31.5.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 206/6


Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 25 de março de 2021 (pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Administrativen sad Sofia-grad — Bulgária) — BT/Balgarska Narodna Banka

(Processo C-501/18) (1)

(«Reenvio prejudicial - Sistemas de garantia de depósitos - Diretiva 94/19/CE - Artigo 1.o, n.o 3, alínea i) - Artigo 7.o, n.o 6 - Artigo 10.o, n.o 1 - Conceito de “depósito indisponível” - Declaração da indisponibilidade do depósito - Autoridade competente - Direito a indemnização do depositante - Cláusula contratual contrária à Diretiva 94/19 - Princípio do primado do direito da União - Sistema europeu de supervisão financeira - Autoridade Bancária Europeia (ABE) - Regulamento (UE) n.o 1093/2010 - Artigo 1.o, n.o 2 - Artigo 4.o, n.o 2, alínea iii) - Artigo 17.o, n.o 3 - Recomendação da ABE a uma autoridade bancária nacional relativamente às medidas a tomar para dar cumprimento à Diretiva 94/19 - Efeitos jurídicos - Validade - Saneamento e liquidação das instituições de crédito - Diretiva 2001/24/CE - Artigo 2.o, sétimo travessão - Conceito de “medidas de saneamento” - Compatibilidade com o artigo 17.o, n.o 1, e o artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia - Responsabilidade dos Estados-Membros em caso de violação do direito da União - Requisitos - Violação suficientemente caracterizada do direito da União - Autonomia processual dos Estados-Membros - Princípio da cooperação leal - Artigo 4.o, n.o 3, TUE - Princípios da equivalência e da efetividade»)

(2021/C 206/08)

Língua do processo: búlgaro

Órgão jurisdicional de reenvio

Administrativen sad Sofia-grad

Partes no processo principal

Demandante: BT

Demandado: Balgarska Narodna Banka

Dispositivo

1)

O artigo 7.o, n.o 6, da Diretiva 94/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 1994, relativa aos sistemas de garantia de depósitos, conforme alterada pela Diretiva 2009/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2009, deve ser interpretado no sentido de que o direito a indemnização do depositante que prevê abrange apenas a restituição, pelo sistema de garantia de depósitos, dos depósitos indisponíveis desse depositante, até ao montante fixado no artigo 7.o, n.o 1-A, desta diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, na sequência da declaração de indisponibilidade, pela autoridade nacional competente, dos depósitos detidos pela instituição de crédito em causa, em conformidade com o artigo 1.o, n.o 3, alínea i), da referida diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, pelo que o artigo 7.o, n.o 6, da mesma diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, não pode fundar, em benefício do referido depositante, um direito a indemnização do prejuízo causado pela restituição tardia do montante garantido de todos os seus depósitos ou por uma supervisão deficiente por parte das autoridades nacionais competentes relativamente à instituição de crédito cujos depósitos se tornaram indisponíveis.

2)

As disposições conjugadas do artigo 1.o, n.o 3, alínea i), do artigo 7.o, n.o 6, e do artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 94/19, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, devem ser interpretadas no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional ou a uma cláusula contratual, por força da qual um depósito numa instituição de crédito cujos pagamentos foram suspensos só se torna exigível após a revogação, pela autoridade competente, da licença bancária concedida a essa instituição e desde que o depositante tenha pedido expressamente a restituição desse depósito. Por força do princípio do primado do direito da União, qualquer órgão jurisdicional nacional chamado a conhecer de uma ação de indemnização do prejuízo pretensamente causado pela restituição do montante garantido desse depósito fora do prazo previsto no artigo 10.o, n.o 1, desta diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, deve afastar essa regulamentação nacional ou essa cláusula contratual, para efeitos de decidir essa ação.

