Edição provisória
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção)
20 de novembro de 2019 (*)
«Reenvio prejudicial – Espaço de liberdade, segurança e justiça – Política relativa à imigração – Direito ao reagrupamento familiar – Diretiva 2003/86/CE – Artigo 5.°, n.° 4 – Decisão sobre o pedido de reagrupamento familiar – Consequências da inobservância do prazo de decisão – Emissão automática da autorização de residência»
No processo C‑706/18,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Raad voor Vreemdelingenbetwistingen (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros, Bélgica), por decisão de 8 de novembro de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de novembro de 2018, no processo
X
contra
Belgische Staat,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sexta Secção),
composto por: R. Silva de Lapuerta (relatora), vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de presidente da Sexta Secção, L. Bay Larsen e C. Toader, juízes,
advogado‑geral: G. Hogan,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
– em representação do Governo belga, por C. Pochet, M. Jacobs e P. Cottin, na qualidade de agentes, assistidos por C. Decordier e T. Bricout, advocaten,
– em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,
– em representação da Comissão Europeia, por C. Cattabriga, M. Condou‑Durande e G. Wils, na qualidade de agentes,
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 2003/86/CE do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar (JO 2003, L 251, p. 12).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe X, cidadã afegã, ao Belgische Staat (Estado Belga), a propósito do indeferimento por este último do pedido de emissão de um visto por aquela apresentado para efeitos de reagrupamento familiar.
Quadro jurídico
Direito da União
3 Nos termos do considerando 6 da Diretiva 2003/86, «[a] fim de assegurar a proteção da família e a manutenção ou a criação da vida familiar, é importante fixar, segundo critérios comuns, as condições materiais necessárias ao exercício do direito ao reagrupamento familiar».
4 O artigo 1.° desta Diretiva 2003/86 dispõe:
«A presente diretiva tem por objetivo estabelecer as condições em que o direito ao reagrupamento familiar pode ser exercido por nacionais de países terceiros que residam legalmente no território dos Estados‑Membros.»
5 O artigo 2.° da referida diretiva tem a seguinte redação:
«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:
[...]
c) “Requerente do reagrupamento”: o nacional de um país terceiro com residência legal num Estado‑Membro e que requer, ou cujos familiares requerem, o reagrupamento familiar para se reunificarem;
d) “Reagrupamento familiar”: a entrada e residência num Estado‑Membro dos familiares de um nacional de um país terceiro que resida legalmente nesse Estado, a fim de manter a unidade familiar, independentemente de os laços familiares serem anteriores ou posteriores à entrada do residente;
e) “Autorização de residência”: toda a autorização emitida pelas autoridades de um Estado‑Membro que permita a um nacional de um país terceiro permanecer legalmente no seu território, em conformidade com o disposto na alínea a) do n.° 2 do artigo 1.° do Regulamento (CE) n.° 1030/2002 do Conselho, de 13 de junho de 2002, que estabelece um modelo uniforme de título de residência para os nacionais de países terceiros [(JO 2002, L 157, p. 1)];
[...]»
6 O artigo 3.°, n.° 5, da Diretiva 2003/86 enuncia:
«A presente diretiva não afeta a possibilidade de os Estados‑Membros aprovarem ou manterem disposições mais favoráveis.»
7 Nos termos do artigo 4.° desta diretiva:
«1. Em conformidade com a presente diretiva e sob reserva do cumprimento das condições previstas no capítulo IV, bem como no artigo 16.°, os Estados‑Membros devem permitir a entrada e residência dos seguintes familiares:
a) O cônjuge do requerente do reagrupamento;
[...]»
8 O artigo 5.° da referida diretiva prevê:
«[...]
2. O pedido deve ser acompanhado de documentos que atestem os laços familiares e o cumprimento das condições previstas nos artigos 4.° e 6.° e, quando aplicáveis, nos artigos 7.° e 8.°, bem como de cópias autenticadas dos documentos de viagem dos familiares.
A fim de se certificarem da existência de laços familiares, os Estados‑Membros podem, se necessário, proceder a entrevistas com o requerente do reagrupamento e os seus familiares e conduzir outras investigações que considerem necessárias.
Ao examinarem um pedido relativo a uma pessoa que mantenha uma união de facto com o requerente do reagrupamento, os Estados‑Membros devem tomar em consideração fatores como um filho comum, a coabitação prévia, o registo da união de facto ou qualquer outro meio de prova fiável, a fim de determinarem a existência de uma relação familiar.
