JULIANE KOKOTT
apresentadas em 29 de novembro de 2018 ( 1 )
Processo C‑60/18
AS Tallinna Vesi
contra
Keskkonnaamet,
interveniente:
Keskkonnaministeerium
[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tallinna Ringkonnakohus (Tribunal de Recurso de Talin, Estónia)]
«Diretiva 2008/98/CE — Resíduos — Fim do estatuto de resíduo — Valorização — Critérios específicos sobre o fim do estatuto de resíduo das lamas de depuração — Ausência de critérios a nível europeu ou nacional»
I. Introdução
1. |
O Tribunal de Justiça tem‑se debruçado há várias décadas, desde o Acórdão Vessoso e Zanetti ( 2 ), sobre o conceito de resíduos. Mais recente é a questão de saber em que condições os resíduos são novamente transformados em ativos normais, deixando de estar sujeitos às regras estritas previstas pela legislação em matéria de resíduos ( 3 ). Com a reformulação da Diretiva relativa aos resíduos em 2008 ( 4 ), o legislador deu os primeiros passos para chegar a uma resposta a esta questão. Apesar de a referida questão ter sido recentemente objeto de maior clarificação por parte do legislador ( 5 ), estas alterações ainda não são aplicáveis ao processo principal. |
2. |
Independentemente das últimas alterações, um aspeto fundamental a este respeito é o facto de a substância ou objeto satisfazer os requisitos técnicos para os fins específicos e respeitar a legislação e as normas aplicáveis aos produtos. Não obstante, isto significa que os resíduos só podem deixar de ser considerados como tal, se e após se terem transformado num produto que cumpre as normas gerais estabelecidas para o efeito? Ou o detentor de resíduos pode exigir que as autoridades competentes decidam, caso a caso e independentemente da existência de normas de produto, se os resíduos já não devem ser considerados como tal? |
3. |
Estas são as questões suscitadas pelo pedido de decisão prejudicial. |
II. Quadro jurídico
A. Diretiva relativa aos resíduos
4. |
Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos, «entende‑se por “resíduos”, quaisquer substâncias ou objetos de que o detentor se desfaz ou tem intenção ou obrigação de se desfazer». |
5. |
O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos estabelece a hierarquia dos resíduos: «A hierarquia dos resíduos a seguir apresentada é aplicável enquanto princípio geral da legislação e da política de prevenção e gestão de resíduos:
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6. |
O artigo 6.o da Diretiva relativa aos resíduos, na sua formulação inicial, regula o fim do estatuto de resíduo: «1. Determinados resíduos específicos deixam de ser resíduos na aceção do ponto 1 do artigo 3.o caso tenham sido submetidos a uma operação de valorização, incluindo a reciclagem, e satisfaçam critérios específicos a estabelecer nos termos das seguintes condições:
Se necessário, os critérios incluem valores‑limite para os poluentes e têm em conta eventuais efeitos ambientais adversos da substância ou objeto. 2. — 3. […] 4. Caso não tenham sido definidos critérios a nível comunitário nos termos dos n.os 1 e 2, os Estados‑Membros podem decidir caso a caso se determinado resíduo deixou de ser um resíduo tendo em conta a jurisprudência aplicável. Os Estados‑Membros notificam dessas decisões a Comissão nos termos da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação, nos casos em que essa diretiva assim o exija.» |
7. |
A obrigação e finalidade essenciais da Diretiva relativa aos resíduos são estabelecidas no artigo 13.o: «Os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que a gestão de resíduos seja efetuada sem pôr em perigo a saúde humana nem prejudicar o ambiente […].» |
8. |
Após a receção do pedido de decisão prejudicial, a Diretiva relativa aos resíduos foi alterada em muitos aspetos, em particular no que se refere ao artigo 6.o Todavia, estas alterações só serão implementadas em 5 de julho de 2020, pelo que não são aplicáveis ao processo principal. |
B. Lei estónia sobre os resíduos
9. |
O pedido de decisão prejudicial faz referência, em especial, ao § 2 1 da Jäätmeseadus (Lei estónia sobre os resíduos), na redação em vigor em 18 de julho de 2014, que regula o fim do estatuto de resíduo: «1. Considera‑se que os resíduos deixam de ser resíduos se tiverem sido sujeitos a um procedimento de valorização, incluindo um procedimento de reciclagem, e cumprirem os critérios estabelecidos nos termos do artigo 6.o, n.o 2, da [Diretiva relativa aos resíduos], que devem observar as seguintes condições:
