ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

7 de agosto de 2018 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Política agrícola comum — Pagamentos diretos — Regulamento (UE) n.o 1306/2013 — Artigos 93.o e 94.o — Anexo II — Condicionalidade — Condições agrícolas e ambientais — Requisitos mínimos — Aplicação por um Estado‑Membro — Dever de conservação do “património fúnebre” — Alcance»

No processo C‑435/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tartu Halduskohus (Tribunal Administrativo de Tartu, Estónia), por decisão de 7 de julho de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 18 de julho de 2017, no processo

Argo Kalda Mardi talu

contra

Põllumajanduse Registrite ja Informatsiooni Amet (PRIA),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, J. Malenovský, M. Safjan, D. Šváby e M. Vilaras (relator), juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Argo Kalda Mardi talu, por M. Kõiva, vandeadvokaat,

em representação do Governo estónio, por N. Grünberg, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por A. Sauka e E. Randvere, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 7 de junho de 2018,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 72.o, n.o 1, alínea a), do artigo 93.o, n.os 1 e 2, do artigo 94.o e do Anexo II do Regulamento (UE) n.o 1306/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao financiamento, à gestão e ao acompanhamento da política agrícola comum e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 352/78, (CE) n.o 165/94, (CE) n.o 2799/98, (CE) n.o 814/2000, (CE) n.o 1290/2005 e (CE) n.o 485/2008 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 549, e retificações no JO 2014, L 61, p. 11, no JO 2016, L 130, p. 13, e no JO 2017, L 327, p. 83), bem como do artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c) e e), do Regulamento (UE) n.o 1307/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, que estabelece regras para os pagamentos diretos aos agricultores ao abrigo de regimes de apoio no âmbito da política agrícola comum e que revoga o Regulamento (CE) n.o 637/2008 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 73/2009 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 608).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Argo Kalda Mardi talu ao Põllumajanduse Registrite ja Informatsiooni Amet (Serviço de Registos e Informações Agrícolas, Estónia) (a seguir «PRIA») a propósito da redução dos pagamentos diretos concedidos à recorrente no processo principal, por violação dos requisitos relativos à manutenção de boas condições agrícolas e ambientais das terras.

Quadro jurídico

Direito da União

Regulamento n.o 1306/2013

3

Nos termos do considerando 54 do Regulamento n.o 1306/2013:

«[…] A condicionalidade visa contribuir para o desenvolvimento de uma agricultura sustentável através de uma maior sensibilização dos beneficiários para a necessidade de cumprirem essas normas básicas. […] A experiência também tem mostrado que certos requisitos no âmbito da condicionalidade não são suficientemente pertinentes à atividade agrícola ou à superfície da exploração ou dizem mais respeito às autoridades nacionais do que aos beneficiários. […]»

4

O artigo 2.o, n.o 1, alíneas c) e d), deste regulamento dispõe:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

c)

“Superfície agrícola”, uma superfície agrícola na aceção do artigo 4.o do Regulamento (UE) n.o 1307/2013;

d)

“Exploração”, uma exploração na aceção do artigo 4.o do Regulamento (UE) n.o 1307/2013, sob reserva do disposto no artigo 91.o, n.o 3».

5

O artigo 72.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 1306/2013 prevê:

«Os beneficiários do apoio referido no artigo 67.o, n.o 2, apresentam, anualmente, um pedido de pagamentos diretos ou um pedido de pagamento relativo às superfícies pertinentes e às medidas de desenvolvimento rural relacionadas com animais, respetivamente, indicando, se for caso disso:

a)

Todas as parcelas agrícolas da exploração, bem como a superfície não agrícola relativamente à qual é solicitado o apoio referido no artigo 67.o, n.o 2.»

