ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

5 de maio de 2021 ( *1 )

«Auxílios de Estado — Sector postal — Compensação da execução da obrigação de serviço universal — Decisão de não levantar objeções — Cálculo da compensação — Metodologia dos custos líquidos evitados — Tomada em consideração dos benefícios imateriais imputáveis ao serviço universal — Utilização dos fundos concedidos a título da compensação — Garantia pública do pagamento de indemnizações por despedimento em caso de insolvência — Isenção do IVA para certas operações efetuadas pelo prestador do serviço universal — Repartição contabilística dos custos comuns às atividades abrangidas pelo serviço universal e às não abrangidas por esse serviço — Entrada de capital de uma empresa pública para evitar a insolvência da sua filial — Denúncia de um concorrente — Decisão que declara a inexistência de auxílio de Estado no termo da fase de análise preliminar — Auxílio existente — Concessão periódica de vantagens — Imputabilidade ao Estado — Critério do investidor privado»

No processo T‑561/18,

ITD, Brancheorganisation for den danske vejgodstransport A/S, com sede em Padborg (Dinamarca),

Danske Fragtmænd A/S, com sede em Åbyhøj (Dinamarca),

representadas por L. Sandberg‑Mørch, advogada,

recorrentes,

apoiadas por

Jørgen Jensen Distribution A/S, com sede em Ikast (Dinamarca), representada por L. Sandberg‑Mørch e M. Honoré, advogados,

e por

Dansk Distribution A/S, com sede em Karlslunde (Dinamarca), representada por L. Sandberg‑Mørch e J. Buendía Sierra, advogados,

intervenientes,

contra

Comissão Europeia, representada por K. Blanck e D. Recchia, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por

Reino da Dinamarca, representado por J. Nymann‑Lindegren e M. Wolff, na qualidade de agentes, assistidos por R. Holdgaard, advogado,

interveniente,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão C(2018) 3169 final da Comissão, de 28 de maio de 2018, relativa ao auxílio de Estado SA.47707 (2018/N) — Compensações estatais concedidas à PostNord pela prestação do serviço postal universal — Dinamarca,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção),

composto por: R. da Silva Passos (relator), presidente, V. Valančius e L. Truchot, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após audiência de 22 de outubro de 2020,

profere o presente

Acórdão

I. Antecedentes do litígio

1

A ITD, Brancheorganisation for den danske vejgodstransport A/S (a seguir «ITD»), é uma associação profissional que reúne sociedades de direito dinamarquês que operam, à escala nacional e internacional, nos mercados de serviços de transporte rodoviário de mercadorias e de serviços logísticos.

2

A Danske Fragtmænd A/S é uma sociedade de direito dinamarquês que opera, nomeadamente, no mercado dinamarquês dos serviços de transporte rodoviário de mercadorias e de distribuição de encomendas.

3

A postloven, lov nr. 1536 (Lei postal n.o 1536), de 21 de dezembro de 2010 (Lovtidende 2010 A), conforme alterada, designou a Post Danmark A/S de prestador do serviço universal de distribuição do correio na Dinamarca. Em aplicação dessa lei, em 30 de maio de 2016, o Ministério dos Transportes dinamarquês adotou um mandato de serviço público que encarregava a Post Danmark de uma obrigação de serviço universal (a seguir «OSU») para o período de 1 de julho de 2016 a 31 de dezembro de 2019 (a seguir «mandato de serviço universal»). A Post Danmark é detida a 100 % pela PostNord AB, cujo capital social é, por sua vez, detido a 40 % pelo Reino da Dinamarca e a 60 % pelo Reino da Suécia e cujos direitos de voto no conselho de administração são repartidos na proporção de 50 % para cada um dos dois Estados acionistas.

4

Segundo o ponto 2 do mandato de serviço universal, esse serviço deve ser assegurado tanto a nível nacional como internacional e garantido, pelo menos, cinco dias úteis por semana. Inclui os seguintes serviços:

a recolha, triagem, transporte e distribuição de envios postais de cartas, de jornais e revistas (diários, semanais e mensais) e de publicidade (catálogos e prospetos) até 2 quilogramas;

a recolha, triagem, transporte e distribuição de encomendas até 20 quilogramas com entrega ao domicílio ou num ponto de recolha, os envios de encomendas entre profissionais abrangidos por um contrato de distribuição não incluído no serviço universal;

os serviços relativos ao correio registado e aos envios com valor declarado;

um serviço postal gratuito para invisuais, limitado aos envios até 7 quilogramas.

5

Particularmente, quanto à OSU para os envios de e para destinos internacionais, o mandato de serviço universal especifica que se regem pela Convenção Postal Universal

6

A partir do início dos anos 2000, o recurso generalizado ao correio eletrónico levou a uma redução dos envios postais de correspondência, a ponto de, sobretudo por este motivo, o volume de negócios da Post Danmark ter diminuído em 38 % entre 2009 e 2016. Foi neste contexto que, em 23 de fevereiro de 2017, a PostNord realizou um aumento de capital, a favor da Post Danmark, no valor de mil milhões de coroas dinamarquesas (DKK) (cerca de 134 milhões de euros) (a seguir «aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017»).

7

Por outro lado, tendo em consideração as consequências da digitalização da correspondência, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia celebraram, em 20 de outubro de 2017, um acordo relativo à transformação do modelo de produção da Post Danmark (a seguir «acordo de 20 de outubro de 2017»), conforme desenvolvido pela PostNord e formalizado numa proposta do conselho de administração desta última de 29 de setembro de 2017.

8

Nos termos do acordo de 20 de outubro de 2017, as partes contratantes acordaram na necessidade de adotar esse novo modelo de produção a fim de «enfrentar o desafio da digitalização na Dinamarca» e assegurar a viabilidade económica da Post Danmark. Segundo o mesmo acordo, o novo modelo de produção desenvolvido pela PostNord devia assentar em aumentos de capital da Post Danmark e numa redução de pessoal de cerca de 4000 trabalhadores nesta última, estimando‑se a totalidade destes custos em cerca de 5 mil milhões de coroas suecas (SEK) (cerca de 491 milhões de euros).

9

Particularmente, a implementação do novo modelo de produção da Post Danmark implicava o pagamento de indemnizações especiais por despedimento de antigos funcionários da Post Danmark que passaram a ser trabalhadores desta quando da sua transformação de empresa pública independente em sociedade de responsabilidade limitada. A este respeito, o acordo de 20 de outubro de 2017 previa que o Reino da Dinamarca devia compensar esses custos através de uma entrada de capital de 1,533 mil milhões de SEK (cerca 150 milhões de euros) a favor da PostNord.

10

A implementação do novo modelo de produção da Post Danmark devia ser efetuada através de três medidas distintas, a saber:

uma compensação pela prestação do serviço universal na Dinamarca, paga pelas autoridades dinamarquesas à Post Danmark, por intermédio da PostNord, cujo montante seria afetado ao financiamento de uma parte das indemnizações especiais por despedimento de antigos funcionários da Post Danmark;

um aumento de capital de 667 milhões de SEK (cerca de 65 milhões de euros) por parte do Reino da Dinamarca e do Reino da Suécia, a favor da PostNord;

uma contribuição interna da PostNord a favor da Post Danmark de cerca de 2,3 mil milhões de DKK (cerca de 309 milhões de euros).

11

Em 3 de novembro de 2017, as autoridades dinamarquesas procederam à pré‑notificação, à Comissão Europeia, da primeira destas três medidas, a saber, a concessão de uma compensação de 1,533 mil milhões de SEK paga à Post Danmark, por intermédio da PostNord, pela prestação do serviço postal universal na Dinamarca entre 2017 e 2019, montante este afetado ao financiamento de uma parte dos custos de despedimento acima descritos no n.o 9.

12

Em 27 de novembro de 2017, ITD apresentou à Comissão uma denúncia alegando que, através de diversas medidas anteriores ou futuras, as autoridades dinamarquesas e suecas tinham concedido ou iriam conceder auxílios de Estado ilegais à Post Danmark.

13

Segundo a denúncia, esses auxílios resultavam:

em primeiro lugar, da existência de uma garantia em virtude da qual, em caso de insolvência da Post Danmark, o Reino da Dinamarca se tinha comprometido a pagar a esta última, sem contrapartidas, os custos relativos ao despedimento dos antigos funcionários, que correspondiam a três anos de salário por cada funcionário (a seguir «garantia em causa»);

em segundo lugar, de uma prática administrativa dinamarquesa que permitia uma isenção do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) a favor dos clientes de sociedades de venda por correspondência se estas optassem pela entrega através da Post Danmark, proporcionando a esta última um aumento da procura;

em terceiro lugar, de uma má repartição contabilística, entre 2006 e 2013, dos custos comuns à OSU e às atividades por ela não abrangidas, levando a um aumento artificial dos custos da OSU e a uma diminuição artificial dos custos das atividades comerciais da Post Danmark e constituindo, assim, um financiamento cruzado das atividades comerciais da Post Danmark através da OSU;

em quarto lugar, do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, na medida em que este era imputável aos Estados dinamarquês e sueco e essa medida não satisfazia o critério do investidor privado numa economia de mercado;

em quinto lugar, da medida de compensação objeto de pré‑notificação pelo Reino da Dinamarca em 3 de novembro de 2017 (v. n.o 11, supra);

em sexto lugar, dos aumentos de capital da Post Danmark pelo Reino da Dinamarca, pelo Reino da Suécia e pela PostNord, conforme previstos no acordo de 20 de outubro de 2017.

14

Em 30 de novembro de 2017, a Comissão comunicou a denúncia da ITD às autoridades dinamarquesas e suecas, as quais submeteram, em 20 de dezembro de 2017, as suas observações conjuntas sobre algumas acusações dessa denúncia. Em 21 de dezembro de 2017, as autoridades dinamarquesas submeteram as suas observações sobre as restantes acusações da referida denúncia.

15

Em 8 de fevereiro de 2018, as autoridades dinamarquesas notificaram à Comissão a concessão à Post Danmark de uma compensação no montante de 1,533 mil milhões de SEK pela prestação do serviço postal universal no período entre 2017 e 2019 (a seguir «compensação em causa»).

16

Em 7 de maio de 2018, as autoridades dinamarquesas indicaram que a compensação em causa seria afinal no montante máximo de 1,683 mil milhões de SEK (cerca de 160 milhões de euros).

17

Em 28 de maio de 2018, a Comissão adotou a Decisão C(2018) 3169 final, relativa ao auxílio de Estado SA.47707 (2018/N) — Compensações estatais concedidas à PostNord pela prestação do serviço postal universal — Dinamarca (a seguir «decisão impugnada»).

18

Na decisão impugnada, em primeiro lugar, a Comissão esclareceu que a sua análise incidiria, por um lado, sobre a compensação em causa e, por outro, sobre as acusações apresentadas pela ITD na sua denúncia, com exceção, porém, dos aumentos de capital previstos no acordo de 20 de outubro de 2017 (n.o 73 da decisão impugnada), os quais seriam objeto de uma decisão posterior.

19

Em segundo lugar, quanto à compensação em causa, antes de mais, a Comissão considerou que esta compensação não satisfazia o quarto dos critérios estabelecidos no Acórdão de 24 de julho de 2003, Altmark Trans e Regierungspräsidium Magdeburg (C‑280/00, EU:C:2003:415), uma vez que não tinha sido concedida no âmbito de um procedimento de concurso e que o seu montante não tinha sido determinado com base nos custos de uma empresa média bem gerida. A Comissão inferiu daí que essa medida constituía um auxílio de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e que havia que examinar a compatibilidade desse auxílio à luz do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, conforme aplicado na Comunicação da Comissão relativa ao Enquadramento da União Europeia aplicável aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público (2011) (JO 2012, C 8, p. 15; a seguir «Enquadramento SIEG»).

20

Em seguida, aquando da apreciação da compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno, a Comissão analisou, nomeadamente, o cálculo, pelas autoridades dinamarquesas, do custo líquido necessário para a execução da OSU, utilizando para isso a metodologia dos custos líquidos evitados (a seguir «CLE»). No seu método de cálculo, as autoridades dinamarquesas previram um cenário factual segundo o qual, ao assegurar a OSU no período de 2017 a 2019, a Post Danmark esperava, primeiro, um aumento substancial dos envios das empresas aos consumidores devido ao aumento do comércio eletrónico, segundo, uma redução contínua dos envios de cartas na sequência da crescente digitalização das trocas de correspondência, terceiro, uma redução significativa dos envios de jornais e de revistas e, em quarto lugar, a implementação de um novo modelo de produção que implicava o despedimento de trabalhadores. Segundo o cenário contrafactual proposto pelas autoridades dinamarquesas, se a Post Danmark não tivesse sido encarregada da OSU no mesmo período, tal teria tido por consequência, primeiro, o abandono de atividades não rentáveis, como a distribuição de jornais e revistas, os envios não endereçados e os envios postais internacionais, segundo, a otimização da distribuição de cartas comerciais, cuja entrega ao domicílio apenas estaria disponível nas grandes cidades, terceiro, o abandono da entrega de encomendas ao domicílio em certas zonas rurais e, quarto, uma redução do número de estações de correios.

21

As autoridades dinamarquesas deduziram daí os custos evitados na ausência da OSU, calculados com base nos custos, nomeadamente de pessoal, decorrentes, primeiro, da manutenção de uma rede de caixas de correio abrangendo todo o território nacional e da emissão de selos, segundo, do funcionamento do centro de envios internacionais de Copenhaga (Dinamarca) que seria encerrado após o abandono dos envios postais internacionais, terceiro, dos centros de triagem de cartas e das plataformas de distribuição que seriam encerrados após a otimização da distribuição das cartas comerciais, quarto, da entrega ao domicílio dos envios postais em certas zonas e, quinto, do funcionamento das estações de correios que seriam encerradas.

22

Em contrapartida, as autoridades dinamarquesas deduziram dos custos evitados, por um lado, as receitas decorrentes dos serviços abandonados ou otimizados pela Post Danmark na ausência da OSU e, por outro, os lucros decorrentes de um aumento da procura devido à isenção do IVA de que tinha beneficiado enquanto prestador do serviço universal, bem como dos ativos de propriedade intelectual relacionados com a OSU, particularmente, a publicidade relativa à sua visibilidade em pontos de contacto e nas caixas de correio.

23

A Comissão considerou que a metodologia proposta pelas autoridades dinamarquesas era fiável e salientou que, segundo essa metodologia, os CLE para a execução da OSU eram de 2,571 mil milhões de DKK (cerca de 345 milhões de euros), ou seja, um montante consideravelmente superior à compensação em causa, fixada num máximo de 1,192 mil milhões de DKK (cerca de 160 milhões de euros).

24

Por último, após ter afastado as acusações apresentadas pela ITD na sua denúncia especificamente dirigidas contra a compensação em causa, a Comissão concluiu que essa compensação era compatível com o mercado interno.

25

Em terceiro lugar, quanto às restantes acusações suscitadas na denúncia da ITD, primeiro, a Comissão considerou que a garantia em causa podia constituir um auxílio de Estado. Neste sentido, entendeu que essa garantia podia traduzir‑se numa vantagem, embora muito indireta, na medida em que tinha permitido à Post Danmark, quando da sua transformação em sociedade de responsabilidade limitada, em 2002, conservar uma parte do seu pessoal. No entanto, a Comissão considerou que, admitindo que a garantia em causa constituía um auxílio de Estado, esta tinha sido concedida em 2002, uma vez que apenas diziam respeito aos trabalhadores que tinham renunciado ao seu estatuto de funcionário nessa data. Assim, a garantia em causa tinha sido concedida mais de dez anos antes de a Comissão ser informada dessa medida, pela denúncia da ITD, e constituía, consequentemente, um auxílio existente em aplicação do artigo 1.o, alínea b), iv), e do artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o TFUE (JO 2015, L 248, p. 9).

26

Segundo, quanto à prática administrativa dinamarquesa que levou a uma isenção do IVA em benefício de clientes da Post Danmark, a Comissão entendeu que esta medida era suscetível de conceder uma vantagem indireta à Post Danmark. No entanto, a Comissão considerou que a isenção em causa resultava do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do IVA (JO 2006, L 347, p. 1, a seguir «Diretiva IVA»), que prevê a obrigatoriedade da isenção dos serviços abrangidos pela OSU. Por conseguinte, nos termos da decisão impugnada, a isenção do IVA em benefício da Post Danmark não era imputável ao Estado dinamarquês e não podia, por tal motivo, constituir um auxílio de Estado.

27

Terceiro, no que respeita à fixação dos custos relativos às atividades da Post Danmark e à eventual subvenção cruzada destas, a Comissão aceitou as explicações das autoridades dinamarquesas para concluir pelo caráter adequado da repartição dos custos comuns às atividades da Post Danmark abrangidas pela OSU e às não abrangidas por essa obrigação. A Comissão acrescentou que, em todo o caso, a alocação errada dos custos alegada pela ITD não parecia, desde logo, implicar uma transferência de recursos do Estado. Em seguida, segundo a decisão impugnada, essa alocação não era imputável às autoridades dinamarquesas, na medida em que, embora seja verdade que estas adotaram a regulamentação contabilística aplicável à Post Danmark, a ITD não demonstrou, todavia, de que modo as mesmas estavam implicadas na fixação dos preços pela Post Danmark para as suas atividades não abrangidas pela OSU. Por último, a Comissão considerou que a pretensa subvenção cruzada das atividades comerciais da Post Danmark pelos fundos recebidos a título da OSU não era constitutiva de uma vantagem, na medida em que a Post Danmark nunca tinha recebido qualquer compensação pela execução da OSU, calculada com base na repartição dos custos conforme denunciada pela ITD.

28

Quarto, quanto ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, a Comissão considerou que, efetivamente, à luz da estrutura de capital da PostNord e das modalidades de nomeação dos membros do conselho de administração da mesma, o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia estavam em condições de exercer uma influência dominante sobre esta sociedade. Contudo, segundo a Comissão, os elementos apresentados pela ITD em apoio da sua denúncia não permitiam demonstrar que o Reino da Dinamarca ou o Reino da Suécia estavam efetivamente implicados nesse aumento de capital. A Comissão deduziu daí que o referido aumento de capital não era imputável a um Estado e, por esse motivo, não constituía um auxílio de Estado.

29

Além disso, a Comissão considerou que, em circunstâncias como aquelas em que se encontrava a PostNord, um investidor privado teria decidido proceder ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 em vez de deixar que fosse declarada a insolvência da sua filial, no caso concreto a Post Danmark.

30

Por último, os pontos conclusivos da decisão impugnada têm a seguinte redação:

«(205)

A Comissão decide […] considerar que a medida de auxílio notificada para a compensação da OSU para o período de 2017‑2019 é compatível com o mercado interno com fundamento no artigo 106.o, n.o 2, TFUE e não suscitar objeções quanto a es[sa] medid[a].

(206)

Além disso, a Comissão decide que:

(i)

a [garantia em causa é] um auxílio existente;

(ii)

a isenção do IVA não constitui um auxílio de Estado;

(iii)

a subvenção cruzada dos serviços comerciais não está materialmente confirmada e não constitui[,] em todo o caso[,] um auxílio de Estado; e

(iv)

o [aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017] não constitui um auxílio de Estado.»

II. Tramitação processual e pedidos das partes

31

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de setembro de 2018, as recorrentes, a ITD e a Danske Fragtmænd, interpuseram o presente recurso.

32

A Comissão apresentou a contestação em 7 de dezembro de 2018.

33

As recorrentes apresentaram a réplica em 15 de fevereiro de 2019. A Comissão apresentou a tréplica em 17 de abril de 2019.

34

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 16 de janeiro de 2019, o Reino da Dinamarca pediu para intervir em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão de 11 de abril de 2019, o presidente da Nona Secção do Tribunal Geral deferiu este pedido.

35

Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral, respetivamente, em 17 de janeiro e em 21 de janeiro de 2019, a Dansk Distribution A/S e a Jørgen Jensen Distribution A/S pediram para intervir em apoio dos pedidos das recorrentes. Por Despachos de 12 de abril de 2019, o presidente da Nona Secção do Tribunal Geral deferiu estes pedidos.

36

O Reino da Dinamarca apresentou o seu articulado de intervenção em 1 de julho de 2019. A Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution apresentaram os seus articulados de intervenção em 3 de julho de 2019. A Comissão e as recorrentes apresentaram as suas observações sobre os articulados de intervenção, respetivamente, em 15 de novembro e em 18 de novembro de 2019.

37

Tendo sido alterada a composição das secções do Tribunal Geral em conformidade com o artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o juiz relator foi afetado à Sétima Secção, à qual o presente processo foi, consequentemente, reatribuído em 17 de outubro de 2019.

38

As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

declarar a inadmissibilidade e, em todo o caso, a improcedência dos argumentos apresentados pelo Reino da Dinamarca;

declarar a admissibilidade e procedência da petição;

anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão e o Reino da Dinamarca nas despesas.

39

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar os recorrentes nas despesas.

40

O Reino da Dinamarca conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

negar provimento ao recurso.

41

A Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution concluem pedindo ao Tribunal Geral se digne:

declarar a admissibilidade e a procedência do recurso e anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão nas despesas.

III. Questão de direito

42

Em apoio do seu recurso, as recorrentes invocam um fundamento único, relativo ao facto de a Comissão não ter dado início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, apesar das dificuldades sérias suscitadas pela apreciação da compensação em causa e das outras medidas constantes da denúncia da ITD.

43

Antes de mais, refira‑se que a fase de análise preliminar das medidas de auxílio notificadas, prevista no artigo 108.o, n.o 3, TFUE e regulada no artigo 4.o do Regulamento 2015/1589, tem por objeto permitir à Comissão formar uma primeira opinião sobre essas medidas (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.o 43).

44

No final dessa fase, a Comissão constata que uma medida notificada ou não constitui um auxílio, caso em que toma uma decisão de não levantar objeções de acordo com o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento 2015/1589, ou entra no âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Se a Comissão constatar, após a análise preliminar, que a medida notificada, na medida em que entra no âmbito do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, não suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno, toma uma decisão de não levantar objeções de acordo com o artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589 (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.os 43 e 44).

45

Quando a Comissão toma uma decisão de não levantar objeções, não só declara que a medida em causa não constitui um auxílio incompatível com o mercado interno, mas também recusa implicitamente dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE e no artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589 (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.o 45).

46

Se a Comissão constatar, após a análise preliminar, que a medida notificada suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno, deve adotar, com fundamento no artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento 2015/1589, uma decisão de início do procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE e no artigo 6.o, n.o 1, do referido regulamento (Acórdão de 24 de maio de 2011, Comissão/Kronoply e Kronotex, C‑83/09 P, EU:C:2011:341, n.o 46).

47

Por outro lado, o artigo 24.o, n.o 2, primeira frase, do Regulamento 2015/1589 concede a qualquer parte interessada o direito de apresentar uma denúncia para informar a Comissão sobre qualquer alegado auxílio ilegal, o que, em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, primeira frase, do mesmo regulamento, conduz à instauração da fase de análise preliminar prevista no artigo 108.o, n.o 3, TFUE que implica a adoção, pela Comissão, de uma decisão nos termos do artigo 4.o, n.os 2, 3 ou 4, do Regulamento 2015/1589.

48

A existência de dúvidas suscetíveis de justificar o início do procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE traduz‑se na existência objetiva de dificuldades sérias enfrentadas pela Comissão aquando da análise do caráter de auxílio da medida em causa ou da sua compatibilidade com o mercado interno. Com efeito, resulta da jurisprudência que o conceito de dificuldades sérias tem um caráter objetivo (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.o 31). A existência de tais dificuldades deve ser apreciada, de modo objetivo, tanto em função das circunstâncias da adoção do ato impugnado como do seu conteúdo, relacionando os motivos da decisão com os elementos de que a Comissão dispunha e podia dispor quando se pronunciou sobre a compatibilidade dos auxílios controvertidos com o mercado interno (v. Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 77 e jurisprudência referida), recordando‑se a este respeito que os elementos de informação de que a Comissão «podia dispor» são os que se afiguravam pertinentes para efeitos da apreciação a efetuar e cuja apresentação ela podia obter, a seu pedido, durante a fase de análise preliminar (Acórdão de 20 de setembro de 2017, Comissão/Frucona Košice, C‑300/16 P, EU:C:2017:706, n.o 71).

49

Daqui resulta que a fiscalização da legalidade efetuada pelo Tribunal Geral no que respeita à existência de dificuldades sérias não se pode limitar, por natureza, à verificação de um erro manifesto de apreciação (v. Acórdãos de 27 de setembro de 2011, 3F/Comissão, T‑30/03 RENV, EU:T:2011:534, n.o 55 e jurisprudência referida, e de 10 de julho de 2012, Smurfit Kappa Group/Comissão, T‑304/08, EU:T:2012:351, n.o 80 e jurisprudência referida). Com efeito, se tais dificuldades existem, uma decisão adotada pela Comissão sem ser dado início ao procedimento formal de investigação pode ser anulada unicamente por esse motivo, devido à omissão da investigação contraditória e aprofundada prevista pelo TFUE, mesmo que não esteja demonstrado que as apreciações feitas pela Comissão quanto ao mérito eram erradas de direito ou de facto (v., neste sentido, Acórdão de 9 de setembro de 2010, British Aggregates e o./Comissão, T‑359/04, EU:T:2010:366, n.o 58).