2. Se não tiverem sido fixados critérios na aceção do n.o 1 do presente parágrafo, nos termos previstos no artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 2008/9/CE, o Ministro competente nessa área pode fixar por regulamento, com observância das condições referidas nos pontos 1 a 4 do n.o 1 do presente parágrafo, os critérios segundo os quais se considera que determinados tipos de resíduos deixaram de ser resíduos. 3. Esses critérios devem incluir valores limite para substâncias perigosas, caso seja necessário, e levar em conta os possíveis danos ambientais e para a saúde. 4. O procedimento de valorização, após o qual os resíduos deixam de ser considerados resíduos, deve ser indicado na autorização de transformação dos resíduos ou numa autorização ambiental integrada emitida, nos termos da lei das emissões industriais, ao empresário que efetuou o procedimento de valorização dos resíduos […]» |
III. Matéria de facto e pedido de decisão prejudicial
10. |
Nos anos de 2014 e de 2015, a Keskkonnaamet (Autoridade Ambiental) emitiu à AS Tallinna Vesi, uma empresa que explora estações de tratamento de águas residuais, autorizações de transformação de resíduos para a valorização de resíduos numa instalação de tratamento de resíduos em Talin, até uma quantidade total anual de 32000 toneladas, e, numa instalação de tratamento de resíduos no município de Harku em Harjumaa, até uma quantidade total anual de 7000 toneladas. |
11. |
Da fundamentação das referidas decisões infere‑se que a Tallinna Vesi procede à canalização de águas residuais urbanas e ao tratamento de águas residuais numa instalação de lamas ativadas. |
12. |
A Autoridade Ambiental e a Tallinna Vesi estão em desacordo quanto à questão de saber se as lamas de depuração assim tratadas ainda devem ser consideradas resíduos, ou se podem ser livremente vendidas como um produto. |
13. |
Segundo a Tallinna Vesi, o procedimento de purificação das águas residuais é uma reciclagem biológica. Ao abrigo da legislação estónia, a reciclagem biológica é um procedimento de valorização dos resíduos, em que os resíduos são transformados em produtos e que põe termo ao seu estatuto de resíduos. A Tallinna Vesi pretende obter a correspondente autorização de transformação de resíduos. |
14. |
A Autoridade Ambiental considera, pelo contrário, que para que cesse o estatuto de resíduo, têm de ser cumpridos simultaneamente todos os requisitos constantes do § 2 1, n.o 1, pontos 1 a 4, da Lei estónia sobre os resíduos. Nos termos do § 2 1, n.o 1, ponto 3, da Lei estónia sobre os resíduos, a substância ou objeto torna‑se um produto se cumprir a norma de produto para um fim definido. |
15. |
Não há nenhuma norma para o produto resultante do procedimento de estabilização e higienização efetuado pela Tallinna Vesi, pelo que o procedimento de tratamento de resíduos efetuado por essa empresa deve ser qualificado de tratamento biológico dos resíduos que antecede a sua valorização. Por conseguinte, o utilizador de lamas de depuração deve registar‑se, independentemente de ter intervindo previamente como explorador de resíduos não perigosos ou de dispor de uma autorização integrada. |
16. |
Além disso, a Autoridade Ambiental acrescenta que o § 2 1 da Lei estónia sobre os resíduos não dá o direito de decidir do fim do estatuto de resíduo; pelo contrário, só pode atuar com base num ato jurídico da União Europeia ou num regulamento do Ministro do Ambiente. |
17. |
A Tallinna Vesi propôs uma ação contra as autorizações de transformação de resíduos, na medida em que estas continuam a considerar as lamas de depuração tratadas como resíduos. Depois de esta ação ter sido julgada improcedente em primeira instância, o recurso encontra‑se agora pendente no Tribunal de Recurso de Talin. Por conseguinte, este último submete à apreciação do Tribunal de Justiça as seguintes questões:
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18. |
Apresentaram observações escritas a AS Tallinna Vesi, a República da Estónia, a República Italiana, a República da Áustria, o Reino dos Países Baixos e a Comissão Europeia. Não houve audiência, visto que o Tribunal de Justiça considerou que dispunha de informações suficientes. |
IV. Apreciação jurídica
19. |
O Tribunal de Recurso parte manifestamente do princípio de que as lamas de depuração são resíduos, já que não questiona se, à luz da exceção prevista pelo artigo 2.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva relativa aos resíduos em conjugação com a Diretiva relativa às águas residuais ( 6 ) e/ou a Diretiva relativa às lamas de depuração ( 7 ), as lamas de depuração devem efetivamente ser consideradas resíduos. Da mesma forma, o tribunal de recurso não questiona se a Diretiva relativa às lamas de depuração pode constituir uma norma de produto suficiente. Caso ainda subsistam dúvidas relativamente a estas questões, a sua apreciação é deixada, pelo menos provisoriamente, ao órgão jurisdicional nacional. |
