ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

11 de julho de 2019 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Adjudicação de contratos públicos de fornecimentos e de obras — Diretiva 2014/24/UE — Artigo 28.o, n.o 2 — Concurso limitado — Operadores económicos que podem apresentar uma proposta — Necessidade de manter uma identidade jurídica e material entre o candidato pré‑selecionado e aquele que apresenta a proposta — Princípio da igualdade de tratamento dos proponentes»

No processo C‑697/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália), por Decisão de 19 de outubro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 11 de dezembro de 2017, no processo

Telecom Italia SpA

contra

Ministero dello Sviluppo Economico,

Infrastrutture e telecomunicazioni per l’Italia (Infratel Italia) SpA,

sendo interveniente:

OpEn Fiber SpA,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: E. Regan, presidente de secção, K. Lenaerts, presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Quinta Secção, C. Lycourgos, E. Juhász (relator) e I. Jarukaitis, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: R. Șereș, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 15 de novembro de 2018,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Telecom Italia SpA, por F. Lattanzi, F. Cardarelli e F. S. Cantella, avvocati,

em representação da Infrastrutture e telecomunicazioni per l’Italia (Infratel Italia) SpA, por F. Isgrò, P. Messina e D. Cutolo, avvocati,

em representação da OpEn Fiber SpA, por L. Torchia, avvocatessa,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por G. Aiello, avvocato dello Stato,

em representação da Comissão Europeia, por G. Conte, P. Ondrůšek e T. Vecchi, na qualidade de agentes,

em representação do Órgão de Fiscalização da EFTA, por M. Sánchez Rydelski e C. Zatschler, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 23 de janeiro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 28.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE (JO 2014, L 94, p. 65).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de cinco recursos interpostos pela Telecom Italia SpA, a fim de obter a anulação das decisões adotadas pela Infrastrutture e telecomunicazioni per l’Italia (Infratel Italia) SpA (a seguir «Infratel»), sociedade encarregada pelo Ministero dello Sviluppo Economico (Ministério do Desenvolvimento Económico, Itália) da gestão dos projetos de criação de uma rede de banda larga e ultralarga em Itália, no que respeita à adjudicação dos contratos públicos para a construção, manutenção e gestão das redes públicas de banda ultralarga em várias regiões de Itália (Abruzo, Molise, Emília‑Romanha, Lombardia, Toscânia e Veneto).

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2004/17/CE

3

O artigo 51.o, n.o 3, da Diretiva 2004/17/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1), previa:

«As entidades adjudicantes verificarão a conformidade das propostas apresentadas pelos proponentes assim […] selecionados com as regras e exigências aplicáveis às propostas e adjudicarão o contrato com base nos critérios previstos nos artigos 55.o e 57.o»

Diretiva 2014/24

4

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, ponto 12, da Diretiva 2014/24, o «candidato» é definido como «um operador económico que tenha solicitado um convite ou tenha sido convidado a participar num concurso limitado, num procedimento concorrencial com negociação ou num procedimento por negociação [sem] publicação prévia de anúncio, num diálogo concorrencial ou numa parceria para a inovação».

5

O artigo 28.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Concurso limitado», tem a seguinte redação:

«1.   Nos concursos limitados, qualquer operador económico pode apresentar um pedido de participação em resposta a um anúncio de concurso do qual consta a informação prevista no anexo V, partes B ou C, conforme o caso, apresentando as informações para efeitos de seleção qualitativa solicitadas pela autoridade adjudicante.

[…]

2.   Só podem apresentar propostas os operadores económicos convidados pela autoridade adjudicante após a sua avaliação das informações prestadas. As autoridades adjudicantes podem limitar o número de candidatos convidados a participar no procedimento nos termos do artigo 65.o

[…]»

Direito italiano

6

O decreto legislativo n.o 50 — Attuazione delle direttive 2014/23/UE, 2014/24/UE e 2014/25/UE sull’aggiudicazione dei contratti di concessione, sugli appalti pubblici e sulle procedure d’appalto degli enti erogatori nei settori dell’acqua, dell’energia, dei trasporti e dei servizi postali, nonché per il riordino della disciplina vigente in materia di contratti pubblici relativi a lavori, servizi e forniture (Decreto Legislativo n.o 50, que transpõe as Diretivas 2014/23/UE, 2014/24/UE e 2014/25/UE, relativas à adjudicação de contratos de concessão, aos contratos públicos e aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais, bem como reordenação da legislação vigente em matéria de contratos públicos de obras, serviços e fornecimentos), de 18 de abril de 2016 (suplemento ordinário do GURI n.o 91, de 19 de abril de 2016, a seguir «Código dos Contratos Públicos»), transpôs para o direito italiano as referidas diretivas.