50

Há que recordar que, em conformidade com a finalidade do artigo 108.o, n.o 3, TFUE e com o dever de boa administração que lhe incumbe, a Comissão pode, nomeadamente, estabelecer um diálogo com o Estado notificante ou com terceiros a fim de ultrapassar, durante a análise preliminar, as dificuldades eventualmente encontradas. Esta faculdade pressupõe que a Comissão possa adaptar a sua posição em função dos resultados do diálogo estabelecido, sem que esta adaptação deva, a priori, ser interpretada como prova da existência de dificuldades sérias (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.o 35). Só no caso de não ter sido possível ultrapassar essas dificuldades é que as mesmas se revelam sérias e devem suscitar dúvidas à Comissão, levando‑a assim a iniciar o procedimento formal de investigação (Acórdãos de 2 de abril de 2009, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão, C‑431/07 P, EU:C:2009:223, n.o 61, e de 27 de outubro de 2011, Autriche/Scheucher‑Fleisch e o., C‑47/10 P, EU:C:2011:698, n.o 70).

51

É ao recorrente que cabe provar a existência de dificuldades sérias, prova essa que pode ser feita a partir de uma série de indícios concordantes (v. Acórdão de 19 de setembro de 2018, HH Ferries e o./Comissão, T‑68/15, EU:T:2018:563, n.o 63 e jurisprudência referida).

52

É à luz das considerações anteriores que deve ser analisada a argumentação das recorrentes que visa demonstrar a existência de dificuldades sérias que deveriam ter levado a Comissão a iniciar o procedimento formal de investigação.

53

No caso em apreço, as recorrentes invocam uma série de indícios que, na sua opinião, demonstram a existência de dificuldades sérias e que resultam, por um lado, da duração da fase de análise preliminar e das circunstâncias que rodearam a tramitação desta última e, por outro, do conteúdo da decisão impugnada e da apreciação da Comissão sobre as diferentes medidas analisadas nessa decisão.

A. Quanto aos indícios relativos à duração e à tramitação da fase de análise preliminar

54

Antes de mais, as recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, alegam que a duração da fase de análise preliminar demonstra as dificuldades sérias enfrentadas pela Comissão. A este respeito, sublinham que as autoridades dinamarquesas notificaram a compensação em causa em 8 de fevereiro de 2018 e que a decisão impugnada foi adotada em 28 de maio de 2018, ou seja, ultrapassado o prazo de dois meses previsto no artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589 para a tomada de uma decisão de dar início ou não ao procedimento formal de investigação.

55

As recorrentes acrescentam que a excedência desse prazo é ainda mais evidente tendo em conta a data de pré‑notificação da compensação em causa, ou seja, 3 de novembro de 2017. A este respeito, por um lado, alegam que, no Acórdão de 15 de novembro de 2018, Tempus Energy e Tempus Energy Technology/Comissão (T‑793/14, pendente de recurso, EU:T:2018:790), o Tribunal Geral declarou que a fase de pré‑notificação devia ser tomada em conta para efeitos da apreciação da existência de dificuldades sérias. Por outro lado, as recorrentes referem que a duração superior a três meses da fase de pré‑notificação não cumpre a duração de dois meses prevista no n.o 14 do Código de Boas Práticas para a condução dos procedimentos de controlo dos auxílios estatais (JO 2009, C 136, p. 13, a seguir «Código de Boas Práticas»). Na sua opinião, essa duração resulta do facto de a Comissão ter começado a sua apreciação da compatibilidade da compensação em causa durante a fase de pré‑notificação.

56

Além disso, a Comissão excedeu o prazo exigido ao adotar a decisão impugnada seis meses após a apresentação da denúncia da ITD.

57

Em seguida, as recorrentes alegam que a troca de correspondência entre a Comissão e as autoridades dinamarquesas e suecas, tanto na fase de pré‑notificação como na fase de análise preliminar, demonstra a existência de dificuldades sérias. Requerem ao Tribunal Geral a adoção de uma medida de organização do processo para que essa troca de correspondência seja apresentada.

58

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta a argumentação das recorrentes.

59

Em primeiro lugar, quanto ao argumento das recorrentes relativo à duração excessiva da análise preliminar, recorde‑se que, segundo jurisprudência constante, essa duração pode, juntamente com outros elementos, constituir um indício das dificuldades sérias enfrentadas pela Comissão, se exceder significativamente o tempo normalmente exigido pela análise preliminar de uma medida (v. Acórdão de 3 de dezembro de 2014, Castelnou Energía/Comissão, T‑57/11, EU:T:2014:1021, n.o 58 e jurisprudência referida).

60

A este respeito, deve distinguir‑se o procedimento na sequência de uma notificação por parte de um Estado‑Membro daquele no decurso do qual a Comissão analisa, após a apresentação de uma denúncia, as informações, qualquer que seja a sua origem, respeitantes a um alegado auxílio ilegal. Com efeito, o artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589 prevê que a duração do primeiro não deve exceder dois meses a contar do dia seguinte à receção de uma notificação completa. Em contrapartida, o direito da União Europeia não prevê nenhum prazo para a conclusão do segundo, uma vez que o artigo 12.o, n.o 1, do Regulamento 2015/1589 precisa simplesmente que a Comissão «examinará sem demora injustificada as denúncias» (Acórdão de 6 de maio de 2019, Scor/Comissão, T‑135/17, não publicado, EU:T:2019:287, n.o 106).

61

No caso em apreço, a Comissão, por um lado, recebeu a denúncia da ITD de 27 de novembro de 2017 e, por outro, recebeu a notificação completa, pelo Reino da Dinamarca, da medida respeitante à concessão da compensação em causa, efetuada em 8 de fevereiro de 2018. A Comissão adotou a decisão impugnada, que abrange os dois procedimentos, em 28 de maio de 2018.

62

Por conseguinte, a fase de análise preliminar durou três meses e dezanove dias se se contar a partir do dia seguinte à notificação pelas autoridades dinamarquesas ou seis meses e um dia se se contar a partir da denúncia da ITD.

63

Assim, por um lado, quanto ao período de três meses e dezanove dias que decorreu entre a apresentação da notificação pelas autoridades dinamarquesas e a adoção da decisão impugnada, o prazo de dois meses previsto no artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589 foi excedido em mais de um mês. Contudo, essa excedência do prazo previsto nesta disposição pode explicar‑se facilmente pelo facto de, conforme resulta do n.o 72 da decisão impugnada, a Comissão ter analisado simultaneamente a medida notificada pelas autoridades dinamarquesas e quatro das cinco medidas que foram implementadas pelas autoridades dinamarquesas em benefício da Post Danmark, referidas na denúncia da ITD (v. n.o 13, supra). Por conseguinte, a Comissão foi levada a analisar um volume considerável de informações submetidas pelas partes. Além disso, na antevéspera da expiração do prazo de dois meses previsto no artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589, as autoridades dinamarquesas informaram a Comissão que tencionavam alterar o montante da compensação em causa, passando de uma compensação fixa de 1,533 mil milhões de SEK para uma compensação máxima de 1,683 mil milhões de SEK.

64

Portanto, a circunstância de a duração da fase de análise preliminar ter excedido em um mês e dezanove dias o prazo previsto no artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589 não constitui um indício da existência de dificuldades sérias.

65

Por outro lado, quanto ao período de seis meses e um dia que decorreu entre a apresentação da denúncia da ITD e a decisão impugnada, as recorrentes limitam‑se a afirmar, sem mais precisões, que essa duração «excede claramente [o prazo] no qual a Comissão deve concluir a sua análise preliminar». Ora, conforme acima recordado no n.o 60, as disposições pertinentes não preveem nenhum prazo vinculativo de tramitação de uma denúncia submetida à Comissão em matéria de auxílios de Estado.

66

Além disso, já foi declarado que, a fim de apreciar se a duração da análise constituía um indício de dificuldades sérias, importava remeter para as regras internas fixadas pela Comissão (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de março de 2001, Prayon‑Rupel/Comissão, T‑73/98, EU:T:2001:94, n.o 94, e de 9 de junho de 2016, Magic Mountain Kletterhallen e o./Comissão, T‑162/13, não publicado, EU:T:2016:341, n.o 146). A este respeito, o n.o 47 do Código de Boas Práticas prevê que «[a] Comissão envidará todos os seus esforços no sentido de investigar uma denúncia num prazo indicativo de doze meses a partir da sua receção», que «[e]ste prazo não constitui um compromisso vinculativo» e que, «[c]onsoante as circunstâncias do caso específico, a eventual necessidade de solicitar informações adicionais ao autor da denúncia, ao Estado‑Membro ou a partes interessadas pode obrigar a prolongar a investigação de uma denúncia».

67

No caso em apreço, ao adotar a decisão impugnada seis meses e um dia após a apresentação da denúncia da ITD, a Comissão respeitou os princípios fixados nas suas regras internas.

68

O Acórdão de 10 de fevereiro de 2009, Deutsche Post e DHL International/Comissão (T‑388/03, EU:T:2009:30), não pode ser invocado utilmente pelas recorrentes, na medida em que resulta dos n.os 96 a 98 desse acórdão que o Tribunal Geral considerou que um período de sete meses após a notificação de uma medida por um Estado‑Membro, e não na sequência de uma denúncia, excedia consideravelmente a duração de dois meses que a Comissão era, em princípio, obrigada a respeitar para concluir a sua análise preliminar, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1), cujo conteúdo era idêntico ao do artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589. Esse acórdão também não é pertinente quanto à apreciação, no caso em apreço, da duração da fase de análise preliminar a contar da notificação da compensação em causa pelas autoridades dinamarquesas, uma vez que esta duração, de três meses e um dia, foi considerada razoável pelos motivos acima expostos no n.o 63.

69

Nestas condições, a duração da análise preliminar não constitui um indício da existência de dificuldades sérias.

70

Em segundo lugar, no que respeita às circunstâncias que rodearam a fase de análise preliminar, as recorrentes apoiam‑se numa pretensa numerosa troca de correspondência entre a Comissão e as autoridades dinamarquesas e suecas.

71

A este respeito, recorde‑se que o simples facto de terem existido conversações entre a Comissão e o Estado‑Membro interessado durante a fase de análise preliminar e, nesse contexto, terem sido pedidas informações complementares pela Comissão sobre as medidas sujeitas ao seu controlo não pode, por si só, ser considerado uma prova de que aquela instituição se confrontava com dificuldades sérias de apreciação (v., neste sentido, Acórdão de 15 de março de 2018, Naviera Armas/Comissão, T‑108/16, EU:T:2018:145, n.o 69 e jurisprudência referida). Todavia, não se pode excluir que o teor das conversações mantidas entre a Comissão e o Estado‑Membro notificante durante esta fase do procedimento possa, em determinadas circunstâncias, revelar a existência de dificuldades sérias, o mesmo acontecendo com um elevado número de pedidos de informação dirigidos ao Estado‑Membro notificante pela Comissão (v., neste sentido, Acórdãos de 9 de dezembro de 2014, Netherlands Maritime Technology Association/Comissão, T‑140/13, não publicado, EU:T:2014:1029, n.o 74, e de 8 de janeiro de 2015, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, T 58/13, não publicado, EU:T:2015:1, n.o 47).

72

No caso em apreço, decorre dos n.os 1 a 10 da decisão impugnada que, antes de mais, a Comissão comunicou a denúncia da ITD às autoridades dinamarquesas e suecas em 30 de novembro de 2017, sobre a qual estes apresentaram as suas observações em 20 e 21 de dezembro de 2017. Em seguida, em 5 de fevereiro de 2018, a Comissão dirigiu um pedido de informações às autoridades dinamarquesas, a respeito de uma denúncia complementar enviada pela ITD em 2 de fevereiro de 2018. As autoridades dinamarquesas responderam‑lhe em 13 de fevereiro de 2018. Por último, na sequência da notificação completa da compensação em causa, em 8 de fevereiro de 2018, as autoridades dinamarquesas, em 7 de maio de 2018, informaram a Comissão que tinham alterado o montante máximo dessa compensação.

73

Ora, essas trocas de correspondência não podem ser consideradas de frequência ou intensidade particulares, uma vez que a Comissão apenas se dirigiu às autoridades dinamarquesas para recolher as suas observações sobre a denúncia da ITD. Por conseguinte, não constituem um indício da existência de dificuldades sérias.

74

Em terceiro e último lugar, contrariamente ao que alegam as recorrentes, a fase de pré‑notificação não é, em princípio, pertinente para efeitos da apreciação da existência de dificuldades sérias, uma vez que a existência dessas dificuldades é apreciada à luz da fase de análise preliminar, que começa com a notificação completa da medida, conforme resulta do artigo 4.o, n.o 5, do Regulamento 2015/1589 (v., neste sentido, Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 168).

75

Foi só em circunstâncias específicas, como a complexidade e o caráter inédito da medida pré‑notificada, a duração da fase de pré‑notificação e a apreciação da compatibilidade dessa medida durante esta fase, que o Tribunal Geral declarou, no Acórdão de 15 de novembro de 2018, Tempus Energy e Tempus Energy Technology/Comissão (T‑793/14, pendente de recurso, EU:T:2018:790), que a tramitação da fase de pré‑notificação podia constituir um indício da existência de dificuldades sérias.

76

Ora, no caso em apreço, as recorrentes não estão em condições de demonstrar a existência de circunstâncias específicas dessa natureza.

77

Por um lado, apesar de argumentarem com base na duração superior a três meses da fase de pré‑notificação, esta não se revela excessiva, embora exceda o prazo de dois meses mencionado no Código de Boas Práticas. Com efeito, durante a fase de pré‑notificação, a Comissão também solicitou às autoridades dinamarquesas e suecas as respetivas observações sobre a denúncia da ITD e sobre as observações complementares desta última (v. n.o 14, supra).

78

Por outro lado, quanto ao conteúdo das trocas de correspondência entre a Comissão e as autoridades dinamarquesas e suecas, as recorrentes apenas pressupõem que a compatibilidade da compensação em causa foi discutida durante a fase de pré‑notificação, sem apresentarem qualquer indício concreto nesse sentido.

79

Consequentemente, mesmo tendo em conta a fase de pré‑notificação, a duração e as circunstâncias que rodearam a tramitação da fase de análise preliminar não são, por si só, reveladoras de dificuldades sérias que obrigassem a Comissão a iniciar o procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE.

80

Uma vez que o Tribunal Geral estava em condições de se pronunciar sobre os argumentos das recorrentes relativos à duração e às circunstâncias que rodearam a fase de análise preliminar, não pode ser deferido o seu pedido de medida de organização do processo para que fossem juntas aos autos todas as trocas de correspondência ocorridas, durante a fase de análise preliminar e a fase anterior a esta, entre, por um lado, a Comissão e, por outro, as autoridades dinamarquesas e suecas. Em todo o caso, as recorrentes não apresentaram, em apoio do seu pedido de medida de organização do processo, nenhum elemento que permita acreditar a utilidade dessa medida para a instância (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2018, Europa Terra Nostra/Parlamento, T‑13/17, não publicado, EU:T:2018:428, n.o 103 e jurisprudência referida).

81

Consequentemente, devem ser analisados os restantes argumentos invocados pelas recorrentes em apoio do fundamento único e destinados a demonstrar que o próprio conteúdo da decisão impugnada fornece indícios no sentido de que a análise das medidas em causa suscitava dificuldades sérias que deveriam ter levado a Comissão a dar início ao procedimento formal de investigação.

B. Quanto aos indícios relativos ao conteúdo da decisão impugnada

82

Em apoio da segunda parte do fundamento único, as recorrentes sublinham, em substância, que a Comissão cometeu vários erros que demonstram a existência de dificuldades sérias, quando considerou, na decisão impugnada, que:

a compensação em causa era compatível com o mercado interno;

a garantia em causa constituía um auxílio existente;

a isenção do IVA em benefício da Post Danmark não era imputável ao Estado;

o erro na repartição, na contabilidade da Post Danmark, dos custos abrangidos pela OSU e dos não abrangidos por essa obrigação não estava demonstrado, não implicava a transferência de recursos do Estado e não era imputável ao Estado;

o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não era imputável ao Estado e não constituía uma vantagem económica.

1.   Quanto à compensação em causa

83

As recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, alegam que, ao concluir pela compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno, a Comissão cometeu vários erros, o que demonstra que se confrontava com dificuldades sérias a este respeito.

84

Antes de mais, as recorrentes alegam que a Comissão considerou erradamente que, sem a OSU, a Post Danmark abandonaria a prestação de determinados serviços.

85

Por um lado, quanto aos envios de cartas e de encomendas unitárias, aos envios de correio registado e com valor declarado e ao serviço gratuito para invisuais, as recorrentes sublinham que estes serviços são rentáveis nas zonas urbanas, conforme resulta de um relatório elaborado pela sociedade BDO e apresentado em apoio da petição (a seguir «relatório da BDO»). Ora, na sua avaliação do cenário contrafactual necessário ao cálculo dos CLE, a Comissão não fez nenhuma distinção entre as zonas urbanas e as zonas rurais relativamente a esses serviços.

86

Na réplica, as recorrentes precisam que a decisão de abandonar ou de manter a prestação de certos serviços deve basear‑se num cenário a longo prazo e que os serviços acima referidos no n.o 85, supra, são rentáveis a longo prazo. No entanto, segundo as recorrentes, atendendo à situação económica da Post Danmark e aos custos por esta suportados tendo em vista a sua restruturação, os serviços em causa não podem ser considerados rentáveis a curto prazo. Assim, uma vez que o cálculo da compensação diz respeito a um período a curto prazo, a saber, entre 2017 e 2019, a Comissão deveria ter considerado que a Post Danmark continuaria a prestar esses serviços mesmo na ausência da OSU, embora, no período em causa, os referidos serviços tivessem ocasionado perdas.

87

Por outro lado, as recorrentes censuram a Comissão por ter considerado que, sem a OSU, a Post Danmark poria termo aos serviços de envios internacionais de cartas e encomendas. A este respeito, sublinham que uma brochura da PostNord referia objetivos estratégicos com vista à «mundialização» e a uma «presença internacional» através do «fornecimento de soluções logísticas completas». Por conseguinte, mesmo sem a OSU, seria pouco provável que a Post Danmark renunciasse a prestar os serviços internacionais em causa.

88

Em seguida, as recorrentes acusam a Comissão de não ter tido em conta que a Post Danmark gozava de certos benefícios imateriais graças à OSU.

89

Por um lado, foi erradamente que a Comissão não teve em conta o reforço da reputação da Post Danmark devido à execução da OSU. Com efeito, a OSU conferia à Post Danmark um monopólio nos serviços postais e autoriza‑a a imprimir selos ostentando a palavra «Danmark», bem como a utilizar o logótipo da corneta postal com uma coroa dourada nas estações de correio públicas. Segundo as recorrentes, resulta do relatório da BDO, que refere um estudo realizado em 2010 pela WIK Consult a pedido da Autorité de régulation des communications électroniques et des postes (ARCEP, Autoridade Reguladora das Comunicações Eletrónicas e dos Correios, França) (a seguir «estudo da WIK de 2010»), que o valor desse benefício imaterial podia chegar a 81 % do montante da OSU.

90

Na réplica, as recorrentes acrescentam que é geralmente considerado que a prestação de serviços postais melhora a reputação da empresa encarregadas dos mesmos e que isso acontece mesmo quando a referida empresa enfrenta dificuldades financeiras. Em apoio deste argumento, apresentam, no anexo C.2, um relatório de 28 de janeiro de 2015 do United States Postal Service Office of Inspector General (Gabinete do Inspetor Geral dos Serviços Postais dos Estados Unidos da América) relativo ao valor da marca do operador US Postal (a seguir «relatório US Postal»), no anexo C.3, o estudo da WIK de 2010 e, no anexo C.4, um relatório da Commission for Communications Regulation (Autoridade Reguladora das Comunicações, Irlanda) de 20 de dezembro de 2017 relativo à estratégia postal do operador An Post para o período compreendido entre 2018 e 2020. Esses mesmos documentos são apresentados pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution em anexo aos seus articulados de intervenção.

91

Por outro lado, segundo as recorrentes, a ubiquidade da Post Danmark, cujos serviços cobrem todo o território dinamarquês, confere‑lhe uma vantagem importante e constitui um fator de venda, nomeadamente, em relação às sociedades de comércio eletrónico. A existência dessa vantagem foi reconhecida no relatório anual e de viabilidade da PostNord para o ano de 2017. Ora, no cálculo dos CLE aceite pela Comissão, não foi deduzido nenhum montante relacionado com essa ubiquidade.

92

Na réplica, as recorrentes referem que o relatório US Postal é igualmente pertinente em relação à ubiquidade, tal como um documento elaborado em 2014 pelo Economic and Social Research Council (ESRC, Conselho para a Investigação Económica e Social, Reino Unido), no âmbito de uma consulta pública sobre a concorrência no sector postal no Reino Unido, apresentado como anexo C.5 da réplica e igualmente apresentado pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution em anexo aos respetivos articulados de intervenção. Além disso, estas últimas sublinham que qualquer prestador encarregado da OSU beneficia de um valor de marca associado à ubiquidade uma vez que «a OSU exige um serviço universal completo e abrangente».

93

Por outro lado, segundo as recorrentes, a compensação em causa não tem em conta incentivos à eficiência, incumprindo os n.os 39 a 43 do Enquadramento SIEG. Neste sentido, as recorrentes sublinham que a Comissão calculou os custos da OSU com base nos custos reais e nos custos previsionais da Post Danmark. Ora, esta última estava em risco de insolvência no período a que respeita a compensação em causa e necessitou de uma remodelação significativa para se tornar eficiente. Por conseguinte, o cálculo dessa compensação não foi efetuado com base num prestador eficiente. As recorrentes acrescentam que a referida compensação, que diz respeito à OSU para o período de 2017 a 2019, foi concedida «a posteriori» no que se refere à primeira metade desse período, compreendida entre o ano de 2017 e a adoção da decisão impugnada, em 28 de maio de 2018. Assim, para esta primeira metade do período em causa, não poderia ter sido verificado o respeito das normas de qualidade fixadas no mandato de serviço universal.

94

Por último, as recorrentes alegam que a Comissão cometeu um «erro de direito» ao considerar a compensação em causa compatível com o mercado interno aceitando expressamente que serve para financiar uma parte dos custos decorrentes do despedimento de certos trabalhadores da Post Danmark não afetados à OSU, ao passo que essa compensação só deveria ter sido afetada à execução da OSU. Com efeito, a Comissão é obrigada a verificar a compatibilidade de um auxílio à luz do objetivo que prossegue, o que não fez no caso em apreço, ao não verificar se o objetivo relativo ao despedimento de trabalhadores da Post Danmark era compatível com o mercado interno. Nestas condições, segundo as recorrentes, a Comissão aceitou uma utilização abusiva da compensação em causa.

95

As recorrentes sublinham ainda que foi erradamente que a Comissão aceitou a tomada em consideração dos custos de despedimento de trabalhadores da Post Danmark no cálculo dos CLE, sem que tenha sido demonstrado que os trabalhadores em questão trabalhavam no âmbito da OSU. Afirmam que a sua argumentação é corroborada por um relatório de agosto de 2012 do Grupo dos Reguladores Europeus dos Serviços Postais (ERGP) sobre o cálculo dos CLE (a seguir «relatório do ERGP»).

96

Nas suas observações sobre o articulado de intervenção do Reino da Dinamarca, as recorrentes alegam que a Comissão se devia ter baseado nas Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade (JO 2014, C 249, p. 1; a seguir «Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à restruturação») para autorizar a afetação da compensação em causa ao despedimento de antigos funcionários da Post Danmark. Este argumento foi retomado na audiência tanto pelas recorrentes como pela Dansk Distribution.

97

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta a argumentação das recorrentes.

98

Particularmente, por um lado, a Comissão contesta a admissibilidade dos anexos C.2 a C.5, cuja apresentação pela primeira vez na fase da réplica não foi justificada pelas recorrentes.

99

Por outro lado, nos termos do artigo 84.o do Regulamento de Processo, a Comissão suscita uma exceção de inadmissibilidade dos diferentes argumentos invocados após a primeira troca de articulados. É esse o caso, em primeiro lugar, do argumento em que as recorrentes sublinham, na fase da réplica, que o cenário contrafactual deve ser determinado com base na rentabilidade a longo prazo de certas atividades. Em segundo lugar, em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo, a Comissão contestou a admissibilidade do argumento segundo o qual a afetação à OSU dos trabalhadores da Post Danmark que foram objeto de um plano de despedimento não estava demonstrada, pelo facto de esse argumento ter sido desenvolvido pelas recorrentes apenas na fase da réplica e, posteriormente, na fase das suas observações sobre o articulado de intervenção apresentado pelo Reino da Dinamarca. Por último, em terceiro lugar na audiência, a Comissão contestou a admissibilidade da argumentação acima resumida no n.o 96, supra, relativa à análise da compensação em causa à luz das Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à restruturação.

a)   Quanto à admissibilidade dos anexos C.2 a C.5

100

Nos termos do artigo 76.o, alínea f), do Regulamento de Processo, qualquer petição deve conter as provas e oferecimentos de prova, se a tal houver lugar.