6

O título VI do referido regulamento, intitulado «Condicionalidade», contém um capítulo I, intitulado «Âmbito de aplicação», do qual fazem parte os artigos 91.o a 94.o

7

O artigo 91.o do mesmo regulamento dispõe:

«1.   No caso de um beneficiário referido no artigo 92.o não cumprir as regras de condicionalidade estabelecidas no artigo 93.o, deve ser‑lhe imposta uma sanção administrativa.

2.   A sanção administrativa referida no n.o 1 só é imposta se o incumprimento resultar de um ato ou omissão diretamente imputável ao beneficiário em causa e se estiver preenchida uma das condições adicionais seguintes ou as duas simultaneamente:

a)

O incumprimento estiver relacionado com a atividade agrícola do beneficiário;

b)

Estiver em causa a superfície da exploração do beneficiário.

[…]

3.   Para efeitos do presente título, são aplicáveis as seguintes definições:

a)

“Exploração”, o conjunto das unidades de produção e superfícies geridas pelo beneficiário referido no artigo 92.o, situadas no território do mesmo Estado‑Membro;

b)

“Requisito”, cada um dos requisitos legais de gestão previstos no direito da União a que se refere o Anexo II previstos num determinado ato, e que seja de natureza diferente da de qualquer outro requisito do mesmo ato.»

8

O artigo 93.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1306/2013 tem a seguinte redação:

«As regras de condicionalidade são os requisitos legais de gestão estabelecidos pelo direito da União e as normas em matéria de boas condições agrícolas e ambientais das terras estabelecidas a nível nacional, enunciados no Anexo II e relativos aos seguintes domínios:

a)

Ambiente, alterações climáticas e boas condições agrícolas das terras;

b)

Saúde pública, saúde animal e fitossanidade;

c)

Bem‑estar dos animais.»

9

Nos termos do artigo 94.o deste regulamento:

«Os Estados‑Membros asseguram que todas superfícies agrícolas, incluindo as terras que já não sejam utilizadas para fins produtivos, são mantidas em boas condições agrícolas e ambientais. Os Estados‑Membros definem, a nível nacional ou regional, normas mínimas a cumprir pelos beneficiários no que respeita às boas condições agrícolas e ambientais das terras, com base no Anexo II, tendo em conta as características específicas das zonas em questão, nomeadamente as condições edafoclimáticas, os sistemas de exploração existentes, a utilização das terras, a rotação das culturas, as práticas agrícolas e as estruturas agrícolas.

Os Estados‑Membros não podem definir requisitos mínimos que não estejam estabelecidos no Anexo II.»

10

O Anexo II do referido regulamento, intitulado «Regras de condicionalidade nos termos do artigo 93.o», estabelece a lista dos requisitos legais de gestão e das normas em matéria de boas condições agrícolas e ambientais das terras.

11

A norma relativa às boas condições agrícolas e ambientais denominada «norma BCAA 7», cujo assunto principal se intitula «Paisagem, nível mínimo de manutenção», é definida do seguinte modo:

«Manutenção das características das paisagens, incluindo, se for caso disso, sebes, lagoas, valas, árvores em linha, agrupadas ou isoladas, e orlas dos campos e socalcos […]»

Regulamento n.o 1307/2013

12

O artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c) e e), do Regulamento n.o 1307/2013, sob a epígrafe «Definições e disposições conexas», prevê:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

[…]

b)

“Exploração”: o conjunto das unidades utilizadas para atividades agrícolas e geridas por um agricultor, situadas no território do mesmo Estado‑Membro;

c)

“Atividade agrícola”:

i)

a produção, a criação ou o cultivo de produtos agrícolas, incluindo a colheita, a ordenha, a criação de animais, e a detenção de animais para fins de produção,

ii)

a manutenção de uma superfície agrícola num estado que a torne adequada para pastoreio ou cultivo sem ação preparatória especial para além dos métodos e máquinas agrícolas habituais, com base em critérios a definir pelos Estados‑Membros a partir de um quadro estabelecido pela Comissão, ou

iii)

a realização de uma atividade mínima, definida pelos Estados‑Membros, em superfícies agrícolas naturalmente mantidas num estado adequado para pastoreio ou cultivo;

[…]

e)

“Superfície agrícola” qualquer superfície de terras aráveis, prados permanentes e pastagens permanentes, ou culturas permanentes.»