7

O artigo 61.o do Código dos Contratos Públicos, sob a epígrafe «Concurso limitado», transpôs o artigo 28.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24. Este artigo prevê, no seu n.o 3:

«Na sequência da avaliação, pelas autoridades adjudicantes das informações prestadas, apenas os operadores económicos convidados podem apresentar uma proposta.»

Litígio no processo principal e questão prejudicial

8

Em maio de 2016, a Infratel lançou, em nome do Ministério do Desenvolvimento Económico, um concurso limitado para a adjudicação de contratos públicos para a construção, manutenção e gestão de uma rede passiva pública de banda ultralarga nas zonas ditas «brancas» de várias regiões de Itália (Abruzo, Molise, Emília‑Romanha, Lombardia, Toscânia e Veneto).

9

Este procedimento de adjudicação inseria‑se no âmbito da execução do regime de auxílios de Estado SA.41647 (2016/N) (Strategia Italiana Banda Ultra‑Larga), notificado pelas autoridades italianas em 10 de agosto de 2015 e aprovado por uma decisão da Comissão de 30 de junho de 2016 [C(2016) 3931 final].

10

O referido procedimento tinha por objeto a adjudicação de cinco lotes e incluía as três fases seguintes:

apresentação de pedidos de participação (até 18 de julho de 2016);

envio de convites para participação aos operadores pré‑selecionados (até 9 de agosto de 2016); e

apresentação de propostas (até 17 de outubro de 2016).

11

A Telecom Italia, a Metroweb Sviluppo Srl e a Enel OpEn Fiber SpA (a seguir «OpEn Fiber») apresentaram os seus pedidos de participação para cada um dos cinco lotes. Embora tenha sido pré‑selecionada, a Metroweb Sviluppo acabou por não apresentar nenhuma proposta.

12

Em 9 de janeiro de 2017, a Infratel publicou a lista dos proponentes admitidos e, em 24 de janeiro de 2017, a qualificação provisória dos adjudicatários. A OpEn Fiber ocupava o primeiro lugar em cada um dos referidos cinco lotes, tendo a Telecom Italia sido classificada em segundo lugar, exceto para o lote 4, onde ocupava o terceiro lugar.

13

Não satisfeita com o resultado do procedimento em causa, a Telecom Italia apresentou um pedido de acesso aos documentos que figuram no dossiê relativo a esse procedimento.

14

Resulta desses documentos que, entre a fase de pré‑seleção e 17 de outubro de 2016, data‑limite para apresentação das propostas, a Enel SpA e a Metroweb Italia SpA, sociedades holding, celebraram, em 10 de outubro de 2016, um acordo‑quadro vinculativo que estabelecia que a OpEn Fiber adquiria todas as ações da Metroweb SpA, que detinha a Metroweb Sviluppo, pelo que esta aquisição implicava a fusão por incorporação da Metroweb SpA e, por conseguinte, da Metroweb Sviluppo, na OpEn Fiber. Em conformidade com esse acordo‑quadro, a incorporação da Metroweb Sviluppo na OpEn Fiber foi decidida em 23 de janeiro de 2017.

15

Este projeto de concentração tinha sido notificado à Comissão Europeia em 10 de novembro de 2016, nos termos do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho, de 20 de janeiro de 2004, relativo ao controlo das concentrações de empresas (JO 2004, L 24, p. 1). Por Decisão de 15 de dezembro de 2016 (Processo M.8234 — Enel/CDP Equity/Cassa Depositi e Prestiti/Enel Open Fiber/Metroweb Italia) (JO 2017, C 15, p. 1), a Comissão decidiu não se opor à mesma.

16

A Telecom Italia contestou a adjudicação dos cinco lotes em causa em cinco recursos interpostos no Tribunale amministrativo regionale del Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio, Itália), que lhes negou provimento. A seguir, a Telecom Italia interpôs recurso das decisões do referido órgão jurisdicional para o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália).