101

Além disso, o artigo 85.o, n.o 1, do Regulamento de Processo dispõe que as provas e os oferecimentos de prova são apresentados na primeira troca de articulados. No artigo 85.o, n.o 2, do mesmo Regulamento, especifica‑se que, em apoio da sua argumentação, as partes podem ainda apresentar ou oferecer provas na réplica e na tréplica, desde que o atraso na apresentação desses elementos seja justificado.

102

A este respeito, resulta da jurisprudência que a contraprova e a ampliação da prova oferecida na sequência da apresentação de uma prova contrária pela outra parte na contestação não são abrangidas pela norma de preclusão do artigo 85.o, n.o 1, do Regulamento de Processo. Com efeito, esta disposição diz respeito às novas provas e deve ser interpretada à luz do artigo 92.o, n.o 7, do referido Regulamento, que prevê expressamente que a admissão da contraprova e da ampliação da prova depende de decisão do Tribunal [v. Acórdão de 22 de junho de 2017, Biogena Naturprodukte/EUIPO (ZUM wohl), T‑236/16, EU:T:2017:416, n.o 17 e jurisprudência referida].

103

No caso em apreço, as recorrentes apresentaram diferentes documentos nos anexos C.2 a C.5 da réplica, cuja admissibilidade é contestada pela Comissão devido ao seu caráter extemporâneo.

104

A este respeito, importa assinalar que, na contestação, a Comissão objeta, por um lado, que, regra geral, os operadores postais encarregados da OSU não gozam, por esse facto, de uma reputação acrescida e, por outro, que esses mesmos operadores podem beneficiar de vantagens decorrentes da ubiquidade quando propõem uma vasta gama de atividades comerciais além da atividade postal propriamente dita. Ora, os documentos apresentados nos anexos C.2 a C.5 visam, em substância, demonstrar que, contrariamente ao que alega a Comissão, a melhoria da reputação e a ubiquidade constituem vantagens imateriais decorrentes da OSU que são geralmente reconhecidas no sector postal. Por conseguinte, como expuseram as recorrentes em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo, a apresentação desses anexos na fase da réplica pode ser justificada para efeitos de assegurar o respeito do princípio do contraditório em relação a certos argumentos desenvolvidos na contestação, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 102.

105

Nestas condições, os anexos C.2 a C.5 são admissíveis.

b)   Quanto à existência de dificuldades sérias relacionadas com a compensação em causa

106

Nos termos do artigo 106.o, n.o 2, TFUE, as empresas encarregadas da gestão de um serviço de interesse económico geral (SIEG) estão sujeitas às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada e desde que o desenvolvimento das trocas comerciais não seja afetado de maneira que contrarie os interesses da União (v. Acórdão de 1 de julho de 2010, M6 e TF1/Comissão, T‑568/08 e T‑573/08, EU:T:2010:272, n.o 136 e jurisprudência referida).

107

Ao permitir, sob determinadas condições, derrogações às regras gerais do Tratado, o artigo 106.o, n.o 2, TFUE visa conciliar o interesse dos Estados‑Membros em utilizar certas empresas, nomeadamente do sector público, como instrumentos de política económica ou social, com o interesse da União no respeito das regras de concorrência e na preservação da unidade do mercado interno. O que o artigo 106.o, n.o 2, TFUE pretende evitar, com a apreciação da proporcionalidade do auxílio, é que o operador encarregado do serviço público beneficie de um financiamento que ultrapasse os custos líquidos do serviço público (Acórdãos de 7 de novembro de 2012, CBI/Comissão, T‑137/10, EU:T:2012:584, n.o 293; de 16 de outubro de 2013, TF1/Comissão, T‑275/11, não publicado, EU:T:2013:535, n.o 131; e de 24 de setembro de 2015, Viasat Broadcasting UK/Comissão, T‑125/12, EU:T:2015:687, n.o 87).

108

Assim, a título da fiscalização de proporcionalidade inerente ao artigo 106.o, n.o 2, TFUE, incumbe à Comissão comparar o montante dos auxílios de Estado previstos com o nível dos custos líquidos induzidos pelas missões de serviço público assumidas pelo beneficiário desses auxílios (v., por analogia, Acórdão de 10 de julho de 2012, TF1 e o./Comissão, T‑520/09, não publicado, EU:T:2012:352, n.o 121).

109

É este o objetivo prosseguido pela metodologia dos CLE, em que, segundo o n.o 25, primeira frase, do Enquadramento SIEG, «os custos líquidos necessários ou que se prevê que sejam necessários para cumprir a obrigação de serviço público são calculados como a diferença entre os custos líquidos para o prestador do serviço quando executa a obrigação de serviço público e o custo ou lucro líquidos do mesmo prestador que opera sem essa obrigação». Por conseguinte, a metodologia dos CLE implica elaborar um cenário contrafactual, ou seja, uma situação hipotética na qual o prestador do serviço universal já não está encarregado desse serviço, e compará‑lo com o cenário factual, no qual o referido prestador assegura a OSU.

110

É à luz destas considerações que importa analisar os diferentes argumentos das recorrentes relativos ao facto de a Comissão ter enfrentado dificuldades sérias ao apreciar a compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno.

111

No caso em apreço, as recorrentes apresentam quatro séries de indícios da existência de dificuldades sérias, relativas, a primeira, ao abandono errado de certas atividades no cenário contrafactual na origem do cálculo dos CLE, a segunda, à não dedução de certos benefícios imateriais no cálculo dos CLE, a terceira, à não tomada em consideração, nesse cálculo, de incentivos à eficiência na aceção dos n.os 39 a 43 do Enquadramento SIEG e, a quarta, à utilização da compensação em causa para outros fins diferentes da execução da OSU.

1) Quanto ao cenário contrafactual

112

As recorrentes contestam a elaboração do cenário contrafactual na medida em que não toma em consideração certas atividades. A este respeito, censuram a Comissão ter aceitado o cenário contrafactual que lhe foi enviado pelas autoridades dinamarquesas, quando este referia o abandono de certas atividades que, na realidade, teriam sido provavelmente prosseguidas pela Post Danmark na ausência da OSU.

113

A título preliminar, importa recordar que, nos n.os 21 a 23 do Enquadramento SIEG, que figuram no seu ponto 2.8, intitulado «Montante da compensação», é referido o seguinte:

«21. O montante da compensação não deve exceder o necessário para cobrir os custos líquidos ocasionados pelo cumprimento das obrigações de serviço público, incluindo um lucro razoável.

22. O montante da compensação pode ser estabelecido com base nos custos e receitas esperados ou nos custos e receitas efetivamente suportados, ou numa combinação de ambos, dependendo dos incentivos à eficiência que o Estado‑Membro deseja dar desde o início, em conformidade com os pontos 40 e 41.

23. Sempre que a compensação se baseie, no todo ou em parte, nos custos e receitas esperados, estes devem ser especificados no ato de atribuição. Estas estimativas devem basear‑se em parâmetros plausíveis e observáveis sobre o quadro económico em que o SIEG é prestado. Devem basear‑se, se for caso disso, nos conhecimentos especializados das autoridades de regulamentação do sector ou de outras entidades independentes das empresas. Os Estados‑Membros devem indicar as fontes em que estas expectativas se baseiam ([f]ontes de informação públicas, níveis de custos suportados pelo prestador do SIEG no passado, níveis de custos dos concorrentes, planos de atividades, relatórios sectoriais, etc.). A estimativa de custos deve refletir as expectativas dos ganhos de eficiência alcançados pelo prestador do SIEG durante o período da atribuição.»

114

Resulta dos n.os 21 a 23 do Enquadramento SIEG que os Estados‑Membros, aos quais incumbe notificar à Comissão os seus projetos destinados a instituir um auxílio, dispõem de uma certa margem de apreciação na escolha dos dados relevantes para o cálculo dos CLE e que, quando esse cálculo assenta em dados previsionais, a Comissão fiscaliza a sua plausibilidade e assegura‑se que não excede o necessário para cobrir o custo líquido da execução do serviço público, tendo em conta um lucro razoável.

115

A este respeito, refira‑se que os dados de caráter previsional comportam, por natureza, uma margem de erro e que este único facto não é suscetível de constituir um indício de que a Comissão tenha enfrentado dificuldades sérias aquando da análise preliminar de um auxílio de Estado (v., neste sentido, Acórdão de 10 de julho de 2012, TF1 e o./Comissão, T‑520/09, não publicado, EU:T:2012:352, n.os 103 e 139).

116

No caso em apreço, no n.o 148 da decisão impugnada, a Comissão referiu que o cenário factual assentava nos custos e nas receitas previsionais para o período de 2017 a 2019, com base nas contas financeiras da Post Danmark para os dez primeiros meses do ano de 2017, em projeções para os dois últimos meses desse ano e no plano de negócios da Post Danmark para os anos de 2018 e 2019. No n.o 151 da decisão impugnada, a Comissão precisou que o cenário contrafactual assentava na estimativa dos custos e das receitas da atividade comercial da Post Danmark num cenário em que não estava encarregada da OSU.

117

Resulta dos n.os 151 e 160 da decisão impugnada que as autoridades dinamarquesas consideraram que, sem a OSU, a Post Danmark teria posto termo aos envios de cartas e encomendas unitárias, definidos no n.o 3 do mandato de serviço universal como «as cartas franqueadas e as encomendas incluídas na OSU, enviadas esporadicamente e/ou em pequenas quantidades e que não [estavam] abrangidas por um contrato celebrado com a Post Danmark», ao correio registado e com valor declarado, ao serviço gratuito para os invisuais, à distribuição de jornais, revistas e catálogos, bem como aos envios internacionais de correspondência e encomendas postais.

118

Em primeiro lugar, as recorrentes realçam o facto de que os envios de cartas e encomendas unitárias, o correio registado e com valor declarado, o serviço gratuito para os invisuais, a distribuição de jornais e revistas e os envios internacionais de correspondência e encomendas postais são rentáveis nas zonas urbanas e, portanto, mesmo que deixasse de estar encarregada da OSU, a Post Danmark teria continuado a assegurar estas atividades nessas zonas.

119

Antes de mais, saliente‑se que o alegado caráter rentável das atividades em causa decorre do relatório da BDO.

120

A este respeito, por um lado, segundo jurisprudência constante, a atividade do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral rege‑se pelo princípio da livre apreciação das provas e o único critério para apreciar o valor das provas apresentadas reside na sua credibilidade. Para apreciar o valor probatório de um documento, há que verificar a verosimilhança da informação nele contida, terem consideração, nomeadamente, a origem do documento, as circunstâncias da sua elaboração e o seu destinatário e questionar‑se sobre se, atendendo ao seu conteúdo, esse documento se afigura razoável e fiável (v. Acórdão de 15 de setembro de 2016, Ferracci/Comissão, T‑219/13, EU:T:2016:485, n.o 42 e jurisprudência referida).

121

Por outro lado, conforme acima recordado no n.o 48, a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios de Estado deve ser apreciada em função das informações de que a Comissão podia dispor à data em que a proferiu.

122

Ora, no caso em apreço, o relatório da BDO foi elaborado posteriormente à adoção da decisão impugnada e ao pedido da ITD. Assim, o valor probatório desse relatório para efeitos da demonstração da existência de dificuldades sérias, que incumbe aos recorrentes, deve ser considerado muito limitado.

123

Em seguida, como sublinha a Comissão, a inclusão de atividades rentáveis no cenário contrafactual teve como efeito aumentar os lucros obtidos pela Post Danmark nesse cenário e, assim, aumentar a diferença, necessária ao cálculo dos CLE, entre as receitas decorrentes OSU e as que a Post Danmark teria obtido sem a OSU. Por conseguinte, apesar de o cenário contrafactual mencionar a prossecução de outras atividades rentáveis, a possibilidade de o cálculo dos CLE conduzir a uma sobrecompensação continuava a ser reduzida, o mesmo acontecendo, consequentemente, com o risco de incompatibilidade da compensação em causa com o mercado interno.

124

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento apresentado pelas recorrentes na réplica de que as atividades que apresentam como rentáveis só o são, efetivamente a longo prazo, embora, no cenário contrafactual delineado para o período de curto prazo entre 2017 e 2019, essas atividades ocasionariam perdas.

125

Com efeito, mesmo aceitando a sua admissibilidade, este argumento assenta numa premissa errada. A este respeito, importa recordar que o cálculo dos CLE, destinado a isolar o custo inerente à prestação do serviço universal, implica elaborar um cenário contrafactual, ou seja, uma situação hipotética na qual o prestador já não estaria encarregado desse serviço (v. n.o 109, supra). Esta metodologia consiste, numa primeira fase, em verificar se, sem a OSU, o operador inicialmente encarregado dessa OSU mudaria de comportamento e cessaria a prestação de serviços deficitários ou alteraria as modalidades da prestação dos serviços deficitários e, numa segunda fase, verificar o impacto dessa mudança de comportamento nos seus custos e receitas, para daí deduzir e calcular eventuais CLE. Por outras palavras, trata‑se de estimar o custo líquido da OSU verificando em que medida o operador encarregado da OSU aumentaria os seus lucros caso não estivesse obrigado a prestar o serviço universal (v., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2020, První novinová společnost/Comissão, T‑316/18, não publicado, EU:T:2020:489, n.os 272 e 273).

126

Por conseguinte, para este efeito, é necessário, como refere a Comissão, que o cenário contrafactual descreva uma situação estável sem ter em conta as despesas inerentes ao facto de o prestador do serviço universal deixar de estar encarregado da OSU. A argumentação das recorrentes não pode ser admitida uma vez que pressupõe que a prossecução de atividades rentáveis gera mais perdas do que ganhos.

127

Em segundo lugar, as recorrentes alegam que o cenário contrafactual proposto pelas autoridades dinamarquesas não era realista, na medida em que pressupunha que, sem a OSU, a Post Danmark renunciaria aos envios internacionais de cartas e encomendas postais, apesar de os objetivos estratégicos divulgados pela Post Danmark referirem uma «sólida presença internacional» e o fornecimento de soluções logísticas completas para a entrega de mercadorias provenientes do estrangeiro ao cliente final.

128

Contudo, como alega com razão o Reino da Dinamarca, o cenário contrafactual apenas diz respeito ao abandono, pela Post Danmark, sem a OSU, das atividades incluídas no mandato de serviço universal, a saber, de acordo com a Convenção Postal Universal, para a qual remete o n.o 2 do mandato de serviço universal (v. n.o 5, supra), os «envios de cartas» e «encomendas postais» destinados a particulares até 20 quilogramas.

129

Por conseguinte, não resulta do cenário contrafactual que as autoridades dinamarquesas consideraram que, se já não estivesse encarregada da OSU, a Post Danmark reduziria a sua presença internacional ou deixaria de estar em condições de assegurar a entrega de mercadorias à escala internacional. Daqui decorre que o cenário contrafactual não entra em contradição com os objetivos da Post Danmark relativos a um reforço da sua presença internacional e à oferta de soluções logísticas completas ao cliente final.

130

Atendendo ao anteriormente exposto, as críticas das recorrentes relativas à elaboração do cenário contrafactual não são suscetíveis de revelar a existência de dificuldades sérias enfrentadas pela Comissão.

2) Quanto à dedução dos benefícios imateriais

131

Nos termos do n.o 25, última frase, do Enquadramento SIEG, «[n]o quadro do cálculo do custo líquido, devem ser avaliados os benefícios, incluindo os imateriais, tanto quanto possível, para o prestador do SIEG».

132

Mais especificamente, quanto ao serviço postal universal, a Diretiva 2008/6/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008, que altera a Diretiva 97/67/CE no respeitante à plena realização do mercado interno dos serviços postais da Comunidade (JO 2008, L 52, p. 3), introduziu na Diretiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço (JO 1998, L 15, p. 14), o anexo I, intitulado «Orientações sobre o cálculo do eventual custo líquido do serviço universal». Este anexo prevê, na sua parte B, terceiro e quarto parágrafos, a tomada em consideração dos benefícios imateriais no cálculo do custo líquido do serviço universal.

133

Assim, em princípio, qualquer cálculo dos CLE deve deduzir os benefícios imateriais imputáveis à OSU (v., neste sentido, Acórdão de 25 de março de 2015, Slovenská pošta/Comissão, T‑556/08, não publicado, EU:T:2015:189, n.o 373), especificando‑se que nenhuma disposição enumera os tipos de benefícios imateriais que são, geralmente, imputáveis a um SIEG ou, particularmente, imputáveis à OSU no domínio postal.

134

No caso em apreço, no n.o 157 da decisão impugnada, a Comissão recordou que os benefícios imateriais no sector postal incluem as economias de escala e de quantidade, as vantagens publicitárias relacionadas com a propriedade intelectual, os efeitos sobre a procura devidos à isenção do IVA, as vantagens decorrentes da cobertura territorial integral, o poder de negociação e uma melhor angariação de clientela.

135

No n.o 158 da decisão impugnada, a Comissão salientou que o cálculo dos CLE proposto pelas autoridades dinamarquesas integrava duas categorias de benefícios imateriais. Por um lado, esse cálculo tinha em conta o aumento da procura em benefício da Post Danmark no que respeita aos clientes sujeitos a IVA e que não o podem deduzir, devido à isenção desse imposto nos serviços abrangidos pela OSU. Por outro lado, a Comissão salientou que as autoridades dinamarquesas tinham deduzido os ativos de propriedade intelectual relacionados com a OSU, particularmente os resultantes das repercussões a nível publicitário decorrentes dos pontos de contacto visíveis como as caixas de correio e dos pontos self‑service de recolha de encomendas.

136

No n.o 159 da decisão impugnada, a Comissão referiu que, em contrapartida, as autoridades dinamarquesas tinham excluído do cálculo do custo líquido da OSU três categorias de benefícios imateriais, respetivamente, decorrentes de economias de escala, de um poder de negociação acrescido e de uma cobertura territorial integral no mercado da distribuição postal de jornais, revistas e catálogos.

137

Em substância, as recorrentes censuram a Comissão por ter aceitado uma metodologia de cálculo dos CLE que não procedia à dedução de qualquer benefício imaterial decorrente da melhoria da reputação da Post Danmark e da ubiquidade desta no território dinamarquês.

i) Quanto à melhoria da reputação da Post Danmark

138

As recorrentes alegam que a melhoria da reputação do prestador do serviço universal continua a ser considerada um benefício imaterial no sector postal e que pode chegar a 81 % do custo da OSU. No caso da Post Danmark, a OSU permitia‑lhe imprimir selos com a palavra «Danmark» e utilizar o logótipo da corneta postal com uma coroa dourada nas estações de correio públicas, reforçando assim o valor da marca desta empresa, constituída numa situação de monopólio.

139

A título preliminar, saliente‑se, à semelhança da Comissão, que a percentagem de 81 % do custo da OSU, apresentada pelas recorrentes, provém de um estudo sobre as telecomunicações realizado pela WIK Consult em 1997 e reproduzido no n.o 2.2 do estudo da WIK de 2010, intitulado «Vantagens imateriais no sector das comunicações eletrónicas». Por conseguinte, não se podia deduzir desse dado, que não diz respeito ao serviço postal universal, que Comissão tinha enfrentado dificuldades sérias devido à não tomada em consideração do impacto da OSU na reputação da Post Danmark.

140

No entanto, resulta das diferentes provas apresentadas pelas recorrentes que a melhoria da reputação do prestador do serviço universal pode ser considerada como um benefício imaterial imputável à OSU no sector postal. Particularmente, o estudo da WIK de 2010 e o relatório ERGP enunciam, em termos idênticos, o seguinte:

«A maior parte dos operadores históricos/[prestadores do serviço universal] prestam serviços postais de grande qualidade em todo o território (país). Por tal motivo, gozam de uma excelente reputação e consequentemente de um forte valor da sua marca. A clientela, que se apercebe disso (reconhecendo também que o [prestador do serviço universal] põe à sua disposição serviços com prejuízo), terá tendência para adquirir serviços (não‑OSU) ao [prestador do serviço universal] em detrimento de outro operador. Reduzir a qualidade de serviço abaixo dos padrões OSU poderia levar a uma perda de reputação da empresa e do valor da marca.»

141

A este respeito, importa sublinhar que esta citação consta nas partes do estudo da WIK de 2010 e do relatório do ERGP dedicadas ao inventário da documentação e das publicações disponíveis a propósito das vantagens de que beneficia o prestador do serviço universal no sector postal. Esses documentos especificam que a identificação da vantagem relativa à melhoria da reputação do prestador do serviço universal se baseia em estudos que datam de 2001, de 2002 e de 2008.

142

No caso em apreço, as recorrentes não estão em condições de explicar de que modo as considerações acima recordadas no n.o 140, que são suscetíveis de demonstrar que a OSU melhora a reputação do operador dela encarregado, são aplicáveis à Post Danmark, para quem o recurso generalizado ao correio eletrónico levou a uma redução de 38 % do volume de negócios entre 2009 e 2016. Sobre este último ponto, como sublinha a Comissão, as dificuldades financeiras enfrentadas pela Post Danmark durante esse período levaram, por um lado, a uma diminuição das prestações de serviços disponibilizadas a título da OSU e, por outro, ao aumento dos preços desses serviços, o que é suscetível de excluir a existência de dificuldades sérias quanto à não dedução dos benefícios decorrentes da melhoria da reputação da Post Danmark no cálculo dos CLE.

143

Esta conclusão não é posta em causa pelo relatório US Postal, do qual resulta que, apesar das dificuldades financeiras, o operador US Postal, encarregado da OSU nos Estados Unidos, viu o valor da sua marca de empresa atingir um nível muito elevado e equivalente ao custo da OSU. A este respeito, mesmo admitindo que o contexto no qual opera a US Postal seja transponível para o relativo à Post Danmark, a importância do valor da sua marca de empresa e a comparação desta com o custo da OSU não têm qualquer relevância para demonstrar que, sem a OSU, a reputação da empresa seria afetada. Com efeito, para efeitos da dedução dos benefícios imateriais no âmbito do cálculo dos CLE, o que importa não é determinar o valor da marca de empresa do prestador do serviço universal, mas sim se a reputação de um prestador do serviço universal melhorou pelo facto de assegurar esse serviço.

144

Por outro lado, a circunstância, realçada pelas recorrentes, de que a OSU leva a Post Danmark a emitir selos com o nome «Danmark» e a utilizar o logótipo da corneta postal com uma coroa dourada também não pode ser vista como um indício de dificuldades sérias relacionado com a não tomada em consideração de um benefício imaterial relativo à melhoria da reputação da Post Danmark. Com efeito, embora esta circunstância seja suscetível de demonstrar a existência de um vínculo entre o Estado dinamarquês e a Post Danmark, as recorrentes não comprovam que, sem a OSU, esse vínculo seria rompido. Ora, atendendo ao facto de que o nome «Danmark» é uma componente da denominação social da Post Danmark, que é o operador histórico dinamarquês e, nessa qualidade, beneficiou de uma situação de monopólio no território nacional, e que o Estado dinamarquês é um dos dois acionistas da sociedade‑mãe da Post Danmark, é provável que, mesmo que este operador deixe de ser encarregado da OSU, a sua imagem continue associada ao Estado dinamarquês.

145

Por último, as recorrentes não podiam validamente usar como argumento o estudo da WIK de 2010 relativo ao operador francês La Poste e um relatório sobre o operador irlandês An Post.

146

Por um lado, embora o estudo da WIK de 2010 tenha concluído, em relação à La Poste, que o facto de ser prestador do serviço universal era suscetível de melhorar a sua reputação, esta conclusão estava relacionada com a existência de circunstâncias específicas do prestador em causa, como resulta da constatação segundo a qual «A La Poste tem a reputação de uma empresa socialmente responsável junta da clientela», «[t]udo o que se relaciona, em França, com o conceito de “[s]erviço [p]úblico” tem, tradicionalmente, um lugar e uma função muito importantes aos olhos da população», «[a]s pessoas confiam nos serviços postais e financeiros de La Poste e são muito sensíveis a qualquer mudança na oferta desses serviços». Ora, as recorrentes não demonstram, nem sequer alegam, que essas circunstâncias são transponíveis para a Post Danmark.

147

Por outro lado, quanto ao relatório sobre a An Post, a passagem referida pelas recorrentes, segundo a qual a prestação do serviço universal permite uma melhoria da reputação, consta de uma parte relativa ao «envio de correspondência». Só em relação a esse serviço é que se poderia deduzir, dessa passagem, uma melhoria da reputação devido à OSU.

148

Ora, resulta dos n.os 151 e 160 da decisão impugnada que, sem a OSU, a Post Danmark deixaria de assegurar o envio de cartas devido ao caráter deficitário desse serviço. Por conseguinte, qualquer perda de reputação limitada ao sector do envio de cartas não teria influência na situação da Post Danmark sem a OSU, uma vez que esta deixaria de estar presente nesse sector.