20. |
Em vez disso, o pedido de decisão prejudicial tem por objeto uma norma complexa, que, na sua versão aplicável, apresenta uma redação um pouco infeliz. Embora o artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos contenha certas condições relevantes para o fim do estatuto de resíduo, estas condições devem, todavia, em primeiro lugar, ser concretizadas pela Comissão noutros atos jurídicos, antes de se poder recorrer às mesmas para determinar se certos resíduos já não devem ser considerados como tal ( 8 ). Se não tiverem sido definidos critérios a nível da União, os Estados‑Membros podem, em alternativa, por força do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva 2008/98, decidir caso a caso se determinado resíduo deixou de ser um resíduo, tendo em conta a jurisprudência aplicável na matéria. |
21. |
Ambas as questões relativas ao fim do estatuto de resíduo submetidas à apreciação do Tribunal de Justiça referem‑se a esta última disposição. Por um lado, questiona‑se se é compatível com o artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos subordinar o fim do estatuto de resíduo ao estabelecimento a nível europeu ou nacional de normas de produto para a substância ou objeto e, por outro, se um detentor de resíduos pode exigir que uma autoridade ou um tribunal decida caso a caso se o resíduo ainda deve ser considerado como tal ou se o deixou de ser. |
22. |
A este respeito, a resposta dada a uma das questões pode influenciar significativamente a resposta a dar à outra. Com efeito, considerando‑se admissível subordinar o fim do estatuto de resíduo ao estabelecimento de critérios, não pode existir qualquer obrigação, independentemente disso, de decidir caso a caso sobre o fim do estatuto de resíduo. Em contrapartida, a redação do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos, que autoriza os Estados‑Membros a decidir caso a caso, poderia ser também entendida no sentido de que os Estados‑Membros adotam apenas decisões individuais, não podendo, porém, fixar quaisquer critérios gerais. |
23. |
Contudo, como explicarei seguidamente, as respostas a estas questões devem ser encontradas entre estes dois extremos. Neste sentido, abordarei primeiramente a redação do artigo 6.o, n.o 4, primeiro período, da Diretiva relativa aos resíduos, em seguida, analisarei as condições jurídico‑materiais do fim do estatuto de resíduo, examinarei as competências dos Estados‑Membros neste contexto e, por último, avaliarei a relação existente entre as disposições gerais e as decisões individuais na aplicação do artigo 6.o, n.o 4. |
A. Quanto à redação do artigo 6.o, n.o 4, primeiro período, da Diretiva relativa aos resíduos
24. |
A resposta ao pedido de decisão prejudicial parece resultar de modo relativamente claro do artigo 6.o, n.o 4, primeiro período, da Diretiva relativa aos resíduos. Segundo este artigo, os Estados‑Membros podem decidir caso a caso se determinado resíduo deixou de ser um resíduo tendo em conta a jurisprudência aplicável, caso a Comissão não tenha definido critérios a nível da União. |
25. |
À primeira vista, parece, por conseguinte, adequado remeter para a redação desta disposição, designadamente para a utilização do verbo «poder», e, possivelmente, ter ainda em consideração a competência dos Estados‑Membros para adotar medidas de proteção reforçadas de acordo com o artigo 193.o TFUE. Daqui poderia, desde logo, concluir‑se que nem a Administração Nacional, nem os tribunais dos Estados‑Membros são obrigados, na ausência de normas europeias ou nacionais no que se refere a certas substâncias ou objetos, a declarar o fim do estatuto de resíduo. Neste contexto, os Estados‑Membros não teriam de definir critérios, nem adotar decisões individuais. |
26. |
No entanto, esta abordagem seria, na realidade, excessivamente superficial. O pedido de decisão prejudicial exige, porém, uma análise mais aprofundada do conceito de resíduo e, em particular, das condições para o fim do estatuto de resíduo. Com efeito, não seria conforme com a Diretiva relativa aos resíduos continuar a tratar uma substância ou objeto como resíduo, quando este já não deveria, de acordo com a diretiva, ser considerado como tal. Pelo contrário, deve encontrar‑se um equilíbrio adequado entre os objetivos da Diretiva relativa aos resíduos: por um lado, o de assegurar um elevado nível de proteção e, por outro, o de transformar os resíduos na medida do possível em produtos utilizáveis. |