17

O Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) pretende saber se, no âmbito de um concurso limitado regulado pelo artigo 28.o da Diretiva 2014/24, como o que está em causa no litígio no processo principal, a exigência de identidade jurídica e material desenvolvida pelo Tribunal de Justiça à luz do artigo 51.o da Diretiva 2004/17, no Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin (C‑396/14, EU:C:2016:347), pode ser aplicada.

18

Além disso, esse órgão jurisdicional observa que, na data da apresentação das propostas, em 17 de outubro de 2016, a operação de fusão em causa no processo principal tinha apenas começado, uma vez que a sua conclusão só ocorreu posteriormente, pelo que, nessa data, a estrutura de OpEn Fiber não tinha sofrido qualquer alteração.

19

Segundo o referido órgão jurisdicional, é impossível demonstrar que, através do acordo de fusão em causa, as partes tenham querido realizar um acordo anticoncorrencial, com o objetivo de restringir a concorrência no âmbito do procedimento de adjudicação do contrato em causa no processo principal.

20

Foi nestas condições que o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 28.o, n.o 2, [primeiro período], da Diretiva [2014/24] ser interpretado no sentido de que exige a plena identidade jurídica e económica entre os operadores pré‑selecionados e aqueles que apresentam propostas no âmbito do concurso limitado e, em concreto, de que se opõe a um acordo entre as sociedades holding que controlam dois operadores pré‑selecionados, celebrado entre a pré‑seleção e a apresentação das propostas, sempre que: a) esse acordo tenha por objeto e por efeito (inter alia) a realização de uma fusão por incorporação de uma das empresas pré‑selecionadas noutra também pré‑selecionada no referido concurso (operação que ademais foi autorizada pela [Comissão]); b) os efeitos da operação de fusão se tenham plenamente concretizado depois da apresentação da proposta pela empresa incorporante (razão pela qual, no momento da apresentação da proposta, a sua composição não tinha sido objeto de alteração em relação à existente no momento da pré‑seleção); c) a empresa posteriormente incorporada (cuja composição não tinha sido objeto de alteração no último dia de apresentação das propostas) tenha decidido, contudo, não participar no concurso limitado, provavelmente em execução do programa contratual estabelecido no acordo celebrado entre as sociedades holding

Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

21

Segundo a Infratel, a OpEn Fiber e o Governo italiano, o pedido de decisão prejudicial deve ser declarado inadmissível, tanto por não ser pertinente para o processo principal como pelo seu caráter hipotético ou por não responder a uma dúvida genuína do órgão jurisdicional de reenvio.

22

A este respeito, há que recordar que é exclusivamente ao órgão jurisdicional nacional chamado a conhecer do litígio, ao qual cabe assumir a responsabilidade da decisão judicial a proferir, que compete apreciar, tendo em conta a especificidade de cada processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Por conseguinte, quando as questões submetidas disserem respeito à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre um pedido de decisão prejudicial formulado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 10 de julho de 2018, Jehovan todistajat, C‑25/17, EU:C:2018:551, n.o 31 e jurisprudência referida).

23

No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que o processo de concurso em causa no processo principal se rege pelas regras estabelecidas no anúncio, uma das quais remete para o artigo 61.o do Código dos Contratos Públicos, que transpõe o artigo 28.o da Diretiva 2014/24. Além disso, nenhum dos elementos dos autos permite considerar que a interpretação do direito da União solicitada não esteja relacionada com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, ou que seja hipotético. Com efeito, como salientou o órgão jurisdicional de reenvio, a questão colocada visa permitir‑lhe determinar se esta disposição da Diretiva 2014/24 impõe a identidade plena entre os operadores pré‑selecionados e aqueles que apresentam as propostas no âmbito de um concurso limitado.

24

Por outro lado, se é verdade que o Consiglio di Stato (Conselho de Estado em formação jurisdicional) expõe as razões que, em seu entender, levam a uma determinada interpretação do artigo 28.o da Diretiva 2014/24, isso não significa que não tenha dúvidas sobre o sentido da referida disposição. Ao expor o seu ponto de vista, o referido órgão jurisdicional colabora lealmente com o Tribunal de Justiça no âmbito do processo prejudicial e dá seguimento ao convite que consta do ponto 17 das Recomendações à atenção dos órgãos jurisdicionais nacionais, relativos à apresentação de processos prejudiciais (JO 2018, C 257, p. 1), nos termos do qual «[o] órgão jurisdicional de reenvio pode igualmente indicar sucintamente o seu ponto de vista sobre a resposta a dar às questões submetidas a título prejudicial», indicação que esse ponto 17 qualifica de «útil para o Tribunal de Justiça».