3)

O artigo 17.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 1093/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia), altera a Decisão n.o 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/78/CE da Comissão, lido à luz do seu considerando 27, deve ser interpretado no sentido de que um órgão jurisdicional nacional deve tomar em consideração uma recomendação da Autoridade Bancária Europeia emitida com base nesta disposição, com vista a resolver o litígio que lhe foi submetido, designadamente no âmbito de uma ação destinada a responsabilizar um Estado-Membro por danos causados a um particular devido à não aplicação ou à aplicação incorreta ou insuficiente do direito da União que deu origem ao procedimento de investigação que resultou na adoção desta recomendação. Os particulares lesados pela violação do direito da União declarada por essa recomendação, mesmo que não sejam os seus destinatários, devem poder basear-se nessa recomendação a fim de obter a declaração, perante os órgãos jurisdicionais nacionais competentes, da responsabilidade do Estado-Membro em causa devido à referida violação do direito da União.

A Recomendação EBA/REC/2014/02 da Autoridade Bancária Europeia, de 17 de outubro de 2014, ao Balgarska Narodna Banka (Banco Central da Bulgária) e ao Fond za garantirane na vlogovete v bankite (Fundo de garantia dos depósitos bancários), sobre as medidas necessárias para dar cumprimento à Diretiva 94/19/CE, é inválida, na medida em que equiparou a decisão do Balgarska Narodna Banka (Banco Central da Bulgária) de colocar o Korporativna targovska banka AD (Banco Comercial Corporativo) sob supervisão especial e de suspender as suas obrigações a uma declaração de indisponibilidade dos depósitos, na aceção do artigo 1.o, n.o 3, alínea i), da Diretiva 94/19, conforme alterada pela Diretiva 2009/14.

4)

O artigo 2.o, sétimo travessão, da Diretiva 2001/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de abril de 2001, relativa ao saneamento e à liquidação das instituições de crédito, lido à luz do artigo 17.o, n.o 1, e do artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, deve ser interpretado no sentido de que uma medida de suspensão dos pagamentos aplicada por um banco central nacional a uma instituição de crédito, enquanto medida de saneamento destinada a preservar ou restabelecer a situação financeira dessa instituição, constitui uma ingerência injustificada e desproporcionada no exercício do direito de propriedade dos depositantes na referida instituição se não respeitar o conteúdo essencial desse direito e se, tendo em conta o risco iminente de perda financeira ao qual ficariam expostos os depositantes em caso de insolvência desta instituição, outras medidas menos restritivas permitissem alcançar os mesmos resultados, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

5)

O direito da União, em especial o princípio da responsabilidade dos Estados-Membros pelos danos causados aos particulares devido a uma violação do direito da União, bem como os princípios da equivalência e da efetividade, deve ser interpretado no sentido de que:

não se opõe a uma regulamentação nacional que subordina o direito dos particulares de obterem uma indemnização pelo dano sofrido em consequência de uma violação do direito da União à anulação prévia do ato administrativo ou da omissão administrativa na origem do dano, desde que essa anulação, mesmo que seja necessária para os pedidos semelhantes baseados numa violação do direito nacional, não esteja, na prática, excluída ou muito limitada;

se opõe a uma regulamentação nacional que subordina o direito dos particulares de obterem uma indemnização pelo dano sofrido em consequência de uma violação do direito da União ao requisito relativo ao caráter intencional do dano causado pela autoridade nacional em questão;

não se opõe a uma regulamentação nacional que subordina o direito dos particulares de obterem uma indemnização pelo dano sofrido em consequência de uma violação do direito da União ao requisito de apresentar a prova de um dano real e certo no momento da propositura da ação, desde que esse requisito, por um lado, não seja menos favorável do que os aplicáveis aos pedidos semelhantes baseados numa violação do direito nacional e, por outro, não seja concebido de forma que torne o exercício desse direito impossível ou excessivamente difícil, tendo em conta as particularidades do caso concreto.

6)

Os princípios da equivalência e da efetividade devem ser interpretados no sentido de que não obrigam um órgão jurisdicional chamado a conhecer de uma ação de indemnização formalmente baseada numa disposição de direito nacional relativa à responsabilidade do Estado por danos resultantes de uma atividade administrativa, mas na qual são invocados fundamentos relativos à violação do direito da União em consequência dessa atividade, a qualificar oficiosamente essa ação como tendo por base o artigo 4.o, n.o 3, TUE, desde que esse órgão jurisdicional não esteja impedido, pelas disposições de direito nacional aplicáveis, de examinar os fundamentos relativos à violação do direito da União invocados nessa ação.


(1)  JO C 364, de 8.10.2018.