ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

8 de maio de 2019 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Política económica e monetária — Regulamento (UE) n.o 1024/2013 — Artigo 6.o, n.o 4 — Regulamento (UE) n.o 468/2014 — Artigo 70.o, n.o 1 — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Atribuições conferidas ao Banco Central Europeu (BCE) — Mecanismo Único de Supervisão — Exercício destas atribuições pelas autoridades nacionais competentes — Instituição de crédito “menos significativa” — “Circunstâncias específicas” que justificam considerar uma instituição de crédito “menos significativa”»

No processo C‑450/17 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 26 de julho de 2017,

Landeskreditbank Baden‑Württemberg — Förderbank, estabelecido em Karlsruhe (Alemanha), representado por A. Glos, T. Lübbig e M. Benzing, Rechtsanwälte,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Banco Central Europeu (BCE), representado por E. Koupepidou e R. Bax, na qualidade de agentes, assistidos por H.‑G. Kamann, Rechtsanwalt,

recorrido em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por W. Mölls e K.‑P. Wojcik, na qualidade de agentes,

interveniente em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot, presidente de secção, R. Silva de Lapuerta (relatora), vice‑presidente do Tribunal de Justiça, A. Rosas, L. Bay Larsen e M. Safjan, juízes,

advogado‑geral: G. Hogan,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 5 de dezembro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, o Landeskreditbank Baden‑Württemberg — Förderbank (a seguir «Landeskreditbank») pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE (T‑122/15, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2017:337), pelo qual este negou provimento ao seu recurso destinado a obter a anulação da Decisão ECB/SSM/15/1 do Banco Central Europeu (BCE), de 5 de janeiro de 2015, tomada em aplicação do artigo 6.o, n.o 4, e do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao Banco Central Europeu atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63) (a seguir «decisão controvertida»).

Quadro jurídico

Regulamento n.o 1024/2013

2

Nos termos do considerando 55 do Regulamento n.o 1024/2013:

«As atribuições de supervisão conferidas ao BCE implicam uma responsabilidade importante no sentido de salvaguardar a estabilidade financeira na União e de exercer os seus poderes de supervisão da forma mais eficaz e proporcionada. […]»

3

O artigo 1.o, primeiro parágrafo, desse regulamento dispõe:

«O presente regulamento confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, com vista a contribuir para a segurança e a solidez das instituições de crédito e para a estabilidade do sistema financeiro na União e em cada Estado‑Membro, tendo plena e diligentemente em conta a unidade e a integridade do mercado interno, e por base a igualdade de tratamento das instituições de crédito com vista a evitar a arbitragem regulamentar.»

4

O artigo 4.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Atribuições conferidas ao BCE», prevê, no seu n.o 1:

«Nos termos do artigo 6.o, cabe ao BCE, de acordo com o n.o 3 do presente artigo, exercer em exclusivo, para fins de supervisão prudencial, as seguintes atribuições relativamente à totalidade das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes:

[…]»

5

O artigo 6.o do mesmo regulamento prevê:

«1.   O BCE exerce as suas atribuições no âmbito de um mecanismo único de supervisão [(MUS)] composto pelo BCE e pelas autoridades nacionais competentes. O BCE é responsável pelo funcionamento eficaz e coerente do MUS.

[…]

4.   No [que] se refere às atribuições previstas no artigo 4.o, com exceção do n.o 1, alíneas a) e c), o BCE dispõe dos poderes previstos no n.o 5 do presente artigo, e as autoridades nacionais competentes dispõem dos poderes previstos no n.o 6 do presente artigo, no âmbito e sob reserva dos procedimentos a que se refere o n.o 7 do presente artigo, em matéria de supervisão das seguintes instituições de crédito, companhias financeiras ou companhias financeiras mistas, ou sucursais — que estejam estabelecidas nos Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes:

Aquelas que sejam menos significativas em base consolidada, ao nível mais elevado de consolidação nos Estados‑Membros participantes, ou individualmente no caso específico das sucursais — que estejam estabelecidas em Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes. O caráter significativo é avaliado com base nos seguintes critérios:

i)

dimensão;

ii)

importância para a economia da União ou de um Estado‑Membro participante;

iii)

importância das atividades transfronteiriç[a]s.

No que respeita ao primeiro parágrafo acima, uma instituição de crédito, uma companhia financeira ou uma companhia financeira mista não é considerada menos significativa, a não ser que tal se justifique por circunstâncias específicas a mencionar na metodologia, se se verificar uma das seguintes condições:

i)

o valor total dos seus ativos exceder 30 mil milhões de euros; ou

ii)

o rácio entre a totalidade dos seus ativos e o PIB do Estado‑Membro participante de estabelecimento exceder 20 %, salvo se o valor total dos seus ativos [for] inferior a 5 mil milhões de euros;

iii)

após notificação, pela autoridade nacional competente, de que esta considera que a instituição em causa assume caráter significativo para a economia nacional, o BCE tomar uma decisão que confirma esse caráter significativo, após ter realizado uma avaliação completa da instituição de crédito, incluindo uma avaliação do seu balanço.

O BCE pode também, por iniciativa própria, considerar que uma instituição tem caráter significativo se tiver filiais bancárias estabelecidas em mais de um Estado‑Membro participante e os seus ativos ou passivos transfronteiriços representarem uma parte considerável da totalidade dos seus ativos ou passivos, sob reserva das condições estabelecidas na metodologia.

Aquelas instituições para as quais foi solicitada ou recebida diretamente assistência financeira pública do [Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF)] ou do [Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE)] não podem ser consideradas menos significativas.

Não obstante os parágrafos anteriores e a menos que circunstâncias específicas justifiquem outra solução, o BCE exerce as atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento no que respeita às três instituições de crédito mais significativas em cada Estado‑Membro participante.

