CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

EVGENI TANCHEV

apresentadas em 16 de julho de 2020 ( 1 )

Processo C‑147/19

Atresmedia Corporación de Medios de Comunicación S.A.

contra

Asociación de Gestión de Derechos Intelectuales (AGEDI),

Artistas e Intérpretes o Ejecutantes, Sociedad de Gestión de España (AIE)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha)]

«Pedido de decisão prejudicial — Direito de aluguer, direito de comodato e direitos conexos ao direito de autor em matéria de propriedade intelectual — Comunicação ao público de fonogramas publicados com fins comerciais — Pedido de indemnização —Remuneração equitativa e única»

1. 

O presente pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) diz respeito à interpretação do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 2006/115 ( 2 ) e do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100 ( 3 ), com uma redação semelhante (a seguir, conjuntamente, «Diretiva relativa ao aluguer»). Mais concretamente, o órgão jurisdicional de reenvio procura orientação sobre o âmbito de aplicação desta disposição no contexto da «comunicação ao público» de obras audiovisuais nas quais foram incorporados fonogramas publicados preexistentes.

2. 

O processo perante o órgão jurisdicional de reenvio diz respeito a pedidos de remuneração apresentados por duas sociedades de gestão coletiva para intérpretes e produtores de fonogramas em Espanha, nos termos da legislação espanhola de transposição da Diretiva relativa ao aluguer, pelo que alegam ser a utilização de fonogramas por uma empresa de televisão para comunicação ao público. A empresa de televisão é de opinião que as «comunicações ao público» em causa não são comunicações de «fonogramas» ou «reproduções» dos mesmos, mas «obras audiovisuais» e que a remuneração exigida não é devida para este tipo de conteúdo, mesmo que as obras audiovisuais incorporem fonogramas preexistentes que tenham sido publicados para fins comerciais como (parte das) suas bandas sonoras.

3. 

A resposta às questões do órgão jurisdicional de reenvio irá necessariamente implicar uma análise não apenas das diretivas da União relevantes, mas também de disposições de direito internacional, mais precisamente a Convenção Internacional para a Proteção dos Artistas Intérpretes ou Executantes, dos Produtores de Fonogramas e dos Organismos de Radiodifusão (a seguir «Convenção de Roma») ( 4 ) e o Tratado da Organização Mundial da Propriedade Intelectual sobre Prestações e Fonogramas (a seguir «Tratado OMPI») ( 5 ).

I. Quadro jurídico

A.   Convenção de Roma

4.

A Convenção de Roma foi aprovada em Roma em 26 de outubro de 1961.

5.

Apesar de a Convenção de Roma não fazer propriamente parte da ordem jurídica da União Europeia, tem, no entanto, efeitos indiretos na mesma ( 6 ).

6.

O artigo 3.o da Convenção de Roma define diversos termos que estão igualmente definidos, embora com algumas variações, no Tratado OMPI, e que são também utilizados na Diretiva relativa ao aluguer. Para os fins da Convenção, o artigo define os termos enumerados infra da seguinte forma:

«[…]

b)

“Fonograma”, toda a fixação exclusivamente sonora dos sons de uma execução ou de outros sons, num suporte material;

[…]

d)

“Publicação”, o facto de pôr à disposição do público exemplares de um fonograma em quantidade suficiente;

e)

“Reprodução”, a realização da cópia ou de várias cópias de uma fixação;

[…]»

7.

O artigo 7.o, n.o 1, da Convenção de Roma estabelece:

«A proteção aos artistas intérpretes ou executantes prevista na presente Convenção compreenderá a faculdade de impedir:

[…]

c)

A reprodução sem seu consentimento de uma fixação da sua execução:

i)

Se a primeira fixação foi feita sem seu consentimento;

ii)

Se a reprodução for feita para fins diferentes daqueles para os quais foi dado o consentimento;

iii)

Quando a primeira fixação, feita em virtude das disposições do artigo 15.o da presente Convenção, for reproduzida para fins diferentes dos previstos nesse artigo.»

8.

O artigo 12.o prevê que «[q]uando um fonograma publicado com fins comerciais ou uma reprodução desse fonograma forem utilizados diretamente pela radiodifusão ou para qualquer comunicação ao público, o utilizador pagará uma remuneração equitativa e única aos artistas intérpretes ou executantes ou aos produtores de fonogramas ou aos dois». O conceito de «remuneração equitativa e única» é recorrente tanto no Tratado OMPI como na Diretiva relativa ao aluguer.

9.

O artigo 19.o da Convenção de Roma tem a seguinte redação:

«Não obstante quaisquer outras disposições da presente Convenção, não será aplicável o artigo 7.o quando um artista intérprete ou executante haja consentido na inclusão da sua execução numa fixação de imagens ou de imagens e sons.»

B.   Tratado OMPI

10.

Em 20 de dezembro de 1996, foi adotado em Genebra o Tratado OMPI. A Decisão do Conselho 2000/278/CE de 16 de março de 2000 ( 7 ), «aprovou» o Tratado OMPI e autorizou o depósito dos instrumentos de celebração. O Tratado OMPI foi ratificado pela União Europeia em 14 de dezembro de 2009 e entrou em vigor no que diz respeito à União Europeia em 14 de março de 2010. Por conseguinte, o Tratado OMPI integra a ordem jurídica da União Europeia.

11.

O artigo 2.o do Tratado OMPI estabelece:

«Para efeitos do presente Tratado, entende‑se por:

[…]

b)

“Fonograma” a fixação dos sons de uma prestação ou de outros sons, ou de uma representação de sons, com exceção da fixação incorporada numa obra cinematográfica ou outra obra audiovisual;

c)

“Fixação” a corporização de sons, ou de representação de sons, a partir da qual estes possam ser apreendidos, reproduzidos ou comunicados por meio de um dispositivo;

[…]

g)

“Comunicação ao público” de uma prestação ou de um fonograma a difusão ao público por qualquer meio, com exceção da emissão de radiodifusão, de sons de uma prestação, ou dos sons ou das representações de sons fixados num fonograma. Para efeitos do disposto no artigo 15.o, a “comunicação ao público” inclui a operação de tornar os sons ou representações de sons fixados num fonograma audíveis para o público.»

12.

A Conferência Diplomática ( 8 ) adotou diversas «declarações acordadas» relativas à OMPI ( 9 ). A declaração acordada relativa ao artigo 2.o, alínea b), tem a seguinte redação:

«Considera‑se que a definição de fonograma constante da alínea b) do artigo 2.o não sugere que os direitos sobre o fonograma sejam de algum modo afetados pela sua incorporação numa obra cinematográfica ou noutra obra audiovisual.»

13.

O artigo 15.o do Tratado OMPI, com a epígrafe «Direito a remuneração pela radiodifusão e comunicação ao público», tem a seguinte redação:

«1)   Os artistas intérpretes ou executantes e os produtores de fonogramas gozam do direito a uma remuneração equitativa e única pela utilização direta ou indireta de fonogramas publicados com fins comerciais para radiodifusão ou para qualquer comunicação ao público.

2)   As Partes Contratantes podem determinar na sua legislação nacional que a remuneração equitativa e única seja reclamada ao utilizador pelo artista intérprete ou executante ou pelo produtor de um fonograma, ou por ambos. As Partes Contratantes podem adotar legislação nacional que, na falta de acordo entre o artista intérprete ou executante e o produtor de um fonograma, determine as condições de repartição da remuneração equitativa e única entre os artistas intérpretes ou executantes e os produtores de fonogramas.

[…]»

14.