Direito estónio

13

Nos termos do § 32, n.o 3, da Euroopa põllumajanduspoliitika Liidu rakendamise seadus (Lei de execução da política agrícola comum da União Europeia):

«Os requisitos relativos à manutenção das boas condições agrícolas e ambientais das terras são estabelecidos por um regulamento do ministro competente na matéria.»

14

O § 3, n.o 9, do põllumajandusministri määrus nr 4 «Maa heas põllumajandus‑ ja keskkonnaseisundis hoidmise nõuded» (Regulamento n.o 4 do ministro da Agricultura — Requisitos relativos à manutenção das boas condições agrícolas e ambientais das terras), de 14 de janeiro de 2015 (a seguir «Regulamento n.o 4»), tem a seguinte redação:

«Devem ser conservados os monumentos imóveis, na aceção do § 3, n.o 2, da muinsuskaitseseadus [Lei da Proteção do Património], constituídos por túmulos, sítios arqueológicos, pedras megalíticas, locais de culto, caminhos ou pontes, que se encontrem numa superfície agrícola.»

15

Nos termos do § 8, n.o 1, do maaeluministri määrus nr 32 «Otsetoetuste saamise üldised nõuded, ühtne pindalatoetus klimaa‑ ja keskkonnatoetus ning noore põllumajandustootja toetus» (Regulamento n.o 32 do ministro da Ruralidade — Requisitos gerais em matéria de obtenção de pagamentos diretos, de pagamentos únicos por superfície, de apoios às práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente e de apoio aos jovens agricultores), de 17 de abril de 2015:

«O beneficiário de um dos pagamentos previstos no artigo 92.o do Regulamento […] n.o 1306/2013 […] deve cumprir, no âmbito da sua atividade agrícola e na totalidade da superfície agrícola, os requisitos previstos no Regulamento n.o 4 […], bem como os requisitos legais de gestão, publicados em conformidade com o § 32, n.o 2, da Lei de execução da política agrícola comum da União Europeia.»

16

O § 3 do muinsuskaitseseadus (Lei da Proteção do Património), sob a epígrafe «Tipos de monumentos», dispõe, no seu n.o 2:

«Podem constituir monumentos imóveis os elementos ou conjuntos de elementos seguintes:

1)

os locais residenciais da Antiguidade, medievais e modernos, as fortificações, os locais de refúgio, os locais de culto, os túmulos, os sítios da antiguidade, as pedras megalíticas (lohukivid), os caminhos, as pontes, os portos e os locais destinados ao exercício de ofícios […]»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17

A recorrente no processo principal requereu, relativamente ao ano de 2016, que lhe fosse atribuído um pagamento único por superfície e um apoio às práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente.

18

Em 24 de novembro de 2016, na sequência de uma inspeção, o PRIA informou a recorrente no processo principal de que tinha violado o artigo 4.o do Regulamento n.o 4, pelo facto de as pedras de um monumento arqueológico, a saber, um túmulo marcado com pedras, situado na estrema de uma parcela agrícola, terem sido deslocadas para a estrema do campo e de os arbustos existentes terem sido retirados. O PRIA tencionava, consequentemente, reduzir em 3% o pagamento solicitado.

19

Em 7 de dezembro de 2016, o PRIA respondeu às objeções formuladas pela recorrente no processo principal clarificando que a obrigação violada resultava, na realidade, do § 3 do Regulamento n.o 4 e devia ter sido cumprida relativamente à parte da superfície situada no exterior das estremas da parcela agrícola e para a qual não tinha sido solicitado qualquer apoio.

20

Por duas Decisões de 15 de dezembro de 2016, o PRIA reduziu em 3% o pagamento único concedido à recorrente no processo principal e o apoio por práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente, em montantes que ascendem, respetivamente, a 2554,94 euros e a 1161,34 euros.