5.   No que respeita às instituições de crédito a que se refere o n.o 4 e no âmbito do n.o 7:

[…]

b)

Quando necessário para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, o BCE pode, a qualquer momento, por iniciativa própria e após consulta às autoridades nacionais competentes ou a pedido de uma autoridade nacional competente, decidir exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito a que se refere o n.o 4, incluindo no caso em que tenha sido solicitada ou recebida indiretamente assistência financeira do FEEF ou do MEE;

[…]

6.   Sem prejuízo do n.o 5 do presente artigo, as autoridades nacionais competentes exercem e são responsáveis pelas atribuições de supervisão a que se refere o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), d) a g), e i), adotando todas as decisões de supervisão relevantes dirigidas às instituições de crédito a que se refere o n.o 4, primeiro parágrafo, do presente artigo, no âmbito e sob reserva dos procedimentos a que se refere o n.o 7 do presente artigo.

[…]

As autoridades nacionais competentes informam periodicamente o BCE sobre as atividades realizadas no âmbito do presente artigo.

7.   O BCE, em consulta com as autoridades nacionais competentes, e com base numa proposta do Conselho de Supervisão, adota e publica o enquadramento legal sobre as modalidades práticas de aplicação do presente artigo. […]

8.   Sempre que o BCE for coadjuvado pelas autoridades nacionais competentes ou por autoridades nacionais designadas para efeitos do exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento, o BCE e as autoridades nacionais competentes cumprem as disposições previstas nos atos aplicáveis da União relativos à atribuição de poderes e à cooperação entre as autoridades competentes de diversos Estados‑Membros.»

6

O artigo 24.o do Regulamento n.o 1024/2013 dispõe:

«1.   O BCE institui uma Comissão de Reexame de natureza administrativa, encarregada de proceder a uma revisão administrativa interna das decisões tomadas pelo BCE no exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo presente regulamento após um pedido de revisão apresentado nos termos do n.o 5. A revisão administrativa interna tem como objeto a conformidade processual e material da decisão em causa com o presente regulamento.

[…]

5.   Qualquer pessoa singular ou coletiva pode, nos casos a que se refere o n.o 1, apresentar um pedido de revisão de uma decisão do BCE ao abrigo do presente regulamento de que seja destinatária ou que lhe diga direta e individualmente respeito. Não são admissíveis os pedidos de revisão das decisões do Conselho do BCE a que se refere o n.o 7.

6.   Os pedidos de revisão devem ser feitos por escrito, incluindo a respetiva fundamentação, e ser apresentados ao BCE no prazo de um mês a contar da data da notificação da decisão à pessoa que solicita a revisão ou, na falta de notificação, a contar da data em que essa pessoa tiver tido conhecimento da decisão, consoante o caso.

7.   Depois de se pronunciar sobre a admissibilidade do pedido de revisão, a Comissão de Reexame emite um parecer dentro de um prazo adequado à urgência da questão, mas que não pode exceder dois meses a contar da receção do pedido, e remete o processo ao Conselho de Supervisão, para ser elaborado um novo projeto de decisão. O Conselho de Supervisão tem em conta o parecer da Comissão de Reexame e apresenta sem demora o novo projeto de decisão ao Conselho do BCE. O novo projeto de decisão revoga a decisão inicial, substitui essa decisão por outra de conteúdo idêntico, ou substitui a decisão inicial por uma decisão alterada. O novo projeto de decisão é considerado adotado, salvo se o Conselho do BCE formular objeções no prazo máximo de 10 dias úteis.

[…]

9.   O parecer emitido pela Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão apresentado pelo Conselho de Supervisão e a decisão adotada pelo Conselho do BCE nos termos do presente artigo devem ser fundamentados e notificados às partes.

10.   O BCE adota uma decisão que estabelece as regras de funcionamento da Comissão de Reexame.

[…]»

Regulamento (UE) n.o 468/2014

7

O considerando 9 do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (JO 2014, L 141, p. 1) enuncia:

«[…] [O] presente regulamento desenvolve e especifica os procedimentos de cooperação estabelecidos no Regulamento do MUS entre o BCE e as ANC no âmbito do MUS assim como, quando apropriado, com as autoridades nacionais designadas, assegurando desse modo o funcionamento eficaz e coerente do MUS.»

8

Nos termos do artigo 1.o, n.o 1, deste regulamento:

«O presente regulamento estabelece regras em relação a todos os seguintes aspetos:

a)

o enquadramento legal referido no artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento [n.o 1024/2013], nomeadamente para organizar as modalidades práticas de aplicação do artigo 6.o do Regulamento [n.o 1024/2013] relativas à cooperação no âmbito do MUS, de modo a incluir:

i)

a metodologia específica para a apreciação e controlo da classificação de uma entidade supervisionada como significativa ou menos significativa, de acordo com os critérios definidos no artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento [n.o 1024/2013], e as disposições resultantes dessa avaliação;

[…]

[…]»

9

O artigo 70.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Circunstâncias específicas conducentes à classificação de uma entidade supervisionada significativa como menos significativa», estabelece:

«1.   A expressão “circunstâncias específicas”, referida no artigo 6.o, n.o 4, segundo e quinto parágrafos do Regulamento [n.o 1024/2013] (a seguir “circunstâncias específicas”) significa que se verificam circunstâncias específicas e factuais que, na opinião do BCE, tornam desadequada a classificação de uma entidade supervisionada como significativa, tendo em conta os objetivos e princípios do Regulamento [n.o 1024/2013] e, em particular, a necessidade de garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão.

2.   A expressão “circunstâncias específicas” será interpretada em sentido estrito.»

10

O artigo 71.o do Regulamento n.o 468/2014, sob a epígrafe «Avaliação da existência de circunstâncias específicas», tem a seguinte redação:

«1.   A existência de circunstâncias específicas que justifiquem a classificação como menos significativa de uma entidade que, se assim não fosse, seria uma entidade supervisionada significativa será determinada numa base individual e especificamente para a entidade supervisionada ou grupo supervisionado em causa, mas não para categorias de entidades supervisionadas.