A Conferência de 20 de dezembro de 1996 adotou a «Resolução relativa às Prestações Audiovisuais», na qual as delegações participantes lamentam que a «[OMPI] não cubra os direitos dos artistas intérpretes ou executantes nas fixações audiovisuais da sua prestação» e pedem que sejam tomadas medidas preparatórias com vista à adoção de um protocolo relativo às apresentações audiovisuais o mais tardar em 1998. Nenhum protocolo foi adotado posteriormente e a questão não foi resolvida no âmbito do Tratado OMPI, tendo‑o sido finalmente num outro tratado, o Tratado de Pequim sobre as interpretações e execuções audiovisuais, adotado em 24 de junho de 2012.

C.   Diretiva 92/100

15.

A Diretiva 92/100 foi adotada em 19 de novembro de 1992 e, depois de diversas alterações a diferentes disposições, foi substituída pela Diretiva 2006/115 que codificou a referida diretiva na sequência dessas alterações.

16.

O artigo 7.o da Diretiva 92/100, com a epígrafe «Direito de reprodução», na redação original estabelecia:

«1.   Os Estados‑Membros deverão prever o direito exclusivo de permitir ou proibir a reprodução direta ou indireta, no que se refere:

aos artistas intérpretes ou executantes, das fixações das suas prestações,

aos produtores de fonogramas, dos seus fonogramas,

[…]

2.   O direito de reprodução referido no n.o 1 pode ser transmitido, cedido ou ser objeto de licenças contratuais.»

17.

O artigo 8.o da Diretiva 92/100 permaneceu, em substância, inalterado desde a sua adoção e é reproduzido no n.o 20 das presentes conclusões conforme figura na Diretiva 2006/115.

D.   Diretiva 2001/29

18.

O artigo 7.o da Diretiva 92/100 foi alterado e substituído pelo artigo 2.o, com a epígrafe «Direito de reprodução», da Diretiva 2001/29/CE ( 10 ) e dispõe:

«Os Estados‑Membros devem prever que o direito exclusivo de autorização ou proibição de reproduções, diretas ou indiretas, temporárias ou permanentes, por quaisquer meios e sob qualquer forma, no todo ou em parte, cabe:

[…]

b)

Aos artistas intérpretes ou executantes, para as fixações das suas prestações;

c)

Aos produtores de fonogramas, para os seus fonogramas;

[…]»

E.   Diretiva 2006/115

19.

A Diretiva 2006/115 codificou a Diretiva 92/100, conforme alterada, depois de esta ter sido objeto de várias modificações. Embora tenham sido efetuadas alterações, nomeadamente ao artigo 7.o da Diretiva 92/100, que foi suprimido e substituído pelo artigo 2.o da Diretiva 2001/29, o artigo 8.o permaneceu, em substância, inalterado desde a sua adoção na Diretiva 92/100.

20.

O artigo 8.o, com a epígrafe «Radiodifusão e comunicação ao público», prevê:

«[…]

2.   Os Estados‑Membros devem prever um direito que garanta, não só o pagamento de uma remuneração equitativa única pelos utilizadores que usem fonogramas publicados com fins comerciais ou suas reproduções em emissões radiodifundidas por ondas radioelétricas ou em qualquer tipo de comunicações ao público, mas também a partilha de tal remuneração pelos artistas intérpretes ou executantes e pelos produtores dos fonogramas assim utilizados. Na falta de acordo entre os artistas intérpretes ou executantes e os produtores dos fonogramas, os Estados‑Membros podem determinar em que termos é por eles repartida a referida remuneração.

[…]»

F.   Direito espanhol

21.

De acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, o artigo 108.o, n.o 4, e o artigo 116.o, n.o 2, do Texto Refundido de la Ley de Propiedad Intelectual (Texto Reformulado da Lei da Propriedade Intelectual) têm uma redação idêntica. A primeira das referidas disposições diz respeito aos direitos dos artistas intérpretes e executantes; a segunda aos direitos dos produtores de fonogramas. O texto destas duas disposições, conforme transmitido pelo órgão jurisdicional de reenvio, dispõe:

«Os utilizadores de um fonograma publicado com fins comerciais, ou de uma reprodução do referido fonograma que se utilize para qualquer forma de comunicação ao público, têm que pagar uma remuneração equitativa e única aos artistas intérpretes ou executantes e aos produtores de fonogramas, entre os quais a remuneração é repartida. Na falta de acordo entre eles relativamente à repartição da indemnização, esta é feita em partes iguais […]»

22.

O artigo 114.o, n.o 1, da mesma lei estabelece a seguinte definição:

«Entende‑se por fonograma toda a fixação exclusivamente sonora da execução de uma obra ou de outros sons.»

II. Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

23.

O litígio no processo principal diz respeito a ações intentadas pela Asociación de Gestión de Derechos intellectuales (a seguir «AGEDI») e pela Artistas Intérpretes o Ejecutantes, Sociedad de Gestión de España (a seguir «AIE») contra a Atresmedia Corporación de Medios de Comunicación, SA (a seguir «Atresmedia»), com vista ao pagamento de uma indemnização pelos atos de comunicação ao público ( 11 ) de fonogramas publicados com fins comerciais (ou de reproduções dos mesmos) realizados entre 1 de junho de 2003 e 31 de dezembro de 2009 através dos canais de televisão explorados pela Atresmedia e pela reprodução não autorizada de fonogramas efetuada para os referidos atos de comunicação ao público.

24.

Em 29 de julho de 2010, a AGEDI e a AIE intentaram uma ação contra a Atresmedia no Juzgado Mercantil de Madrid (Tribunal de Comércio de Madrid, Espanha) com vista ao pagamento de uma indemnização pelos supramencionados atos de comunicação e reprodução. O Juzgado Mercantil proferiu uma sentença na qual declarou não ser devida nenhuma indemnização pelos atos de comunicação ao público de fonogramas incorporados ou «sincronizados» em obras audiovisuais nem pela reprodução «instrumental» dos mesmos. O referido órgão jurisdicional declarou que a sincronização do fonograma preexistente numa obra audiovisual através da respetiva licença remunerada implica o surgimento de uma obra derivada e autónoma e que os direitos de remuneração por comunicação ao público e reprodução instrumental de um fonograma (a que o Juzgado Mercantil se refere como «obra» no pedido de decisão prejudicial) «caducam» com o pagamento da sincronização […] O referido órgão jurisdicional condenou a Atresmedia no pagamento da indemnização com base noutros fundamentos.

25.

A AGEDI e a AIE recorreram da sentença do Juzgado Mercantil perante a Audiencia Provincial de Madrid (Audiência Provincial de Madrid, Espanha), e pediram também a condenação da Atresmedia no pagamento de uma indemnização relativa aos atos de comunicação ao público de fonogramas «sincronizados» nas obras audiovisuais comunicadas ao público nas cadeias de televisão da Atresmedia. A Audiencia Provincial deu provimento ao recurso e declarou na sua decisão:

«O fonograma não é uma obra […] [É] um simples suporte que contém a fixação de [uma prestação em concreto]. […] Por conseguinte, se o fonograma não é uma obra, não é possível realizar sobre ele nenhuma operação que implique um fenómeno de transformação em sentido técnico‑jurídico e, concomitantemente, também não é possível que o fonograma dê origem a uma obra derivada […] O certo é que as qualidades dos sons fixados no fonograma são objetivamente as mesmas antes e depois da sincronização […] A [fixação sonora contida na obra audiovisual] só pode ser considerada, enquanto mera réplica dos sons fixados no fonograma sincronizado, uma reprodução desse mesmo fonograma. Reprodução de cuja comunicação ao público, tal como da do fonograma propriamente dito, decorre o direito de remuneração equitativa previsto [nas disposições espanholas relevantes].»