149

Resulta do anteriormente exposto que nenhum dos elementos apresentados pelas recorrentes permite considerar que a não tomada em consideração, pelas autoridades dinamarquesas, da melhoria da imagem de marca devido à OSU no cálculo dos CLE deveria ter suscitado dúvidas à Comissão na apreciação da compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno.

ii) Quanto à ubiquidade

150

Segundo as recorrentes, a Comissão também aceitou erradamente o cálculo dos CLE proposto pelas autoridades dinamarquesas, quando esse cálculo não deduz nenhum montante correspondente à ubiquidade.

151

A este respeito, resulta de diferentes documentos apresentados pelas recorrentes, nomeadamente do estudo da WIK de 2010 e do relatório do ERGP, que, no sector postal, a ubiquidade designa o efeito de angariação e de fidelização de clientes, que preferem recorrer ao prestador do serviço universal do que aos seus concorrentes, na medida em que sabem que, devido à OSU, esse prestador fornece serviços em todo o território.

152

Assim, antes de mais, importa referir que, por um lado, contrariamente ao que alega a Comissão, a vantagem decorrente da ubiquidade não beneficia apenas os operadores que prestam serviços bancários ou de seguros, apesar de essa vantagem poder ser tanto mais importante quanto mais numerosos e variados forem os serviços propostos. Por outro lado, contrariamente ao que alega o Reino da Dinamarca, a vantagem relacionada com a ubiquidade distingue‑se da eficácia publicitária, que designa o facto de a presença territorial decorrente da OSU conferir ao prestador do serviço universal uma visibilidade em todo o território, ao passo que qualquer outro operador teria de suportar despesas com publicidade para obter uma visibilidade equivalente.

153

Dito isto, o facto de a ubiquidade poder ser considerada um benefício imaterial decorrente do serviço universal no domínio postal não entra em contradição com o conteúdo da decisão impugnada, tendo a Comissão referido, no n.o 157 desta, que os benefícios imateriais e comerciais típicos incluíam as «vantagens [relacionadas com] a cobertura universal» e uma «melhor angariação de clientela».

154

Além disso, como sublinha o Reino da Dinamarca, não é sistematicamente deduzida do cálculo dos CLE uma vantagem imaterial relacionada com a ubiquidade, como testemunha o estudo da WIK de 2010, apresentado pelas recorrentes, que considerou que a OSU não proporcionava ao operador francês La Poste nenhuma vantagem imaterial relacionada com a ubiquidade.

155

No caso em apreço, no n.o 159, iii), da decisão impugnada, a Comissão referiu que os distribuidores de catálogos, de revistas e de jornais estavam, segundo as autoridades dinamarquesas, plenamente dispostos a escolher distribuidores que não ofereciam uma cobertura territorial universal. Esta consideração, que as recorrentes não contestam, tende a demonstrar que a Post Danmark não beneficia, com o seu estatuto de prestador do serviço universal, de uma vantagem imaterial relacionada com a ubiquidade.

156

Quanto aos elementos apresentados pelas recorrentes e destinados a demonstrar que a OSU confere à Post Danmark um benefício imaterial decorrente da sua ubiquidade, importa declarar que, efetivamente, no seu relatório anual e de viabilidade para o ano de 2017, a PostNord indicou que a assunção da responsabilidade pela OSU na Suécia e na Dinamarca lhe permitia aceder à totalidade das residências nestes dois Estados, o que constituía um fator de força face ao crescimento do comércio eletrónico.

157

Contudo, esse excerto não entra em contradição com o conteúdo da decisão impugnada relativo à não dedução de um benefício imaterial decorrente da ubiquidade. Com efeito, por um lado, no n.o 149, i), da decisão impugnada, a Comissão salientou que a Post Danmark previa, para o período entre 2017 e 2019, um aumento substancial dos envios das empresas aos consumidores, atendendo ao crescimento do comércio eletrónico. Por outro lado, resulta do n.o 151 da decisão impugnada que, sem a OSU, a Post Danmark teria continuado a distribuir outras encomendas diferentes de encomendas unitárias, mediante alguns ajustamentos respeitantes à entrega ao domicílio, que tinha cessado em certas zonas rurais particularmente pouco populosas. Por conseguinte, como sublinharam a Comissão e o Reino da Dinamarca, mesmo sem a OSU, a ubiquidade da Post Danmark não teria sido substancialmente alterada em relação aos serviços ligados ao comércio eletrónico, uma vez que a Post Danmark teria continuado a propor, em todo o território dinamarquês, a distribuição de encomendas diferentes de encomendas unitárias, com ou sem entrega ao domicílio consoante as zonas.

158

Por outro lado, como alega acertadamente a Comissão, os excertos do relatório US Postal e do documento elaborado pela ESRC, citados pelas recorrentes, dizem respeito à ubiquidade da marca de empresa de um prestador do serviço universal, ou seja, o impacto da cobertura integral do território sobre a reputação desse prestador. Ora, como assinalado acima nos n.os 142 a 149, atendendo à situação da Post Danmark, a Comissão podia excluir o facto de a OSU melhorar a sua reputação.

159

Nestas condições, os elementos apresentados pelas recorrentes não permitem considerar que a não dedução específica de um benefício imaterial decorrente da ubiquidade, no cálculo dos CLE apresentado pelas autoridades dinamarquesas, deveria ter colocado a Comissão face a dificuldades sérias quanto à compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno.

3) Quanto à tomada em consideração de incentivos à eficiência

160

As recorrentes criticam a Comissão por ter considerado que a compensação em causa era compatível com o mercado interno quando, na sua opinião, o cálculo dos CLE que deu origem a essa compensação não cumpre, em dois aspetos, os n.os 39 a 43 do Enquadramento SIEG, relativos aos incentivos à eficiência. Por um lado, o cálculo dos CLE não foi elaborado com base num prestador eficiente e, por outro, não podia ter sido efetuada nenhuma fiscalização da qualidade do serviço universal, uma vez que parte da compensação em causa foi paga posteriormente.

161

Os n.os 39 a 43 do Enquadramento SIEG têm a seguinte redação:

«39. Ao conceberem o método de compensação, os Estados‑Membros devem introduzir incentivos para promover uma prestação eficiente de um SIEG de elevada qualidade, a menos que possam justificar adequadamente que não é viável ou adequado fazê‑lo.

40. Os incentivos à eficiência podem ser concebidos de diferentes formas, para que correspondam da melhor forma à especificidade de cada caso ou sector. Por exemplo, os Estados‑Membros podem definir de antemão um nível fixo de compensação que antecipa e integra os ganhos de eficiência que se espera que a empresa obtenha ao longo do período previsto no ato de atribuição.

41. Em alternativa, os Estados‑Membros podem definir objetivos de eficiência produtiva no ato de atribuição, que façam depender o nível de compensação da medida em que os objetivos tenham sido atingidos. Se a empresa não atingir os objetivos, a compensação deve ser reduzida segundo o método de cálculo especificado no ato de atribuição. Em contrapartida, se a empresa ultrapassar os objetivos, a compensação deve aumentar de acordo com um método também especificado no ato de atribuição. As recompensas associadas aos ganhos de eficiência produtiva devem ser fixadas a um nível que permita a repartição equilibrada desses ganhos entre a empresa e o Estado‑Membro e/ou os utilizadores.

42. Todos os mecanismos de incentivo às melhorias de eficiência devem basear‑se em critérios objetivos e mensuráveis, definidos no ato de atribuição e sujeitos a uma avaliação ex post transparente, realizada por uma entidade independente do prestador do SIEG.

43. Os ganhos de eficiência devem ser atingidos sem prejuízo da qualidade do serviço prestado e devem satisfazer as normas previstas na legislação da União.»

162

No caso em apreço, nos n.os 166 a 169 da decisão impugnada, bem como no seu n.o 181, vi), a Comissão considerou que as autoridades dinamarquesas tinham previsto suficientes incentivos à eficiência do serviço universal. Por um lado, a Comissão considerou que podia ser deduzido um importante incentivo à eficiência do facto de a compensação em causa ser paga antecipadamente e representar 46 % dos CLE, o que autorizava a Post Danmark a conservar todos os ganhos de eficiência na condição de tal não conduzir a uma sobrecompensação. Por outro lado, a Comissão salientou que as normas de qualidade, impostas à Post Danmark no mandato de serviço universal, e o sistema de penalização instituído em caso de incumprimento dessas normas eram suscetíveis de evitar que a qualidade do serviço universal fosse afetada por esses ganhos de eficiência.

163

Os argumentos apresentados pelas recorrentes não permitem concluir que essas considerações comportam um indício de existência de dificuldades sérias quanto à apreciação da compatibilidade da compensação em causa.

164

Em primeiro lugar, as recorrentes não têm razão quando alegam que a compensação em causa não comportava um incentivo à eficiência pelo facto de o seu beneficiário, a Post Danmark, estar em risco de insolvência e, por conseguinte, não podia ser considerado como um prestador eficiente. Com efeito, esse argumento procede de uma confusão entre, por um lado, os incentivos à eficiência conforme exigidos nos n.os 39 a 43 do Enquadramento SIEG, que visam que a prestação de um SIEG proporcione ganhos de eficiência assegurando simultaneamente um serviço de qualidade, e, por outro, a ideia de que o cálculo dos CLE seja efetuado com base num prestador eficiente.

165

A este respeito, a questão de saber se o nível da compensação necessária deve ser determinado com base numa análise dos custos que um prestador eficiente teria apresentado para executar a OSU não é pertinente para a apreciação da compatibilidade do auxílio no âmbito de aplicação do artigo 106.o, n.o 2, TFUE. Com efeito, a tomada em consideração da eficiência económica do prestador do serviço universal equivaleria a exigir que esse serviço fosse sempre prestado em condições normais de mercado, o que poderia obstar ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular confiada às empresas encarregadas da gestão de um SIEG. Ora, é precisamente essa situação que o artigo 106.o, n.o 2, TFUE visa prevenir (v., neste sentido, Acórdão de 24 de setembro de 2015, Viasat Broadcasting UK/Comissão, T‑125/12, EU:T:2015:687, n.o 90 e jurisprudência referida).

166

Em segundo lugar, o argumento das recorrentes de que uma parte da compensação em causa foi paga sem que pudesse ter sido verificado o cumprimento das normas de qualidade do serviço universal carece de base factual. Com efeito, essas normas de qualidade, bem como o mecanismo de fiscalização e de sanção foram fixados no mandato de serviço universal, datado de 30 de maio de 2016, ou seja, antes do início do período a que respeita a compensação em causa.

4) Quanto à utilização da compensação em causa

167

Em primeiro lugar, as recorrentes criticam a Comissão por ter cometido um erro de direito ao considerar que a compensação em causa era compatível com o mercado interno, com base no Enquadramento SIEG, e ao autorizar expressamente que essa compensação fosse utilizada não para a execução da OSU, mas para pagar as despesas originadas pelo despedimento de antigos funcionários.

168

A este respeito, é pacífico que, como salientou a Comissão no n.o 23 da decisão impugnada, a compensação em causa é um componente do novo modelo de produção da Post Danmark. Particularmente, as autoridades dinamarquesas previram que o montante correspondente à compensação em causa serve para financiar uma parte das indemnizações especiais por despedimento de antigos funcionários da Post Danmark.

169

Segundo a jurisprudência acima recordada nos n.os 106 a 108, o objetivo subjacente ao artigo 106.o, n.o 2, TFUE é evitar que as regras de concorrência obstem ao cumprimento das respetivas missões pelas empresas encarregadas de um serviço público, ao permitir que os Estados‑Membros lhes concedam um financiamento, sob a condição de este não ultrapassar os custos líquidos imputáveis a esse serviço público, tendo em conta um lucro razoável.

170

Por conseguinte, o exame, pela Comissão, da compatibilidade de uma compensação de serviço público com o mercado interno consiste em verificar, independentemente da afetação efetiva do montante que lhe corresponde, se esse serviço público existe e se obriga a empresa encarregada de o assegurar a suportar um custo líquido.

171

Tal apreciação é confirmada pelo facto de uma compensação de serviço público poder ter em conta um lucro razoável e, por conseguinte, exceder o estrito montante dos custos líquidos do serviço público.

172

E isto é tanto mais verdade no domínio postal, dado que as disposições do anexo I, parte C, primeiro parágrafo, da Diretiva 97/67 preveem que «[a] recuperação ou o financiamento de todos os custos líquidos das obrigações de serviço universal pode implicar o pagamento de uma compensação aos prestadores do serviço universal pelos serviços que estes oferecem em condições não comerciais». Com efeito, a expressão «[a] recuperação ou o financiamento» utilizada nesta disposição exclui qualquer exigência de afetação efetiva da transferência de fundos correspondente a uma compensação pelo serviço universal à execução desse serviço.

173

Consequentemente, o facto de o montante concedido a título da compensação em causa ser afetado a um fim diferente da OSU não implica, por si só, que a Comissão tenha enfrentado dificuldades sérias na apreciação da compatibilidade dessa medida (v., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2020, První novinová společnost/Comissão, T‑316/18, não publicado, EU:T:2020:489, n.o 187).

174

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo argumento das recorrentes relativo às regras jurídicas que proíbem a utilização abusiva dos auxílios de Estado.

175

A este respeito, resulta do artigo 1.o, alínea g), do Regulamento 2015/1589 que um auxílio utilizado de forma abusiva é um auxílio utilizado pelo seu beneficiário em violação de uma decisão da Comissão.

176

No caso em apreço, a decisão impugnada tem por objeto a apreciação da compatibilidade da compensação em causa, concedida para efeitos de cobrir os custos líquidos induzidos pela OSU conforme prevista no mandato de serviço universal. Ora, não foi contestado que, na Dinamarca, a OSU é assegurada pela Post Danmark. Assim, só poderia ter sido constatada uma utilização abusiva da compensação em causa se tivesse sido demonstrado que a Post Danmark não cumpriu as suas obrigações decorrentes da OSU.

177

Em segundo lugar, as recorrentes alegam, em substância, que a Comissão não podia aceitar que o cálculo da compensação em causa incluía o montante das despesas de despedimento dos antigos funcionários da Post Danmark. Particularmente, não foi demonstrado que os antigos funcionários cujo despedimento estava abrangido pela compensação em causa estavam efetivamente alocados à execução da OSU (v. n.o 95, supra).

178

A este respeito, antes de mais, como já exposto no n.o 114, supra, os Estados‑Membros dispõem de uma margem de apreciação na escolha dos dados pertinentes para o cálculo dos CLE e nada obsta a que, à semelhança das autoridades dinamarquesas no caso em apreço, se baseiem nos custos anteriormente suportados pelo prestador do serviço universal ou no plano de negócios deste último. Em seguida, como resulta dos n.os 1 e 10 do acordo de 20 de outubro de 2017 e do ponto 2.2 da decisão impugnada, por um lado, tornou‑se necessária a implantação de um novo modelo de produção na Post Danmark por causa da mudança de natureza do mercado postal devida à digitalização crescente das trocas de correspondência na Dinamarca e, por outro, o novo modelo em questão centra‑se em grande parte na racionalização de certos custos de pessoal relacionados com a distribuição do correio. Ficou assim demonstrado que, contrariamente ao que alegam as recorrentes, os antigos funcionários da Post Danmark, cujo despedimento estava previsto, estavam intrinsecamente ligados à distribuição do correio, atividade central da OSU. Por último, como sublinhou a Comissão, sem ser contraditada pelas recorrentes quanto a este ponto, as autoridades dinamarquesas adotaram uma abordagem prudente ao considerar, no cenário contrafactual, que, mesmo que não tivesse sido encarregada da OSU, a Post Danmark teria igualmente de pagar as despesas de despedimento de antigos funcionários na mesma proporção da prevista no cenário factual, o que tende a reduzir a incidência dessas despesas de despedimento no montante dos CLE.

179

Por todas estas razões, há que concluir que a tomada em consideração das despesas de despedimento de antigos funcionários da Post Danmark no cálculo dos CLE não é suscetível de demonstrar que a Comissão tenha enfrentado dificuldades sérias a este respeito.

180

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo relatório do ERGP. Com efeito, nos termos do excerto deste relatório invocado pelas recorrentes, «as restrições à redução dos efetivos […] não devem ser definidas como fazendo parte da OSU no sector postal». Ora, no caso em apreço, como sublinha a Comissão, não foram impostas à Post Danmark quaisquer restrições à redução dos efetivos devido à OSU. Pelo contrário, esta empresa previu reduzir os seus efetivos no cenário factual.

181

A alegação relativa à tomada em consideração das despesas de despedimento no cálculo do montante dos CLE deve, assim, ser julgada improcedente, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a sua admissibilidade, contestada pela Comissão em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo.

182

Em terceiro lugar, as recorrentes e a Dansk Distribution alegam que a Comissão cometeu um erro ao não apreciar a compatibilidade da compensação em causa com base nas Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à restruturação.

183

A este respeito, importa recordar que, em conformidade com o artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, é proibido deduzir fundamentos novos no decurso da instância, a menos que esses fundamentos tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. Todavia, deve ser declarado admissível um fundamento que constitua a ampliação de um fundamento anteriormente enunciado, explicita ou implicitamente, na petição inicial e que apresente um nexo estreito com este. Para poder ser considerado uma ampliação de um fundamento ou de uma alegação anteriormente enunciados, um novo argumento deve apresentar uma ligação suficientemente estreita com os fundamentos ou as alegações inicialmente expostas na petição, para se poder considerar que resultou da evolução normal do debate num processo contencioso (v. Acórdão de 20 de novembro de 2017, Petrov e o./Parlamento, T‑452/15, EU:T:2017:822, n.o 46 e jurisprudência referida).

184

Ora, não se pode deixar de constatar que foi apenas na fase das suas observações sobre o articulado de intervenção do Reino da Dinamarca que as recorrentes alegaram, pela primeira vez, que a Comissão estava obrigada a aplicar as Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à restruturação e que a petição não contém qualquer referência a essas Orientações. Assim, contrariamente ao que alegaram na audiência, esse argumento não está relacionado com a alegação constante na parte da petição intitulada «Utilização dos fundos» e na qual criticaram a Comissão por ter declarado erradamente que a compensação em causa era compatível com o mercado interno com base no Enquadramento SIEG e autorizado que uma parte desta fosse despendida com o despedimento de antigos funcionários da Post Danmark.

185

Por conseguinte, o argumento relativo à não aplicação das Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à restruturação não pode ser considerado uma ampliação do fundamento alegado na petição na aceção do artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo e deve, por esse motivo, ser considerado um novo argumento na aceção desta mesma disposição. Na medida em que este argumento não se baseia em elementos que se tenham revelado após a interposição do presente recurso, há que considerá‑lo extemporâneo e, por conseguinte, julgá‑lo inadmissível. A reprodução do referido argumento pela Dansk Distribution na audiência também não pode ser admitida, uma vez que não tinha sido alegado no seu articulado de intervenção.

5) Conclusão

186

De todos os elementos acima analisados resulta que as recorrentes não forneceram prova da existência de dificuldades sérias quanto à compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno.

187

Esta conclusão é corroborada pela circunstância, referida no n.o 160 da decisão impugnada, de que o montante dos CLE calculado, de 2,571 mil milhões de DKK (cerca de 345 milhões de euros), ser substancialmente superior ao montante máximo da compensação em causa, de 1,192 mil milhões de DKK (cerca de 160 milhões de euros). Isto é tanto mais verdade quanto as recorrentes não apresentaram nenhuma contestação destinada a pôr em causa estes montantes, que constam da versão pública da decisão impugnada. De igual modo, enquanto a Comissão sublinhou na contestação a diferença entre o montante da compensação em causa e o dos CLE, as recorrentes também não contestaram essa diferença na réplica.

2.   Quanto à garantia em causa

188

As recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, alegam que não se pode considerar que a garantia em causa, em virtude da qual o Estado dinamarquês se comprometeu a pagar as indemnizações por despedimento dos antigos funcionários da Post Danmark, em caso de insolvência desta última, foi concedida no momento da sua adoção, em 2002. Assim, essa garantia não constitui um auxílio existente na aceção do artigo 17.o do Regulamento 2015/1589.

189

Em primeiro lugar, segundo as recorrentes, o auxílio não reside na vantagem conferida pela existência da própria garantia, mas na falta de pagamento de um prémio ao Estado pela Post Danmark, em contrapartida do benefício conferido pela garantia em causa. A este respeito, sublinham que resulta do ponto 2.2 da Comunicação da Comissão relativa à aplicação dos artigos [107.o] e [108.o TFUE] aos auxílios estatais sob forma de garantias (JO 2008, C 155, p. 10, a seguir «Comunicação relativa às garantias»), que qualquer garantia deve ser remunerada por intermédio de um prémio adequado, sob pena de o beneficiário da garantia, a saber, no caso concreto, a Post Danmark, obter uma vantagem.

190

Ora, uma vez que um prémio da garantia é, geralmente, faturado periodicamente e, pelo menos, anualmente, a medida de auxílio denunciada pelas recorrentes foi concedida à Post Danmark, pelo menos anualmente, desde 2002. A falta repetida de pagamentos anuais de um prémio adequado em contrapartida da garantia em causa traduz‑se, assim, na concessão periódica de vantagens, na aceção do Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão (C‑81/10 P, EU:C:2011:811, n.o 82).

191

Em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo, as recorrentes precisaram que, na sua opinião, a garantia em causa constituía um regime de auxílios e que, mesmo admitindo que não fosse esse o caso, as considerações desenvolvidas pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão (C‑81/10 P, EU:C:2011:811), continuariam a ser pertinentes.

192

Em segundo lugar, as recorrentes observam que o simples facto de a Comissão ter manifestado dúvidas quanto à existência de uma vantagem basta para demonstrar que enfrentou dificuldades sérias quanto à natureza existente ou nova do auxílio concedido à Post Danmark sob a forma de garantias.

193

Em terceiro lugar, a Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution alegam que, de acordo com o princípio do investidor privado numa economia de mercado, a concessão de uma garantia sem prémio constitui um benefício económico que um operador não teria obtido em condições normais de mercado. Esta conclusão é válida independentemente do motivo pelo qual a garantia foi concedida, mesmo admitindo que não aproveita a qualquer credor. A este respeito, a Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution sublinham que qualquer isenção dos custos de exploração normalmente suportados por uma empresa constitui, segundo a jurisprudência, uma vantagem.

194

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta estes argumentos.

195

Segundo jurisprudência constante, o exame dos auxílios existentes só pode ser objeto, se for o caso, de uma decisão de incompatibilidade que produza efeitos para o futuro (Acórdãos de 11 de março de 2009, TF1/Comissão, T‑354/05, EU:T:2009:66, n.o 166, e de 15 de novembro de 2018, Stichting Woonlinie e o./Comissão, T‑202/10 RENV II e T‑203/10 RENV II, EU:T:2018:795, n.o 120).

196

A este respeito, o artigo 1.o, alínea b), iv), do Regulamento 2015/1589 dispõe que é um auxílio existente qualquer auxílio considerado existente nos termos do artigo 17.o do mesmo regulamento.

197

Nos termos do artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento 2015/1589, qualquer auxílio cujo prazo de prescrição de dez anos tenha caducado será considerado um auxílio existente. Os n.os 1 e 2 do mesmo artigo, por sua vez, precisam que os poderes da Comissão para recuperar o auxílio ficam sujeitos a um prazo de prescrição de dez anos e que este prazo começa a contar na data em que o auxílio ilegal tenha sido concedido ao beneficiário, quer como auxílio individual, quer como auxílio ao abrigo de um regime de auxílio.

198

Resulta destas disposições que a qualificação de auxílio existente depende do termo do prazo de prescrição previsto no artigo 17.o do Regulamento 2015/1589, cujo ponto de partida é data da concessão desse auxílio.

199

Segundo a jurisprudência, os auxílios são considerados concedidos no momento em que o direito de os receber é conferido ao beneficiário em virtude da regulamentação nacional aplicável (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de março de 2013, Magdeburger Mühlenwerke, C‑129/12, EU:C:2013:200, n.os 40 e 41, e de 29 de novembro de 2018, ARFEA/Comissão, T‑720/16, não publicado, EU:T:2018:853, n.os 177 e 178).

200

No caso em apreço, o direito de receber a garantia em causa, pela qual o Estado dinamarquês se comprometeu a cobrir, em caso de insolvência da Post Danmark, as indemnizações por despedimento dos trabalhadores desta que mantinham o seu estatuto de funcionário em 1 de janeiro de 2002, data da sua transformação em sociedade de responsabilidade limitada, foi conferido em virtude do artigo 9.o da lov nr. 409 om Post Danmark A/S (Lei n.o 409 Relativa à Post Danmark), de 6 de junho de 2002 (Lovtidende 2002 A).

201

Na decisão impugnada, a Comissão considerou que foi nessa data que foi concedida a única vantagem suscetível de decorrer dessa garantia, e que consistia em evitar uma saída massiva de membros do pessoal da Post Danmark no momento da sua transformação em sociedade de responsabilidade limitada (n.o 187 da referida decisão). A Comissão deduziu daí que, na medida em que tinha tomado conhecimento da garantia em causa através da denúncia da ITD, enviada em 27 de novembro de 2017, qualquer auxílio eventualmente concedido por essa garantia era um auxílio existente na aceção do artigo 1.o, alínea b), iv), do Regulamento 2015/1589 (n.os 189 a 192).