[…]»

Decisão 2014/360/UE

11

A Decisão 2014/360/UE do Banco Central Europeu, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (JO 2014, L 175, p. 47), criou a Comissão de Reexame referida no artigo 24.o do Regulamento n.o 1024/2013.

12

O artigo 7.o, n.o 1, desta decisão prevê:

«Qualquer pessoa singular ou coletiva destinatária de uma decisão do BCE adotada ao abrigo do Regulamento (UE) n.o 1024/2013, ou que lhe diga direta e individualmente respeito, que deseje solicitar uma revisão administrativa […] deve enviar ao Secretário um pedido de revisão, por escrito, identificando a decisão contestada. O pedido de revisão deve ser apresentado numa das línguas oficiais da União.»

13

O artigo 16.o da referida decisão dispõe:

«1.   A Comissão de Reexame adota pareceres sobre os pedidos de revisão num prazo adequado à urgência da questão, o mais tardar dois meses a contar da data de receção do pedido.

2.   O parecer deverá propor que a decisão inicial seja anulada, substituída por decisão de conteúdo idêntico ou substituída por uma decisão alterada. Neste último caso, o parecer deve propor as alterações necessárias.

[…]»

14

O artigo 18.o da mesma decisão enuncia:

«O parecer da Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão submetido pelo Conselho de Supervisão e a nova decisão adotada pelo Conselho do BCE devem ser notificados às partes pelo Secretário do Conselho do BCE, incluindo a fundamentação pertinente.»

Factos na origem do litígio

15

O Landeskreditbank é uma pessoa coletiva de direito público criada por lei, cujo capital pertence inteiramente ao Land de Bade‑Vurtemberga (Alemanha).

16

Em 25 de junho de 2014, o BCE informou o Landeskreditbank, em substância, de que o facto de ser uma entidade significativa implicava que estivesse sob a supervisão exclusiva do BCE e não sob a supervisão partilhada do mecanismo único de supervisão (MUS), em aplicação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013, e convidou‑o a apresentar as suas observações.

17

Em 10 de julho de 2014, o Landeskreditbank contestou esta análise, alegando, designadamente, a existência de circunstâncias específicas na aceção da referida norma e dos artigos 70.o e 71.o do Regulamento n.o 468/2014.

18

Em 1 de setembro de 2014, o BCE adotou uma decisão que qualificou o Landeskreditbank de «entidade significativa» na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013.

19

Em 6 de outubro de 2014, o Landeskreditbank pediu o reexame dessa decisão ao abrigo do artigo 24.o, n.os 1, 5 e 6, do Regulamento n.o 1024/2013, lido em conjugação com o artigo 7.o da Decisão 2014/360. Em 23 de outubro de 2014, realizou‑se uma audiência perante a Comissão de Reexame.

20

Em 20 de novembro de 2014, a Comissão de Reexame emitiu um parecer no qual concluía pela legalidade da decisão tomada pelo BCE em 1 de setembro de 2014.

21

Com a decisão controvertida, o BCE, em 5 de janeiro de 2015, revogou e substituiu essa decisão, embora mantendo a qualificação do Landeskreditbank como «entidade significativa». Nessa decisão, o BCE salientou, em substância, o seguinte:

a qualificação do Landeskreditbank como «entidade significativa» não era contraditória com os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013;

o perfil de risco de uma entidade não era uma questão pertinente na fase da sua qualificação e o artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014 não podia ser interpretado como incluindo critérios não previstos pelo Regulamento n.o 1024/2013;

ainda que considerasse que havia circunstâncias específicas no caso do Landeskreditbank, devia verificar igualmente se essas circunstâncias justificavam a reclassificação do Landeskreditbank como entidade «menos significativa»;

nos termos do artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 468/2014, o conceito de «circunstâncias específicas» tinha de ser objeto de uma interpretação estrita e, portanto, uma entidade «significativa» apenas podia ser reclassificada como «menos significativa» quando a supervisão direta do BCE fosse inadequada;

a tomada em consideração do princípio da proporcionalidade para efeitos de interpretação não lhe pode impor que verifique se a aplicação dos critérios do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013 a uma entidade era proporcionada, e a análise do caráter «desadequado» da qualificação de uma entidade como «significativa» não equivalia a tal exame da proporcionalidade;

o caráter adequado dos quadros de supervisão nacionais e a sua capacidade para aplicar elevados padrões de supervisão não permitiam concluir pela inadequação do exercício de uma supervisão prudencial direta pelo BCE, uma vez que o Regulamento n.o 1024/2013 não a fazia depender da demonstração do caráter inadequado dos enquadramentos de supervisão nacionais ou dos padrões nacionais de supervisão.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

22

Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de março de 2015, o Landeskreditbank interpôs um recurso destinado a obter a anulação da decisão controvertida.

23

Em apoio do seu recurso, o Landeskreditbank aduziu cinco fundamentos, relativos, em substância, o primeiro, a uma violação do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014 na escolha dos critérios aplicados pelo BCE, o segundo, à existência de erros manifestos de apreciação dos factos, o terceiro, a uma violação do dever de fundamentação, o quarto, a um desvio de poder por o BCE não ter exercido o seu poder de apreciação, e o quinto, a um incumprimento da obrigação de o BCE tomar em consideração todas as circunstâncias relevantes do caso concreto.

24

Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso do Landeskreditbank.

Pedidos das partes

25

Através do seu recurso, o Landeskreditbank pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

anular o acórdão recorrido;

anular a decisão controvertida, ordenando a manutenção dos efeitos da decisão decorrentes da substituição da Decisão do BCE, de 1 de setembro de 2014;

a título subsidiário, anular o acórdão recorrido e remeter o processo ao Tribunal Geral; e

condenar o BCE nas despesas.