26.

Com base neste raciocínio, a Audiencia Provincial revogou a sentença do Juzgado Mercantil e deu provimento ao recurso da AGEDI e da AIE na sua totalidade.

27.

A Atresmedia interpôs recurso de cassação perante o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha), que tem exclusivamente por objeto a questão de saber se a comunicação ao público de obras audiovisuais efetuada pela Atresmedia nos seus canais de televisão confere aos artistas intérpretes e executantes e aos produtores de fonogramas um direito a remuneração equitativa previsto nas disposições do direito espanhol que transpõem o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, concretamente os artigos 108.o, n.o 4, e 116.o, n.o 2, da Lei da propriedade intelectual.

28.

Nestas circunstâncias, o Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O conceito de reproduções de “fonogramas publicados com fins comerciais” decorrente do artigo 8.o, n.o 2, das Diretivas 92/100 e 2006/115, abrange as reproduções de fonogramas publicados com fins comerciais numa gravação audiovisual que incorpore a fixação de uma obra audiovisual?

2)

Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, está obrigada ao pagamento da remuneração equitativa e única prevista no artigo 8.o, n.o 2, das referidas diretivas, uma entidade de radiodifusão televisiva que utilize, para qualquer tipo de comunicação ao público, uma gravação audiovisual que incorpore a fixação de uma obra cinematográfica ou outra obra audiovisual em que tenha sido reproduzido um fonograma publicado com fins comerciais?»

29.

Foram apresentadas observações escritas pela Atresmedia, pela AGEDI, pela AIE, pelo Governo espanhol e pela Comissão Europeia. Na audiência de 30 de janeiro de 2020, todas as partes referidas apresentaram observações orais.

III. Análise

A.   Observações preliminares

30.

A primeira das duas questões prejudiciais apresentadas ao Tribunal de Justiça no presente processo procura esclarecer o conceito de «reproduções de ( 12 ) fonogramas publicados com fins comerciais» conforme utilizado no artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer. No pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio coloca esta questão em relação ao processo de «sincronização» que tem lugar no momento da criação da obra audiovisual. Não parece que a Atresmedia participe neste processo na sua qualidade de transmissor de sinais de televisão.

31.

Assim estruturada, a questão torna‑se numa questão relacionada com o ato de reprodução; no entanto, o artigo 8.o, n.o 2, diz respeito ao ato de utilização do objeto: «um fonograma […] ou as suas reproduções»«em qualquer tipo de comunicações ao público». Nos termos da legislação atualmente em vigor, o artigo 2.o (Direito de reprodução) da Diretiva 2001/29 regulamenta atos de reprodução. Esta interpretação da primeira questão é apoiada tanto pelo resumo da posição da Atresmedia ( 13 ) como pelo resumo dos argumentos apresentados pela AGEDI e pela AIE ( 14 ).

32.

Com a sua segunda questão, lida em conjugação com a primeira, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se um canal de televisão que, enquanto utilizador, comunica ao público uma obra audiovisual que incorpora um fonograma publicado com fins comerciais, ou a sua reprodução, está obrigado ao pagamento da remuneração equitativa e única prevista no artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer. Ficou claro no pedido de decisão prejudicial que a «sincronização» dos fonogramas em causa foi feita após ter sido dada a devida autorização ( 15 ). Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que reformule as questões prejudiciais e faculte ao órgão prejudicial de reenvio orientação sobre se os conceitos de «fonograma» ou de «reprodução de um fonograma», constantes do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, abrangem uma obra audiovisual na qual foi incorporado um fonograma — após ter sido obtida a autorização do ou dos titulares de direitos pertinentes sobre o fonograma conforme exigido pelo artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29 — e sobre se o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer exige aos Estados‑Membros que estabeleçam que o utilizador deve pagar uma «remuneração equitativa e única» ao ou aos titulares de direitos sobre o fonograma em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal.

33.

Antes de analisar a questão da natureza do conteúdo audiovisual que incorpora fonogramas publicados anteriormente, analisarei primeiro a da natureza do ato de «sincronização» realizado pelo produtor do conteúdo audiovisual.

34.

No processo Pelham e o. ( 16 ), o Tribunal de Justiça declarou que, para efeitos do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29, um direito de reprodução de um fonograma de um produtor do mesmo lhe permite opor‑se à utilização, por um terceiro, de uma amostra sonora do fonograma, ainda que com uma duração muito reduzida, para efeitos da inclusão dessa amostra noutro fonograma, exceto se essa amostra neste tiver sido incluída sob forma alterada e não reconhecível na audição, precisamente porque essa amostra é um ato de «reprodução» em parte do fonograma do qual a amostra foi retirada. Para efeitos do direito de reprodução agora previsto no artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29, deve, portanto, resultar da jurisprudência constante que a sincronização (que, em termos práticos, deve sempre implicar uma reprodução reconhecível do fonograma) é (um ato de) reprodução.

35.

Apesar de este ato de «sincronização» ser de facto uma «reprodução» no sentido do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29 e, por conseguinte, exigir o consentimento e autorização ( 17 ) do titular do direito relevante, ou seja, o produtor do fonograma, tal não implica necessariamente que o resultado deste ato de reprodução do fonograma num novo conjunto mais vasto deva ser considerado uma «reprodução de um fonograma» para os efeitos do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer.

B.   Âmbito de aplicação do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer

1. Interpretação dos termos da Diretiva 92/100 — antecedentes legislativos

36.

A Diretiva 92/100 não define muitos dos termos fundamentais nela contidos. Considerou‑se necessário definir os termos «aluguer», «comodato» e «filme» ( 18 ), mas a maior parte dos termos — como, por exemplo, «reprodução» ou «fonograma» — não foram definidos de forma explícita na diretiva. Ficou claro na Exposição de Motivos da proposta original da Diretiva 92/100 ( 19 ) que a omissão de definições detalhadas dos termos empregues foi uma escolha deliberada da Comissão e que a intenção foi que os termos da diretiva fossem interpretados em conformidade com a Convenção de Berna ( 20 ) e com a Convenção de Roma ( 21 ).

37.

Conforme descrito na proposta alterada da Diretiva 92/100 ( 22 ), a proposta original estava limitada a «formas de pirataria associadas à exploração material», e — em linha com o Livro Verde relativo aos direitos de autor ( 23 ) — não incluía qualquer proteção dos direitos conexos semelhante à que seria por fim adotada no artigo 8.o da referida diretiva. A proposta alterada seguiu o parecer do Parlamento Europeu relativamente ao que acabou por ser o artigo 8.o da Diretiva relativa ao aluguer e adotou a proposta do Parlamento Europeu com ligeiras alterações a nível da redação, como artigo 6.o‑A da proposta alterada. De acordo com a Exposição de Motivos, o artigo 6.o‑A observa, em grande medida, as disposições mínimas da Convenção de Roma, deixando aos Estados‑Membros a manutenção ou introdução de uma proteção mais ampla ( 24 ).

38.