202

As recorrentes contestam que a data da adoção da Lei n.o 409 Relativa à Post Danmark possa constituir o ponto de partida do prazo de prescrição para a recuperação do auxílio decorrente da garantia em causa. Segundo as recorrentes, a garantia em causa melhora a situação financeira da Post Danmark ao isentá‑la do pagamento, no mínimo anual, de um prémio de garantia, o que implica a concessão periódica de vantagens suscetíveis de fazer recomeçar a correr o prazo de prescrição em cada isenção deste tipo.

203

A este respeito, como sublinham as recorrentes, a determinação da data de concessão de um auxílio é suscetível de variar em função da sua natureza (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão, C‑81/10 P, EU:C:2011:811, n.o 82, e Despacho de 5 de outubro de 2016, Diputación Foral de Bizkaia/Comissão, C‑426/15 P, não publicado, EU:C:2016:757, n.o 29). Assim, no Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão (C‑81/10 P, EU:C:2011:811, n.os 80 a 84), invocado pelas recorrentes, o Tribunal de Justiça declarou que, no caso de regimes de auxílios plurianuais, que se traduzem em pagamentos ou na concessão periódica de vantagens, deve considerar‑se que o auxílio foi atribuído ao beneficiário apenas na data em que efetivamente lhe foi concedido, de modo que o prazo de prescrição recomeça a correr a cada concessão efetiva, eventualmente anual, do benefício.

204

Esta solução justifica‑se pelo facto de, no âmbito dos regimes de auxílios, nomeadamente dos regimes de auxílios fiscais, poder haver um lapso de tempo significativo entre a data da instauração de um regime de auxílios e a data em que um auxílio individual é concedido em aplicação desse regime. Por conseguinte, o prazo de prescrição é suscetível de recomeçar a correr cada vez que um auxílio individual é novamente concedido em aplicação de um regime de auxílios, o que, no âmbito de um regime de auxílios fiscais, corresponde a cada isenção concedida quando o imposto é devido, isto é, regra geral, anualmente.

205

A este respeito, nos termos do artigo 1.o, alínea d), do Regulamento 2015/1589, constitui um «regime de auxílios» qualquer ato com base no qual, sem que sejam necessárias outras medidas de execução, podem ser concedidos auxílios individuais a empresas nele definidas de forma geral e abstrata e qualquer diploma com base no qual pode ser concedido a uma ou mais empresas um auxílio não ligado a um projeto específico, por um período de tempo indefinido e/ou com um montante indefinido.

206

Ora, no caso em apreço, a garantia em causa limita‑se a conceder, sem prémio, a uma determinada pessoa coletiva, a Post Danmark, o benefício de uma garantia de Estado para o pagamento das indemnizações por despedimento de alguns dos seus trabalhadores, em caso de insolvência. Trata‑se, assim, de uma medida individual que não está abrangida num regime de auxílios plurianual.

207

Independentemente da qualificação da garantia em causa de regime de auxílios ou de auxílio individual, a situação no presente processo não é comparável à que tinha justificado que, no Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão (C‑81/10 P, EU:C:2011:811), o Tribunal de Justiça tenha considerado que o prazo de prescrição recomeçava a correr todos os anos. Com efeito, nesse processo, a vantagem em causa dependia, em cada ano, de circunstâncias específicas, na medida em que essa vantagem decorria, se fosse esse o caso, de uma diferença de tributação entre, por um lado, o montante que a France Télécom deveria ter pago a título de imposto profissional, cujos nível e taxa eram votados anualmente por cada coletividade territorial francesa, e, por outro, o montante que lhe foi efetivamente cobrado em virtude de um regime derrogatório (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2009, França e France Télécom/Comissão, T‑427/04 e T‑17/05, EU:T:2009:474, n.os 200 a 203 e 321 a 324, confirmado em sede de recurso pelo Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão, C‑81/10 P, EU:C:2011:811). Ora, no caso em apreço, as recorrentes não apresentaram nenhum elemento suscetível de demonstrar que o montante do prémio que a Post Danmark deveria ter pago anualmente, como contrapartida da garantia em causa, devia ser determinado periodicamente em função de circunstâncias próprias de cada período, e nem sequer que era esse o caso, em geral, do montante de um prémio de garantia.

208

A argumentação das recorrentes provém, assim, de uma confusão entre, por um lado, a concessão periódica de vantagens sucessivas na sequência da aplicação individual, reiteradamente, de um regime de auxílios e, por outro, a concessão de uma garantia individual que pode ter por efeito melhorar, continuamente, a situação do seu beneficiário. Neste último caso, a data da concessão do auxílio é a da sua adoção, esclarecendo‑se que, na hipótese de esta medida constituir um auxílio existente, poderia ser objeto de uma decisão da Comissão para o futuro, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 195.

209

Por outro lado, na Comunicação relativa às garantias, invocada pelas recorrentes, a Comissão referiu, no final do ponto 2.1, o seguinte:

«O auxílio é concedido aquando da atribuição da garantia, e não aquando da sua execução ou da realização de pagamentos ao abrigo da mesma. É O facto de a garantia constituir ou não um auxílio estatal e, em caso afirmativo, a determinação do montante desse auxílio deverão ser apreciados no momento em que a garantia é concedida.»

210

Por conseguinte, a Comissão podia, sem que daí resulte a existência de dificuldades sérias, fixar a data da concessão da garantia em causa e, consequentemente, o início do prazo de prescrição à luz de qualquer auxílio eventualmente concedido por intermédio dessa garantia, na data da sua adoção, ou seja, em 6 de junho de 2002 (v. n.o 201, supra).

211

Em todo o caso, o argumento das recorrentes acima reproduzido no n.o 202 assenta na premissa errada segundo a qual a garantia em causa confere à Post Danmark uma vantagem que decorre exclusivamente da inexistência de pagamentos, pelo menos anuais, de um prémio de garantia.

212

A este respeito, é certo que, como sublinham as recorrentes e como resulta dos pontos 2.1 e 2.2 da Comunicação relativa às garantias, o não pagamento de um prémio adequado como contrapartida de uma garantia pública constitui uma condição necessária da vantagem conferida por esta garantia ao seu beneficiário.

213

No entanto, para demonstrar que teria sido necessário um pagamento como contrapartida da concessão de uma garantia para essa concessão não ser qualificada de auxílio estatal, há que apreciar, previamente, se a referida garantia confere uma vantagem ao melhorar a situação do seu beneficiário. Foi assim que o Tribunal de Justiça declarou que o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro ao considerar que a vantagem conferida ao estabelecimento público francês La Poste por uma garantia ilimitada do Estado assentava, por um lado, na inexistência de contrapartida a essa garantia e, por outro, numa melhoria das condições de crédito desse estabelecimento público (Acórdão de 3 de abril de 2014, França/Comissão, C‑559/12 P, EU:C:2014:217, n.o 102).

214

Assim, contrariamente ao que alegam as recorrentes, a Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution, não se pode não ter em conta o objeto de uma garantia pública quando da análise da sua influência sobre a situação do seu beneficiário.

215

Tal apreciação é confirmada pelo ponto 2.2 da Comunicação relativa às garantias, invocada pelas recorrentes, do qual decorre que a identificação da existência de uma vantagem concedida por uma garantia pública sem contrapartida implica apreciar o impacto concreto da garantia em questão sobre a situação do seu beneficiário em relação à dos seus concorrentes.

216

No caso em apreço, importa sublinhar que, em primeiro lugar, a garantia em causa impõe ao Estado dinamarquês a cobertura das indemnizações especiais por despedimento dos antigos funcionários que entraram ao serviço da Post Danmark em 1 de janeiro de 2002, apenas no caso de insolvência desta última. Ora, não parece que essa garantia melhore a situação da Post Danmark, uma vez que só pode ser executada na hipótese de esta empresa ter deixado de existir. Por outras palavras, enquanto a Post Danmark for solvente, incumbe‑lhe pagar as indemnizações especiais por despedimento dos seus antigos funcionários.

217

Em segundo lugar, importa igualmente sublinhar que a garantia em causa diz respeito exclusivamente aos antigos funcionários da Post Danmark que aceitaram tornar‑se trabalhadores desta à data da sua transformação em sociedade de responsabilidade limitada em 1 de janeiro de 2002. Assim, esta garantia não é suscetível de beneficiar o pessoal contratado depois dessa data, pelo que também não se pode considerar que a referida garantia reforça a atratividade da Post Danmark junto de potenciais novos trabalhadores.

218

Em terceiro lugar, efetivamente, conforme salientam a Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution, são considerados auxílios as intervenções que, de formas diversas, reduzem os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, os quais compreendem os custos decorrentes da remuneração dos trabalhadores (Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Bélgica/Comissão, C‑5/01, EU:C:2002:754, n.os 32 e 39). Contudo, no caso em apreço, não é alegado por estas nem pelas recorrentes, e também não resulta dos autos, que a garantia em causa isente a Post Danmark de uma cotização regular à qual estão sujeitos os seus concorrentes para assegurar a indemnização por despedimentos em caso de insolvência, nem que os seus encargos regulares em matéria de pessoal sejam reduzidos devido à referida garantia.

219

Nestas condições, o Tribunal Geral considera que, como acertadamente sublinha a Comissão, a garantia em causa confere, antes de mais, uma vantagem aos antigos funcionários da Post Danmark que entraram ao serviço desta no momento da sua transformação em sociedade de responsabilidade limitada, uma vez que esses trabalhadores tinham garantia, em caso de insolvência da Post Danmark, de receberem a totalidade das suas indemnizações especiais de despedimento.

220

Do anteriormente exposto decorre que, contrariamente ao que alegam, as recorrentes não demonstram que a garantia em causa melhora a situação da Post Danmark de forma continuada. Pelas mesmas razões, não pode ser acolhido o argumento apresentado pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution segundo o qual, em aplicação do critério do investidor privado numa economia de mercado, qualquer garante teria exigido o pagamento de um prémio regular pela concessão da garantia em causa, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a admissibilidade deste argumento, contestada pela Comissão.

221

Por último, o argumento das recorrentes de que a Comissão manifestou dúvidas quanto à existência de uma vantagem decorrente da garantia em causa também não é procedente. Com efeito, a Comissão julgou improcedente a denúncia na parte respeitante à garantia em causa com o fundamento de que a existência de uma vantagem devido essa garantia era muito incerta e que, em todo o caso, admitindo que essa vantagem tenha existido, o auxílio daí resultante constituiria um auxílio existente cuja recuperação já não poderia ser ordenada (v. n.o 201, supra).

222

Resulta de todas as considerações precedentes que nenhum dos indícios relativos ao conteúdo da decisão impugnada apresentados pelas recorrentes revela a existência de dificuldades sérias suscetíveis de justificar a abertura do procedimento formal de investigação quanto à garantia em causa.

3.   Quanto à isenção do IVA

223

As recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, contestam a conclusão nos termos da qual Comissão considerou que a isenção do IVA sobre as prestações de transporte de bens efetuadas pela Post Danmark, no âmbito das transações entre uma sociedade de venda por correspondência e um cliente final (a seguir «prática administrativa em causa»), não constituía um auxílio de Estado, uma vez que era imputável ao artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, e não ao Estado dinamarquês. Alegam, a este respeito, que a apreciação efetuada pela Comissão foi insuficiente ou estava incompleta e, por esse motivo, suscitava dificuldades sérias.

224

Antes de mais, as recorrentes salientam que, na decisão impugnada, a Comissão não contestou que a prática administrativa em causa tinha conferido uma vantagem económica à Post Danmark, resultante de um aumento da procura a seu favor, antes de precisar que o facto de essa empresa só indiretamente ter beneficiado dessa prática é suficiente para ser qualificado de vantagem na aceção das regras relativas aos auxílios de Estado. Referem, assim, que concentram os seus argumentos na questão da imputabilidade da isenção decorrente da prática administrativa em causa.

225

A este respeito, as recorrentes sublinham que foi a Administração dinamarquesa que instituiu a prática administrativa em causa, através da Decisão Administrativa n.o 1306/90 e do Regulamento Administrativo F 6742/90 de 1990, antes de a revogar, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2017, através da Instrução n.o 14‑2926872/SKM2016.306.SKAT de 30 de junho de 2016.

226

As recorrentes sublinham igualmente que a prática administrativa em causa tinha como base jurídica não o artigo 13.o, n.o 13, alínea a), da lov om merværdiafgift (momsloven) nr. 106 (Lei n.o 106 Relativa ao IVA), de 23 de janeiro de 2013 (Lovtidende 2013 A) (a seguir «Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA»), que transpõe para o direito nacional a isenção prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, mas sim o artigo 27.o, n.o 3, alínea 3), desta lei, que transpõe o artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA, que permite excluir da matéria coletável do IVA os montantes que uma sociedade recebe do seu cliente para reembolso dos custos suportados em nome e por conta deste último. Alegam assim que é com fundamento nestas últimas disposições que a prática administrativa em causa permitia às sociedades de venda por correspondência considerarem os pagamentos que efetuavam às sociedades de transporte de bens, nomeadamente à Post Danmark, despesas suportadas em nome e por conta dos seus clientes finais. Assim, segundo as recorrentes, devido à prática administrativa em causa, a transação relativa ao transporte de bens presumia‑se realizada entre os clientes finais das sociedades de venda por correspondência e a transportadora, apesar de não existir nenhuma relação jurídica entre eles.

227

Neste contexto, as prestações de transporte asseguradas pela Post Danmark estavam isentas de IVA, em aplicação da isenção obrigatória do IVA relativo às atividades efetuadas pelos serviços públicos postais, enunciada no artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, transposto pelo artigo 13.o, n.o 13, da Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA. Por conseguinte, a procura das sociedades de venda por correspondência transitou automaticamente para o serviço de transporte assegurado pela Post Danmark. Em contrapartida, sem a prática administrativa em causa, a prestação de transporte contratada com a Post Danmark, por uma sociedade de venda por correspondência, estaria isenta de IVA, ao passo que deveria ser aplicada uma taxa de IVA às despesas de transporte faturadas por esta sociedade ao cliente final.

228

Segundo as recorrentes, é evidente que a prática administrativa em causa não aplicava nem apresentava nenhum vínculo com o artigo 13.o, n.o 13, alínea a), da Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA, que transpôs o artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA. As recorrentes afirmam que, ao estabelecer esse vínculo, a Comissão confundiu a isenção do IVA especificamente conferida pela prática administrativa em causa, para as operações das sociedades de venda por correspondência, com a isenção distinta obrigatória de IVA das prestações efetuadas pelos serviços públicos postais.

229

As recorrentes acrescentam que a prática administrativa em causa foi introduzida por uma decisão e por um regulamento administrativo, e posteriormente revogada por uma instrução. Alegam que esta prática emana, assim, de um instrumento jurídico adotado diretamente pelas autoridades fiscais dinamarquesas e que, consequentemente, é imputável ao Estado dinamarquês.

230

Por último, as recorrentes sublinham que a prática administrativa em causa se baseava, efetivamente, na regra prevista no artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA, mas que não interpretava, não clarificava nem aplicava esta regra. A este respeito, sublinham que as próprias autoridades fiscais dinamarquesas reconheceram que a revogação da prática administrativa em causa tinha sido motivada pela falta de fundamento jurídico dessa prática na Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA ou na Diretiva IVA.

231

Por conseguinte, as recorrentes alegam que a Post Danmark era o beneficiário indireto da isenção do IVA das prestações de transporte que lhe eram encomendadas pelas sociedades de venda por correspondência e que esta isenção era imputável unicamente à prática administrativa em causa e, assim, ao Estado dinamarquês. Consequentemente, consideram que a apreciação desta medida, suscetível de constituir um auxílio de Estado a favor da Post Danmark, foi efetuada pela Comissão de maneira insuficiente ou incompleta e suscitou, por tal motivo, dificuldades sérias.

232

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta estes argumentos.

233

Por um lado, sublinha que a isenção do IVA de que a Post Danmark beneficia para os seus serviços decorrentes da OSU resulta diretamente do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA. Esta isenção do IVA é imputável não ao Estado dinamarquês mas a esta diretiva. A este respeito, o Reino da Dinamarca acrescenta que, independentemente da prática administrativa em causa, a Post Danmark não devia faturar o IVA às sociedades de venda por correspondência relativamente aos respetivos envios abrangidos pela OSU.

234

Por outro lado, a Comissão alega que a prática administrativa em causa era uma medida que visava, como principais beneficiários, as sociedades de venda por correspondência e os consumidores, e não a Post Danmark. No mesmo sentido, o Reino da Dinamarca refere, baseando‑se nos trabalhos preparatórios da adoção da prática administrativa em causa, que esta não se destinava a assegurar mais clientela à Post Danmark, mas cumprir o objetivo da Diretiva IVA que consiste em assegurar aos consumidores envios mais baratos. Para o efeito, a referida prática permitiu que os consumidores e as sociedades de venda por correspondência beneficiassem da vantagem da isenção prevista pela Diretiva IVA para os envios abrangidos pela OSU.

235

A Comissão salienta que, se as sociedades de venda por correspondência podiam propor aos seus clientes custos inferiores de transporte quando optavam pelas entregas através da Post Danmark, era unicamente porque a Post Danmark já beneficiava da isenção do IVA da OSU, devido ao seu estatuto de prestador do serviço universal.

236

Por conseguinte, segundo a Comissão e o Reino da Dinamarca, a vantagem «indireta e incidental» de que a Post Danmark era a beneficiária, a saber, o aumento da procura a seu favor, não era mais do que um simples efeito secundário da combinação da prática administrativa em causa e da isenção do IVA decorrente da OSU, imputável à Diretiva IVA e, assim, à União.

237

Por último, o Reino da Dinamarca sublinha, por um lado, que a Post Danmark não era o beneficiário efetivo da prática administrativa em causa, na medida em que esta última não lhe tinha permitido libertar‑se dos encargos que oneram habitualmente o seu orçamento. Por outro lado, segundo o Reino da Dinamarca, a prática administrativa em causa não a levou a renunciar a recursos, tendo em conta o efeito diminuto dessa prática sobre o volume de negócios da Post Danmark.

238

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a qualificação de uma medida nacional de «auxílio de Estado», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, exige que estejam preenchidos todos os seguintes requisitos. Em primeiro lugar, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou através de recursos do Estado. Em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem seletiva ao seu beneficiário. Em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (v. Acórdão de 10 de junho de 2010, Fallimento Traghetti del Mediterraneo, C‑140/09, EU:C:2010:335, n.o 31 e jurisprudência referida; Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Hansestadt Lübeck, C‑524/14 P, EU:C:2016:971, n.o 40, e de 21 de dezembro de 2016, Comissão/World Duty Free Group e o., C‑20/15 P e C‑21/15 P, EU:C:2016:981, n.o 53).

239

A este respeito, quando a Comissão estiver em condições de excluir desde logo a qualificação das medidas em causa de auxílio de Estado, depois de ter concluído que uma das condições essenciais à aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE não está preenchida, pode, sendo caso disso, arquivar uma queixa no termo da análise preliminar (v. Acórdão de 15 de março de 2018, Naviera Armas/Comissão, T‑108/16, EU:T:2018:145, n.o 113 e jurisprudência referida).

240

Particularmente quanto à primeira das condições acima mencionadas no n.o 238, importa recordar que, para que as vantagens possam ser qualificadas de «auxílios» na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE devem, por um lado, ser concedidas direta ou indiretamente através de recursos do Estado e, por outro, ser imputáveis ao Estado, sendo estes dois requisitos distintos e cumulativos (v. Acórdão de 16 de janeiro de 2020, Iberpotash/Comissão, T‑257/18, EU:T:2020:1, n.o 50 e jurisprudência referida).

241

Quanto à condição relativa à imputabilidade ao Estado, esta exige que se verifique se as autoridades públicas devem ser consideradas implicadas na adoção da medida em causa (Acórdãos de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 17; de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 21; e de 11 de dezembro de 2014, Autriche/Comissão, T‑251/11, EU:T:2014:1060, n.o 86).

242

A este respeito, quando uma vantagem é prevista por uma disposição de direito nacional, a exigência de imputabilidade ao Estado deve considerar‑se satisfeita (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 18, e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 22). De igual modo, essa exigência está satisfeita quando um regime fiscal é criado pelo governo de um estado (v., neste sentido, Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416, n.o 128).

243

Particularmente, quanto a uma medida nacional tomada para assegurar a transposição para o direito nacional de uma obrigação emanada de uma diretiva, a imputabilidade dessa medida ao Estado não pode ser a priori excluída. Com efeito, já foi declarado que uma decisão de uma instituição que autoriza um Estado‑Membro a introduzir, em conformidade com uma diretiva, uma isenção fiscal não pode ter por efeito impedir a Comissão de exercer as competências que o Tratado lhe confia e, consequentemente, aplicar o procedimento previsto no artigo 108.o TFUE para examinar se essa isenção constitui um auxílio de Estado (v., neste sentido, Acórdão de 10 de dezembro de 2013, Comissão/Irlanda e o., C‑272/12 P, EU:C:2013:812, n.o 49).

244

Em contrapartida, o mesmo não acontece no caso de uma isenção fiscal prevista por uma medida nacional que aplica uma disposição de uma diretiva que impõe aos Estados‑Membros uma obrigação clara e precisa de não sujeitar a imposto uma determinada transação. Com efeito, nessa hipótese, a transposição da isenção para o direito nacional constitui uma simples execução das obrigações que incumbem aos Estados por força dos tratados. Daqui resulta que uma medida tomada em aplicação de uma obrigação clara e precisa prevista numa diretiva não é imputável ao Estado‑Membro, mas decorre, na realidade, de um ato do legislador da União (v., neste sentido, Acórdão de 5 de abril de 2006, Deutsche Bahn/Comissão, T‑351/02, EU:T:2006:104, n.o 102).

245

Resumindo, uma prática administrativa nacional que institui uma isenção fiscal deve ser imputada à União quando se limite a reproduzir uma obrigação clara e precisa prevista numa diretiva, ao passo que deve ser considerada imputável ao Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, se este a adotou fazendo uso, na transposição de uma diretiva, da sua margem de apreciação.

246

No caso em apreço, as partes admitem que a prática administrativa em causa foi adotada pela Administração fiscal dinamarquesa com fundamento no artigo 27.o, n.o 3, n.o 3, da Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA, o qual, por sua vez, foi adotado para assegurar a transposição para o direito nacional do artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA. Também é pacífico que esta prática administrativa tinha por objeto equiparar as despesas pagas pelas sociedades de venda por correspondência, por serviços de transporte, a empresas de transportes, às despesas suportadas em nome e por conta dos clientes finais dessas sociedades. Assim, nenhuma das partes contesta que esse dispositivo permitiu às sociedades de venda por correspondência repercutir nos seus clientes finais a isenção do IVA de que tinham beneficiado, em virtude do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, quando solicitavam os serviços da Post Danmark para assegurar o transporte e entrega de bens aos referidos clientes, desde que esse transporte estivesse abrangido no âmbito da OSU.

247

Na decisão impugnada, numa primeira fase, a Comissão considerou, no n.o 193, que era provável que a prática administrativa em causa tivesse proporcionado à Post Danmark uma vantagem indireta resultante de um aumento da sua procura, tendo em conta o facto de, em aplicação da referida prática, os clientes finais de sociedades de venda por correspondência terem usufruído da não faturação do IVA sobre as despesas de transporte quando o serviço de transporte era assegurado pela Post Danmark.

248

Numa segunda fase, no n.o 194 da decisão impugnada, a Comissão considerou que essa vantagem indireta provinha principalmente da isenção do IVA de que beneficiava a Post Danmark para os serviços abrangidos pela OSU, em virtude do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA. A Comissão inferiu daí que a isenção do IVA sobre o transporte, pela Post Danmark, dos bens encomendados pelos clientes finais a sociedades de venda por correspondência não era imputável ao Estado dinamarquês, antes de concluir, no n.o 195 da decisão impugnada, que a prática administrativa em causa não constituía um auxílio de Estado.

249

A título preliminar, importa sublinhar que, uma vez que, na decisão impugnada, a Comissão excluiu a existência de um auxílio de Estado devido à não imputabilidade dos efeitos da prática administrativa em causa ao Estado dinamarquês, o Reino da Dinamarca não pode utilmente alegar, em substância, para efeitos de ser negado provimento ao recurso, que a referida prática não conferiu uma vantagem à Post Danmark e não implicou a renúncia aos recursos por parte do Estado dinamarquês. Com efeito, esses argumentos, a serem acolhidos, conduziriam o Tribunal Geral a alterar os fundamentos da decisão impugnada, contrariamente a jurisprudência constante segundo a qual, em sede de recurso de anulação, o juiz da União não pode substituir pela sua a fundamentação do autor do ato recorrido (v., neste sentido, Acórdão de 26 de outubro de 2016, PT Musim Mas/Conselho, C‑468/15 P, EU:C:2016:803, n.o 64 e jurisprudência referida).

250

As recorrentes contestam a conclusão da Comissão na decisão impugnada quanto à prática administrativa em causa e alegam que esta efetivamente conferiu à Post Danmark uma vantagem imputável ao Estado dinamarquês.