[...]
4. Logo que possível e em todo o caso no prazo de nove meses a contar da data de apresentação do pedido, as autoridades competentes do Estado‑Membro devem notificar por escrito a decisão tomada à pessoa que apresentou o pedido.
Em circunstâncias excecionais associadas à complexidade da análise do pedido, o prazo a que se refere o primeiro parágrafo poderá ser prorrogado.
A decisão de indeferimento do pedido deve ser fundamentada. As eventuais consequências da não tomada de uma decisão no prazo fixado no primeiro parágrafo devem ser determinadas pela legislação nacional do Estado‑Membro em causa.»
9 O artigo 11.°, n.° 2, da Diretiva 2003/86 tem a seguinte redação:
«Quando um refugiado não puder apresentar documentos oficiais que comprovem a relação familiar, os Estados‑Membros devem tomar em consideração outro tipo de provas da existência dessa relação, avaliadas de acordo com a legislação nacional. Uma decisão de indeferimento do pedido não pode fundamentar‑se exclusivamente na falta de documentos comprovativos.»
10 O artigo 13.° desta diretiva dispõe:
«1. Logo que o pedido de entrada para efeitos de reagrupamento familiar seja deferido, o Estado‑Membro em causa deve permitir a entrada do familiar ou familiares. Posto isso, o Estado‑Membro em causa deve facilitar a essas pessoas a obtenção dos vistos necessários.
2. O Estado‑Membro em causa deve emitir, em favor dos familiares, uma primeira autorização de residência de validade não inferior a um ano. Essa autorização de residência deve ser renovável.
3. O prazo de validade das autorizações de residência concedidas aos familiares não excede, em princípio, a data de validade da autorização de residência de que é titular o requerente do reagrupamento.»
Direito belga
11 O artigo 10.° da wet betreffende de toegang tot het grondgebied, het verblijf, de vestiging en de verwijdering van vreemdelingen (Lei sobre o acesso ao território, a residência, o estabelecimento e o afastamento de estrangeiros), de 15 de dezembro de 1980 (Belgisch Staatsblad, de 31 de dezembro de 1980, p. 14584), na versão aplicável aos factos do processo principal (a seguir «Lei de 15 de dezembro de 1980»), dispõe:
«§ 1. Sem prejuízo do disposto nos artigos 9.° e 12.°, são automaticamente autorizados a residir na Bélgica por um período superior a três meses:
[...]
4° Os seguintes membros da família de um estrangeiro autorizado, há pelo menos doze meses, a residir permanentemente na Bélgica ou autorizado, há pelo menos doze meses, a aí se estabelecer. Este período de doze meses não é exigido se o vínculo conjugal ou a parceria registada já existissem à data da chegada à Bélgica do estrangeiro que pretende reagrupar‑se ou caso o casal tenha um filho menor em comum. Estes requisitos relativos ao tipo e duração da estada não se aplicam no caso de membros da família de um estrangeiro que, nos termos do artigo 49.°, § 1, segundo ou terceiro parágrafo, ou do artigo 49.°/2, § § 2 ou 3, tenha sido autorizado a residir na Bélgica enquanto beneficiário de proteção internacional:
– o cônjuge estrangeiro ou o estrangeiro com quem tenha sido celebrado uma parceria registada considerada equivalente ao casamento na Bélgica, que venha viver com ele, desde que ambos tenham idade superior a vinte e um anos. Todavia, este limite de idade é reduzido para os dezoito anos se, consoante o caso, o vínculo conjugal ou a parceria registada já existissem à data da chegada à Bélgica do estrangeiro que pretende reagrupar‑se;
[...]»
12 O artigo 12.° bis, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980 enuncia:
«Se o estrangeiro a que se refere o § 1 apresentar o seu pedido ao representante diplomático ou consular belga competente para o seu local de residência ou permanência no estrangeiro, devem ser apresentados, juntamente com o pedido, documentos que comprovem que preenche os requisitos estabelecidos no artigo 10.°, § § 1 a 3, incluindo um atestado médico que indique que não sofre de nenhuma das doenças enumeradas no anexo à presente lei, e, caso tenha mais de dezoito anos, uma certidão de registo criminal ou documento equivalente.