26

O BCE pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso e

condenar o Landeskreditbank nas despesas.

27

A Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

negar provimento ao recurso e

condenar o Landeskreditbank nas despesas.

Quanto ao recurso

28

Em apoio do seu recurso, o Landeskreditbank invoca três fundamentos.

Quanto ao primeiro fundamento

29

Com o seu primeiro fundamento, o Landeskreditbank invoca uma violação do direito da União no âmbito da interpretação e da aplicação do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014.

30

Este fundamento está subdividido em três partes.

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento

– Argumentos das partes

31

Com a primeira parte do seu primeiro fundamento, o Landeskreditbank sustenta, no essencial, que o Tribunal Geral interpretou de maneira errada o conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, e, em especial, que foi erradamente que o Tribunal Geral não interpretou estas disposições em conformidade com o princípio da proporcionalidade.

32

Segundo o Landeskreditbank, o Regulamento n.o 1024/2013 transferiu para o BCE uma competência exclusiva em matéria de supervisão prudencial das instituições de crédito unicamente no que respeita às entidades significativas, continuando as autoridades nacionais a ser competentes no que respeita à supervisão prudencial das instituições menos significativas.

33

A este respeito, o Landeskreditbank considera que, em virtude do princípio da proporcionalidade, o Tribunal Geral deveria ter interpretado o artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e o artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014 no sentido de que uma entidade deve ser classificada como «menos importante» quando, devido a circunstâncias específicas e factuais do caso em apreço, se verificar que uma supervisão prudencial direta dessa entidade pelas autoridades nacionais competentes permite atingir os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 pelo menos tão bem como no caso de uma supervisão prudencial direta pelo BCE.

34

Além disso, o Landeskreditbank alega que o Tribunal Geral violou o princípio interpretativo ut res magis valeat quam pereat e a proibição de exigir uma probatio diabolica, na medida em que a interpretação feita pelo Tribunal Geral do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, privaria essas disposições do seu efeito útil, tornando impossível a prova da existência de tais circunstâncias.

35

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

36

Como corretamente assinala o Tribunal Geral no n.o 64 do acórdão recorrido, a interpretação, por este, dos textos relativos à competência conferida pelo Conselho ao BCE em matéria de supervisão prudencial não é posta em causa pela argumentação do recorrente, que se baseia no pressuposto da manutenção em proveito das autoridades nacionais, nos termos do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013, de uma competência para efeitos de exercício das funções referidas no artigo 4.o, n.o 1, alíneas b) e d) a i), deste regulamento, no que diz respeito às entidades qualificadas de «menos significativas».

37

Com efeito, no que respeita, em primeiro lugar, ao alcance da competência do BCE em matéria de supervisão prudencial direta das instituições de crédito, há que recordar que o artigo 4.o do Regulamento n.o 1024/2013, sob a epígrafe «Atribuições conferidas ao BCE», prevê, no seu n.o 1, que, nos termos do artigo 6.o deste regulamento, cabe ao BCE «exercer em exclusivo», para fins de supervisão prudencial, as atribuições enumeradas no artigo 4.o, n.o 1, relativamente à «totalidade» das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes, sem distinguir entre instituições significativas e instituições menos significativas.

38

Assim, resulta da redação do artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 que o BCE tem competência exclusiva para exercer as atribuições enunciadas nessa disposição relativamente a todas essas instituições.

39

É verdade que, nos termos do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, o BCE exerce as suas atribuições no âmbito do MUS, composto por ele próprio e pelas autoridades nacionais competentes, sendo responsável pelo funcionamento eficaz e coerente do MUS.

40

É neste contexto que, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 6, do Regulamento n.o 1024/2013, as autoridades nacionais competentes exercem e são responsáveis pelas atribuições a que se refere o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), d) a g) e i), desse regulamento, adotando todas as decisões de supervisão relevantes dirigidas às instituições de crédito a que se refere o artigo 6.o, n.o 4, primeiro parágrafo, ou seja, às que, em conformidade com os critérios enunciados nesta última disposição, são «menos significativas».

41

Assim, as autoridades nacionais competentes assistem o BCE no cumprimento das funções que lhe são atribuídas pelo Regulamento n.o 1024/2013, através do exercício descentralizado de algumas destas funções relativamente às instituições de crédito menos significativas, na aceção do artigo 6.o, n.o 4, primeiro parágrafo, do referido regulamento.

42

Como decorre do considerando 9 do Regulamento n.o 468/2014, este regulamento desenvolve e especifica os procedimentos de cooperação estabelecidos no Regulamento n.o 1024/2013 entre o BCE e as autoridades nacionais competentes no âmbito do MUS, assegurando assim o funcionamento eficaz e coerente deste mecanismo.

43

Deste modo, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 468/2014, este tem por objetivo, nomeadamente, estabelecer o enquadramento, referido no artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1024/2013, a saber, um quadro para organizar as modalidades práticas de aplicação do referido artigo 6.o, que rege a cooperação entre o BCE e as autoridades nacionais competentes no âmbito do MUS.

44

Em especial, em conformidade com o referido artigo 1.o, n.o 1, alínea a), i), o Regulamento n.o 468/2014 comporta, na sua parte IV, regras para a determinação, de acordo com os critérios enunciados no artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013, do caráter significativo ou menos significativo de uma entidade supervisionada e define, neste contexto, o conceito de «circunstâncias específicas», na aceção desta última disposição, que podem justificar a classificação de uma entidade supervisionada como menos significativa, embora preencha os critérios para ser classificada como significativa.

45

A este respeito, o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 468/2014 dispõe que constituem tais circunstâncias específicas as circunstâncias específicas factuais que tornam desadequada a classificação de uma entidade supervisionada como significativa, tendo em conta os objetivos e os princípios do Regulamento n.o 1024/2013 e, particularmente, a necessidade de garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão.