B. Quanto ao fim do estatuto de resíduo
27. |
O artigo 6.o da Diretiva relativa aos resíduos refere duas formas de pôr fim ao estatuto de resíduo. |
28. |
Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos, determinados resíduos específicos deixam de ser resíduos caso tenham sido submetidos a uma operação de valorização e satisfaçam critérios específicos, estabelecidos pela Comissão sob certas condições. Em conformidade com esta disposição, o fim do estatuto de resíduo seria obrigatório, mas as condições desta disposição não se verificam. De facto, a Comissão não definiu os referidos critérios em relação às lamas de depuração. |
29. |
A segunda forma de pôr fim ao estatuto de resíduo está consagrada no artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos. A decisão dos Estados‑Membros aí prevista deve ter em conta a jurisprudência (do Tribunal de Justiça). |
30. |
A jurisprudência referida no artigo 6.o, n.o 4 foi desenvolvida independentemente do artigo 6.o e baseia‑se na definição constante do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos ( 9 ), segundo o qual resíduos são quaisquer substâncias ou objetos de que o detentor se desfaz ou tem intenção ou obrigação de se desfazer. A questão de saber se o detentor se desfez do resíduo deve ser verificada (objetivamente) em face de todas circunstâncias, tendo em conta o objetivo dessa diretiva e tendo o cuidado de não prejudicar a sua eficácia ( 10 ). |
31. |
Esta definição poderia ser entendida no sentido de que a substância ou objeto deixa de ser resíduo, caso o seu detentor deixe de se desfazer ou deixe de ter intenção ou obrigação de se desfazer do mesmo. |
32. |
Uma tal alteração (até mesmo espontânea) do estatuto de resíduo seria, aliás, incompatível com o sistema de gestão de resíduos estabelecido pela Diretiva relativa aos resíduos, visto que este começa por pressupor a continuação da aplicabilidade da legislação em matéria de resíduos. |
33. |
Em particular, nos termos do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos, os Estados‑Membros tomam as medidas necessárias para assegurar que o produtor inicial dos resíduos ou outros detentores procedam eles próprios ao tratamento dos resíduos ou confiem esse tratamento a um comerciante ou a um estabelecimento ou empresa que execute operações de tratamento de resíduos, ou a um serviço de recolha de resíduos público ou privado, nos termos dos artigos 4.o e 13.o |
34. |
O artigo 13.o da Diretiva relativa aos resíduos contém a obrigação fundamental em matéria de resíduos, de assegurar que a gestão de resíduos seja efetuada sem pôr em perigo a saúde humana nem prejudicar o ambiente. O artigo 4.o estabelece a hierarquia dos resíduos, que menciona em primeiro lugar a prevenção e redução de resíduos, seguidamente, a preparação para a reutilização, a reciclagem, outros tipos de valorização e, somente como última opção, a possibilidade de eliminar os resíduos. |
35. |
No entanto, quem se dedica profissionalmente ao tratamento dos resíduos neste contexto não se desfará dos mesmos pelo menos durante o seu processamento. Ao contrário, a posse dos resíduos é uma condição indispensável da atividade em causa e dos lucros que com ela se pretendem obter. Deste modo, a exploração de um aterro consiste precisamente em possuir os resíduos de forma permanente. Por outro lado, a valorização profissional dos resíduos pressupõe a obtenção regular dos resíduos em causa. Portanto, existem também conflitos quanto à questão de saber quem pode eliminar ou valorizar determinados resíduos ( 11 ). |
36. |
O facto de o detentor não se desfazer dos resíduos na gestão dos mesmos não pode levar, por si só, à exclusão dos resíduos do âmbito de aplicação da legislação em matéria de resíduos. Com efeito, logo que a legislação em matéria de resíduos deixa de ser aplicável, deixa igualmente de se assegurar o respeito pelos artigos 4.o e 13.o da Diretiva relativa aos resíduos. |
37. |
Por conseguinte, a perda do estatuto de resíduo pressupõe corretamente que o detentor da substância ou objeto não se desfaz ou tem intenção ou obrigação de se desfazer dele ( 12 ), porém, esta condição não é suficiente para pôr fim ao estatuto de resíduo. Isto é, de resto, demonstrado pelas condições previstas pelo artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos, como também pela jurisprudência do Tribunal de Justiça a que se refere o artigo 6.o, n.o 4. |
38. |