Na breve secção da Exposição de Motivos relativa ao artigo 6.o‑A, n.o 2 (que se tornou artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer), declara‑se que a disposição «já se encontra prevista, em princípio, na legislação da maioria dos Estados‑Membros; constitui, deste modo, uma disposição mínima». A Exposição de Motivos não dá exemplos dessas legislações dos Estados‑Membros e a proposta original, apesar de incluir uma extensa discussão sobre a situação jurídica dos Estados‑Membros na época em relação tanto aos direitos de autor como aos direitos conexos, não incluía uma disposição semelhante ao artigo 8.o e não parece analisar disposições comparáveis na legislação dos Estados‑Membros. Tendo em conta o caráter em geral pouco desenvolvido dos direitos conexos na época, tanto internacionalmente como nos Estados‑Membros, parece improvável que as leis da maioria dos Estados‑Membros, em 1992, pudessem ter proporcionado o tipo de direitos económicos relativos à «comunicação ao público» de obras audiovisuais para produtores e artistas intérpretes e executantes de fonogramas, cujas gravações fossem incluídas nessas obras audiovisuais, que a AGEDI e a AIE reivindicam. Parece igualmente improvável que a Comissão, ao elaborar a nova disposição com base no parecer do Parlamento Europeu, tivesse a intenção de criar esses direitos.

39.

O artigo 6.o‑A, n.o 2, da proposta alterada foi por fim adotado como artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100, apenas com pequenas e pouco importantes alterações de redação. Por conseguinte, os antecedentes legislativos da disposição demonstram claramente que o âmbito da proteção oferecida pelo artigo 8.o, n.o 2, não pretendia expandir radicalmente a proteção já existente à data na maioria dos Estados‑Membros. A declaração no décimo considerando e as declarações explícitas na Exposição de Motivos da proposta original, bem como os comentários relativos ao artigo 6.o‑A na Exposição de Motivos da proposta alterada, confirmam que os termos utilizados no artigo 8.o, n.o 2, devem ser interpretados à luz dos termos análogos definidos na Convenção de Roma.

2. Convenção de Roma

40.

O artigo 12.o da Convenção de Roma, com a epígrafe «Utilização secundária de fonogramas», estabelece que «[q]uando um fonograma publicado com fins comerciais ou uma reprodução desse fonograma forem utilizados diretamente pela radiodifusão ou para qualquer comunicação ao público, o utilizador pagará uma remuneração equitativa e única aos artistas intérpretes ou executantes ou aos produtores de fonogramas ou aos dois».

41.

Foi esta disposição que inspirou o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer. Embora o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer seja diferente, em alguns aspetos, do artigo 12.o da Convenção de Roma [a diretiva não prevê reservas análogas às permitidas nos termos do artigo 16.o, n.o 1, alínea a), da Convenção de Roma, exige que seja paga a remuneração equitativa e única tanto aos produtores como aos artistas intérpretes e executantes de fonogramas ( 25 ) e abrange a utilização direta e indireta], as partes mais relevantes da disposição para efeitos do presente processo («um fonograma publicado com fins comerciais, ou a reprodução desse fonograma») têm uma redação idêntica na Convenção e na diretiva. O artigo 12.o posteriormente constituiu a base para o artigo 15.o da OMPI, que será discutido na secção 3. «Tratado OMPI»infra.

42.

Para efeitos da Convenção de Roma (e, assim, presumivelmente, para efeitos da Diretiva 92/100), o termo «fonograma» é definido no artigo 3.o, alínea b), da Convenção como «toda a fixação exclusivamente sonora dos sons de uma execução ou de outros sons, num suporte material». O Guia da Convenção de Roma e da Convenção de Fonogramas ( 26 ) indica expressamente que «[a] fixação deve ser exclusivamente sonora [para se qualificar como um fonograma]. A fixação de imagens (por exemplo, cinema) ou de imagens e sons (por exemplo, televisão) é […] excluída».

43.

Com base nesta definição, qualquer fixação audiovisual parece estar excluída do termo «fonograma» conforme utilizado no artigo 12.o da Convenção de Roma e, presumivelmente, do termo «fonograma» conforme utilizado no artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100. Consequentemente, com base nesta interpretação, nem o artigo 12.o da Convenção de Roma, nem o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100 exigem o pagamento de uma remuneração equitativa e única para a comunicação ao público de fixações audiovisuais, a menos que a fixação seja uma «reprodução de [um] fonograma» publicado com fins comerciais.

44.

O artigo 3.o, alínea e), da Convenção de Roma define «reprodução» como «a realização da cópia ou de várias cópias de uma fixação». No contexto da Convenção de Roma de 1961 e do desenvolvimento tecnológico da época, uma «cópia» era considerada um objeto material ( 27 ). Embora uma reprodução não precise de ser uma cópia idêntica e individual da totalidade do conteúdo copiado nos termos da Convenção de Roma, qualquer interpretação do termo que expanda o conceito de reprodução do fonograma para algo que não é em si um fonograma iria contra o regime e a lógica da Convenção, bem como do significado comum dado às expressões reprodução e cópia.

45.

Por conseguinte, sou de opinião que uma interpretação do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, à luz das disposições da Convenção de Roma apoia firmemente a conclusão de que a referida disposição não obriga os Estados‑Membros a conceder um direito a uma remuneração equitativa pela comunicação ao público de uma obra audiovisual na qual foi incorporado um fonograma (ou partes do mesmo) publicado com fins comerciais.

3. Tratado OMPI

46.

O Tratado OMPI foi assinado pela Comunidade em 20 de dezembro de 1996 e «aprovado» pela Decisão 2000/278. Foi ratificado pela União em 14 de dezembro de 2009 e entrou em vigor em relação à União Europeia em 14 de março de 2010.

47.

O Tribunal de Justiça já abordou a questão da aplicabilidade do Tratado OMPI na ordem jurídica da União Europeia. No Acórdão SCF ( 28 ), considerou que o Tratado OMPI «vincula as instituições da União e os Estados‑Membros» uma vez que foi assinado pela União Europeia e aprovado pela Decisão 2000/278. Como tal, as disposições do Tratado OMPI fazem parte integrante do seu ordenamento jurídico, pelo que são aplicáveis na União Europeia ( 29 ).

48.

Em conformidade com o artigo 1.o, n.o 1, do Tratado OMPI, nenhuma das disposições do Tratado implica a derrogação das obrigações que vinculam as Partes Contratantes entre si ao abrigo da Convenção de Roma. No Acórdão SCF, com esta base, o Tribunal de Justiça considerou que a União Europeia, embora não seja parte contratante na Convenção de Roma, está obrigada «a não entravar as obrigações que para os Estados‑Membros decorrem dessa Convenção» e que, consequentemente, a Convenção de Roma produz efeitos indiretos na União ( 30 ). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça não mencionou os efeitos da Convenção de Roma quanto à aplicação e conteúdo da Diretiva relativa ao aluguer através da utilização de termos efetivamente definidos por referência a essa convenção, conforme descrito supra no n.o 36 e seguintes das presentes Conclusões relativamente aos antecedentes legislativos da diretiva.

49.

O artigo 2.o do Tratado OMPI prevê definições de diversos termos fundamentais. Assim, o termo «fonograma» é definido como «a fixação dos sons de uma prestação ou de outros sons, ou de uma representação de sons, com exceção da fixação incorporada numa obra cinematográfica ou outra obra audiovisual». Esta definição baseia‑se no conceito de «fonograma», conforme definido para efeitos da Convenção de Roma, e desenvolve‑o de duas maneiras. Como reflexo dos desenvolvimentos na tecnologia da música, a definição do Tratado OMPI também abrange «representaç[ões] de sons — por exemplo, gravações de sons sintéticos, como sintetizadores, que nunca foram gerados como verdadeiros sons antes da fixação.

50.