251

A este respeito, importa, em primeiro lugar, salientar que a prática administrativa em causa foi instituída em 1990 pela Decisão Administrativa n.o 1306/90 e pelo Regulamento Administrativo F 6742/90, da Administração fiscal dinamarquesa, e que se pôs termo a esta prática com a Instrução n.o 14‑2926872/SKM2016.306.SKAT, emanada da mesma Administração, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2017. Assim, de acordo com o acima enunciado nos n.os 241 e 242, a prática administrativa em causa afigura‑se, de um ponto de vista formal, imputável ao Estado dinamarquês.

252

Em segundo lugar, importa verificar se a Comissão podia considerar que a isenção do IVA sobre as prestações de transporte asseguradas pela Post Danmark era, de um ponto de vista material, imputável à União na medida em que essa isenção emanava da Diretiva IVA, sem que tal revele a existência de dificuldades sérias.

253

Primeiro, recorde‑se que o artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, no qual a Comissão baseou a sua análise constante do n.o 194 da decisão impugnada, impõe a isenção do IVA das prestações de serviços efetuadas pelos serviços públicos postais.

254

A este respeito, por um lado, o Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de «serviços públicos postais» na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA designam os órgãos de gestão que efetuam as prestações de serviços a isentar e que, para estarem abrangidas pela letra desta disposição, é necessário que essas prestações sejam efetuadas por um operador que possa ser qualificado de «serviço público postal», no sentido orgânico deste termo (v., neste sentido, Acórdão de 23 de abril de 2009, TNT Post UK, C‑357/07, EU:C:2009:248, n.o 27 e jurisprudência referida). Por outro lado, o Tribunal de Justiça declarou que as prestações de serviços abrangidas pelo artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA são as que os serviços públicos postais realizam nessa qualidade, ou seja, precisamente no âmbito da sua qualidade de serviços públicos postais (v., neste sentido, Acórdão de 23 de abril de 2009, TNT Post UK, C‑357/07, EU:C:2009:248, n.o 44).

255

A redação do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA é, assim, clara e precisa na medida em que determina a isenção do IVA das operações efetuadas por um prestador do serviço universal e que entram no âmbito da OSU, em derrogação da regra geral de que o IVA é cobrado em cada prestação de serviços efetuada a título oneroso por um sujeito passivo.

256

É por esta razão, como o admitem as partes, que quando uma sociedade de venda por correspondência solicita os serviços da Post Danmark para o transporte de um bem, esta, na qualidade de prestador do serviço universal na Dinamarca, não deve faturar o IVA a essa sociedade se a prestação solicitada entrar no âmbito da OSU.

257

Contudo, quando a mesma prestação de transporte do bem em questão é, em seguida, faturada pela sociedade de venda por correspondência ao seu cliente final, essa prestação é acessória da operação principal de venda do referido bem por essa sociedade e não é equiparável a uma prestação «efetuada por um serviço público postal», na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA.

258

Por outras palavras, em conformidade com o artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, uma sociedade de venda por correspondência não deve pagar à Post Danmark o IVA sobre a prestação de transporte de um bem destinado ao seu cliente final, se essa prestação for abrangida pela OSU. Em contrapartida, quando a mesma prestação é, em seguida, faturada pela sociedade de venda por correspondência ao seu cliente final, deixa de entrar no âmbito de isenção previsto nessa disposição, de modo que o cliente final é efetivamente devedor do IVA sobre as despesas de porte que paga a essa sociedade.

259

Assim, contrariamente ao que resulta da decisão impugnada e ao que parecem sugerir a Comissão e o Reino da Dinamarca no âmbito do presente litígio, não se pode considerar que a isenção do IVA permitida pela prática administrativa em causa para as prestações de transporte de bens efetuadas pela Post Danmark, mas faturadas pelas sociedades de venda por correspondência aos seus clientes finais, decorre diretamente do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA.

260

Segundo, importa apreciar o argumento das recorrentes de que a isenção do IVA das prestações de transporte de bens faturadas pelas sociedades de venda por correspondência aos seus clientes finais, quando estas prestações eram efetuadas pela Post Danmark, não pode ser considerada imputável à União por força do artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA.

261

Nos termos do artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA, não devem ser incluídas no valor tributável as quantias que um sujeito passivo receba do adquirente dos bens ou do destinatário dos serviços, a título de reembolso das despesas efetuadas em nome e por conta destes últimos e que sejam registadas na sua contabilidade em contas de passagem.

262

O artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA obriga, assim, a excluir do valor tributável do IVA as quantias que correspondem não ao preço de uma prestação proposta por um sujeito passivo, mas a um reembolso de um pagamento efetuado por este último em nome e por conta do seu cliente. A este respeito, importa salientar, à semelhança das partes, que essa obrigação clara e precisa foi transposta para o direito dinamarquês pelo artigo 27.o, n.o 3, ponto 3, da Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA.

263

Contudo, contrariamente ao que, em substância, alegam a Comissão e o Reino da Dinamarca, não se pode inferir do artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA que os Estados‑Membros devem considerar que as despesas de transporte faturadas por uma sociedade de venda por correspondência ao seu cliente final constituem, em todo o caso, um reembolso das despesas suportadas por esta sociedade em nome e por conta deste último e devem, por conseguinte, ser excluídas do valor tributável do IVA.

264

Pelo contrário, o artigo 78.o, primeiro parágrafo, alínea b), da Diretiva IVA obriga a incluir no valor tributável do IVA as despesas acessórias, como as despesas de comissão, embalagem, transporte e seguro, exigidas pelo fornecedor ao adquirente de um bem.

265

Além disso, como referem acertadamente as recorrentes e como reconheceu o Reino da Dinamarca em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo, a Administração fiscal dinamarquesa considerou, na sua Instrução n.o 14‑2926872/SKM2016.306.SKAT de 30 de junho de 2016, que revoga a prática administrativa em causa, que esta prática «não encontra[va] fundamento jurídico na Lei Dinamarquesa Relativa ao IVA nem na Diretiva [IVA] que revogou a prática», antes de concluir que «não [era] possível manter o regime existente». Conforme resulta do n.o 49 da decisão impugnada, a Comissão tinha conhecimento dessa revogação, mencionada pela ITD na sua denúncia.

266

Nestas condições, não se pode excluir que, ao permitir equiparar, através da prática administrativa em causa, as despesas de transporte faturadas pelas sociedades de venda por correspondência aos seus clientes finais aos reembolsos de quantias pagas por estas sociedades em nome e por conta destes últimos, a Administração fiscal dinamarquesa não se limitou a reproduzir uma exigência clara e precisa imposta pelo direito da União, mas fez uso da sua margem de apreciação no âmbito da transposição de uma diretiva. Tal circunstância tende a demonstrar a imputabilidade dessa medida ao Estado dinamarquês e não à União, de acordo com os princípios acima recordados nos n.os 243 a 245. Essa apreciação é confirmada pelos próprios articulados da Comissão e do Reino da Dinamarca, dos quais decorre que a prática administrativa em causa resultava da «interpretação», pelas autoridades dinamarquesas, da regra prevista no artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA (v. n.o 86 da contestação, n.o 65 do articulado de intervenção do Reino da Dinamarca e n.o 28 das respostas deste último às questões do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo).

267

Ora, foi efetivamente em aplicação da prática administrativa em causa que as sociedades de venda por correspondência foram autorizadas a repercutir, nos seus clientes finais, a isenção do IVA sobre as prestações de transporte efetuadas pela Post Danmark, de que essas sociedades tinham beneficiado em aplicação do artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA. Por outro lado, no n.o 89 da contestação e no n.o 67 da tréplica, a Comissão sublinha que o aumento da procura de que a Post Danmark pôde beneficiar indiretamente foi possibilitado pela «combinação», por um lado, da isenção do IVA prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da diretiva IVA e, por outro, da repercussão dessa isenção nos clientes finais das sociedades de venda por correspondência, conforme autorizado pela prática administrativa em causa. Por outras palavras, como referem acertadamente as recorrentes, na ausência da prática administrativa em causa, as sociedades de venda por correspondência teriam sido obrigadas a aplicar o IVA às despesas de transporte faturadas aos seus clientes finais, qualquer que fosse o operador responsável por esse transporte. Por conseguinte, nessa hipótese, as sociedades de venda por correspondência não teriam sido incentivadas a solicitar os serviços da Post Danmark, de modo que esta última não poderia ter beneficiado de um aumento da procura.

268

Em face do anteriormente exposto, a Comissão não podia excluir a existência de dificuldades sérias no que respeita à questão da imputabilidade ao Estado dinamarquês dos efeitos da prática administrativa em causa sobre a procura em benefício da Post Danmark, limitando‑se a recordar a isenção do IVA das prestações efetuadas pelos serviços públicos postais prevista no artigo 132.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva IVA, isenção relativamente à qual, por outro lado, foi demonstrado não ser suscetível de se aplicar às despesas de transporte de um bem quando estas eram faturadas por uma sociedade de venda por correspondência aos seus clientes finais (v. n.o 257, supra). Ao atuar deste modo, a fim de examinar se os efeitos da prática administrativa em causa eram imputáveis à União ou ao Estado dinamarquês, a Comissão não examinou as ligações entre essa prática e a regra prevista no artigo 79.o, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva IVA, que lhe servia de fundamento. De igual modo, a Comissão não teve em conta a revogação da referida prática pela Administração fiscal dinamarquesa pelo facto de não ter origem no direito da União, apesar de essa revogação ter sido mencionada na denúncia da ITD.

269

Esta apreciação não pode ser posta em causa pelo argumento apresentado pelo Reino da Dinamarca de que, em todo o caso, a prática administrativa em causa tinha por objetivo assegurar despesas de envio mais baratas aos consumidores, e não aumentar a procura em benefício da Post Danmark. Com efeito, o artigo 107.o, n.o 1, TFUE não distingue as intervenções estatais consoante as suas causas ou os seus objetivos, mas define‑as em função dos seus efeitos, de modo que o conceito de auxílio de Estado é um conceito objetivo (v., neste sentido, Acórdão de 15 de março de 2018, Naviera Armas/Comissão, T‑108/16, EU:T:2018:145, n.o 86 e jurisprudência referida). Assim, o objetivo prosseguido pelas intervenções estatais não tem incidência na respetiva qualificação de auxílio de Estado (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2011, France Télécom/Comissão, C‑81/10 P, EU:C:2011:811, n.o 17 e jurisprudência referida).

270

Consequentemente, há que concluir que as recorrentes têm razão ao alegar que a Comissão não fez uma análise completa e suficiente da questão de saber se o aumento da procura de que a Post Danmark pôde beneficiar indiretamente, com a aplicação da prática administrativa em causa, era imputável ao Estado dinamarquês.

271

Daqui resulta que deve ser dado provimento ao presente recurso na medida em que visa a parte da decisão impugnada na qual a Comissão, sem dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, concluiu que a prática administrativa em causa não era imputável ao Estado dinamarquês e, por conseguinte, que essa prática não constituía um auxílio de Estado.

4.   Quanto à repartição contabilística dos custos comuns às atividades da Post Danmark abrangidas pela OSU e às não abrangidas por essa obrigação

272

Segundo as recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, a Comissão concluiu erradamente, por um lado, pelo caráter adequado da repartição de custos entre as atividades comerciais da Post Danmark e as decorrentes da OSU e, por outro, que essa repartição não implicava, em todo o caso, a imputabilidade ao Estado, nem a transferência de recursos do Estado nem a concessão de uma vantagem.

273

Em apoio dessas alegações, em primeiro lugar, as recorrentes referem que o raciocínio em resultado do qual a Comissão chegou a essa conclusão não consta da decisão impugnada e que, não tendo sido publicado esse raciocínio, devia considerar‑se que a regulamentação contabilística aplicável à Post Danmark entre 2006 e 2013 impunha a esta uma repartição errada dos custos comuns aos serviços decorrentes da OSU e aos que dela não decorrem (a seguir «custos comuns»).

274

Em segundo lugar, as recorrentes alegam, em substância, que a regulamentação contabilística aplicável entre 2006 e 2013 permitiu à Post Danmark imputar à OSU a totalidade dos custos comuns, sem verificar se uma parte desses custos era ou não partilhada com os serviços não decorrentes da OSU. Consequentemente, segundo as recorrentes, é impossível concluir que os custos comuns foram imputados, na prática, com base numa análise direta da sua origem, em violação do artigo 14.o, n.o 3, alínea b), i), da Diretiva 97/67, segundo o qual, «sempre que possível, os custos comuns devem ser imputados com base na análise direta da origem dos próprios custos». Particularmente, a regulamentação contabilística aplicável à Post Danmark foi alterada em 2014 com o objetivo específico de pôr termo à incompatibilidade das versões anteriores com a Diretiva 97/67.

275

As recorrentes acrescentam que os argumentos da Comissão destinados a demonstrar a regularidade da regulamentação contabilística aplicável à Post Danmark se baseiam, erradamente, na versão desta regulamentação aplicável a partir de 2014. Ora, na sua denúncia, a ITD pôs em causa as duas regulamentações contabilísticas aplicáveis sucessivamente de 2006 a 2011 (a seguir «regulamentação contabilística de 2006») e, posteriormente, de 2011 a 2013 (a seguir «regulamentação contabilística de 2011»), revogadas com a adoção, em 2014, de uma nova regulamentação contabilística.

276

Em terceiro lugar, segundo as recorrentes, a repartição dos custos relativos às diferentes atividades da Post Danmark, decorrente da regulamentação contabilística aplicável entre 2006 e 2013, conferiu uma vantagem à Post Danmark ao lhe permitir reduzir artificialmente os custos das suas atividades comerciais não abrangidas pela OSU e, assim, faturar preços predatórios nessas atividades. A este respeito, essa repartição dos custos das atividades da Post Danmark levou a um aumento dos preços propostos para os serviços postais abrangidos pela OSU de 280 milhões de DKK (cerca de 37,5 milhões de euros) por ano. Além disso, uma análise do exercício contabilístico seguinte à adoção da nova regulamentação contabilística, em 2014, demonstra que 4,2 % dos custos anteriormente suportados a título da OSU foram transferidos para os custos suportados a título das atividades não abrangidas pela OSU.

277

Em quarto lugar, as recorrentes alegam que a repartição errada dos custos comuns implicou a transferência de recursos do Estado a favor da Post Danmark. Com efeito, o Estado dinamarquês estava em posição de dar instruções e orientar a utilização dos recursos da Post Danmark. A este respeito, as recorrentes sublinham que transferências internas a uma entidade jurídica podem constituir um auxílio de Estado.

278

Além disso, as recorrentes alegam que a repartição errada dos custos comuns permitiu à Post Danmark beneficiar de um aumento dos seus «direitos de emissão de selos postais». Neste sentido, as recorrentes salientam que a Post Danmark, enquanto prestador do serviço universal, emite selos postais cujo preço é fixado para cobrir os custos gerados pela OSU e que só pode manter as receitas resultantes da venda de selos postais estritamente necessárias para cobrir os custos gerados pela OSU, devendo ser devolvido ao Estado dinamarquês todo o excedente. Assim, ao sobreavaliar esses custos, a Post Danmark beneficiou de um excedente de direitos de emissão de selos postais, o que constitui um lucro cessante para o Estado dinamarquês e uma disponibilização de recursos do Estado a favor da Post Danmark. Nas suas observações sobre o articulado de intervenção do Reino da Dinamarca, as recorrentes precisam que o ministro dos Transportes deve aprovar o preço dos selos postais para o correio nacional franqueado, conferindo assim às receitas provenientes da venda destes selos postais a qualificação de recursos do Estado.

279

Em quinto lugar, as recorrentes alegam que a Comissão deveria ter aprofundado a sua análise da imputabilidade ao Estado da medida, objeto da presente alegação. A este respeito, a Comissão não verificou nenhum dos indícios pertinentes desenvolvidos pela jurisprudência para efeitos de determinar se uma decisão tomada por uma empresa pública era imputável ao Estado. Além disso, as recorrentes sublinham que foram as autoridades dinamarquesas que adotaram as regulamentações contabilísticas de 2006 e de 2011 e que esta regulamentação contabilística obrigou a Post Danmark a seguir uma metodologia de repartição que implica integrar os custos comuns nos custos relativos à OSU.

280

Assim, segundo as recorrentes, esses erros implicam que o exame efetuado pela Comissão durante o procedimento de análise preliminar era insuficiente ou incompleto e constituem a prova da existência de dificuldades sérias, na presença das quais a Comissão deveria ter dado início ao procedimento formal de investigação.

281

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta a argumentação das recorrentes.

282

Antes de mais, recorde‑se que, no n.o 196 da decisão impugnada, a Comissão considerou que as regras contabilísticas aplicáveis à Post Danmark permitiam uma separação adequada entre as atividades abrangidas pela OSU e as que não são abrangidas por essa obrigação. A este respeito, remete para a parte da decisão impugnada relativa à sua análise da conformidade dessas regras com a sua Diretiva 2006/111/CE, de 16 de novembro de 2006, relativa à transparência das relações financeiras entre os Estados‑Membros e as empresas públicas, bem como à transparência financeira relativamente a certas empresas (JO 2006, L 318, p. 17), efetuada no âmbito da apreciação da compatibilidade da compensação em causa com o mercado interno. No n.o 197 da mesma decisão, a Comissão precisou que, entre 2006 e 2013, as contas regulamentares da Post Danmark tinham sido objeto de um exame anual da respetiva conformidade com a regulamentação contabilística por um perito contabilista reconhecido pelo Estado, de um controlo regular por parte da autoridade reguladora nacional e de uma auditoria por parte de um gabinete independente, cujo relatório, publicado em 4 de dezembro de 2014, referiu o mérito da chave de repartição dos custos na contabilidade da Post Danmark.

283

Em seguida, num dos pontos da decisão impugnada intitulado «Imputabilidade e recursos do Estado», a Comissão considerou, no n.o 198, primeiro, que a deficiente repartição dos custos alegada não parecia implicar uma transferência de recursos do Estado, segundo, que não tinha sido demonstrada a implicação das autoridades dinamarquesas na fixação dos preços dos serviços não abrangidos pela OSU e, terceiro, que a subvenção cruzada alegada não parecia ter conferido qualquer vantagem à Post Danmark, uma vez que, particularmente, esta última não tinha recebido nenhuma compensação com base na repartição dos custos posta em causa durante o período em questão. A Comissão inferiu daí, no n.o 199 da decisão impugnada, que a alegada repartição deficiente dos custos comuns na contabilidade da Post Danmark não constituía um auxílio de Estado.

284

Por último, no n.o 206, iii), da decisão impugnada, a Comissão concluiu que a subvenção cruzada dos serviços comerciais não estava materialmente confirmada e que, em todo o caso, não constituía um auxílio de Estado (v. n.o 30, supra).

285

Por conseguinte, resulta da decisão impugnada que a Comissão baseou a sua conclusão, a título principal, no caráter errado da alegação de que as regras contabilísticas aplicáveis à Post Danmark tinham gerado uma deficiente repartição dos custos comuns e, em todo o caso, no facto de não se encontrarem reunidos vários dos critérios previstos no artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

286

Assim, as recorrentes não têm razão quando censuram a Comissão por não ter fundamentado a sua conclusão, cujos elementos puderam, consequentemente, contestar na sua petição.

287

Quanto ao caráter pretensamente insuficiente e incompleto da análise efetuada pela Comissão, recorde‑se, a título preliminar, os termos do artigo 14.o, n.os2 a 4, da Diretiva 97/67, com a seguinte redação:

«2.   O prestador ou prestadores de serviço universal mantêm contas separadas nos respetivos sistemas contabilísticos para distinguir claramente entre os serviços e produtos que fazem parte do serviço universal e os que não fazem. Esta separação de contas contribui para que os Estados‑Membros possam calcular o custo líquido do serviço universal. A aplicação deste sistema contabilístico interno deve basear‑se nos princípios da contabilidade analítica, coerentemente aplicados e objetivamente justificáveis.

3.   Os sistemas contabilísticos referidos no n.o 2 devem, sem prejuízo do n.o 4, repartir os custos do seguinte modo:

a)

Devem ser imputados a um determinado serviço ou produto os custos que lhe sejam diretamente atribuíveis;

b)

Os custos comuns, ou seja, os custos que não possam ser diretamente atribuídos a um serviço ou produto, devem ser imputados da seguinte forma:

i)

sempre que possível, os custos comuns devem ser imputados com base na análise direta da origem dos próprios custos;

ii)

quando a análise direta não for possível, as categorias de custos comuns devem ser imputadas com base numa ligação indireta a outra categoria ou grupo de categorias de custos relativamente aos quais seja possível efetuar uma imputação ou atribuição direta; a referida ligação indireta deve basear‑se em estruturas de custos comparáveis;

iii)

quando não for possível estabelecer medidas diretas ou indiretas de repartição dos custos, a categoria de custos deve ser imputada com base numa chave de repartição geral, calculada em função da relação entre todas as despesas direta ou indiretamente imputadas ou atribuídas, por um lado, a cada serviço universal e, por outro, aos outros serviços;

iv)

os custos comuns necessários para prestar serviços universais e não universais devem ser corretamente atribuídos, devendo ser aplicados os mesmos fatores de custo a ambos os serviços.

4.   Só podem ser aplicados outros sistemas de contabilidade analítica se forem compatíveis com o n.o 2 e tiverem sido aprovados pela autoridade reguladora nacional. A Comissão deve ser previamente informada da sua aplicação.»

288

Nos termos do artigo 4.o, n.o 3, da regulamentação contabilística de 2011, previa‑se o seguinte:

«a)

São atribuídos a um serviço específico os custos incrementais dele decorrentes. Isto aplica‑se tanto aos custos variáveis como aos custos fixos.

b)

Os custos que não possam ser diretamente atribuídos a um serviço específico são atribuídos, na medida do possível, a um grupo de serviços com base numa análise direta da origem dos custos (custos comuns imputáveis).

c)

Na determinação da repartição dos custos previstos nas alíneas a) e b), os custos necessários para cumprir a obrigação de serviço universal devem ser imputados a cada um dos serviços abrangidos pela obrigação de serviço universal ou a um grupo de serviços abrangidos pela obrigação de serviço universal.

d)

Os custos que não puderem ser imputados com base numa análise direta (custos comuns não imputáveis) são atribuídos aos grupos de serviços em causa com base num vínculo indireto com uma outra categoria de custos ou um outro grupo de categorias de custos em relação aos quais seja possível efetuar uma orientação ou um destaque direto. Esse vínculo indireto deve basear‑se em estruturas de custos comparáveis.

e)

No caso de custos comuns não imputáveis para os quais não existe nenhuma metodologia de imputação dos custos diretos ou indiretos, as categorias de custos devem ser repartidas com base numa chave de repartição geral calculada utilizando a relação entre todos os custos direta ou indiretamente imputados ou repartidos por cada serviço abrangido pelo serviço universal, por um lado, e pelos outros serviços, por outro.

f)

Os custos comuns, necessários para o cumprimento tanto dos serviços universais como dos serviços não universais (custos comuns não imputáveis), devem ser adequadamente repartidos. Devem ser aplicados os mesmos indutores de custos aos serviços universais e aos serviços não universais.»

289

O artigo 4.o, n.o 3, alíneas a) a e), da regulamentação contabilística de 2011 era idêntico ao artigo 4.o, n.o 4, alínea a) a e), da regulamentação contabilística de 2006.

290

Antes de mais, importa salientar que, efetivamente, é pacífico que o artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da regulamentação contabilística de 2011 não está redigido nos mesmos termos que a parte do artigo 14.o, n.o 3, da Diretiva 97/67 que enuncia os princípios contabilísticos a respeitar obrigatoriamente pelos prestadores do serviço universal designados nos Estados‑Membros.

291

Contudo, só esta diferença não é suficiente para demonstrar que as regulamentações contabilísticas de 2006 e de 2011 não cumprem os princípios contabilísticos previstos na Diretiva 97/67. De resto, o artigo 14.o, n.o 4, da Diretiva 97/67 reserva a possibilidade de os Estados‑Membros imporem aos prestadores do serviço universal outros sistemas de contabilidade analítica diferentes dos previstos no n.o 3 da mesma disposição.

292

Particularmente, contrariamente ao que alegam as recorrentes, que se limitam a uma simples afirmação sobre este ponto, da redação do artigo 4.o, n.o 4, alínea c), da regulamentação contabilística de 2006 e do artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da regulamentação contabilística de 2011, acima reproduzida no n.o 288, não resulta que estas disposições impunham ou mesmo permitiam que a Post Danmark imputasse todos os custos comuns aos custos suportados para assegurar a OSU. Quanto aos custos comuns, o princípio estabelecido nestas disposições era o de uma repartição com base numa análise direta da respetiva origem.