25

Nestas circunstâncias, o pedido de decisão prejudicial deve ser considerado admissível.

Quanto à questão prejudicial

26

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2014/24 deve ser interpretado no sentido de que, tendo em conta a exigência de identidade jurídica e material entre os operadores económicos pré‑selecionados e aqueles que apresentam propostas, se opõe a que, no âmbito de um concurso limitado de adjudicação de um contrato público, um candidato pré‑selecionado, que se compromete a incorporar outro candidato pré‑selecionado, ao abrigo de um acordo de fusão celebrado entre a fase de pré‑seleção e a de apresentação das propostas e executado após essa fase de apresentação, possa apresentar uma proposta.

27

Em conformidade com o artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2014/24, só podem apresentar propostas os operadores económicos convidados pela autoridade adjudicante após a sua avaliação das informações prestadas.

28

Esta regra está prevista para o concurso limitado, que se desenrola em várias fases, nomeadamente, a fase de pré‑seleção e a de apresentação das propostas.

29

Resulta da redação do artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2014/24 que o operador económico que apresenta uma proposta deve, em princípio, ser o mesmo que foi pré‑selecionado.

30

Esta disposição não prevê regras relativas às eventuais alterações ocorridas na estrutura ou na capacidade económica e técnica do candidato pré‑selecionado.

31

No contexto análogo da Diretiva 2004/17, o Tribunal de Justiça examinou a questão da incidência dessas alterações no decurso de um procedimento por negociação de adjudicação de um contrato público no Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin (C‑396/14, EU:C:2016:347), à luz dos princípios gerais do direito da União, nomeadamente do princípio da igualdade de tratamento e da obrigação de transparência que dele decorre, bem como dos objetivos desse direito em matéria de contratos públicos.

32

A este respeito, há que recordar que o princípio da igualdade de tratamento e o dever de transparência significam, designadamente, que os proponentes devem estar em pé de igualdade tanto no momento em que preparam as suas propostas como no momento em que estas são avaliadas pela entidade adjudicante e constituem a base das regras da União relativas aos procedimentos de adjudicação de contratos públicos (Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin, C‑396/14, EU:C:2016:347, n.o 37 e jurisprudência referida).

33

O princípio da igualdade de tratamento entre os proponentes, que tem por objetivo favorecer o desenvolvimento de uma concorrência efetiva entre as empresas que participam num concurso público, impõe que todos os proponentes disponham das mesmas oportunidades na formulação dos termos nas suas propostas e implica, assim, que estas estejam sujeitas às mesmas condições para todos os concorrentes. Uma aplicação estrita do princípio da igualdade de tratamento entre proponentes, no âmbito de um procedimento por negociação, levaria à conclusão de que só os operadores económicos que foram pré‑selecionados enquanto tal podem apresentar propostas e vir a ser adjudicatários (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin, C‑396/14, EU:C:2016:347, n.os 38 e 39).

34

Esta abordagem encontra o seu fundamento no artigo 28.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24, segundo o qual «[s]ó podem apresentar propostas os operadores económicos convidados pela autoridade adjudicante após a sua avaliação das informações prestadas», o que pressupõe uma identidade jurídica e material entre os operadores económicos pré‑selecionados e os que apresentam as propostas (v., por analogia, Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin, C‑396/14, EU:C:2016:347, n.o 40).

35

Todavia, o Tribunal de Justiça declarou igualmente que, num procedimento por negociação, em caso de dissolução de um agrupamento pré‑selecionado enquanto tal, do qual faziam parte dois operadores económicos, um deles pode substituir‑se a esse agrupamento e continuar envolvido nesse procedimento, sem que o princípio da igualdade seja violado, desde que esteja assente que esse operador económico satisfaz por si só as exigências definidas inicialmente pela autoridade adjudicante e que a continuidade da sua participação no referido procedimento não acarreta uma deterioração da situação concorrencial dos demais proponentes (v., neste sentido, Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin, C‑396/14, EU:C:2016:347, n.o 48 e dispositivo).