21

Por Decisão de 20 de fevereiro de 2017, o PRIA indeferiu a reclamação apresentada pela recorrente no processo principal por considerar que era competente para declarar a violação da obrigação de conservar um monumento imóvel que se encontra numa parcela agrícola, que os requisitos deviam ser cumpridos em relação à totalidade da superfície agrícola, incluindo aquela em relação à qual nenhum pagamento tinha sido pedido, que tinha apreciado as circunstâncias na origem da redução dos pagamentos na sua globalidade e que não tinha sido violado o direito de ser ouvido.

22

Em 23 de março de 2017, a recorrente no processo principal pediu ao Tartu Halduskohus (Tribunal Administrativo de Tartu, Estónia) a anulação das Decisões de 15 de dezembro de 2016 e da Decisão de 20 de fevereiro de 2017, bem como a condenação do PRIA no pagamento dos montantes que, por força destas decisões, não lhe foram pagos.

23

A recorrente no processo principal alega que as pedras em questão não constituíam um túmulo e que o PRIA não era competente para avaliar o estado de um monumento imóvel. Sustenta que este não apreciou a questão de saber se tinha sido a autora do ato que lhe é imputado e se se verificavam causas de exclusão da responsabilidade. Salienta que a fixação do montante da sanção administrativa não é compreensível, uma vez que o PRIA recorreu a um modelo de avaliação, prescindindo da fundamentação do ato administrativo em causa, o que é formalmente contrário ao direito.

24

Alega igualmente que a superfície sobre a qual a infração foi cometida se situa fora da parcela agrícola em causa e não faz parte da sua exploração agrícola. Ao concluir pela existência de uma infração, porém, o PRIA violou os artigos 23.o e 32.o da Constituição estónia, já que a norma de habilitação não é suficientemente clara e precisa. Segundo afirma, a sanção administrativa que lhe foi aplicada viola o princípio ne bis in idem. Por último, o seu direito de ser ouvido foi violado, uma vez que o PRIA não teve em conta os seus argumentos.

25

O PRIA pede que seja negado provimento ao recurso, alegando, em primeiro lugar, que a recorrente no processo principal não ignorava, no momento da inspeção, a existência de uma violação das suas obrigações, tendo havido trocas de correspondência sobre este assunto, em segundo lugar, que o ato administrativo em causa é formalmente conforme com o direito, tendo sido dadas explicações a este respeito à recorrente no processo principal, a qual também foi ouvida, e, em terceiro lugar, que as conclusões que levaram à adoção deste ato foram alcançadas com base nas provas recolhidas durante essa inspeção.

26

O PRIA especifica que o monumento arqueológico em causa, que consiste num túmulo marcado com pedras, está inscrito no registo nacional, que figura no sítio Internet do Muinsuskaitseamet (Serviço de Proteção do Património, Estónia). A este respeito, está previsto um direito de preferência a favor do Estado, inscrito no registo predial. Indica ter‑se baseado também nestes elementos para adotar as decisões impugnadas. Acrescenta que a recorrente no processo principal tinha indicado, no seu pedido de pagamento, possuir um elemento paisagístico que devia ser conservado. Considera que não houve violação do princípio ne bis in idem, dado que não existe uma pendência simultânea de processos de natureza administrativa e penal.

27

Segundo o PRIA, a redução dos pagamentos é justificada pela apreciação a que procedeu e pelo modelo de avaliação que figura no auto de inspeção, sendo que a taxa de 3% foi fixada tendo em conta a importância dos pagamentos, a gravidade e o caráter duradouro da infração.

28

Além disso, tendo em conta que o terreno em causa faz parte da superfície agrícola, os requisitos em matéria de boas condições agrícolas e ambientais deveriam ter sido cumpridos.