Além disso, a definição de «fonograma» para efeitos do Tratado OMPI também abrange as fixações de sons ou representações de sons incorporadas numa fixação audiovisual que não é qualificada de «obra» para efeitos de direitos de autor. Esta é uma alteração substancial.

51.

A declaração acordada, relativamente ao artigo 2.o, alínea b), também declara que «a definição de fonograma […] não sugere que os direitos do fonograma sejam de algum modo afetados pela sua ( 31 ) incorporação numa obra cinematográfica ou outra obra audiovisual».

52.

A AGEDI e a AIE alegaram que esta declaração deve ser entendida no sentido de que os direitos dos titulares dos fonogramas continuam a aplicar‑se depois da incorporação do fonograma numa obra audiovisual como se a obra audiovisual fosse (também) um fonograma. Esta argumentação e interpretação da declaração acordada não são, na minha opinião, corretas.

53.

A lógica e o regime dos artigos 2.o, alínea b), e 15.o do Tratado OMPI, bem como as negociações que deram origem à redação final destas disposições, não sustentam essa interpretação ou a ideia, contrária ao senso comum, de que um fonograma que faz parte de uma obra audiovisual, é também, ao mesmo tempo e depois de incorporado, um «fonograma».

54.

Como explica o «Guia dos tratados de direitos de autor e direitos conexos administrados pela OMPI» ( 32 ), um documento interpretativo elaborado pela OMPI que, sem ter força jurídica obrigatória, auxilia o Tribunal de Justiça na interpretação desta Convenção ( 33 ), a declaração acordada relativa ao artigo 2.o, alínea b), destinava‑se a reafirmar que os fonogramas só podem ser utilizados em obras audiovisuais com base em acordos contratuais adequados, tendo devidamente em conta os direitos dos produtores de fonogramas e que, se os fonogramas forem utilizados novamente, independentemente da obra audiovisual, devem (de novo) ser considerados como fonogramas, o que implica que o fonograma incorporado na obra audiovisual perde o seu caráter como fonograma enquanto faz parte do todo audiovisual (e que, em conformidade com a declaração acordada, recupera o estatuto de fonograma se for de novo separado do todo audiovisual) ( 34 ). V. também a discussão no Comité Principal I da Conferência Diplomática, que esclareceu que as bandas sonoras de um filme, quando emitidas como uma gravação de som, devem ser consideradas fonogramas ( 35 ).

55.

Este ponto de vista encontra igualmente suporte na literatura. V., por exemplo, The WIPO Treaties 1996, p. 258, primeira e segunda parte do número 35, no que diz respeito ao artigo 2.o do Tratado OMPI, onde se explica: «[A] exclusão da definição [como «fonograma»] aplica‑se apenas quando a banda sonora aparece em conjunto com, ou, de outro modo, associada à banda de imagem […] É irrelevante se a banda sonora foi inicialmente concebida para ser explorada […] como um fonograma […] O mesmo é verdade em relação ao tempo de fixação: é irrelevante se a banda sonora de um filme deriva de uma gravação preexistente ou é gravada ao mesmo tempo que as imagens […] A forma de exploração — como uma parte inseparável de uma obra audiovisual ou separadamente como uma mera gravação de sons — é crucial.

Quando uma fixação preexistente de sons ou as suas representações é posteriormente incorporada numa obra audiovisual, ela não altera a sua natureza, mas permanece como um «fonograma»; a sua natureza como um fonograma pode ser considerada suspensa durante a incorporação».

56.

Também surgiram outras opiniões na literatura. V., dos mesmos autores, «The WIPO Treaties on Copyright» ( 36 ), p. 272, n.os 8.2.41 8.2.42, onde se discute a opinião de que os fonogramas preexistentes podem manter a sua natureza enquanto tal, mesmo quando incorporados numa obra audiovisual, e p. 489, secções 9.2.8 e 9.2.9, que descrevem diferentes interpretações, de vários Estados Contratantes, do artigo 2.o, alínea c), do Tratado OMPI que foram avançadas na Conferência Diplomática de 2000 nas negociações que finalmente conduziram ao Tratado de Pequim ( 37 ).

57.

A «Resolução relativa às apresentações audiovisuais», adotada em 20 de dezembro de 1996 pela Conferência Diplomática de 1996, na qual as delegações participantes lamentaram que «[o Tratado OMPI] não abranja os direitos dos artistas intérpretes e executantes nas fixações audiovisuais da sua apresentação», também defende a opinião de que o artigo 15.o do Tratado OMPI não confere o direito a uma remuneração equitativa e única para comunicações ao público de obras audiovisuais nas quais foi incorporado um fonograma preexistente.

58.

Por conseguinte, sou de opinião que uma interpretação do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, à luz das disposições do Tratado OMPI, e que procura interpretar as disposições da diretiva em conformidade com as disposições do referido tratado, apoia de forma veemente a conclusão de que o artigo 8.o, n.o 2, não obriga os Estados‑Membros a conceder o direito a uma remuneração equitativa para a comunicação ao público de uma obra audiovisual em cuja banda sonora foi sincronizado um fonograma publicado com fins comerciais (ou partes do mesmo).

4. Re:Sound contra Motion Picture Theatre Associations of Canada

59.

No processo Re:Sound/Motion Picture Theatre Associations of Canada ( 38 ), o Supremo Tribunal do Canadá foi chamado a interpretar as disposições legais introduzidas para o cumprimento das obrigações do Canadá nos termos do artigo 12.o da Convenção de Roma. Apesar de a terminologia da legislação canadiana em causa, em alguma medida, diferir da terminologia utilizada na Convenção de Roma e na Diretiva relativa ao aluguer, as questões apresentadas perante o tribunal canadiano assemelham‑se de forma estreita às questões prejudiciais apresentadas ao Tribunal de Justiça no presente processo.

60.

A legislação canadiana define «gravação de som» como uma gravação constituída por sons, excluindo, no entanto, «quaisquer bandas sonoras de obras cinematográficas quando acompanham a obra cinematográfica». Importa salientar que esta definição parece assemelhar‑se de forma mais estreita à definição de «fonograma» para os fins do Tratado OMPI do que da definição deste termo para os fins da Convenção de Roma, na medida em a exclusão de bandas sonoras se aplica apenas em relação a gravações sonoras que acompanham «obras» cinematográficas.

61.

O Supremo Tribunal do Canadá declarou unanimemente que a definição de «gravação sonora» implicava que não era gerado nenhum direito a uma remuneração equitativa quando uma banda sonora acompanha o filme cinematográfico, mas que tal remuneração era devida se a banda sonora fosse «tocada separadamente do filme ou programa de [televisão]» e que esta interpretação era consistente com a definição de «fonograma» do artigo 3.o da Convenção de Roma, uma vez que a exclusão canadiana de «bandas sonoras» não abrangia «fixaç[ões] exclusivamente sonoras» ( 39 ).

62.

A análise deste processo é informativa, mas, obviamente, não é de nenhuma forma decisiva para o Tribunal de Justiça no presente processo.

5. Comparação do conceito de «reprodução» na aceção do artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29 e do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer

63.

Parece lógica e linguisticamente coerente tratar o resultado de um ato de reprodução como «uma reprodução» do elemento reproduzido.

64.