Em relação a determinadas formas de valorização, o Tribunal de Justiça reconheceu, com efeito, sob reserva do facto de o detentor se desfazer dos resíduos, que as substâncias transformadas deixaram de ser resíduos. Isto aplica‑se à reciclagem de resíduos de embalagens num novo material ou num novo produto com características comparáveis às do material de que provêm ( 13 ), e à transformação de resíduos metálicos em produtos siderúrgicos, que sejam a tal ponto semelhantes a outros produtos siderúrgicos, resultantes de matérias‑primas, que deles não possam ser distinguidos ( 14 ). A valorização dos resíduos mediante a sua transformação num gás purificado, utilizado como combustível, atinge uma qualidade semelhante ( 15 ). |
39. |
O fim do estatuto de resíduo de uma substância ou objeto está, portanto, sujeita a dois pressupostos. Em primeiro lugar, o detentor da substância ou objeto em causa não pode desfazer‑se ou ter intenção ou obrigação de se desfazer do mesmo, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos. Em segundo lugar, a substância ou objeto devem tornar‑se utilizáveis através de uma operação de valorização, sem pôr em perigo a saúde humana nem prejudicar o ambiente ( 16 ). |
40. |
A jurisprudência não menciona, contudo, que a União ou os Estados‑Membros devem adotar normas ou decisões, para que os resíduos deixem de ser considerados como tal. |
C. Competências dos Estados‑Membros e seus limites
41. |
No entanto, as condições referidas para o fim do estatuto de resíduo são relevantes para efeitos das competências daí resultantes para os Estados‑Membros. Para além do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos, assume, a este respeito, relevância em particular a regulamentação em matéria de valorização de resíduos, que constitui na jurisprudência um pressuposto para o fim do estatuto de resíduo. |
42. |
É certo que o anexo II da Diretiva relativa aos resíduos contém uma lista não taxativa de operações de valorização. Não obstante, salvo disposições específicas da União relativas a determinados resíduos, como as previstas pelo artigo 6.o, n.os 1 e 2, a regulamentação das operações de valorização — incluindo os requisitos de uma valorização completa — é, em regra, em conformidade com o artigo 10.o, da competência dos Estados‑Membros. Estes devem respeitar a hierarquia dos resíduos estabelecida nos termos do artigo 4.o e, de acordo com o artigo 13.o, devem evitar pôr em perigo a saúde humana ou prejudicar o ambiente, podendo, porém, determinar diferentes níveis de proteção ( 17 ). |
43. |
Esta competência dos Estados‑Membros, de decidir das operações de valorização e do nível de proteção aplicável a este respeito, é conforme com a redação do artigo 6.o, n.o 4, primeiro período, da Diretiva relativa aos resíduos, segundo a qual os Estados‑Membros podem decidir caso a caso se determinado resíduo deixou de ser resíduo, porém, não estão obrigados a reconhecer o fim do estatuto de resíduo. Ademais, o artigo 193.o TFUE confirma esta competência, uma vez que permite aos Estados‑Membros manter ou introduzir medidas de proteção reforçada. |
44. |
No entanto, a liberdade dos Estados‑Membros na aplicação do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos não é ilimitada. Os Estados‑Membros devem ter em consideração os objetivos da diretiva, como a hierarquia dos resíduos prevista no artigo 4.o e, em particular, a promoção da valorização de resíduos nos termos do considerando 29, mas devem também respeitar os direitos fundamentais dos interessados, no caso em apreço, em especial, o direito fundamental de propriedade (artigo 17.o da Carta dos Direitos Fundamentais) e a liberdade de empresa (artigo 16.o). |
45. |
O artigo 193.o TFUE não altera substancialmente estes limites, visto que também as medidas de proteção reforçadas devem, por um lado, ser conformes com os objetivos da medida da União correspondente e, por outro, respeitar o direito da União, designadamente os seus princípios gerais ( 18 ), que incluem os direitos fundamentais. |
46. |
Porém, para a realização dos objetivos da Diretiva relativa aos resíduos, os Estados‑Membros dispõem de uma margem de manobra, nomeadamente no que se refere à proteção da saúde e do ambiente ao abrigo do artigo 13.o ( 19 ). Com efeito, as medidas adequadas a este respeito pressupõem uma apreciação complexa dos riscos de cada operação de valorização à luz dos mais recentes conhecimentos científicos e técnicos ( 20 ). O direito da União permite limitar o controlo judicial dessas decisões aos erros manifestos de apreciação ( 21 ), exigindo, porém, que as autoridades competentes respeitem os requisitos processuais, isto é, designadamente, que analisem, de maneira diligente e imparcial, todos os aspetos relevantes do caso concreto ( 22 ). Esta margem de manobra deve igualmente verificar‑se aquando da ponderação que é necessária na aplicação dos direitos fundamentais em causa. |