A data de apresentação do pedido é a data em que são apresentadas todas as provas em conformidade com o artigo 30.° da Lei de 16 de julho de 2004, que aprova o código de direito internacional privado, ou com os acordos internacionais sobre a mesma matéria.
A decisão sobre a autorização de residência será tomada e notificada logo que possível, o mais tardar até seis meses a contar da data de apresentação do pedido, conforme previsto no segundo parágrafo. A decisão deve ser tomada tendo em conta todos os elementos do processo.
Se não for cumprido o requisito relativo à suficiência de meios de subsistência a que se refere o artigo 10.°, § 5, o Ministro ou o seu delegado devem, com base nas necessidades pessoais do estrangeiro e dos membros da sua família, determinar quais os meios de subsistência de que necessitam para satisfazerem as suas necessidades sem se tornarem um encargo para as autoridades públicas. Para o efeito, o Ministro ou o seu delegado podem exigir que o estrangeiro apresente todos e quaisquer documentos e informações que possam ser úteis para determinar esta quantia.
Em circunstâncias excecionais associadas à complexidade da análise do pedido, bem como no âmbito de um inquérito sobre o casamento na aceção do artigo 146.° bis do Código Civil ou os termos da parceria referida no artigo 10.°, § 1, n.° 5, o Ministro ou o seu delegado podem prorrogar este prazo duas vezes, por períodos de três meses, mediante decisão fundamentada e notificada ao requerente.
Se, após o termo do prazo de seis meses a contar da data em que o pedido foi apresentado, eventualmente prorrogado nos termos do quinto parágrafo, não tiver sido tomada nenhuma decisão, a autorização de residência deve ser concedida.»
Litígio no processo principal e questão prejudicial
13 Em 24 de outubro de 2013, X, de nacionalidade afegã, apresentou à Embaixada da Bélgica em Islamabade (Paquistão) um pedido de visto para efeitos de reagrupamento familiar, a fim de poder juntar‑se ao seu pretenso cônjuge, F. S. M., cidadão afegão que beneficia do estatuto de refugiado na Bélgica.
14 Por decisão de 16 de junho de 2014, o gemachtigde van de staatssecretaris voor Asiel en Migratie, Maatschappelijke Integratie en Armoedebestrijding (delegado do Secretário de Estado do Asilo e da Migração, da Integração Social e da Luta contra a Pobreza, Bélgica) indeferiu tal pedido, com o fundamento de que o vínculo matrimonial entre X e F. S. M. não estava demonstrado.
15 Em 24 de julho de 2014, a recorrente no processo principal interpôs recurso dessa decisão no órgão jurisdicional de reenvio, o Raad voor Vreemdelingenbetwistingen (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros, Bélgica). Por Acórdão de 15 de julho de 2016, esse órgão jurisdicional negou provimento ao recurso.
16 Em 22 de agosto de 2016, a recorrente no processo principal interpôs recurso de cassação desse acórdão no Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica).
17 Por Acórdão de 13 de março de 2018, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) anulou o Acórdão do órgão jurisdicional de reenvio de 15 de julho de 2016. No seu acórdão, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) considerou, em substância, que a ultrapassagem do prazo previsto no artigo 12.° bis, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980 implicava, sem exceção, a concessão de uma autorização de entrada e de residência ao requerente, pelo que a recorrente no processo principal devia ter beneficiado dessa autorização, mesmo que existissem dúvidas quanto à existência do seu vínculo matrimonial com F. S. M. Além disso, o Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) remeteu o processo para o órgão jurisdicional de reenvio para nova apreciação.
18 No âmbito da referida remessa do Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), o órgão jurisdicional de reenvio explica que está vinculado à solução adotada pelo Raad van State no seu Acórdão de 13 de março de 2018, relativa à aplicação do artigo 12.° bis, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980. Todavia, na medida em que essa disposição constitui uma transposição do artigo 5.°, n.° 4, da Diretiva 2003/86, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à conformidade de tal solução com esta diretiva.
19 A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, no Acórdão de 27 de junho de 2018, Diallo (C‑246/17, EU:C:2018:499), o Tribunal de Justiça declarou, relativamente à interpretação da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.° 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77; retificações no JO 2004, L 229, p. 35, e no JO 2005, L 197, p. 34), que as autoridades nacionais competentes não podem emitir oficiosamente um cartão de residência a favor dos membros da família de um cidadão da União Europeia, quando já tenha terminado o prazo de seis meses previsto na mesma diretiva para a emissão desse cartão.