O processo de sincronização conforme descrito pelo órgão jurisdicional de reenvio envolve, no entanto, muito mais do que a mera reprodução de um fonograma. Todo o aspeto visual de uma obra audiovisual tem de ser produzido — geralmente, espera‑se, em primeiro lugar — e a banda sonora incluindo (partes do) fonograma terá de ser adaptada ao aspeto visual. Podem ser incluídos diálogos, bem como outras gravações áudio, musicais ou não musicais. Essas outras partes do produto audiovisual têm de ter uma natureza suficientemente original para elevar o resultado combinado ao estatuto de uma «obra» audiovisual para efeitos de direitos de autor, a fim de não ficarem abrangidas pelo conceito de fonograma conforme definido para efeitos do Tratado OMPI ( 40 ).

65.

Tendo em mente que nem a Diretiva relativa ao aluguer, nem a Diretiva 2001/29 contêm definição da expressão «fonograma publicado com fins comerciais, ou reprodução desse fonograma», ou para os termos «fonograma» e «reprodução» que se encontram nessa expressão, o significado e alcance desses termos e desta expressão devem assim ser determinados de acordo com o seu sentido habitual na linguagem corrente, tendo também em conta o contexto em que são utilizados ( 41 ). Enquanto termos de uma disposição que faz referência expressa à legislação dos Estados‑Membros com o fim de determinar o seu sentido e objetivo, devem encontrar, em toda a União Europeia, uma interpretação autónoma e uniforme, conforme exigido pela necessidade de aplicação uniforme da legislação da União e pelo princípio da igualdade ( 42 ).

66.

Partindo do contexto no qual figuram a expressão e os termos supramencionados, o termo «reprodução» encontra‑se não apenas no artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, mas também no artigo 7.o da Diretiva 92/100 e no reaparecimento posterior dessa disposição como parte do artigo 3.o da Diretiva 2001/29.

67.

Como tem repetidamente afirmado o Tribunal de Justiça, os conceitos utilizados nas Diretivas 2001/29 e 2006/115 devem, tendo em conta as exigências do princípio da unidade e da coerência da ordem jurídica da União, ter o mesmo significado, a menos que o legislador da União, num contexto legislativo específico, tenha manifestado uma vontade diferente ( 43 ).

68.

A este respeito, é importante ter em conta os diferentes fins e a diferente natureza dos interesses protegidos, de um lado, pelas disposições da ordem jurídica da União (e disposições correspondentes de direito internacional) que conferem aos artistas intérpretes e executantes e produtores um direito exclusivo (mas transmissível) de autorizar ou proibir determinados atos, tais como o direito dos produtores de autorizar ou proibir a reprodução dos seus fonogramas, e, de outro, pelos direitos à remuneração equitativa pela locação ou comodato, ou pela radiodifusão e comunicação ao público, que são essencialmente direitos de natureza económica ( 44 ).

69.

O objetivo dos primeiros direitos é fornecer aos artistas intérpretes e executantes e produtores de fonogramas os meios para controlar formas específicas de utilização dos resultados das suas contribuições, permitindo‑lhes, assim, negociar uma compensação por essa utilização, enquanto o objetivo dos últimos é compensar os artistas intérpretes e executantes e os produtores pela utilização das suas apresentações ou investimentos no contexto de utilizações sobre as quais não têm qualquer controlo.

70.

Em relação ao conceito de «comunicação ao público» que se encontra no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, bem como no artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva relativa ao aluguer, o Tribunal de Justiça afirmou repetidamente que essas disposições prosseguem objetivos que são, até certa medida, diferentes, uma vez que o supramencionado artigo 3.o confere aos autores um direito de natureza preventiva ( 45 ). Aplica‑se a mesma lógica ao artigo 2.o da Diretiva 2001/29, que também confere aos seus beneficiários um direito preventivo, concretamente o direito de autorizar ou proibir a reprodução.

71.

Além disso, o termo «reprodução» pode ser interpretado no sentido de que significa tanto o processo de reprodução de um determinado elemento, como o resultado dessa reprodução. O que é proibido pelo artigo 2.o, alínea c) da Diretiva 2001/29 é o ato de reprodução não autorizado, enquanto o artigo 8.o, n.o 2, se refere à remuneração por determinadas utilizações de uma reprodução no sentido de uma cópia de um fonograma, isto é, à utilização de um elemento. São dois significados diferentes da mesma palavra.

72.

A este respeito, o presente processo difere da situação analisada no Acórdão Reha Training ( 46 ), no qual o Tribunal de Justiça, nos n.os 31 e 32, declarou que nada permitia afirmar que o legislador da União tenha querido conferir ao conceito de «comunicação ao público» significados diferentes na Diretiva 2001/29 e na Diretiva 2006/115, e que os direitos concedidos por essas duas diretivas decorressem do mesmo elemento desencadeador (e o conceito em causa era uma parte desse elemento desencadeador).

73.

Voltando ao significado habitual de «reprodução» na linguagem corrente, defendo que nenhuma pessoa comum consideraria uma obra audiovisual típica como uma «reprodução» de um fonograma que é utilizado como (parte da) banda sonora para essa obra. Apenas a título de exemplo, não consideraria — e acredito que ninguém o faria — um filme como «Morte em Veneza» ( 47 ) como uma «reprodução» de (partes de) uma gravação da Quinta Sinfonia de Mahler ou de quaisquer outras peças musicais incluídas na banda sonora desse filme, ( 48 ) ou o filme A primeira noite ( 49 ) como uma «reprodução» da canção The Sound of Silence de Simon & Garfunkel, de acordo com o significado habitual do termo na linguagem corrente.

74.

O ato de copiar uma gravação preexistente de uma canção para uma banda sonora de um filme pode ser considerado como um ato de reprodução, porque é isso que é feito. A canção é reproduzida e incorporada num todo audiovisual. Como foi exposto nos n.os 33 a 35 das presentes Conclusões, parece evidente que tal ato de reprodução, na aceção do termo para os efeitos do direito de reprodução, tem lugar quando o fonograma é sincronizado.

75.

No entanto, o facto de o ato de sincronização de uma gravação preexistente ser um ato de reprodução desse fonograma não torna a obra audiovisual daí resultante (da qual a canção é presumivelmente, de longe, a parte mais pequena e insignificante) uma reprodução da canção. Isso dificilmente corresponderia ao significado habitual desse termo na linguagem corrente.

76.

No Acórdão Pelham, foi pedido ao Tribunal de Justiça que interpretasse o «direito de distribuição» previsto no artigo 9.o da Diretiva relativa ao aluguer. Esta disposição concede aos produtores de fonogramas, nomeadamente, um direito exclusivo para fazer os seus fonogramas, «incluindo cópias dos mesmos», disponíveis ao público através da venda ou outro meio. A questão apresentada ao Tribunal de Justiça consistia em saber se um fonograma que continha excertos sonoros transferidos de outro fonograma (nesse caso, sem o consentimento dos titulares de direitos sobre o fonograma do qual provinham os excertos) constitui uma «cópia» deste fonograma, na aceção do artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva relativa ao aluguer. O Tribunal de Justiça respondeu de forma negativa. Alegou, em parte com base no objetivo do direito de distribuição no que se refere aos produtores de fonogramas (permitindo ao produtor, mediante a adequada proteção jurídica dos titulares de direitos de propriedade intelectual, a possibilidade de recuperar o investimento feito, bem como lutar contra a pirataria), e em parte com base na disposição paralela (embora com redação diferente) que figura no artigo 1.o, alínea c), da Convenção de Genebra ( 50 ), que um fonograma que comporta amostras musicais transferidas de outro fonograma não constitui uma «cópia» desse fonograma, «porquanto não contém a totalidade ou uma parte substancial deste mesmo fonograma ( 51 )».

77.