46

Resulta do próprio teor desta disposição que as circunstâncias pertinentes que justificam, para efeitos do exercício de uma supervisão prudencial direta, a classificação como menos significativa de uma entidade que, em princípio, com base nos critérios definidos no artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013, deveria ser classificada como significativa são apenas as relativas ao caráter adequado ou não da qualificação desta entidade como significativa.

47

Por conseguinte, a supervisão prudencial direta de uma entidade significativa pelas autoridades nacionais só é possível verificando‑se circunstâncias que demonstrem que a classificação como significativa dessa entidade não é apropriada para alcançar os objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.o 1024/2013.

48

Como salientou o Tribunal Geral nos n.os 44 e 46 do acórdão recorrido, a redação do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 468/2014 não contém nenhuma menção a uma análise da necessidade de uma supervisão prudencial direta de uma entidade significativa pelo BCE e não resulta de uma interpretação literal desta disposição que o facto de uma supervisão prudencial direta dessa entidade pelas autoridades nacionais ser tão apta para alcançar os objetivos do referido regulamento como uma supervisão exercida unicamente pelo BCE permite justificar a classificação da referida entidade como menos significativa.

49

Por conseguinte, como o Tribunal Geral declarou nos n.os 54, 63 e 72 do acórdão recorrido, no que se refere às funções mencionadas no artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, o Conselho conferiu ao BCE uma competência exclusiva que, em conformidade com o artigo 6.o do referido regulamento, pode ser exercida de maneira descentralizada pelas autoridades nacionais no quadro do MUS e sob o controlo do BCE, relativamente às instituições de crédito menos significativas, na aceção do referido artigo 6.o, n.o 4, primeiro parágrafo, e, relativamente a algumas destas funções, reservou ao BCE a competência exclusiva para determinar o conteúdo do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do referido artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, que foi aplicado pela adoção dos artigos 70.o e 71.o do Regulamento n.o 468/2014.

50

Em seguida, há que recordar que, nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013, a classificação como menos significativa de uma instituição de crédito como o Landeskreditbank, cujos ativos têm um valor total que excede 30 mil milhões de euros, está sujeita à condição de que existam circunstâncias específicas, no sentido dessa disposição, que o justifiquem.

51

A este respeito, é erradamente que o Landeskreditbank sustenta que o Tribunal Geral interpretou o artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e o artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014 sem ter em conta o princípio da proporcionalidade.

52

Com efeito, não se pode deixar de observar que o Tribunal Geral, nos n.os 66 a 85 do acórdão recorrido, procedeu a uma interpretação dessas disposições tendo em conta este princípio.

53

Em particular, o Tribunal Geral recordou, no n.o 68 do acórdão recorrido, que a apreciação da proporcionalidade de uma medida deve ser conciliada com o respeito da margem de apreciação eventualmente reconhecida às instituições da União quando da sua adoção (v., neste sentido, Acórdão de 12 de dezembro de 2006, Alemanha/Parlamento e Conselho, C‑380/03, EU:C:2006:772, n.o 145 e jurisprudência aí referida).

54

Neste contexto, importa salientar que as disposições dos Regulamentos n.o 1024/2013 e n.o 468/2014 atribuem ao BCE um poder de decisão que tem em conta elementos de facto e impõem condições proporcionais a estes. Assim, nos termos do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013, não devendo uma entidade ser considerada menos significativa com base nos critérios enunciados nesta disposição, a mesma poderá, no entanto, ser considerada como tal, se as circunstâncias específicas, que são definidas no artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, o justificarem.

55

A hipótese visada nas referidas disposições é aquela em que a supervisão prudencial direta de uma entidade significativa pelas autoridades nacionais permite uma melhor realização dos objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.o 1024/2013 do que uma supervisão prudencial direta dessa entidade pelo BCE ou, pelo contrário, aquela em que esta supervisão não permite alcançar tais objetivos tão bem quanto uma supervisão prudencial direta dessa entidade pelas referidas autoridades.

56

Em contrapartida, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento n.o 1024/2013, quando necessário para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, o BCE pode, a qualquer momento, por iniciativa própria e após consulta às autoridades nacionais competentes ou a pedido de uma autoridade nacional competente, decidir exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito a que se refere o artigo 6.o, n.o 4.

57

Estas disposições referem‑se a critérios diferentes, a saber, por um lado, o do caráter inadequado da classificação como significativa de uma entidade supervisionada e, por outro, o da necessidade do exercício de competências pertinentes pelo BCE.

58

A comparação das referidas disposições, efetuada no n.o 62 do acórdão recorrido, corrobora a apreciação realizada pelo Tribunal Geral, no n.o 77 desse acórdão, segundo a qual o legislador da União, através da criação do MUS, no artigo 6.o do Regulamento n.o 1024/2013, conciliou a tomada em consideração do papel dos Estados‑Membros na execução do direito da União com a satisfação dos objetivos deste regulamento.

59

Daqui resulta que o princípio da proporcionalidade foi tido em conta pelo legislador da União e que o BCE não tem, como salientou o Tribunal Geral no n.o 75 do acórdão recorrido, de examinar caso a caso se, apesar da aplicação dos critérios constantes do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013, uma instituição significativa deverá ser abrangida pela supervisão direta das autoridades nacionais, por estas serem mais eficazes para alcançar os objetivos desse regulamento.

60

Por conseguinte, foi sem cometer um erro de direito que o Tribunal Geral, no n.o 80 do acórdão recorrido, considerou que as «circunstâncias específicas e factuais que […] tornam desadequada a classificação de uma entidade supervisionada como significativa», no sentido do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 468/2014, dizem respeito apenas às circunstâncias de facto específicas que implicam que uma supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais é mais eficaz para alcançar esses objetivos e realizar esses princípios, nomeadamente a necessidade de garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial, do que uma supervisão prudencial direta pelo BCE.