47. |
Consequentemente, nos termos da Diretiva relativa aos resíduos e, designadamente, do artigo 6.o, n.o 4, para determinar se certos resíduos devem continuar a ser considerados como tal, os Estados‑Membros dispõem se uma margem de manobra mais ampla. Não obstante, ao adotar esta decisão, os Estados‑Membros devem ter em conta todos os aspetos relevantes e os mais recentes conhecimentos científicos e técnicos e respeitar, neste sentido, também os requisitos processuais aplicáveis. |
D. Disposições gerais ou decisões individuais
48. |
Porém, resta ainda esclarecer a questão de saber se à luz destas considerações, é compatível com a Diretiva relativa aos resíduos e, designadamente, com o artigo 6.o, n.o 4, subordinar o fim do estatuto de resíduos ao estabelecimento a nível europeu ou nacional de critérios relativos ao fim desse estatuto no que se refere à substância ou objeto em causa. Se uma tal regulamentação fosse admissível, os detentores dos resíduos não beneficiariam de qualquer direito a uma verificação individual de que certos resíduos, apesar da ausência de critérios, já não devem ser considerados resíduos. |
49. |
Neste contexto, importa começar por esclarecer que, de acordo com o artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva relativa aos resíduos, os Estados‑Membros podem fixar critérios sobre o fim do estatuto de resíduo. Embora estes possam, ao abrigo desta disposição, decidir caso a caso, isto não significa que os Estados‑Membros apenas possam adotar decisões individuais relativamente a determinados resíduos ou detentores dos resíduos. Pelo contrário, o artigo 6.o, n.o 4, segundo período, lembra aos Estados‑Membros a notificação destas decisões, nos termos da Diretiva relativa às normas e regulamentações técnicas ( 23 ), à Comissão, nos casos em que essa diretiva assim o exija. No entanto, a referida diretiva não é aplicável a decisões individuais, mas sim a projetos no domínio das regulamentações técnicas. Os critérios relativos ao fim do estatuto de resíduo de determinados tipos de resíduos estariam em princípio abrangidos. Além disso, tais critérios são muito mais úteis para uma aplicação adequada e coerente da legislação em matéria de resíduos do que uma limitação às decisões individuais. |
50. |
Em regra, será também admissível subordinar o fim do estatuto de resíduo à existência de tais critérios, pois os resíduos comportam, a maioria das vezes, riscos para a proteção da saúde e do ambiente, que justificam a aplicação da legislação em matéria de resíduos ( 24 ). |
51. |
No que diz respeito em especial à valorização das lamas de depuração, em particular a Áustria sublinha corretamente, que esta operação comporta determinados riscos para o ambiente e a saúde humana, sobretudo o risco de contaminação com substâncias poluentes. Por conseguinte, tendo em conta a margem de manobra que lhes é atribuída, os Estados‑Membros deveriam ter a possibilidade de não declararem o fim do estatuto de resíduo das lamas de depuração e de não estabelecerem quaisquer normas de produto para lamas de depuração tratadas, se estas normas conduzirem ao fim do estatuto de resíduo. |
52. |
Contudo, poderão existir resíduos que, tendo em conta todos os aspetos relevantes e os mais recentes conhecimentos científicos e técnicos, através de uma operação de valorização se tornaram, para além de qualquer dúvida razoável, utilizáveis, sem pôr em perigo a saúde humana, sem prejudicar o ambiente e sem que o detentor dos resíduos se tenha desfeito ou tenha intenção ou obrigação de se desfazer dos mesmos, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos. |
53. |
Em tal caso, a margem de manobra dos Estados‑Membros seria substancialmente limitada e estes não poderiam escudar‑se no facto de relativamente a estes resíduos ainda não terem sido estabelecidos quaisquer critérios sobre o fim do estatuto de resíduo. Nestas circunstâncias, o detentor dos resíduos teria direito a que as autoridades competentes ou tribunais declarassem, numa decisão individual, o fim do estatuto de resíduo, a menos que, apesar disso, se deva presumir que o detentor de resíduos se desfez da substância ou objeto ou tem intenção ou obrigação de fazê‑lo. |
54. |