293

A este respeito, o Reino da Dinamarca refere acertadamente que estas disposições constituem uma clarificação da forma como os custos devem ser registados na contabilidade interna da Post Danmark depois de terem sido imputados à OSU. Particularmente, resulta dos esclarecimentos prestados pelo Reino da Dinamarca, em resposta a uma questão do Tribunal Geral no âmbito de uma medida de organização do processo, que a repartição contabilística dos custos da Post Danmark se baseava numa metodologia de imputação relativa aos «custos incrementais», definidos nos anexos à regulamentação contabilística como os «custos tanto fixos como variáveis que, a curto ou a médio prazo (três a cinco anos), deixam de existir em caso de cessação de um serviço», uma vez que os custos assim considerados como incrementais eram entendidos como custos diretamente imputáveis ao serviço específico a que diziam respeito. O artigo 4.o, n.o 4, alínea c), da regulamentação contabilística de 2006 e o artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da regulamentação contabilística de 2011, postos em causa pelas recorrentes, limitavam‑se a indicar que, quando os custos eram imputados à OSU com base na metodologia do custo incremental, esses custos deviam ser atribuídos, na OSU, ao serviço pertinente, seguindo a regra prevista na alínea a), ou ao grupo de serviços pertinente, seguindo a regra prevista na alínea b). Por outras palavras, o artigo 4.o, n.o 4, alínea c), da regulamentação contabilística de 2006 e o artigo 4.o, n.o 3, alínea c), da regulamentação contabilística de 2011 constituíam apenas uma aplicação específica à OSU dos princípios previstos na alínea a) e na alínea b) dessas mesmas disposições.

294

O caráter adequado da repartição contabilística dos custos comuns é confirmado pela circunstância, aceite pela Comissão no n.o 197 da decisão impugnada, de que a contabilidade da Post Danmark tinha sido objeto de controlos regulares por parte de um perito contabilista reconhecido pelo Estado e da autoridade reguladora nacional (v., por analogia, Acórdão de 15 de outubro de 2020, První novinová společnost/Comissão, T‑316/18, não publicado, EU:T:2020:489, n.o 253).

295

De igual modo, as recorrentes, sobre quem impende o ónus da prova da existência de dificuldades sérias (v. n.o 51, supra), não apresentam nenhum elemento que permita fundamentar a sua afirmação segundo a qual, na prática, a Post Danmark imputou sistematicamente os custos comuns aos que dizem respeito à OSU. A este respeito, as recorrentes limitam‑se a alegar que, na sequência da adoção de uma nova regulamentação contabilística que reproduz exatamente a redação do artigo 14.o, n.o 3, da Diretiva 97/67, em 2014, os custos decorrentes da OSU diminuíram em relação ao ano anterior, ao passo que os custos decorrentes das outras atividades da Post Danmark aumentaram. Todavia, por um lado, esse argumento assenta numa afirmação que não foi fundamentada. Por outro lado, mesmo considerando‑a verificada, a existência de uma variação na repartição dos diferentes custos de um ano para o outro, salientada pelas recorrentes, não basta, por si só, para presumir que, durante o período anterior, os custos comuns eram sistematicamente imputados aos custos associados à OSU.

296

Nestas condições, a Comissão podia considerar que a imputação dos custos comuns aos custos abrangidos pela OSU não estava demonstrada e que a regulamentação contabilística aplicável à Post Danmark entre 2006 e 2013 conduzia a uma repartição adequada dos diferentes tipos de custos.

297

Consequentemente, há que concluir que as recorrentes não demonstraram que a Comissão e confrontou com dificuldades sérias que não pôde ultrapassar, quando excluiu que a regulamentação contabilística da Post Danmark entre 2006 e 2013 implicava a existência de um auxílio de Estado, devido, a título principal, ao caráter não demonstrado de uma eventual irregularidade na repartição contabilística dos custos comuns. Por conseguinte, não é necessário apreciar as alegações dirigidas contra o raciocínio adotado a título subsidiário pela Comissão e relativo à inexistência, em todo o caso, de um auxílio de Estado decorrente da repartição dos custos na contabilidade da Post Danmark.

5.   Quanto ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017

298

As recorrentes, apoiadas pela Jørgen Jensen Distribution e pela Dansk Distribution, alegam que a conclusão de que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não constitui um auxílio de Estado demonstra o caráter insuficiente e incompleto da análise da Comissão quanto a esta medida.

299

Em primeiro lugar, as recorrentes contestam a conclusão da Comissão de que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não é imputável ao Estado dinamarquês.

300

Neste sentido, antes de mais, recordam que a ITD referiu, na sua denúncia, que as autoridades dinamarquesas e suecas tinham incentivado a PostNord a proceder a esse aumento de capital, por motivos idênticos aos expostos no acordo de 20 de outubro de 2017. Além disso, a ITD apresentou, durante a fase de análise preliminar, dois memorandos elaborados pelo Ministério dos Transportes dinamarquês, em 9 e 22 de fevereiro de 2017, nos termos dos quais a viabilidade da Post Danmark estava dependente de aumentos de capital por parte da PostNord, o que pode demonstrar que as autoridades dinamarquesas estavam informadas do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 e, por conseguinte, constituía um indício da imputabilidade ao Estado dessa medida.

301

Em seguida, as recorrentes criticam a Comissão por ter concluído pela não imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 e se ter limitado a referir que o simples facto de a PostNord ser uma empresa pública sob controlo estatal não bastava para imputar as medidas tomadas por esta aos Estados seus acionistas. A Comissão devia ter apreciado a eventual imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 à luz dos critérios estabelecidos na jurisprudência e, particularmente, no Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294).

302

Por último, as recorrentes censuram a Comissão por não ter informado a ITD da sua posição sobre a inexistência de elementos suscetíveis de demonstrar a imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 e por não a ter convidado a apresentar as suas observações a este respeito, não cumprindo, assim, o artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589.

303

Em segundo lugar, as recorrentes contestam a ideia de que um investidor privado teria realizado o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017.

304

A este respeito, por um lado, foi erradamente que a Comissão concluiu que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 tinha permitido evitar a insolvência da Post Danmark, quando essa insolvência apenas teria sido adiada alguns anos.

305

Por outro lado, quanto aos efeitos pretensamente negativos que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 tinha permitido evitar, antes de mais, as recorrentes põem em causa a nota do conselho de administração da PostNord (a seguir «nota do conselho de administração»), que não lhes foi comunicada e na qual a Comissão se baseou. Nomeadamente, nenhum elemento permitia comprovar a data, a pertinência ou a fiabilidade dos dados utilizados na avaliação contida nessa nota. As recorrentes requerem assim ao Tribunal Geral a adoção de uma medida de organização do processo para que essa nota seja apresentada.

306

Em seguida, as recorrentes sublinham que os efeitos negativos que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 permitiu evitar foram resumidos de uma forma muito geral na decisão impugnada e que não são suficientes para sustentar uma conclusão segundo a qual um investidor privado teria optado por evitar esses efeitos procedendo ao referido aumento de capital. Com efeito, a Comissão não procedeu a uma apreciação global de todos os elementos pertinentes que permitem determinar se a medida em causa provinha da qualidade de acionistas ou de poder público do Estado, uma vez que se baseou apenas nas explicações das autoridades suecas e dinamarquesas.

307

As recorrentes sublinham ainda que a apreciação da Comissão não pode assentar na racionalidade económica, exceto se se considerar que o princípio do investidor privado abrange qualquer aumento de capital de uma sociedade‑mãe em relação à sua filial em risco de insolvência. Isto é tanto mais verdade quando, atendendo às dificuldades económicas significativas da Post Danmark durante os anos anteriores ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, não se verificou nenhuma urgência na sequência da publicação do relatório anual da Post Danmark.

308

Além disso, quanto a esses efeitos negativos conforme resumidos na decisão impugnada, as recorrentes observam que a Comissão infringiu a jurisprudência relativa ao critério do investidor privado numa economia de mercado, que implica a tomada em consideração de elementos objetivos e verificáveis. Com efeito, a Comissão contentou‑se com declarações gerais e não identificou, em primeiro lugar, as partes cuja confiança no grupo PostNord teria sido afetada pela insolvência da Post Danmark, em segundo lugar, os acordos de financiamento do grupo PostNord suscetíveis de ser rescindidos em caso de insolvência da Post Danmark, em terceiro lugar, os acordos celebrados pela PostNord com proprietários de imóveis ou fornecedores que teriam sido afetados pela insolvência da Post Danmark, bem como as garantias que a PostNord deveria ativar nessa hipótese e, em quarto lugar, as missões que a parte dinamarquesa restante do grupo PostNord teria perdido. As recorrentes acrescentam que nenhuma destas pretensas perdas foi quantificada, pelo que não podem ser utilizadas para demonstrar as perdas sofridas pelo grupo PostNord em caso de insolvência da Post Danmark.

309

Além disso, as recorrentes alegam que os efeitos negativos que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 permitiu evitar estão estreitamente relacionados com a degradação da imagem de marca do grupo PostNord no seu conjunto por uma eventual insolvência da Post Danmark. Ora, resulta da jurisprudência que só a título excecional, em circunstâncias específicas, é que a ofensa à imagem de marca do Estado em caso de insolvência de uma empresa pública pode justificar um aumento de capital para evitar essa insolvência. Quanto a este ponto, as recorrentes sublinham que é do conhecimento público que o Reino da Dinamarca e o Reino da Suécia são os dois acionistas da PostNord, de modo que foi efetivamente a proteção da imagem de marca destes que justificou o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017.

310

Por último, as recorrentes criticam a Comissão por não ter avaliado se alguns dos custos induzidos por uma eventual insolvência da Post Danmark provinham da concessão de auxílios de Estado. Era nomeadamente esse o caso dos empréstimos ou das garantias aceites pela PostNord, que, atendendo às dificuldades financeiras da Post Danmark, provavelmente não teriam sido concedidos por um operador prudente numa economia de mercado.

311

A Comissão, apoiada pelo Reino da Dinamarca, contesta a argumentação das recorrentes.

312

Em primeiro lugar, a Comissão refere que comunicou a sua posição preliminar sobre a denúncia da ITD, numa reunião realizada em 19 de janeiro de 2018, e que essa posição preliminar foi igualmente discutida com a representante das recorrentes durante uma conversa telefónica posterior. Assim, a Comissão não pode ser criticada por não ter cumprido uma obrigação de informação decorrente do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589.

313

Em segundo lugar, sublinha que cumpriu o seu dever de exame diligente da denúncia da ITD, ao solicitar às autoridades dinamarquesas as informações necessárias à apreciação dos elementos apresentados não só nessa denúncia mas também no articulado complementar apresentado pela ITD. A Comissão acrescenta que o simples facto de as recorrentes porem em causa o resultado dessa apreciação não pode ser revelador da existência de dificuldades sérias.

314

Em terceiro lugar, a Comissão refuta os indícios apresentados pelas recorrentes para demonstrar a imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017. Particularmente, os memorandos do Ministério dos Transportes dinamarquês demonstram que o Estado dinamarquês era um «espectador passivo» dessa operação. Com efeito, esses memorandos eram omissos quanto ao risco iminente de uma insolvência da Post Danmark e apenas previam soluções a longo prazo a respeito desta sociedade, que não correspondem ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017. A Comissão invoca igualmente o princípio da cooperação leal para defender que os Estados‑Membros são obrigados a enviar‑lhe todas as informações necessárias para lhe permitir verificar se uma medida constitui um auxílio e, se for esse o caso, se é compatível com o mercado interno. Assim, a Comissão, ao precisar que o início do procedimento formal de investigação não lhe teria permitido obter outras informações, podia basear‑se nas declarações das autoridades dinamarquesas e suecas segundo as quais o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não lhes era imputável para concluir, na falta de indícios contrários, que era esse efetivamente o caso.

315

Por sua vez, o Reino da Dinamarca, ao confirmar que só teve conhecimento do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 depois de este ter sido efetuado, alega que nada indica que as operações da PostNord deviam ser imputadas, de um modo geral, às autoridades dinamarquesas ou suecas. Neste sentido, sublinha que esta sociedade atua de forma independente com uma vasta autonomia no mercado, que é gerida segundo princípios comerciais e opera em concorrência com operadores privados num mercado completamente liberalizado, que não está sujeita a nenhuma obrigação de fazer aprovar determinadas operações pelos seus proprietários e que todas as suas operações respondem a uma lógica puramente económica.

316

Em quarto lugar, quanto aos argumentos das recorrentes relativos ao critério do investidor privado numa economia de mercado, a Comissão alega que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 era uma consequência direta do relatório anual da PostNord, publicado em 10 de fevereiro de 2017, que revelou um risco iminente de insolvência da Post Danmark. Por conseguinte, numerosos motivos, como um ganho de tempo com vista a uma restruturação da filial — que era a posição da PostNord em relação à Post Danmark —, bem como a manutenção de relações profissionais e de condições de financiamento nos mercados financeiros, poderiam justificar que, face a esse risco da sua filial, um investidor privado procedesse a um aumento de capital desta, de um montante limitado, a curto prazo.

317

A Comissão contesta, assim, que a sua argumentação leve a considerar que qualquer aumento de capital de uma sociedade filial realizado por uma sociedade‑mãe é justificado.

318

A este respeito, baseando‑se no Acórdão de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão (T‑305/13, EU:T:2015:435), a Comissão sublinha que, para efeitos de apreciar se um Estado‑Membro se comportou como um operador privado, há que determinar a racionalidade económica da medida em causa no contexto em que foi adotada. Para o efeito, a Comissão deveria dispor dos elementos mais completos e fiáveis possível, os quais das circunstâncias do caso em apreço e da natureza e complexidade da referida medida.

319

Por conseguinte, segundo a Comissão, o simples facto de a PostNord não ter feito preceder o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 de uma análise económica aprofundada por peritos independentes não é suficiente para considerar que não agiu como um investidor privado, uma vez que nenhuma sociedade, perante um risco inesperado e iminente de insolvência da sua filial, teria tido tempo de agir dessa forma.

320

A Comissão conclui, assim, que, ao considerar que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não era suscetível de conferir uma vantagem à Post Danmark, confrontou com a racionalidade e a lógica económicas, por um lado, as informações prestadas pelas autoridades dinamarquesas e suecas e, por outro, as apresentadas pela ITD. Mais especificamente, a Comissão considerou que esse aumento de capital refletia o comportamento razoável de uma sociedade‑mãe, tendo em conta os custos que teria de suportar para deixar declarar a insolvência da Post Danmark e a possibilidade de transformar esta última numa empresa eficiente no futuro. Por conseguinte, é errado alegar que a Comissão seguiu cegamente na tese das autoridades dinamarquesas e suecas e, nomeadamente, os elementos constantes da nota do conselho de administração e descritos no n.o 80 da decisão impugnada.

321

A este respeito, o Reino da Dinamarca sublinha que, por um lado, entre o final de 2016 e o início de 2017, os ativos da Post Danmark sofreram depreciações significativas que levaram, durante esse ano, a uma redução dos resultados de 733 milhões de DKK, a qual, conjugada com as perdas de exploração igualmente sofridas pela Post Danmark, levou esta última a perder subitamente mais de metade dos seus capitais próprios. Por outro lado, o Reino da Dinamarca alega que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 foi efetuado tendo em conta que a transformação da Post Danmark devia permitir a esta obter ganhos de eficiência, mesmo que as modalidades de financiamento dessa transformação só tenham sido fixadas depois da celebração do acordo de 20 de outubro de 2017.

322

Por último, segundo a Comissão, é errada a premissa do raciocínio seguido pelas recorrentes de que a Comissão considerou e aceitou que foi para preservar a sua imagem de marca que a PostNord realizou o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017. Em todo o caso, as analogias com a jurisprudência relativa à preservação da imagem de marca de um Estado‑Membro enquanto agente económico não são transponíveis para o caso da PostNord, que é um operador que tem a sua própria marca.

a)   Quanto à existência de uma violação do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589

323

As recorrentes alegam que a Comissão violou o artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589, na medida em que não informou a ITD da sua intenção de rejeitar a sua denúncia, por falta de elementos suscetíveis de demonstrar a imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, e não a convidou a apresentar novas observações sobre esta questão.

324

Nos termos do artigo 24.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeira frase, do Regulamento 2015/1589, «[s]e a Comissão considerar que a parte interessada não cumpre com os requisitos obrigatórios do formulário ou que os elementos de facto e de direito apresentados pela parte interessada não fornecem fundamentos suficientes para demonstrar, com base numa primeira análise prima facie, a existência de um auxílio ilegal ou de uma utilização abusiva de um auxílio, informa a parte interessada desse facto, convidando‑a a apresentar as suas observações num prazo que, em princípio, não deverá ser superior a um mês».

325

Além disso, o artigo 24.o, n.o 2, terceiro parágrafo, do mesmo regulamento especifica que «[a] Comissão enviará ao queixoso uma cópia da decisão tomada num processo relativo ao assunto da sua denúncia».

326

Resulta do artigo 24.o, n.o 2, segundo e terceiro parágrafos, do Regulamento 2015/1589, que regula os direitos das partes interessadas, que a Comissão, depois de ter obtido de uma parte interessada informações relativas a pretensos auxílios ilegais, ou considera que não há motivos suficientes para se pronunciar sobre o caso e informa a parte interessada desse facto ou toma uma decisão sobre o caso relacionado com as informações fornecidas (v., neste sentido, Acórdão de 18 de novembro de 2010, NDSHT/Comissão, C‑322/09 P, EU:C:2010:701, n.o 55).

327

Ora, no caso em apreço, quanto à questão da imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, a Comissão adotou uma decisão depois de ter analisado a denúncia da ITD e considerou que esta não permitia demonstrar essa imputabilidade.

328

Nestas condições, a Comissão não era obrigada a comunicar à ITD a sua intenção de rejeitar a denúncia previamente à adoção da decisão impugnada. A alegação relativa a uma violação do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589 deve, portanto, ser julgada improcedente.

b)   Quanto à imputabilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017

329

Conforme resulta da jurisprudência acima recordada nos n.os 239 e 240, a imputabilidade de uma medida a um Estado‑Membro é uma condição autónoma da qualificação de auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e, quando a Comissão está em condições de excluir essa imputabilidade quanto a uma medida que lhe é submetida, pode decidir não suscitar objeções a seu respeito.

330

A este propósito, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, a imputabilidade de uma medida ao Estado não pode ser deduzida da simples circunstância de a medida ter sido adotada por uma empresa pública (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.os 51 e 57).

331

Com efeito, embora o Estado possa controlar uma empresa pública e exercer uma influência dominante nas suas operações, o exercício efetivo deste controlo num caso concreto não pode ser automaticamente presumido. Uma empresa pública pode agir com maior ou menor independência, em função do grau de autonomia que lhe é conferido pelo Estado. Por conseguinte, o simples facto de uma empresa pública se encontrar sob controlo estatal não é suficiente para se imputar ao Estado as medidas por ela adotadas. Há ainda que examinar se as autoridades públicas devem ser consideradas implicadas, de uma forma ou de outra, na adoção dessas medidas (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 52).

332

A este respeito, não se pode exigir que seja demonstrado, com base em instruções precisas, que as autoridades públicas incentivaram concretamente a empresa pública a tomar as medidas de auxílio em causa. Por um lado, atendendo ao facto de as relações entre o Estado e as empresas públicas serem, por natureza, estreitas, existe um risco real de que os auxílios de Estado sejam concedidos por intermédio dessas empresas, de forma pouco transparente e em violação do regime de auxílios de Estado previsto pelo Tratado. Por outro lado, regra geral, precisamente em virtude das relações privilegiadas entre o Estado e uma empresa pública, será muito difícil para terceiros demonstrar que, num caso concreto, as medidas de auxílio tomadas por essa empresa o foram efetivamente por instrução das autoridades públicas (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.os 53 e 54).

333

Por estes motivos, no n.o 55 do Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294), o Tribunal de Justiça considerou que a imputabilidade ao Estado de uma medida de auxílio tomada por uma empresa pública podia ser deduzida de um conjunto de indícios resultante das circunstâncias do caso concreto e do contexto no qual essa medida foi tomada. A este respeito, já foi tido em consideração o facto de o organismo em questão não poder tomar a decisão contestada sem ter em conta as exigências dos poderes públicos (v., neste sentido, Acórdão de 2 de fevereiro de 1988, Kwekerij van der Kooy e o./Comissão, 67/85, 68/85 e 70/85, EU:C:1988:38, n.o 37) ou de, além dos elementos de natureza orgânica que ligavam as empresas públicas ao Estado, estas, por intermédio das quais os auxílios foram concedidos, deverem ter em conta as orientações emanadas do governo (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de março de 1991, Itália/Comissão, C‑303/88, EU:C:1991:136, n.os 11 e 12, e de 21 de março de 1991, Itália/Comissão, C‑305/89, EU:C:1991:142, n.os 13 e 14).

334

Além disso, outros indícios podem, eventualmente, ser pertinentes para se concluir pela imputabilidade ao Estado de uma medida de auxílio tomada por uma empresa pública, tais como, nomeadamente, a sua integração nas estruturas da Administração Pública, a natureza das suas atividades e o exercício destas no mercado em condições normais de concorrência com operadores privados, o estatuto jurídico da empresa, a qual é regulada pelo direito público ou pelo direito comum das sociedades, a intensidade da tutela exercida pelas autoridades públicas sobre a gestão da empresa ou qualquer outro indício, no caso concreto, de uma implicação ou da improbabilidade da não implicação das autoridades públicas na adoção de uma medida, atendendo igualmente ao alcance desta, ao seu conteúdo e às condições de que se reveste (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 56).

335

Contudo, a simples circunstância de uma empresa pública ter sido constituída sob a forma de sociedade de capitais de direito comum não pode ser considerada suficiente para se excluir que uma medida de auxílio adotada por essa sociedade possa ser imputável ao Estado, tendo em conta a autonomia que essa forma jurídica é suscetível de conferir. Com efeito, a existência de uma situação de controlo e as possibilidades reais de exercício de uma influência dominante que tal situação comporta na prática impedem que se exclua liminarmente qualquer imputabilidade ao Estado de uma medida adotada por uma sociedade daquela natureza e, consequentemente, o risco de um desvio das regras do Tratado relativas aos auxílios de Estado, não obstante a pertinência enquanto tal da forma jurídica da empresa pública como indício, entre outros, que permite estabelecer, num caso concreto, a implicação ou não do Estado (v., neste sentido, acórdão de 16 de maio de 2002, France/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 57 e jurisprudência referida).

336

No caso em apreço, nos n.os 200 a 202 da decisão impugnada, após ter reproduzido o n.o 52 do Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294), recordado no n.o 331, supra, a Comissão começou por salientar que a estrutura de capital da PostNord e o método de nomeação do seu conselho de administração revelavam que os Estados dinamarquês e sueco podiam eventualmente estar em condições de exercer uma influência dominante sobre esta sociedade. Em seguida, a Comissão considerou que esses elementos não permitiam demonstrar estes Estados tinham um controlo efetivo sobre a PostNord à data do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, nem que os poderes públicos tinham estado, de uma forma ou de outra, implicados na adoção desta medida. Por último, a Comissão considerou que a ITD não tinha apresentado nenhum elemento suscetível de demonstrar a imputabilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 ao Estado dinamarquês ou ao Estado sueco.

337

As recorrentes alegam que essa apreciação demonstra o caráter insuficiente e incompleto da análise efetuada pela Comissão.

338

A este respeito, saliente‑se que a Comissão tem razão ao referir que o simples facto de uma sociedade ser detida por capitais públicos não era suficiente para se presumir que qualquer decisão que esta tome é imputável ao Estado acionista, de acordo com os princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294) (v. n.os 330 e 331, supra).

339

No entanto, resulta igualmente do Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294), que, no caso de uma empresa sobre a qual um Estado‑Membro pode exercer uma influência dominante, a Comissão deve verificar, com base num conjunto de indícios suficientemente precisos e concordantes, que o envolvimento do Estado numa medida tomada por essa empresa é concreto ou que a inexistência desse envolvimento é improvável tendo em conta as circunstâncias e o contexto do caso em apreço (v. n.o 334, supra) (v., neste sentido, Acórdão de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.os 51 e 52).

340

Assim, no caso em apreço, a partir do momento em que constatou que a PostNord era uma empresa sobre a qual os Estados dinamarquês e sueco podiam exercer uma influência dominante, a Comissão não se podia limitar a declarar que não estava em condições de presumir a imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017. De acordo com o princípio acima recordado no n.o 339, incumbia à Comissão, sendo caso disso, demonstrar concretamente, com base em indícios suscetíveis de recolher em função das informações de que podia dispor, se era ou não provável que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 fosse imputável aos Estados dinamarquês e sueco.

341

Daqui resulta que, ao limitar‑se a declarar a natureza de empresa pública da PostNord, a Comissão procedeu a uma análise insuficiente do envolvimento do Estado na adoção da medida controvertida. Com efeito, esta abordagem equivale a excluir a imputabilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 ao Estado pelo simples facto de a PostNord ter sido constituída sob a forma de uma sociedade comercial, em violação do princípio desenvolvido pelo Tribunal de Justiça e acima recordado no n.o 335.

342

Por outro lado, há que salientar que, em apoio da sua denúncia, a ITD tinha mencionado a existência de dois memorandos elaborados pelo Ministério dos Transportes dinamarquês em 9 e 22 de fevereiro de 2017.

