituía um fundamento jurídico mais adequado no caso em apreço, na medida em que garante o respeito pelos direitos de defesa, não merece acolhimento.

58

Em face das considerações precedentes, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao quarto fundamento

Argumentos das partes

59

Com o seu quarto fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao julgar inadmissível o recurso baseado no artigo 277.o TFUE pelo facto de o recurso interposto com base no artigo 263.o TFUE ser manifestamente inadmissível.

60

O CUR, acompanhado pela Comissão, contesta o mérito deste fundamento.

Apreciação do Tribunal de Justiça

61

Após ter recordado que a possibilidade de invocar a ilegalidade de um ato de alcance geral nos termos do artigo 277.o TFUE não constitui um direito de ação autónomo e não pode ser exercida na falta de um direito de ação principal, o Tribunal Geral considerou que o pedido formulado pela recorrente para a declaração de ilegalidade, total ou parcial, do Regulamento Delegado 2015/63 era manifestamente inadmissível na falta de um direito de ação autónomo para invocar a ilegalidade de um ato de alcance geral.

62

Além disso, o Tribunal Geral recordou que, uma vez que tal pedido tinha implícita, mas necessariamente por objetivo obter uma declaração de ilegalidade no contexto de um pedido de anulação das decisões controvertidas, a inadmissibilidade manifesta do recurso de anulação, na medida em que era dirigido contra essas decisões, conduzia à inadmissibilidade da exceção de ilegalidade.

63

No âmbito do quarto fundamento, a recorrente limita‑se a alegar, remetendo para os argumentos apresentados em apoio dos seus dois primeiros fundamentos, que o Tribunal Geral cometeu um erro ao concluir pela inadmissibilidade do pedido baseado no artigo 263.o TFUE. Conclui desse facto que o Tribunal Geral se baseou numa premissa errada ao julgar manifestamente inadmissível o pedido de declaração de ilegalidade, total ou parcial, do Regulamento Delegado 2015/63, apresentado ao abrigo do artigo 277.o TFUE.

64

Todavia, resulta da improcedência dos três primeiros fundamentos do recurso que a conclusão do Tribunal Geral segundo a qual o recurso baseado no artigo 263.o TFUE era manifestamente inadmissível não é posta em causa. Assim, o Tribunal Geral considerou corretamente, em conformidade com jurisprudência constante, que a inadmissibilidade do recurso principal gerava a inadmissibilidade da exceção de ilegalidade baseada no artigo 277.o TFUE (v. Despachos de 28 de junho de 1993, Donatab e o./Comissão, C‑64/93, EU:C:1993:266, n.os 19 e 20, e de 8 de dezembro de 2006, Polyelectrolyte Producers Group/Comissão e Conselho, C‑368/05 P, não publicado, EU:C:2006:771, n.o 72).

65

Por conseguinte, o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto ao quinto fundamento

Argumentos das partes

66

A título subsidiário e para o caso de o Tribunal de Justiça negar provimento ao recurso, a recorrente pede a anulação do despacho recorrido na parte em que o Tribunal Geral a condenou a suportar as suas próprias despesas e as despesas do CUR. Com efeito, tendo a atuação do CUR contribuído para prolongar a instrução do processo no Tribunal Geral e aumentar as despesas, esse Tribunal deveria ter feito uso das possibilidades previstas no artigo 135.o do seu Regulamento de Processo.

67

O CUR e a Comissão alegam que este fundamento é inadmissível. O CUR acrescenta que, em todo o caso, é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

68

Segundo jurisprudência constante, no caso de os demais fundamentos do recurso terem sido julgados improcedentes, os pedidos relativos à alegada irregularidade da decisão do Tribunal Geral sobre as despesas devem ser julgados inadmissíveis, nos termos do artigo 58.o, segundo parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, nos termos do qual não pode ser interposto recurso que tenha por único fundamento o montante das despesas ou a determinação da parte que as deve suportar (Acórdão de 30 de janeiro de 2020, České dráhy/Comissão, C‑538/18 P e C‑539/18 P, não publicado, EU:C:2020:53, n.os 85, 86 e jurisprudência referida).

69

No caso vertente, uma vez que os quatro primeiros fundamentos de recurso são improcedentes, o quinto e último fundamento, relativo à repartição das despesas, deve, portanto, ser declarado inadmissível.

70

Decorre de todas as considerações precedentes que deve ser negado provimento ao presente recurso na íntegra.

Quanto às despesas

71

Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas. Nos termos do disposto no artigo 138.o, n.o 1, do mesmo regulamento, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, desse regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

72

Uma vez que o CUR pediu a condenação da recorrente nas despesas e que esta ficou vencida nos seus fundamentos, a recorrente deve ser condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pelo CUR.

73

Em conformidade com o artigo 140.o, n.o 1, do referido regulamento, segundo o qual os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas, a República Italiana e a Comissão suportarão as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Credito Fondiario SpA é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pelo Conselho Único de Resolução.

 

3)

A República Italiana e a Comissão Europeia suportam as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.