A questão de saber se o estatuto de resíduo pode terminar sob determinadas condições de forma automática, quer seja diretamente com base na Diretiva relativa aos resíduos, quer seja porque a diretiva autoriza uma regulamentação nacional nesse sentido, não tem de ser decidida no presente processo. Por um lado, o direito estónio não prevê esta possibilidade e, por outro, as partes estão em desacordo quanto à legalidade das autorizações administrativas que excluem o fim do estatuto de resíduo. |
V. Conclusão
55. |
Por conseguinte, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo ao pedido de decisão prejudicial: Nos termos do artigo 6.o, n.o 4, da Diretiva 2008/98/CE relativa aos resíduos, os Estados‑Membros podem prever que, em princípio, os resíduos estejam sujeitos à legislação em matéria de resíduos até cumprirem os critérios sobre o fim do estatuto de resíduo, que relativamente a este tipo concreto de resíduos tenham sido fixados por um ato jurídico europeu ou nacional de alcance geral. No entanto, se esses critérios não tiverem sido estabelecidos, o detentor de resíduos tem o direito de requerer à autoridade competente ou a um tribunal de um Estado‑Membro a declaração do fim do estatuto de resíduo para um tipo concreto de resíduo, quando, tendo em conta todos os aspetos relevantes e os mais recentes conhecimentos científicos e técnicos, estes resíduos se tenham tornado, para além de qualquer dúvida razoável, utilizáveis através de uma operação de valorização, sem pôr em perigo a saúde humana, sem prejudicar o ambiente e sem que o detentor dos resíduos se tenha desfeito ou tivesse intenção ou obrigação de se desfazer dos mesmos, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva relativa aos resíduos. |
( 1 ) Língua original: alemão.
( 2 ) Acórdão de 28 de março de 1990, Vessoso e Zanetti (C‑206/88 e C‑207/88, EU:C:1990:145).
( 3 ) Acórdão de 15 de junho de 2000, ARCO Chemie Nederland e o. (C‑418/97 e C‑419/97, EU:C:2000:318).
( 4 ) Diretiva 2008/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa aos resíduos e que revoga certas diretivas (JO 2008, L 312, p. 3). As alterações introduzidas pelo Regulamento (UE) n.o 1357/2014 da Comissão, de 18 de dezembro de 2014, que substitui o anexo III da Diretiva 2008/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa aos resíduos e que revoga certas diretivas (JO 2014, L 365, p. 89) e pela Diretiva (UE) 2015/1127 da Comissão, de 10 de julho de 2015, que altera o anexo II da Diretiva 2008/98/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos resíduos e que revoga certas diretivas (JO 2015, L 184, p. 13) não são pertinentes no âmbito do presente processo.
( 5 ) Diretiva (UE) 2018/851 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2018, que altera a Diretiva 2008/98/CE relativa aos resíduos (JO 2018, L 150, p. 109).
( 6 ) Diretiva 91/271/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1991, relativa ao tratamento de águas residuais urbanas (JO 1991, L 135, p. 40); seria pertinente a redação que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.o 1137/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que adapta à Decisão 1999/468/CE do Conselho certos atos sujeitos ao procedimento previsto no artigo 251.o do Tratado, no que se refere ao procedimento de regulamentação com controlo — Adaptação ao procedimento de regulamentação com controlo — Primeira Parte (JO 2008, L 311, p. 1). V., quanto à delimitação do âmbito de aplicação da Diretiva relativa aos resíduos no que se refere às águas residuais, o Acórdão de 10 de maio de 2007, Thames Water Utilities (C‑252/05, EU:C:2007:276).
( 7 ) Diretiva 86/278/CEE do Conselho, de 12 de junho de 1986, relativa à proteção do ambiente, e em especial dos solos, na utilização agrícola de lamas de depuração (JO 1986, L 181, p. 6); é pertinente a redação que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.o 219/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2009, que adapta à Decisão 1999/468/CE do Conselho certos atos sujeitos ao procedimento previsto no artigo 251.o do Tratado, no que se refere ao procedimento de regulamentação com controlo — Adaptação ao procedimento de regulamentação com controlo — Segunda Parte (JO 2009, L 87, p. 109).
( 8 ) Acórdão de 7 de março de 2013, Lapin ELY‑keskus, liikenne ja infrastruktuuri (C‑358/11, EU:C:2013:142, n.o 55).
( 9 ) Acórdão de 7 de março de 2013, Lapin ELY‑keskus, liikenne ja infrastruktuuri (C‑358/11, EU:C:2013:142, n.o 57 e jurisprudência aí referida).
( 10 ) Acórdãos de 18 de dezembro de 2007, Comissão/Itália (C‑263/05, EU:C:2007:808, n.o 40), e de 12 de dezembro de 2013, Shell Nederland e Belgian Shell (C‑241/12 e C‑242/12, EU:C:2013:821, n.o 40).