Saliente‑se que o processo Pelham dizia respeito a uma situação em que a parte reproduzida ou copiada era substancialmente mais pequena do que o todo integrado porque apenas uma pequena parte do fonograma original foi reproduzida. No caso em apreço, o fonograma em causa pode ser reproduzido na sua totalidade ou em parte no processo de sincronização. No entanto, mesmo que o fonograma seja reproduzido na totalidade na sincronização, a exigência de que o produto audiovisual seja qualificado de «obra» significa que as alterações feitas ao todo devem atingir o limiar da originalidade. Por conseguinte, não é possível alegar que o fonograma e a obra audiovisual são a mesma coisa ou que a obra audiovisual é uma reprodução ou uma cópia do fonograma.

78.

Neste contexto, considero que os termos «reprodução» e «cópia», embora não tenham significado idêntico, são relacionados. Com efeito, o artigo 3.o, alínea e), da Convenção de Roma de facto define «reprodução» como «a realização da cópia ou de várias cópias de uma fixação». A este respeito, a solução proposta é também, na minha opinião, a mais estreitamente alinhada com a jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça.

IV. Conclusão

79.

Pelos fundamentos expostos, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais apresentadas pelo Tribunal Supremo (Supremo Tribunal, Espanha) da seguinte forma:

«Os conceitos de “fonograma” e de “reprodução de [um] fonograma”, constantes do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100/CEE do Conselho, de 19 de novembro de 1992, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos aos direitos de autor em matéria de propriedade intelectual, e do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 2006/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos ao direito de autor em matéria de propriedade intelectual, não incluem uma obra audiovisual na qual foi incorporado um fonograma depois de ter sido devidamente obtida a autorização do ou dos titulares de direitos pertinentes sobre o fonograma, conforme exigido pelo artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação.

Quando a obra comunicada ao público é uma obra audiovisual enquanto tal, não constitui um “fonograma”, na aceção do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100 e do artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 2006/115, que é “utilizado” ou comunicado ao público.

Em consequência, o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 92/100 e o artigo 8.o, n.o 2, da Diretiva 2006/115 não obrigam os Estados‑Membros a prever que o utilizador deve pagar uma “remuneração equitativa e única” ao ou aos titulares de direitos sobre o fonograma incorporado, em caso de “comunicação ao público” de uma obra audiovisual.»


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos ao direito de autor em matéria de propriedade intelectual (versão codificada) (JO 2006, L 376, p. 28).

( 3 ) Diretiva do Conselho, de 19 de novembro de 1992, relativa ao direito de aluguer, ao direito de comodato e a certos direitos conexos aos direitos de autor em matéria de propriedade intelectual (JO 1992, L 346, p. 61).

( 4 ) V. n.o 4 e segs. das presentes conclusões.

( 5 ) V. n.o 10 e segs. das presentes conclusões.

( 6 ) V. n.o 48 das presentes conclusões.

( 7 ) JO 2000, L 89, p. 6.

( 8 ) A Conferência Diplomática relativa a questões relacionadas com certos direitos de autor e direitos conexos, realizada sob os auspícios da Organização Mundial da Propriedade Intelectual em Genebra.

( 9 ) Declarações acordadas relativas ao Tratado da OMPI sobre Prestações e Fonogramas adotadas pela Conferência Diplomática de [20 de dezembro] de 1996.

( 10 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (JO 2001, L 167, p. 10, a seguir «Diretiva 2001/29»).

( 11 ) Não se vê claramente o motivo pelo qual as transmissões televisivas não são qualificadas de «radiodifusão» em vez de «comunicação ao público». No entanto, a «radiodifusão», na aceção do artigo 8.o da Diretiva relativa ao aluguer, é uma emissão «por ondas radioelétricas», o que exclui a televisão por cabo. Em termos práticos, a obrigação de pagar uma «remuneração equitativa e única aplica‑se tanto à “radiodifusão” como à “comunicação ao público”».

( 12 ) O texto da Diretiva relativa ao direito de aluguer refere‑se às «suas reproduções» (o sublinhado é meu).

( 13 ) V. n.o 3 da secção do pedido de decisão prejudicial com a epígrafe «Quinto».

( 14 ) V. n.o 5 da secção do pedido de decisão prejudicial com a epígrafe «Quinto». Por conseguinte, parece que o órgão jurisdicional de reenvio não procura orientação sobre se a Atresmedia fez alguma «reprodução», mas antes sobre se o filme ou outro conteúdo audiovisual que foi comunicado ao público pode ser considerado como uma «reprodução» de fonogramas. Esta questão prende‑se com os atos dos produtores de filmes ou de outros conteúdos audiovisuais e a forma como os produtos que daí resultam, obras ou não, devem ser caracterizados, e não com os atos de uma empresa de televisão na transmissão ou comunicação ao público desses produtos que resultam ou não em obras. Saliente‑se que não parece haver qualquer dúvida sobre se a divulgação dos vários conteúdos audiovisuais é qualificada de «comunicação ao público» ou se os fonogramas em causa foram «publicados com fins comerciais» — esse parece ser um facto assente.

( 15 ) V. pedido de decisão prejudicial, na secção com a epígrafe «Quinto», n.o 3, excerto da sentença do Juzgado Mercantil de Madrid (Tribunal de Comércio de Madrid) («[…] a sincronização de um fonograma preexistente numa obra audiovisual nos termos de uma licença paga para esse efeito […]»), e secção com a epígrafe «Quinto», n.o 2, in fine (descrição das dúvidas interpretativas do órgão jurisdicional de reenvio) («[…] tendo sido feito o pagamento dos direitos conexos no fonograma quando a reprodução ou sincronização na obra audiovisual foi autorizada»).

( 16 ) Acórdão de 29 de julho de 2019, Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2019:624, n.o 29 e n.o 1 do dispositivo).

( 17 ) De acordo com o órgão jurisdicional de reenvio, este consentimento foi devidamente obtido no momento da sincronização em causa.

( 18 ) Definidos respetivamente nos artigos 1.o, n.os 2 e 3, e 2.o, n.o 1, da Diretiva 92/100. O considerando 12 da diretiva estabelece que «é necessário definir as noções de aluguer e comodato para efeitos [da] diretiva».

( 19 ) Proposta de diretiva do Conselho relativa ao direito de locação, ao direito de empréstimo e a certos direitos conexos aos direitos de autor, de 24 de janeiro de 1991, COM(90) 586 final — SYN 319(a seguir «proposta original»).

( 20 ) Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1886, completada pela última vez em Paris, em 24 de julho de 1971, e alterada em 28 de setembro de 1979.

( 21 ) V. proposta original, segunda parte, capítulo I, terceiro parágrafo, na secção relativa ao artigo 6.o (Direito de reprodução), que, em relação aos titulares do direito e ao objeto desse artigo, se refere aos comentários feitos na secção 2.1, onde se declara (em relação aos direitos de aluguer e comodato) que «[o]s termos utilizados são fundamentais no domínio dos direitos de autor e dos direitos conexos e o seu significado tornou‑se indiretamente harmonizado em grande parte da legislação da maioria dos Estados‑Membros através da Convenção de Berna […] e da Convenção de Roma […] Para os fins desta diretiva, é feita referência à Convenção de Berna e à Convenção de Roma na medida em que os termos utilizados […] devem ser interpretados de acordo com estas convenções.»

( 22 ) V. «Proposta alterada da Comissão da Diretiva do Conselho relativa ao direito de locação, ao direito de empréstimo e a certos direitos conexos aos direitos de autor em matéria de propriedade intelectual», COM(92) 159 final — SYN 319, datada de 30 de abril de 1992 (a seguir «proposta alterada»), Exposição de Motivos, p. 12 e segs., relativamente ao artigo 6.o‑A da proposta alterada.