36

Há que salientar que, no processo que deu origem ao referido acórdão, tanto a identidade jurídica como a identidade material entre o operador pré‑selecionado e aquele que apresentou uma proposta tinham sido modificadas, uma vez que, por um lado, não foi o agrupamento de empresas pré‑selecionado enquanto tal que continuou no procedimento, mas apenas um dos operadores desse agrupamento, e que, por outro, a capacidade económica e técnica do candidato inicial tinha sido reduzida pela perda de capacidade de um dos operadores económicos em causa. No entanto, esta alteração não era suscetível de impedir a continuação do procedimento se as condições estabelecidas pelo Tribunal de Justiça fossem respeitadas.

37

A este respeito, importa sublinhar que, em contrapartida, o processo principal diz respeito a uma situação em que um dos proponentes aumentou as suas capacidades mediante a aquisição de um dos outros proponentes pré‑selecionados.

38

Por conseguinte, há que determinar se, nessas circunstâncias, a identidade jurídica e material dos proponentes pré‑selecionados foi alterada.

39

No caso em apreço, é pacífico que, no que respeita à OpEn Fiber, a exigência de identidade jurídica entre o candidato pré‑selecionado e aquele que apresentou uma proposta foi respeitada.

40

Em contrapartida, resulta dos elementos do pedido de decisão prejudicial que, entre a fase de pré‑seleção e a data‑limite para a apresentação das propostas, as sociedades holding de dois proponentes, a OpEn Fiber e a Metroweb Sviluppo, celebraram um acordo‑quadro vinculativo destinado à fusão por incorporação da Metroweb Sviluppo pela OpEn Fiber. Na medida em que tinha sido assumido um compromisso firme, por força do qual OpEn Fiber devia adquirir os ativos da Metroweb Sviluppo, e, portanto, a OpEn Fiber, apesar de estar à espera de uma decisão da Comissão, podia razoavelmente contar com a capacidade da Metroweb Sviluppo no âmbito da sua atividade futura, há que constatar a falta de identidade material entre a OpEn Fiber na data em que foi pré‑selecionada e esta sociedade na data‑limite de apresentação das propostas, ainda que os efeitos concretos e definitivos da operação de fusão em causa só se tenham concretizado depois da apresentação das propostas.

41

Por conseguinte, há que examinar, no caso em apreço, se, não obstante essa falta de identidade material, se pode considerar que o princípio da igualdade não foi violado à luz dos critérios referidos no Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin (C‑396/14, EU:C:2016:347, n.o 48), referido no n.o 36 do presente acórdão.

42

A este respeito, importa sublinhar que, como resulta do n.o 37 do presente acórdão, esses critérios foram elaborados no âmbito de um processo que deu origem ao referido Acórdão de 24 de maio de 2016, MT Højgaard e Züblin (C‑396/14, EU:C:2016:347), que dizia respeito, em substância, a circunstâncias por força das quais as capacidades do proponente inicialmente pré‑selecionado tinham diminuído, ao passo que o presente processo se refere a uma situação em que um dos proponentes aumentou as suas capacidades mediante a aquisição de um dos proponentes pré‑selecionados. Esta diferença incide necessariamente na aplicação, no presente caso, dos referidos critérios, uma vez que, contrariamente a um aumento das capacidades de um proponente, uma diminuição das mesmas é suscetível de originar dificuldades no âmbito de um procedimento de adjudicação de um contrato público.

43

Com efeito, permitir que um candidato cuja capacidade económica e técnica diminuiu sensivelmente desde a sua pré‑seleção apresente uma proposta poderia conduzir a contornar o processo de pré‑seleção, dado que esse candidato cuja capacidade foi assim reduzida não teria eventualmente sido pré‑selecionado.

44

Num procedimento por negociação de adjudicação de um contrato público, é do interesse da entidade adjudicante que os candidatos pré‑selecionados mantenham a sua capacidade económica e técnica ao longo do processo, uma vez que a perda dessa capacidade pode prejudicar o objetivo desse procedimento, que consiste em selecionar um proponente capaz de executar o referido contrato.

45

Em contrapartida, não é contrário aos interesses da entidade adjudicante que um candidato reforce a sua capacidade económica e técnica após a pré‑seleção. Pode mesmo considerar‑se normal que um candidato se dote de meios que lhe permitam garantir uma boa execução do contrato.

46

Este reforço da capacidade económica e técnica pode incluir o recurso a meios de outros operadores económicos e, se for caso disso, a incorporação parcial ou completa de um operador económico, incluindo de um operador económico que participa no mesmo procedimento por negociação de adjudicação de um contrato público.