20 Neste contexto, o referido órgão jurisdicional sublinha, em substância, que a concessão automática de uma autorização de residência aos membros da família de um nacional de um país terceiro nas condições previstas no artigo 12.° bis, n.° 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980, por um lado, levaria a tratar mais favoravelmente os membros da família desse nacional do que os de um cidadão da União e, por outro, poderia prejudicar o objetivo da Diretiva 2003/86, que consiste em estabelecer as condições do exercício do direito ao reagrupamento familiar de que os cidadãos de países terceiros que residem legalmente no território dos Estados‑Membros dispõem.
21 Nestas circunstâncias, o Raad voor Vreemdelingenbetwistingen (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:
«A [Diretiva 2003/86] – à luz do artigo 3.°, n.° 5, e do seu objetivo, a saber, a determinação das condições do exercício do direito ao reagrupamento familiar – opõe‑se a um regime nacional que estabelece que o artigo 5.°, n.° 4, da referida diretiva deve ser interpretado no sentido de que a falta de decisão dentro do prazo fixado implica, para as autoridades nacionais, a obrigação de emitirem oficiosamente uma autorização de residência à pessoa em causa, sem previamente determinarem se essa pessoa preenche efetivamente os requisitos para poder residir na Bélgica em conformidade com o direito da União?»
Quanto à questão prejudicial
22 Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva 2003/86 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual, na falta de decisão no prazo de seis meses a contar da data de apresentação do pedido de reagrupamento familiar, as autoridades nacionais competentes devem emitir oficiosamente uma autorização de residência a favor do requerente, sem terem necessariamente que determinar previamente se este último preenche efetivamente os requisitos para residir no Estado‑Membro de acolhimento em conformidade com o direito da União.
23 A este respeito, resulta do artigo 5.°, n.° 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/86 que a decisão relativa ao pedido de reagrupamento familiar deve ser tomada logo que possível e, em todo o caso, o mais tardar no termo de um prazo de nove meses a contar da data de apresentação desse pedido às autoridades nacionais competentes do Estado‑Membro em causa.
24 Em conformidade com o artigo 5.°, n.° 4, terceiro parágrafo, segundo período, da Diretiva 2003/86, as eventuais consequências da falta de decisão sobre o pedido de reagrupamento familiar no termo desse prazo devem ser reguladas pela legislação nacional do Estado‑Membro em causa.
25 No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que a regulamentação nacional em causa no processo principal prevê um regime de aceitação tácita, segundo o qual a falta de decisão sobre o pedido de reagrupamento familiar no termo de um prazo de seis meses a contar da data de apresentação do referido pedido implica, sem exceção, a emissão automática de uma autorização de residência a favor do requerente.
26 Ora, embora o direito da União não se oponha de forma alguma a que os Estados‑Membros estabeleçam regimes de aceitação ou de autorização implícita, é ainda necessário que esses regimes não prejudiquem o efeito útil do direito da União (Acórdão de 27 de junho de 2018, Diallo, C‑246/17, EU:C:2018:499, n.° 46).
27 A este respeito, cabe assinalar que, embora, por um lado, o objetivo prosseguido pela Diretiva 2003/86 seja o de promover o reagrupamento familiar (Acórdão de 13 de março de 2019, E., C‑635/17, EU:C:2019:192, n.° 45), por outro, por força do artigo 1.° desta diretiva, conjugado com o seu considerando 6, a referida diretiva tem por finalidade fixar, segundo critérios comuns, as condições materiais necessárias ao exercício do direito ao reagrupamento familiar de que os cidadãos de países terceiros que residem legalmente no território dos Estados‑Membros dispõem.
28 O conceito de «reagrupamento familiar» é definido no artigo 2.°, alínea d), da Diretiva 2003/86 como sendo a entrada e residência num Estado‑Membro dos familiares de um nacional de um país terceiro que resida legalmente nesse Estado, a fim de manter a unidade familiar, independentemente de os laços familiares serem anteriores ou posteriores à entrada do residente.