61

A justeza da interpretação adotada pelo Tribunal Geral é confirmada pelo facto de, segundo o artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 468/2014, a expressão «circunstâncias específicas», referida no artigo 70.o, n.o 1, deste regulamento assim como no artigo 6.o, n.o 4, segundo e quinto parágrafos, do Regulamento n.o 1024/2013, dever ser objeto de uma interpretação estrita.

62

Por último, deve ser rejeitado o argumento de que a interpretação feita pelo Tribunal Geral do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, privaria essas disposições do seu efeito útil, tornando impossível a prova da existência de tais circunstâncias.

63

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 74 das suas conclusões, nada indica que essa interpretação, em conformidade com os termos e os objetivos dos Regulamentos n.o 1024/2013 e n.o 468/2014, tornaria impossível para o Landeskreditbank invocar «circunstâncias específicas», na aceção das referidas disposições, e provar a sua existência.

64

Nestas condições, a interpretação feita pelo Tribunal Geral do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção destas disposições, não está ferida de erro de direito.

65

Donde se conclui que a primeira parte do primeiro fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento

– Argumentos das partes

66

Com a segunda parte do seu primeiro fundamento, o Landeskreditbank sustenta que, ao recusar, nos n.os 101 a 112 do acórdão recorrido, reconhecer a existência de erro manifesto de apreciação dos factos cometido pelo BCE, o Tribunal Geral viciou este acórdão com um erro de direito.

67

Em particular, o Landeskreditbank considera que o Tribunal Geral deveria ter, também com base na sua própria interpretação das disposições pertinentes, examinado a sua argumentação específica e factual e verificado se, nos termos desta, uma supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais competentes teria permitido uma melhor realização dos objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 do que uma supervisão direta pelo BCE.

68

Além disso, o Landeskreditbank alega que, mesmo quando examinou o seu argumento de que a diversidade dos quadros jurídicos e das autoridades de controlo que enquadram a sua atividade justificava uma supervisão prudencial pelas autoridades nacionais, o Tribunal Geral cometeu um erro de apreciação.

69

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

70

Uma vez que, como resulta dos n.os 87, 88, 102, 104 e 108 do acórdão recorrido, a argumentação do Landeskreditbank no Tribunal Geral consistiu em afirmar que uma supervisão prudencial direta pelas autoridades alemãs era suficiente para atingir os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013, bem como para assegurar uma aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial, e que uma supervisão prudencial direta pelo BCE não era necessária a este respeito, foi com razão que o Tribunal Geral considerou esta argumentação desprovida de pertinência, tendo em conta a sua interpretação do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, cuja justeza foi confirmada no âmbito do exame da primeira parte do primeiro fundamento do presente recurso.

71

Por outro lado, além de que só foi feita na réplica apresentada no Tribunal Geral, a mera afirmação do Landeskreditbank segundo a qual, em virtude da diversidade de quadros jurídicos e de autoridades de supervisão que enquadram a sua atividade, uma supervisão prudencial pelas autoridades nacionais permite uma melhor realização dos objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 do que uma supervisão prudencial exercida pelo BCE é manifestamente insuficiente para demonstrar o caráter inadequado desta última e não pode obrigar o Tribunal Geral a verificar a existência eventual de circunstâncias específicas, na aceção das referidas disposições.

72

Por conseguinte, foi sem cometer um erro de direito que o Tribunal Geral rejeitou, no n.o 112 do acórdão recorrido, o fundamento do Landeskreditbank baseado na existência de erros manifestos de apreciação dos factos pelo BCE.

73

Daqui resulta que a segunda parte do primeiro fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à terceira parte do primeiro fundamento

– Argumentos das partes

74

Com a terceira parte do seu primeiro fundamento, o Landeskreditbank sustenta que foi erradamente que o Tribunal Geral considerou, nos n.os 140 a 142 e 149 do acórdão recorrido, que não se podia acusar o BCE de não ter exercido o seu poder de apreciação e de não ter cumprido o seu dever de investigar os factos quando rejeitou a sua argumentação como desprovida de pertinência.

75

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

76

Como foi salientado no n.o 70 do presente acórdão, a argumentação do Landeskreditbank perante o Tribunal Geral consistiu, em substância, em sustentar que os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 podiam ser alcançados através de uma supervisão prudencial direta pelas autoridades alemãs, sem que fosse necessária para esse efeito uma supervisão prudencial direta pelo BCE.

77

Ora, na medida em que essa argumentação é desprovida de pertinência para a interpretação do conceito de «circunstâncias específicas», na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o do Regulamento n.o 468/2014, tal como resulta do n.o 80 do acórdão recorrido e dos n.os 50 e 51 do presente acórdão, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao rejeitar, nos n.os 142 e 150 do acórdão recorrido, o quarto e quinto fundamentos do Landeskreditbank, baseados, respetivamente, num desvio de poder cometido pelo BCE por não ter exercido, ilicitamente, o seu poder de apreciação e no incumprimento da obrigação que incumbe ao BCE de examinar e tomar em consideração todas as circunstâncias pertinentes do caso em apreço, por entender que não se podia censurar o BCE por ter rejeitado tal argumentação ou não ter tomado em conta, aquando da aplicação do referido artigo 70.o, n.o 1, as circunstâncias desprovidas de pertinência à luz da letra desta disposição.

78

Consequentemente, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser rejeitada.

79

Tendo em conta o conjunto das considerações antecedentes, há que rejeitar o primeiro fundamento.

Quanto ao segundo fundamento

80

Com o seu segundo fundamento, o Landeskreditbank invoca uma desvirtuação da decisão controvertida e uma apreciação errada das exigências de fundamentação relativas à mesma.

81

Este fundamento divide‑se em duas partes.