( 11 ) São ilustrativos desta situação os Acórdãos de 9 de setembro de 1999, Comissão/Alemanha (C‑102/97, EU:C:1999:394), que diz respeito ao conflito entre determinadas operações de valorização de óleos usados, e de 23 de maio de 2000, Sydhavnens Sten & Grus (C‑209/98, EU:C:2000:279), relativo ao acesso aos resíduos de obras de construção.
( 12 ) Acórdão de 7 de março de 2013, Lapin ELY‑keskus, liikenne ja infrastruktuuri (C‑358/11, EU:C:2013:142, n.o 57).
( 13 ) Acórdão de 19 de junho de 2003, Mayer Parry Recycling (C‑444/00, EU:C:2003:356, n.o 75).
( 14 ) Acórdão de 11 de novembro de 2004, Niselli (C‑457/02, EU:C:2004:707, n.o 52).
( 15 ) Acórdãos de 4 de dezembro de 2008, Lahti Energia (C‑317/07, EU:C:2008:684, n.os 35 e 36), e de 25 de fevereiro de 2010, Lahti Energia II (C‑209/09, EU:C:2010:98, n.os 20 e 21).
( 16 ) V. Acórdão de 7 de março de 2013, Lapin ELY‑keskus, liikenne ja infrastruktuuri (C‑358/11, EU:C:2013:142, n.o 60).
( 17 ) V. Acórdão de 16 de dezembro de 2004, EU‑Wood‑Trading (C‑277/02, EU:C:2004:810, n.os 45 e 46).
( 18 ) Acórdão de 13 de julho de 2017, Túrkevei Tejtermelő Kft. (C‑129/16, EU:C:2017:547, n.o 61).
( 19 ) V. Acórdãos de 9 de novembro de 1999, Comissão/Itália (San Rocco, C‑365/97, EU:C:1999:544, n.os 66 e 67), de 18 de novembro de 2004, Comissão/Grécia (Pera Galini, C‑420/02, EU:C:2004:727, n.o 21), de 16 de dezembro de 2004, EU‑Wood‑Trading (C‑277/02, EU:C:2004:810, n.o 45), e de 11 de dezembro de 2008, MI.VER e Antonelli (C‑387/07, EU:C:2008:712, n.o 25).
( 20 ) V. Acórdão de 28 de julho de 2016, Edilizia Mastrodonato (C‑147/15, EU:C:2016:606, n.o 45).
( 21 ) V. Acórdãos de 21 de janeiro de 1999, Upjohn (C‑120/97, EU:C:1999:14, n.os 34 e 35), de 9 de junho de 2005, HLH Warenvertrieb e Orthica (C‑211/03, C‑299/03 e C‑316/03 a C‑318/03, EU:C:2005:370, n.os 76 e 78), e de 9 de março de 2010, ERG e o. (C‑379/08 e C‑380/08, EU:C:2010:127, n.o 60). Quanto ao controlo das decisões adotadas pelos organismos da União, v., por exemplo, Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München (C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 13), de 9 de setembro de 2003, Monsanto Agricoltura Italia e o. (C‑236/01, EU:C:2003:431, n.o 135), de 6 de novembro de 2008, Países Baixos/Comissão (C‑405/07 P, EU:C:2008:613, n.o 54), e de 9 de junho de 2016, Pesce e o. (C‑78/16 e C‑79/16, EU:C:2016:428, n.o 49).
( 22 ) Quanto ao controlo das medidas adotadas pelos Estados‑Membros, v. Acórdão de 9 de março de 2010, ERG e o. (C‑379/08 e C‑380/08, EU:C:2010:127, n.o 61), relativamente às medidas da União, v., por exemplo, Acórdãos de 6 de novembro de 2008, Países Baixos/Comissão (C‑405/07 P, EU:C:2008:613, n.o 56), e de 16 de junho de 2015, Gauweiler e o. (C‑62/14, EU:C:2015:400, n.o 69).
( 23 ) Faz‑se referência à Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO 1998, L 204, p. 37), que foi, porém, entretanto substituída pela Diretiva (UE) 2015/1535 (JO 2015, L 241, p. 1), de designação idêntica.
( 24 ) V. Acórdãos de 24 de maio de 2007, Comissão/Espanha (C‑361/05, EU:C:2007:298, n.o 20), e de 10 de junho de 2010, Comissão/Portugal (C‑37/09, EU:C:2010:331, n.o 37).