343

É certo que, como sublinham a Comissão e o Reino da Dinamarca, esses memorandos previam soluções a longo prazo que permitiam implementar um novo modelo de produção na Post Danmark, sem sugerir um aumento de capital imediato, como o de 23 de fevereiro de 2017. No entanto, resulta dos mesmos memorandos que, contrariamente ao que alega a Comissão, o Governo dinamarquês tinha consciência da dimensão das dificuldades financeiras enfrentadas pela Post Danmark em 2016 e das previstas para 2017, do risco de insolvência desta empresa e do custo dessa insolvência para o Estado. Ora, como expressou a Comissão tanto na decisão impugnada como nos seus articulados, foram estes últimos elementos que justificaram o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017.

344

Por conseguinte, o facto de estes elementos serem do conhecimento do Estado dinamarquês também justificava que a Comissão aprofundasse a sua análise da questão da imputabilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, uma vez que, atendendo às relações estreitas entre Estados e empresas públicas, não era necessário demonstrar que as autoridades públicas tinham, com fundamento numa instrução específica, incentivado concretamente a PostNord a tomar essa medida (v. n.o 332, supra).

345

A este respeito, importa igualmente recordar que a Comissão pode, em certas circunstâncias, ser obrigada a instruir uma queixa, indo para além da análise exclusiva dos elementos de facto e de direito levados ao seu conhecimento pelo queixoso. Com efeito, a Comissão deve, no interesse de uma boa administração das regras fundamentais do Tratado relativas aos auxílios de Estado, proceder a uma análise diligente e imparcial da queixa, pode tornar necessária a análise de elementos que não foram expressamente invocados pelo queixoso (v. Acórdão de 15 de março de 2018, Naviera Armas/Comissão, T‑108/16, EU:T:2018:145, n.o 101 e jurisprudência referida).

346

Ora, resulta dos autos que a Comissão se limitou a enviar às autoridades dinamarquesas e suecas a denúncia da ITD e que considerou suficiente a respetiva resposta de 20 de dezembro de 2017, segundo a qual só tinham tido conhecimento do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, na sua qualidade de acionistas, depois da realização do mesmo.

347

A este respeito, a Comissão não pode utilmente invocar o princípio da cooperação leal, conforme interpretado no Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão (C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.o 34). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que, no âmbito do princípio da cooperação leal entre os Estados‑Membros e as instituições tal como decorre do artigo 4.o, n.o 3, TUE, e a fim de não atrasar o procedimento, incumbia ao Estado‑Membro, que considerava que uma medida sujeita à análise preliminar da Comissão não constituía um auxílio, fornecer‑lhe o mais rapidamente possível, a partir do momento em que esta o questiona sobre essa medida, os elementos que fundamentam essa posição. Efetivamente, as declarações apresentadas pelos Estados‑Membros não são, por si só, desprovidas de pertinência no âmbito dos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado (v., neste sentido, Acórdão de 26 de junho de 2008, SIC/Comissão, T‑442/03, EU:T:2008:228, n.o 104). Contudo, no caso em apreço, não se pode deduzir do princípio da cooperação leal, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça, que a Comissão se podia basear predominantemente, na fase da análise preliminar, em afirmações apresentadas pelas autoridades dinamarquesas e suecas para concluir pela não imputabilidade ao Estado do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, mesmo que essa medida tivesse sido tomada pela PostNord, que a Comissão tinha constatado ser uma empresa pública sobre qual os Estados dinamarquês e sueco podiam exercer uma influência dominante.

348

Atendendo ao anteriormente exposto, cabe concluir que as recorrentes têm razão ao alegar que a Comissão não procedeu a uma análise completa e suficiente da questão de saber se o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 era imputável aos Estados dinamarquês e sueco.

349

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo argumento do Reino da Dinamarca de que as operações da PostNord respondem a uma lógica puramente económica e não devem ser aprovadas pelos Estados seus proprietários, à semelhança de qualquer empresa privada. Com efeito, a Comissão não teve em conta, de modo nenhum, esta circunstância quando considerou que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não era imputável ao Estado, uma vez que se limitou a indicar que a estrutura de capital da PostNord e o método de nomeação do seu conselho de administração não permitiam demonstrar o envolvimento dos Estados seus acionistas no referido aumento de capital. Em todo o caso, o argumento do Reino da Dinamarca sobre as condições de exercício pela PostNord das suas atividades não se fundamenta em nenhum documento.

350

Tendo em conta as considerações anteriores, há que analisar o segundo fundamento adotado pela Comissão em apoio da sua conclusão segundo a qual o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não constitui um auxílio de Estado, relativo à inexistência de uma conferida por essa medida uma vez que esta respeita o critério do investidor privado numa economia de mercado.

c)   Quanto ao critério do investidor privado numa economia de mercado

351

Segundo a jurisprudência, a questão de saber se a Comissão aplicou de modo errado o critério do investidor privado numa economia de mercado não se confunde com a da existência de dificuldades sérias que exijam que se dê início ao procedimento formal de investigação. Com efeito, o exame da existência de dificuldades sérias não tem por objetivo saber se a Comissão aplicou corretamente o artigo 107.o TFUE, mas demonstrar se dispunha, na data em que adotou a decisão impugnada, de informações suficientemente completas para apreciar a existência de um auxílio de Estado e, eventualmente, a sua compatibilidade com o mercado interno (v. Acórdão de 28 de março de 2012, Ryanair/Comissão, T‑123/09, EU:T:2012:164, n.o 129 e jurisprudência referida; Acórdão de 12 de junho de 2014, Sarc/Comissão, T‑488/11, não publicado, EU:T:2014:497, n.o 93).

352

Os princípios desenvolvidos pelo juiz da União na sua jurisprudência relativa à aplicação do critério do investidor privado numa economia de mercado não deixam de ser úteis para efeitos de apreciar se, durante a fase de análise preliminar, a Comissão enfrentou dificuldades sérias que não ultrapassou quando considerou que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não era suscetível de conferir uma vantagem à Post Danmark.

353

A título preliminar, importa recordar que, segundo jurisprudência assente, os requisitos que uma medida deve preencher para se enquadrar no conceito de auxílio, na aceção do artigo 107.o TFUE, não estão preenchidos se a empresa beneficiária pudesse obter a mesma vantagem que a que foi posta à sua disposição através de recursos do Estado em circunstâncias correspondentes às condições normais do mercado, sendo esta apreciação efetuada, em princípio, por aplicação do critério do investidor privado numa economia de mercado (v. Acórdão de 24 de janeiro de 2013, Frucona Košice/Comissão, C‑73/11 P, EU:C:2013:32, n.o 70 e jurisprudência referida; Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Club Hotel Loutraki e o./Comissão, C‑131/15 P, EU:C:2016:989, n.o 71).

354

Assim, a aplicação do critério do investidor privado numa economia de mercado implica apreciar se, em circunstâncias semelhantes, um investidor privado que opere nas condições normais de uma economia de mercado, de dimensão comparável à da entidade abrangida no sector público, poderia ter sido levado a proceder a entradas de capitais da mesma importância e nas mesmas condições (v., neste sentido, Acórdão de 4 de setembro de 2014, SNCM e França/Corsica Ferries France, C‑533/12 P e C‑536/12 P, EU:C:2014:2142, n.o 32 e jurisprudência referida).

355

Para este efeito, é importante recordar que o comportamento do investidor privado com o qual deve ser comparado o do investidor público não é necessariamente o de um investidor normal que investe os seus capitais com vista à sua rentabilização a mais ou menos curto prazo, mas deve, pelo menos, ser o de uma holding privada ou de um grupo privado de empresas que prossegue uma política estrutural, global ou sectorial, e ser orientado por perspetivas de rentabilidade a mais longo prazo (Acórdãos de 21 de março de 1991, Itália/Comissão, C‑305/89, EU:C:1991:142, n.o 20, e de 24 de setembro de 2008, Kahla/Thüringen Porzellan/Comissão, T‑20/03, EU:T:2008:395, n.o 238). Assim, quando as entradas de capital de um investidor público não têm em conta nenhuma perspetiva de rendibilidade, mesmo a longo prazo, tais entradas devem ser consideradas auxílios na aceção do artigo 107.o TFUE e a sua compatibilidade com o mercado comum deve ser apreciada apenas à luz dos critérios previstos por esta disposição (v. Acórdão de 4 de setembro de 2014, SNCM e França/Corsica Ferries France, C‑533/12 P e C‑536/12 P, EU:C:2014:2142, n.o 39 e jurisprudência referida).

356

Particularmente, o Tribunal de Justiça declarou que um sócio privado pode razoavelmente contribuir com o capital necessário para assegurar a sobrevivência de uma empresa que conhece dificuldades passageiras, mas que, eventualmente, após uma reestruturação, esteja em condições de recuperar a sua rendibilidade. Por conseguinte, uma sociedade‑mãe também pode, durante um período limitado, suportar os prejuízos de uma das suas filiais a fim de permitir a cessação da atividade desta última nas melhores condições (Acórdãos de 21 de março de 1991, Itália/Comissão, C‑303/88, EU:C:1991:136, n.os 21 e 22; de 18 de dezembro de 2008, Componenta/Comissão, T‑455/05, não publicado, EU:T:2008:597, n.o 87; e de 28 de janeiro de 2016, Eslovénia/Comissão, T‑507/12, não publicado, EU:T:2016:35, n.o 221).

357

A este respeito, incumbe ao Estado‑Membro ou à entidade pública em causa comunicar à Comissão os elementos objetivos e verificáveis que revelem que a sua decisão de participar no capital de uma empresa se baseou em avaliações económicas prévias comparáveis às que, em circunstâncias semelhantes, um operador privado razoável numa situação o mais semelhante possível da situação desse Estado ou dessa entidade teria efetuado, antes de adotar a medida em causa, a fim de determinar a rentabilidade futura dessa medida. No entanto, os elementos de avaliação económica prévia exigidos por parte do Estado‑Membro em causa devem ser modulados em função da natureza e da complexidade da operação em causa, do valor dos ativos, dos bens ou dos serviços em causa e das circunstâncias do caso concreto (Acórdãos de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.os 97 e 98, e de 11 de dezembro de 2018, BTB Holding Investments e Duferco Participations Holding/Comissão, T‑100/17, não publicado, EU:T:2018:900, n.os 79 e 80).

358

Também o conteúdo e o grau de precisão dessas avaliações económicas prévias podem depender, nomeadamente, das circunstâncias do caso em apreço, da situação do mercado e da conjuntura económica, de modo que, em alguns casos, a inexistência de um plano de empresa detalhado da filial, contendo estimativas precisas e completas da sua rentabilidade futura e análises detalhadas dos custos e dos benefícios, não permite, por si só, concluir que o investidor público não se comportou como teria feito um investidor privado no seu lugar (Acórdão de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.os 178 e 179).

359

Dito isto, foi declarado que, mesmo que se encontrasse na impossibilidade de efetuar previsões detalhadas e completas, um investidor privado prudente não decidiria proceder a uma entrada de capitais suplementares numa das suas filiais que registasse perdas importantes sem proceder a avaliações prévias, mesmo aproximativas, que permitissem deduzir probabilidades razoáveis de lucros futuros, e sem ter analisado diversos cenários e diversas opções, incluindo, sendo esse o caso, a cessão ou a eventual liquidação da filial. Assim, a impossibilidade de proceder a previsões detalhadas e completas não pode dispensar um investidor público de proceder a uma avaliação prévia adequada da rentabilidade do seu investimento, comparável à que teria efetuado um investidor privado numa situação semelhante, em função dos elementos disponíveis e previsíveis (Acórdão de 25 de junho de 2015, SACE e Sace BT/Comissão, T‑305/13, EU:T:2015:435, n.os 180 a 182).

360

Particularmente, resulta da jurisprudência que, confrontado com várias alternativas antes de efetuar uma operação, um investidor privado prudente deve avaliar as vantagens e as desvantagens de cada uma delas a fim de escolher a alternativa mais vantajosa (v., neste sentido e por analogia, Acórdãos de 24 de janeiro de 2013, Frucona Košice/Comissão, C‑73/11 P, EU:C:2013:32, n.os 79 e 80, e de 21 de março de 2013, Comissão/Buczek Automotive, C‑405/11 P, não publicado, EU:C:2013:186, n.os 56 a 58).

361

É à luz destas considerações que cabe apreciar se, no caso em apreço, a Comissão procedeu a uma análise completa e suficiente da questão de saber se um investidor privado teria efetuado o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 e, por conseguinte, determinar se, a este respeito, enfrentou dificuldades sérias que não ultrapassou.

362

Na decisão impugnada, a Comissão considerou, no n.o 203, que um investidor privado colocado na situação da PostNord teria, muito provavelmente, procedido ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 em alternativa à insolvência da sua filial. Em apoio desta apreciação, por um lado, sublinhou que não suscitava qualquer dúvida que, sem esse aumento de capital, a Post Danmark teria sido declarada insolvente, uma vez que os capitais próprios desta sociedade tinham passado de 1,29 mil milhões de DKK no final de 2015 para 108 milhões de DKK no final do ano seguinte, com uma nova perda prevista para o ano de 2017. Por outro lado, ao remeter para as explicações das autoridades dinamarquesas e suecas descritas no ponto 5.1 da decisão impugnada, a Comissão salientou que a insolvência da Post Danmark teria tido, para o grupo PostNord, um custo muito mais elevado do que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017.

363

Resulta do ponto 5.1 da decisão impugnada e, particularmente, do n.o 80 desta, que, durante o procedimento administrativo, as autoridades dinamarquesas e suecas alegaram, referindo‑se à nota do conselho de administração, que a insolvência da Post Danmark teria gerado os seguintes efeitos negativos:

perda de confiança junto dos mercados do crédito e de capitais, dos clientes, dos fornecedores, dos proprietários, dos trabalhadores e das outras partes envolvidas a nível do grupo na sua totalidade;

rescisão de acordos de financiamento existentes para o grupo PostNord, tornando difíceis o refinanciamento e a mobilização de capitais;

degradação das condições da locação de imóveis pela PostNord e dos fornecimentos e esta, bem como dos requisitos relativos às diversas modalidades de garantias oferecidas pela PostNord;

risco de prejuízo da posição e do nome da PostNord nos mercados logísticos nórdicos, nos quais se encontra a maioria dos seus clientes, os quais operam em vários países;

impacto negativo do fluxo de tesouraria no grupo PostNord e uma perda contabilística.

364

Por conseguinte, a Comissão baseou a sua conclusão no facto de que a insolvência da Post Danmark teria tido, no grupo PostNord, uma série de consequências negativas.

365

A este respeito, não se pode excluir que as consequências negativas geradas pela insolvência de uma filial levam um investidor privado, cuja atuação é guiada pela racionalidade económica, a efetuar entradas de capitais que permitam assegurar a sobrevivência dessa filial.

366

No entanto, para afastar, na fase de análise preliminar, a qualificação de auxílio de Estado em relação a um investimento público que visa assegurar a sobrevivência de uma sociedade filial, pelo facto de este corresponder ao comportamento de um investidor privado prudente, a Comissão deve, em conformidade com a jurisprudência acima referida nos n.os 355 a 360, estar em condições de demonstrar a superioridade desse investimento em relação a qualquer medida alternativa, como a declaração de insolvência da referida filial. Para o efeito, como decorre da mesma jurisprudência, a Comissão deve proceder a uma análise escrupulosa, com base em elementos fiáveis que detenha, das vantagens e desvantagens, por um lado, da opção de declaração de insolvência da sociedade filial e, por outro, da opção de proceder a um investimento público para efeitos de assegurar a sobrevivência da empresa, verificando, nomeadamente, neste último caso, as perspetivas de rendibilidade com que pode contar o investidor público.

367

Ora, no caso em apreço, embora a Comissão tenha considerado que o custo do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 era, para a PostNord, inferior ao da insolvência da Post Danmark, resulta da decisão impugnada que, na realidade, se baseou exclusivamente nas consequências negativas de um processo de insolvência relativo à Post Danmark, sem excluir que esse processo podia, apesar de tudo, ser mais vantajoso do que um aumento de capital que, por exemplo, não oferecia nenhuma perspetiva de rendibilidade, mesmo a longo prazo.

368

A este respeito, a Comissão não pode validamente alegar que a sua conclusão de que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 correspondia ao comportamento de um investidor privado não se baseava na nota do conselho de administração e nos elementos acima elencados no n.o 363, mas na lógica económica, a qual implicava que uma sociedade‑mãe, perante a inesperada e iminente insolvência de uma das suas filiais, decidiria assegurar a sobrevivência desta suportando as suas perdas.

369

Com efeito, em primeiro lugar, com esse argumento, a Comissão contradiz a sua apreciação constante do n.o 203 da decisão impugnada, o único dedicado à apreciação da existência de uma vantagem decorrente do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017, no qual remeteu para os argumentos apresentados pelas autoridades dinamarquesas e suecas constantes do ponto 5.1 da mesma decisão.

370

Em segundo lugar, não resulta da decisão impugnada que a Comissão tenha tido em conta a situação de urgência decorrente do risco de insolvência da Post Danmark revelada na sequência da publicação, em 10 de fevereiro de 2017, do relatório anual da PostNord. De resto, mesmo admitindo que se possa deduzir da decisão impugnada que a Comissão se baseou nessa situação de urgência, não está demonstrado que esta se tenha revelado com a publicação do relatório anual acima referido. A este respeito, na parte introdutória desse relatório, o presidente e diretor‑geral da PostNord referiu que os resultados desta «continu[avam] a ser afetados pela forte redução dos volumes de correio, sobretudo na Dinamarca», que «o ritmo acelerado da digitalização [tinha] levado a uma tendência de redução extraordinária dos volumes e das receitas no mercado dinamarquês», antes de comunicar a adoção de uma decisão de introduzir um novo modelo de produção financeiramente viável para o futuro. Por conseguinte, como sublinham as recorrentes, o risco de insolvência da Post Danmark mais não era do que a consequência das dificuldades financeiras com que esta empresa há muito se debatia, devido à redução dos envios de correio resultante do recurso generalizado aos envios eletrónicos (v. n.o 6, supra).

371

Em terceiro lugar, em todo o caso, o facto de a PostNord ter enfrentado uma situação de urgência não dispensava a Comissão de verificar se o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 podia, mesmo a longo prazo, constituir uma operação rentável. Com efeito, resulta da jurisprudência acima recordada nos n.os 355 a 359 que um investidor privado prudente deve, em princípio, antes de proceder a uma entrada de capital numa sociedade, avaliar a rendibilidade dessa operação, mesmo quando a sua realização não possa ser precedida de previsões detalhadas e completas.

372

A este respeito, a Comissão admite implicitamente que não teve em conta considerações relativas à rendibilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 quando reconhece, na contestação, que, perante a insolvência inesperada e iminente de uma filial, um investidor privado pode assegurar a sobrevivência desta, «pelo menos, para ganhar o tempo necessário para avaliar devidamente a situação».

373

Em quarto lugar, mesmo considerando que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 era uma condição prévia necessária à restruturação da Post Danmark, não se afigura que a Comissão tenha avaliado, ainda que de forma sumária, a plausibilidade da afirmação de que o novo modelo de produção da Post Danmark permitiria restabelecer a eficiência económica desta empresa.

374

Nestas condições, não se pode concluir que a Comissão efetuou uma análise completa e suficiente que levou a demonstrar a superioridade da medida de aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 em relação à declaração de insolvência da Post Danmark.

375

Como alegam as recorrentes, a solução adotada pela Comissão na decisão impugnada equivale a admitir que qualquer entrada de capital realizada por uma sociedade de capitais públicos, a favor da sua filial em risco de insolvência inesperada, responde, por princípio, ao critério do investidor privado numa economia de mercado.

376

Consequentemente, há que dar provimento ao presente recurso na medida em que tem por objeto a parte da decisão impugnada na qual a Comissão, sem dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, concluiu que o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não constituía um auxílio de Estado dado que não era imputável aos Estados dinamarquês e sueco e não se traduzia na existência de uma vantagem.

377

Por conseguinte, não é necessário deferir a medida de organização do processo solicitada pelas recorrentes destinada à apresentação da nota do conselho de administração.

IV. Conclusões sobre o recurso no seu todo

378

Segundo a jurisprudência, o simples facto de considerar que um fundamento invocado pelo recorrente em apoio do seu recurso de anulação é procedente não permite ao Tribunal Geral anular automaticamente o ato impugnado na sua totalidade. Com efeito, não se pode decidir por uma anulação total quando se revele de forma evidente que o referido fundamento, que visa unicamente um aspeto específico do ato impugnado, só é suscetível de fundamentar uma anulação parcial (Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Département du Loiret, C‑295/07 P, EU:C:2008:707, n.o 104).

379

Contudo, a anulação parcial de um ato da União só é possível se os elementos cuja anulação é pedida forem destacáveis da parte restante do ato. Esta exigência de separabilidade não está satisfeita quando a anulação parcial de um ato tenha por efeito modificar a substância deste (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2008, Comissão/Département du Loiret, C‑295/07 P, EU:C:2008:707, n.os 105 e 106 e jurisprudência referida).

380

No caso em apreço, na decisão impugnada, a Comissão analisou cinco medidas diferentes, a saber, a compensação em causa, a garantia em causa, a prática administrativa em causa, a repartição contabilística dos custos da Post Danmark e o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017. Estas medidas, cujo caráter autónomo entre si a Comissão reconheceu na audiência, foram analisadas separadamente na decisão impugnada e cada uma delas é objeto de uma conclusão própria nos n.os 205 e 206 da mesma, acima reproduzidos no n.o 30.

381

A este respeito, nos n.os 271 e 376, supra, considerou‑se que devia ser dado provimento ao presente recurso na medida em que tem por objeto as partes da decisão impugnada nas quais a Comissão, sem dar início ao procedimento formal de investigação previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, concluiu que a prática administrativa em causa e o aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017 não constituíam auxílios de Estado. Consequentemente, há que anular parcialmente a decisão impugnada nesta medida e negar provimento ao recurso quanto ao restante.

V. Quanto às despesas

382

Nos termos do artigo 134.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, o Tribunal Geral pode decidir que cada parte suporte as suas próprias despesas ou repartir as despesas.

383

Dado que dado provimento parcial ao recurso, será feita uma justa apreciação das circunstâncias da causa decidindo que as recorrentes suportarão metade das suas próprias despesas, sendo o restante das suas despesas suportado pela Comissão, e que esta última suportará, por outro lado, as suas próprias despesas.

384

Em aplicação do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, o Reino da Dinamarca suportará as suas próprias despesas. Em aplicação do artigo 138.o, n.o 3, do mesmo regulamento, a Jørgen Jensen Distribution e a Dansk Distribution suportarão as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

decide:

 

1)

A Decisão C(2018) 3169 final da Comissão, de 28 de maio de 2018, relativa ao auxílio de Estado SA.47707 (2018/N) — Compensações estatais concedidas à PostNord pela prestação do serviço postal universal — Dinamarca é anulada na parte em que nela se declarou, no final da fase da investigação preliminar, que não constituíam auxílios de Estado, por um lado, a isenção do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) instituída pela Decisão Administrativa n.o 1306/90 e pelo Regulamento Administrativo F 6742/90, da Administração fiscal dinamarquesa e, por outro, o aumento de capital de mil milhões de coroas dinamarquesas (DKK) realizado pela PostNord AB, a favor da Post Danmark A/S, em 23 de fevereiro de 2017.

 

2)

É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

 

3)

A ITD, Brancheorganisation for den danske vejgodstransport A/S e a Danske Fragtmænd A/S suportarão metade das suas próprias despesas, sendo o restante das suas despesas suportado pela Comissão Europeia.

 

4)

A Comissão, o Reino da Dinamarca, a Jørgen Jensen Distribution A/S e a Dansk Distribution A/S suportarão as suas próprias despesas.

 

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 5 de maio de 2021.

Assinaturas

Índice

 

I. Antecedentes do litígio

 

II. Tramitação processual e pedidos das partes

 

III. Questão de direito

 

A. Quanto aos indícios relativos à duração e à tramitação da fase de análise preliminar

 

B. Quanto aos indícios relativos ao conteúdo da decisão impugnada

 

1. Quanto à compensação em causa

 

a) Quanto à admissibilidade dos anexos C.2 a C.5

 

b) Quanto à existência de dificuldades sérias relacionadas com a compensação em causa

 

1) Quanto ao cenário contrafactual

 

2) Quanto à dedução dos benefícios imateriais

 

i) Quanto à melhoria da reputação da Post Danmark

 

ii) Quanto à ubiquidade

 

3) Quanto à tomada em consideração de incentivos à eficiência

 

4) Quanto à utilização da compensação em causa

 

5) Conclusão

 

2. Quanto à garantia em causa

 

3. Quanto à isenção do IVA

 

4. Quanto à repartição contabilística dos custos comuns às atividades da Post Danmark abrangidas pela OSU e às não abrangidas por essa obrigação

 

5. Quanto ao aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017

 

a) Quanto à existência de uma violação do artigo 24.o, n.o 2, do Regulamento 2015/1589

 

b) Quanto à imputabilidade do aumento de capital de 23 de fevereiro de 2017

 

c) Quanto ao critério do investidor privado numa economia de mercado

 

IV. Conclusões sobre o recurso no seu todo

 

V. Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: inglês.