47

Tendo em conta estas considerações, há que declarar que o critério relativo, em substância, à constatação do facto de que um operador económico que deseje continuar a participar num processo de adjudicação de um contrato público enquanto proponente, na falta de identidade jurídica ou material entre este operador económico na fase de pré‑seleção e o mesmo operador na data‑limite de apresentação das propostas, deve demonstrar que continua a satisfazer as exigências definidas inicialmente pela entidade adjudicante é cumprido por hipótese numa situação em que a sua capacidade material só tenha aumentado.

48

Quanto ao cumprimento, no caso vertente, do critério de que o proponente continua a participar num procedimento de adjudicação de um contrato público sem que isso conduza a uma deterioração da situação concorrencial dos outros proponentes, há que salientar que as disposições do direito da União distintas das que regem os contratos públicos visam especificamente assegurar que a existência de uma concorrência livre e não falseada no mercado interno não seja ameaçada por operações de fusão como as que estão em causa no processo principal. Assim, desde que o comportamento de um ator económico cumpra estas regras específicas, não se pode considerar que a sua participação nessa operação seja suscetível, enquanto tal, de deteriorar a situação concorrencial dos outros proponentes pelo simples facto de a entidade resultante da fusão beneficiar de uma capacidade económica e técnica reforçada.

49

Assim, uma incorporação como a que está em causa no processo principal deve ser realizada no respeito da regulamentação da União, nomeadamente do Regulamento n.o 139/2004.

50

Ora, resulta do pedido de decisão prejudicial que, no caso em apreço, a Comissão decidiu em 15 de dezembro de 2016, ao abrigo do referido regulamento, não se opor à operação notificada.

51

Há que acrescentar igualmente que, embora a fusão entre os dois proponentes pré‑selecionados não viole enquanto tal o princípio da igualdade, não se pode excluir que informações sensíveis relativas ao procedimento de adjudicação do contrato tenham podido ser trocadas entre as partes interessadas da fusão, antes de esta ser realizada. Ora, esta circunstância seria suscetível de, no momento da apresentação das propostas, conferirem vantagens injustificadas face aos outros proponentes, o que implica necessariamente uma deterioração da situação concorrencial destes últimos (v., por analogia, Acórdão de 17 de maio de 2018, Specializuotas transportas, C‑531/16, EU:C:2018:324, n.o 29).

52

Uma tal situação é, em princípio, suficiente para que a proposta do proponente incorporante não possa ser tida em conta pela entidade adjudicante (v., por analogia, Acórdão de 17 de maio de 2018, Specializuotas transportas, C‑531/16, EU:C:2018:324, n.o 31).

53

Todavia, tais trocas de informações, que, por outro lado, como a Comissão salientou nas suas observações, são suscetíveis de infringir o artigo 7.o do Regulamento n.o 139/2004, relativo à suspensão de qualquer concentração abrangida pelo âmbito de aplicação do mesmo até que seja autorizada, bem como o artigo 101.o TFUE, não se podem presumir. Ora, resulta das informações de que o Tribunal de Justiça dispõe que, no caso vertente, não foi demonstrado nenhum comportamento colusório.

54

Resulta de todas as considerações precedentes que o artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2014/24 deve ser interpretado no sentido de que, tendo em conta a exigência de identidade jurídica e material entre os operadores económicos pré‑selecionados e os que apresentam as propostas, não se opõe a que, no âmbito de um concurso limitado de adjudicação de um contrato público, um candidato pré‑selecionado, que se compromete a incorporar outro candidato pré‑selecionado, ao abrigo de um acordo de fusão celebrado entre a fase de pré‑seleção e a de apresentação das propostas e executado após essa fase de apresentação, possa apresentar uma proposta.

Quanto às despesas

55

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

O artigo 28.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE, deve ser interpretado no sentido de que, tendo em conta a exigência de identidade jurídica e material entre os operadores económicos pré‑selecionados e os que apresentam as propostas, não se opõe a que, no âmbito de um concurso limitado de adjudicação de um contrato público, um candidato pré‑selecionado, que se compromete a incorporar outro candidato pré‑selecionado, ao abrigo de um acordo de fusão celebrado entre a fase de pré‑seleção e a de apresentação das propostas e executado após essa fase de apresentação, possa apresentar uma proposta.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.