Quanto à primeira parte do segundo fundamento

– Argumentos das partes

82

Com a primeira parte do seu segundo fundamento, o Landeskreditbank sustenta que o Tribunal Geral, nos n.os 31 e 34 do acórdão recorrido, desvirtuou a decisão controvertida, reproduzindo de maneira errada a sua fundamentação e substituindo‑a pela sua própria fundamentação.

83

Em especial, o Landeskreditbank alega que na referida decisão não é mencionado o critério segundo o qual a sua qualificação como entidade significativa só pode ser afastada demonstrando que uma supervisão prudencial direta pelas autoridades alemãs competentes permitiria uma melhor realização dos objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 do que uma supervisão pelo BCE.

84

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

85

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e mostrar, de maneira clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do ato, de modo que permita aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização (Acórdãos de 5 de dezembro de 2013, Solvay/Comissão, C‑455/11 P, não publicado, EU:C:2013:796, n.o 90, e de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão, C‑247/14 P, EU:C:2016:149, n.o 16).

86

No caso vertente, importa salientar que a decisão controvertida é um ato relativo à supervisão prudencial de uma instituição de crédito adotada pelo BCE, que dispõe de uma ampla margem de apreciação a este respeito, uma vez que, como enuncia o considerando 55 do Regulamento n.o 1024/2013, as atribuições de supervisão confiadas ao BCE implicam uma responsabilidade importante no sentido de salvaguardar a estabilidade financeira na União e de exercer os seus poderes de supervisão da forma mais eficaz e proporcionada.

87

Igualmente segundo jurisprudência constante, a exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários do ato ou outras pessoas por este direta e individualmente afetadas possam ter em receber explicações. Não é necessário que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato cumpre as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor literal mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (Acórdãos de 5 de dezembro de 2013, Solvay/Comissão, C‑455/11 P, não publicado, EU:C:2013:796, n.o 91, e de 10 de março de 2016, HeidelbergCement/Comissão, C‑247/14 P, EU:C:2016:149, n.o 16).

88

A este respeito, há que recordar que, nos termos do artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, o BCE institui uma Comissão de Reexame de natureza administrativa, encarregada de proceder a uma revisão administrativa interna das decisões tomadas pelo BCE no exercício das competências que lhe são conferidas por esse regulamento.

89

Através da Decisão 2014/360, adotada com base no artigo 24.o do Regulamento n.o 1024/2013, o BCE instituiu a referida comissão.

90

Nos termos do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1024/2013, ao receber um pedido de revisão de uma decisão do BCE ao abrigo deste regulamento, a referida comissão, após ter decidido sobre a admissibilidade deste pedido, emite um parecer e remete o processo ao Conselho de Supervisão do BCE, para ser elaborado um novo projeto de decisão. O artigo 16.o, n.o 2, da Decisão 2014/360 prevê que, no seu parecer, a Comissão de Reexame propõe que a decisão inicial seja anulada, substituída por decisão de conteúdo idêntico ou substituída por uma decisão alterada e que, neste último caso, o parecer deve propor as alterações necessárias. O artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1024/2013 dispõe que o Conselho de Supervisão tem em conta esse parecer e apresenta sem demora o novo projeto de decisão ao Conselho do BCE, que revoga a decisão inicial, substitui essa decisão por outra de conteúdo idêntico ou substitui a decisão inicial por uma decisão alterada. O novo projeto de decisão é considerado adotado, salvo se o Conselho do BCE formular objeções no prazo máximo de 10 dias úteis.

91

Por outro lado, em conformidade com o artigo 24.o, n.o 9, do Regulamento n.o 1024/2013 e o artigo 18.o da Decisão 2014/360, o parecer emitido pela Comissão de Reexame, o novo projeto de decisão apresentado pelo Conselho de Supervisão e a decisão adotada pelo Conselho do BCE devem ser fundamentados e notificados às partes.

92

Resulta, assim, das disposições do artigo 24.o do Regulamento n.o 1024/2013 e da Decisão 2014/360 que esse parecer, o novo projeto de decisão e esta decisão provêm de uma mesma instituição, a saber, o BCE, e se inscrevem no âmbito do mesmo procedimento de reexame administrativo interno das decisões tomadas por esta instituição, no exercício das competências que lhe são atribuídas pelo Regulamento n.o 1024/2013, estando, por conseguinte, como salientou o advogado‑geral no n.o 98 das suas conclusões, intrinsecamente ligados.

93

Foi, por isso, com razão que o Tribunal Geral, nos n.os 31, 34 e 128 do acórdão recorrido, apreciou a decisão controvertida à luz do parecer da Comissão de Reexame, que, nos termos do artigo 24.o, n.o 9, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 18.o da Decisão 2014/360, tinha sido notificado ao Landeskreditbank.

94

No caso em apreço, o Tribunal Geral constatou que o parecer, emitido em 20 de novembro de 2014 pela Comissão de Reexame, tinha concluído pela legalidade da decisão adotada pelo BCE em 1 de setembro de 2014, que qualificava o Landeskreditbank como «entidade significativa» na aceção do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1024/2013 e que, através da decisão controvertida, o BCE revogou e substituiu esta decisão, mantendo essa qualificação.

95

Por conseguinte, foi sem cometer um erro de direito que, após ter salientado, no n.o 125 do acórdão recorrido, que o parecer da Comissão de Reexame fazia parte do contexto em que se inseria a decisão controvertida e que podia, por isso, em aplicação da jurisprudência recordada no n.o 87 do presente acórdão, ser tomado em conta para apreciar o caráter suficientemente fundamentado da referida decisão, o Tribunal Geral declarou, no n.o 127 do acórdão recorrido, que resultava necessariamente do artigo 24.o, n.os 1 e 7, do Regulamento n.o 1024/2013 que, na medida em que a referida decisão estava em conformidade com este parecer, ela se inscrevia no seguimento do mesmo e que as explicações que figuram neste último podiam ser tidas em conta para examinar o caráter suficientemente fundamentado da decisão controvertida.