( 23 ) Livro Verde relativo aos direitos de autor e ao desafio tecnológico — Problemas de direitos de autor que exigem ação imediata, COM (88) 172 final, de 7 de junho de 1988.

( 24 ) V. Exposição de Motivos da proposta alterada, p. 12, secção relativa ao artigo 6.o‑A.

( 25 ) V. também as minhas Conclusões recentes no processo Recorded Artists Actors Performers (C‑265/19, EU:C:2020:512), que diz respeito, em particular, à competência exclusiva da União e à competência dos Estados‑Membros para determinar que artistas intérpretes e executantes de países terceiros têm direito à remuneração equitativa.

( 26 ) O «Guia da Convenção de Roma e da Convenção de Fonogramas», publicado em 1981 pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual, faz comentários sobre o artigo 3.o, alínea b), n.o 3.7, p. 22. V. também comentários ao artigo 3.o, alínea e), onde se salienta no n.o 3.15, p. 24, que um «fonograma» é exclusivamente uma fixação sonora de sons, enquanto uma «fixação» pode ser tanto visual como audiovisual e que «a Convenção de Roma apenas protege fonogramas que são exclusivamente sons».

( 27 ) Isto também é refletido no «Guia da Convenção de Roma e da Convenção de Fonogramas», que, nos comentários ao artigo 10.o (Direitos de reprodução para produtores de fonogramas), recorda a interpretação da Conferência Diplomática segundo a qual a reprodução «direta» de um fonograma significa a reprodução pela utilização da matriz e a reprodução «indireta» pela utilização de um registo retirado da matriz ou pela gravação de um programa de rádio ou televisão que contenha o fonograma.

( 28 ) Acórdão de 15 de maio de 2012, SCF Consorzio Fonografici (C‑135/10, EU:C:2012:140, n.o 38).

( 29 ) Idem, n.o 39 e jurisprudência referida.

( 30 ) Idem, n.o 50.

( 31 ) Na versão inglesa da declaração acordada («[…] the definition of phonogram provided in Article 2(b) does not suggest that rights in the phonogram are in any way affected through their incorporation into a cinematographic or other audiovisual work»), a palavra «their» parece referir‑se gramaticalmente aos «direitos» dos fonogramas. Obviamente, isso não pode ser correto — a palavra «their» deve ser interpretada no sentido de que quer dizer «its» e se refere ao fonograma e não aos direitos. V., para o mesmo efeito, Reinbothe, J., and von Lewinski, S., ‘The WIPO Treaties 1996 — The WIPO Copyright Treaty and The WIPO Performances and Phonograms Treaty — Commentary and Legal Analysis, n.o 36, p. 259. Esta leitura é apoiada pela versão francesa igualmente autêntica da Declaração acordada que, na parte relevante, tem a seguinte redação: «la definition du phonogramme […] n'implique pas que l'incorporation dans une œuvre cinématographique ou une autre œuvre audiovisuelle ait une quelconque incidence sur les droits sur le phonogramme» onde se entende que a incorporação é do fonograma, não dos direitos.

( 32 ) Guia dos tratados de direitos de autor e direitos conexos administrados pela OMPI e Glossário dos termos relacionados com os direitos de autor e direitos conexos, Publicação 891(E) da OMPI.

( 33 ) V., no mesmo sentido, relativamente ao «Guia para a Convenção de Berna» da OMPI (Genebra, 1978), Acórdão de 7 de dezembro de 2006, SGAE (C‑306/05, EU:C:2006:764, n.o 41), e Conclusões do advogado‑geral J. Kokott nos processos apensos Football Association Premier League e o. (C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:43, n.o 122).

( 34 ) Guia dos tratados de direitos e autor e direitos conexos administrados pela OMPI, PPT‑2.8., p. 235.

( 35 ) V. registos da Conferência Diplomática de questões relativas acertos direitos de autor e direitos conexos, Genebra 1996, p. 691, n.os 400 e 402.

( 36 ) Reinbothe, J., e von Lewinski, S. The WIPO Treaties on Copyright — A Commentary on the WCT, the WPPT, and the BTAP, Oxford, Oxford University Press, 2.a edição.

( 37 ) V. posição da Austrália conforme expressa nas atas resumidas MC I 2000, n.o 319, para uma perspetiva similar à exposta nas presentes Conclusões; v., por exemplo, posição da União Europeia, que defende uma certa liberdade de interpretação, nas mesmas atas, n.o 97, e posições dos Estados Unidos e do Japão, para interpretações diferentes das defendidas nestas Conclusões (nas mesmas atas, n.os 95 e 96, respetivamente).

( 38 ) [2012] 2 SCR 376.

( 39 ) Idem, n.os 35, 36, 49, 50 e 52. V. para um resultado diferente, processo Phonographic Performance Co. of Australia Ltd./Federation of Australian Commercial Television Stations, [1998] HCA 39, de que o Supremo Tribunal do Canadá se afastou com base nas diferenças entre as disposições legislativas relevantes. O processo australiano foi decidido por uma maioria de três juízes, tendo havido dois votos contra. Saliente‑se que o acórdão australiano parece não se referir a direitos conexos, que constituem o objeto do artigo 12.o da Convenção de Roma.

( 40 ) A Comissão, nas suas alegações na audiência, mencionou os vídeos do Youtube, nos quais os fonogramas são acompanhados por imagens da capa do CD, como exemplos de conteúdo audiovisual que não ascendem ao nível de «obras» para efeitos de direitos de autor e que, consequentemente, constituem «fonogramas» para efeitos do Tratado OMPI. Concordo com esta descrição.

( 41 ) V. Acórdão de 29 de julho de 2019, Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2019:624, n.o 28 e jurisprudência referida).

( 42 ) V. Acórdão de 6 de fevereiro de 2003, SENA (C‑245/00, EU:C:2003:68, n.o 23 e jurisprudência referida).

( 43 ) V. Acórdãos de 31 de maio de 2016, Reha Training (C‑117/15, EU:C:2016:379, n.o 28) e de 4 de outubro de 2011 (Football Association Premier League e o., C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:631, n.o 188).

( 44 ) Para uma discussão sobre o direito à remuneração por oposição a um direito exclusivo no contexto do artigo 15.o do Tratado OMPI, v. Reinbothe, J., e von Lewinski, S., The WIPO Treaties on Copyright — A Commentary on the WCT, the WPPT, and the BTAP, 2.a edição, p. 394, n.o 8.15.17 e segs.

( 45 ) Acórdãos de 15 de março de 2012 (SCF Consorzio Fonografici, C‑135/10, EU:C:2012:140, n.os 74 e 75), e de 31 de maio de 2016 (Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379, n.os 29 e 30).

( 46 ) Acórdão de 31 de maio de 2016 (Reha Training, C‑117/15, EU:C:2016:379).

( 47 ) O filme dramático de 1971, dirigido por Luchino Visconti, com um manuscrito baseado num romance com um título similar de Thomas Mann.

( 48 ) Supondo que foi utilizada música pré‑gravada.

( 49 ) A comédia romântica e dramática de 1967 dirigida por Mike Nichols, com Dustin Hoffman como ator principal.

( 50 ) Convenção para a proteção dos Produtores de fonogramas contra a duplicação não autorizada dos seus fonogramas, de 29 de outubro de 1971.

( 51 ) Acórdão de 29 de julho de 2019, Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2019:624, n.o 55).