29 De acordo com o artigo 4.°, n.° 1, da Diretiva 2003/86, os Estados‑Membros devem, em conformidade com esta diretiva, permitir a entrada e residência de certos familiares do requerente do reagrupamento para efeitos de reagrupamento familiar, entre os quais, designadamente, o seu cônjuge. O Tribunal de Justiça declarou que esta disposição impõe aos Estados‑Membros obrigações positivas precisas, às quais correspondem direitos subjetivos claramente definidos, uma vez que lhes exige, nas hipóteses determinadas pela diretiva, que autorizem o reagrupamento familiar de certos membros da família do requerente do reagrupamento sem que possam exercer a sua margem de apreciação (Acórdão de 27 de junho de 2006, Parlamento/Conselho, C‑540/03, EU:C:2006:429, n.° 60).
30 Todavia, no que se refere às regras processuais que regem a apresentação e análise do pedido de reagrupamento familiar, o artigo 5.°, n.° 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/86, prevê que este pedido seja acompanhado de «documentos que atestem os laços familiares». De igual modo, o artigo 5.°, n.° 2, segundo parágrafo, desta diretiva dispõe que, «[a] fim de se certificarem da existência de laços familiares, os Estados‑Membros podem, se necessário, proceder a entrevistas com o requerente do reagrupamento e os seus familiares e conduzir outras investigações que considerem necessárias».
31 Por outro lado, no que respeita ao reagrupamento familiar de refugiados, resulta do artigo 11.°, n.° 2, da Diretiva 2003/86 que, quando um refugiado não puder apresentar documentos oficiais que comprovem a relação familiar, os Estados‑Membros em causa devem tomar em consideração outro tipo de provas da existência dessa relação.
32 Daqui decorre que as autoridades nacionais competentes devem proceder à análise da existência dos laços familiares alegados pelo requerente do reagrupamento ou pelo membro da sua família a que respeita o pedido de reagrupamento familiar.
33 Assim, quando o pedido de reagrupamento familiar é aceite, o Estado‑Membro em causa deve, em conformidade com o artigo 13.°, n.° 2, da Diretiva 2003/86, autorizar a entrada do membro da família do requerente do reagrupamento e emitir a seu favor uma primeira autorização de residência.
34 Resulta destas considerações que as autoridades nacionais competentes são obrigadas, antes de autorizarem o reagrupamento familiar ao abrigo da Diretiva 2003/86, a verificar a existência dos laços familiares pertinentes entre o requerente do reagrupamento e o nacional de um país terceiro a favor do qual o pedido de reagrupamento familiar é apresentado.
35 Nestas condições, as referidas autoridades não podem emitir uma autorização de residência baseada na Diretiva 2003/86 a favor de um nacional de um país terceiro que não preencha os requisitos fixados por esta para a sua atribuição (v., por analogia, Acórdão de 27 de junho de 2018, Diallo, C‑246/17, EU:C:2018:499, n.° 50).
36 Ora, no caso em apreço, como resulta dos n.os 17 e 25 do presente acórdão, as autoridades nacionais competentes são, por força da regulamentação nacional em causa no processo principal, obrigadas a emitir, sem exceção, uma autorização de residência baseada na Diretiva 2003/86 a favor do requerente do reagrupamento familiar no termo de um prazo de seis meses a contar da data da apresentação do seu pedido, mesmo que não tenha sido previamente determinado se o requerente preenchia efetivamente os requisitos previstos na Diretiva 2003/86 para dele beneficiar.
37 Uma regulamentação dessa natureza, na medida em que permite a emissão de uma autorização de residência baseada na Diretiva 2003/86 a favor de alguém que não preenche os requisitos para a obter, prejudica o efeito útil dessa diretiva e é contrária aos seus objetivos.
38 Atendendo às considerações expostas, há que responder à questão submetida que a Diretiva 2003/86 deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual, na falta de decisão no prazo de seis meses a contar da data de apresentação do pedido de reagrupamento familiar, as autoridades nacionais competentes devem emitir oficiosamente uma autorização de residência a favor do requerente, sem terem necessariamente que determinar previamente se este último preenche efetivamente os requisitos para residir no Estado‑Membro de acolhimento em conformidade com o direito da União.
Quanto às despesas
39 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sexta Secção) declara:
A Diretiva 2003/86/CE do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional nos termos da qual, na falta de decisão no prazo de seis meses a contar da data de apresentação do pedido de reagrupamento familiar, as autoridades nacionais competentes devem emitir oficiosamente uma autorização de residência a favor do requerente, sem terem necessariamente que determinar previamente se este último preenche efetivamente os requisitos para residir no Estado‑Membro de acolhimento em conformidade com o direito da União.
Assinaturas
* Língua do processo: neerlandês.