96

Neste contexto, foi igualmente sem cometer um erro de direito que, para efeitos da apreciação do caráter fundamentado da decisão controvertida, o Tribunal Geral, no n.o 128 do acórdão recorrido, procedeu a uma leitura conjugada desta decisão e do parecer da Comissão de Reexame, da qual resultou que, por um lado, o BCE tinha entendido que as circunstâncias específicas só podiam existir na condição de os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 serem mais bem assegurados por uma supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais e que, por outro, o Landeskreditbank não tinha demonstrado que esta condição estava preenchida a seu respeito.

97

Logo, o Tribunal Geral não desvirtuou a decisão controvertida.

98

Daqui decorre que a primeira parte do segundo fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à segunda parte do segundo fundamento

– Argumentos das partes

99

Com a segunda parte do seu segundo fundamento, o Landeskreditbank considera que, tendo desvirtuado o conteúdo da decisão controvertida, o Tribunal Geral cometeu igualmente um erro de apreciação ao ignorar que esta não satisfazia as exigências de fundamentação impostas pelo direito da União.

100

O Landeskreditbank considera, nomeadamente, que a decisão controvertida é ilógica e contraditória, que não revela as razões que estão na sua origem e que não inclui um exame da sua argumentação, de modo que, contrariamente ao que o Tribunal Geral afirmou, este não esteve em condições de proceder à fiscalização da legalidade dos fundamentos de tal decisão.

101

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

102

Como a segunda parte do segundo fundamento se baseia na hipótese, rejeitada pelo Tribunal de Justiça no âmbito da análise da primeira parte deste fundamento, de que o Tribunal Geral desvirtuou o conteúdo da decisão controvertida, a mesma deve ser rejeitada como inoperante.

103

Tendo em conta todas as considerações precedentes, o segundo fundamento deve ser rejeitado.

Quanto ao terceiro fundamento

Argumentos das partes

104

Com o seu terceiro fundamento, o Landeskreditbank sustenta que o acórdão recorrido está ferido de um erro processual, na medida em que inclui aspetos que não eram objeto do processo.

105

Segundo o Landeskreditbank, ao rejeitar a sua argumentação com o fundamento de que não tinha alegado que uma supervisão prudencial nacional ajudaria a alcançar os objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 com mais eficácia do que uma supervisão direta pelo BCE, embora este critério não tenha sido mencionado no decurso dos processos perante o BCE e o Tribunal Geral, este último violou o direito de ser ouvido e o princípio do contraditório.

106

O mesmo acontece no que respeita à menção, no n.o 111 do acórdão recorrido, da inexistência de um acordo ou de uma colaboração entre as autoridades do Land de Bade‑Vurtemberga e as autoridades federais alemãs suscetível de permitir uma cooperação mais fácil entre elas do que com o BCE.

107

O BCE e a Comissão contestam a argumentação do Landeskreditbank.

Apreciação do Tribunal de Justiça

108

Em primeiro lugar, não pode ser acolhido o argumento do Landeskreditbank segundo o qual o critério que permite concluir pela existência de circunstâncias específicas, na aceção do artigo 6.o, n.o 4, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 1024/2013 e do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 468/2014, a saber, que a realização dos objetivos do Regulamento n.o 1024/2013 é mais bem assegurada por uma supervisão prudencial direta pelas autoridades nacionais do que por uma supervisão prudencial direta pelo BCE, não foi invocado durante o processo.

109

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 116 das suas conclusões, resulta claramente da petição e da contestação que esse critério foi discutido no Tribunal Geral pelas partes, de modo que se respeitou o direito do Landeskreditbank a ser ouvido e o princípio do contraditório.

110

De resto, como referiu o Tribunal Geral no n.o 129 do acórdão recorrido, a análise do primeiro fundamento invocado pelo Landeskreditbank em apoio do seu recurso de anulação demonstra que este teve a possibilidade de compreender o raciocínio do BCE e de o contestar, no âmbito desse fundamento, e o Tribunal Geral pôde exercer uma fiscalização da legalidade no que respeita à procedência dos fundamentos da decisão controvertida.

111

Por outro lado, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência que aí se realizou.

112

Em segundo lugar, no que respeita à referência, no n.o 111 do acórdão recorrido, da inexistência de um acordo ou de uma colaboração entre as autoridades do Land de Bade‑Vurtemberga e as autoridades federais alemãs suscetível de permitir uma cooperação mais fácil entre elas do que com o BCE, basta salientar que, com esta referência, o Tribunal Geral, em resposta ao argumento avançado pelo Landeskreditbank na fase da réplica, segundo o qual, tendo em conta a diversidade dos quadros jurídicos e das autoridades de controlo que enquadram a sua atividade, a supervisão prudencial pelas autoridades alemãs seria mais eficaz para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão prudencial do que uma supervisão prudencial exercida pelo BCE, se limitou a constatar que, na falta de elementos concretos suscetíveis de demonstrar que, para este efeito, a cooperação das autoridades nacionais entre si era mais fácil do que com o BCE, este argumento devia ser rejeitado como não fundamentado.

113

Por conseguinte, o direito do Landeskreditbank a ser ouvido e o princípio do contraditório não foram violados pelo Tribunal Geral.

114

Nestas condições, o terceiro fundamento deve ser rejeitado.

115

Decorre de todas as considerações precedentes que há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

Quanto às despesas

116

Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decidirá igualmente sobre as despesas.

117

De acordo com o artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do disposto no artigo 184.o, n.o 1, do referido regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

118

Tendo o BCE pedido a condenação do Landeskreditbank nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas, bem como nas despesas do BCE e da Comissão.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

O Landeskreditbank Baden‑Württemberg — Förderbank é condenado nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.