29

A título preliminar, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o túmulo em causa no processo principal foi classificado como monumento imóvel pelo Regulamento n.o 59 do ministro da Cultura, de 1 de setembro de 1997.

30

Esse órgão jurisdicional considera que o objetivo prosseguido pelo § 3, n.o 9, do Regulamento n.o 4 consiste em proteger os túmulos marcados com pedras enquanto monumentos, mas que não pode deduzir‑se claramente do direito da União que o artigo 93.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1306/2013 também visa esse objetivo. É possível que a rubrica «Manutenção das características das paisagens», que figura no Anexo II deste regulamento, apenas diga respeito à proteção do ambiente enquanto sistema ecológico e biológico e não como sistema cultural e histórico.

31

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que a recorrente no processo principal não utilizou o terreno onde se encontrava o túmulo como superfície agrícola e que não solicitou apoio para o mesmo.

32

Por último, não é possível determinar claramente se os requisitos em matéria de boas condições agrícolas e ambientais das terras se aplicam a toda a exploração agrícola.

33

Foi nestas circunstâncias que o Tartu Halduskohus (Tribunal Administrativo de Tartu) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve considerar‑se conforme ao artigo 93.o, n.o 1, ao artigo 94.o e às normas mínimas estabelecidas no Anexo II do Regulamento n.o 1306/2013 […] que um Estado‑Membro imponha ao requerente de um pagamento único por superfície e de um apoio às práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente a obrigação de conservar pedras tumulares, obrigação esta cuja violação dá lugar à aplicação de uma redução de 3% dos pagamentos a título de sanção administrativa, nos termos do artigo 39.o do Regulamento Delegado [(UE) n.o 640/2014 da Comissão, de 11 de março de 2014, que completa o Regulamento n.o 1306/2013 no que diz respeito ao sistema integrado de gestão e de controlo e às condições de recusa ou retirada de pagamentos, bem como às sanções administrativas aplicáveis aos pagamentos diretos, ao apoio ao desenvolvimento rural e à condicionalidade (JO 2014, L 181, p. 48)]?

2)

Em caso de resposta negativa à primeira questão, deve considerar‑se que, por força do artigo 72.o, n.o 1, alínea a), do artigo 91.o, n.os 1 e 2, do artigo 93.o, n.o 1, [e] do artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013 […] e do artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c), e e), do Regulamento n.o 1307/2013 […], o requerente de um pagamento único por superfície e de um apoio às práticas agrícolas benéficas para o clima e o ambiente deve respeitar os requisitos em matéria de boas condições agrícolas e ambientais na totalidade da sua exploração agrícola ou apenas na superfície agrícola para a qual foi concretamente pedido um apoio, a fim de evitar a aplicação de uma sanção administrativa?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

34

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 93.o, n.o 1, o artigo 94.o e o Anexo II do Regulamento n.o 1306/2013 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que um Estado‑Membro imponha, como norma em matéria de boas condições agrícolas e ambientais referidas nesse Anexo II, a conservação, numa superfície agrícola, de túmulos marcados com pedras, cuja deslocação implique uma violação dessa norma e, consequentemente, a redução dos pagamentos devidos ao agricultor em causa.

35

Importa recordar que o Tribunal de Justiça declarou que incumbe aos Estados‑Membros a tarefa de assegurar que as terras agrícolas sejam mantidas em boas condições agrícolas e ambientais, os quais definem, para esse fim, a nível nacional ou regional, requisitos mínimos com base no quadro constante do anexo pertinente do regulamento então em vigor, tendo em conta as características específicas das zonas em questão (v., por analogia, Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 25).

36

Embora os Estados‑Membros, ao definir esses requisitos, sejam obrigados a respeitar o referido anexo, todavia este, mediante o emprego de conceitos e de termos gerais, dá‑lhes uma certa margem de apreciação quanto à determinação concreta dos referidos requisitos (v., por analogia, Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 26).

37

Além disso, resulta dos próprios termos da expressão «boas condições agrícolas e ambientais» que os Estados‑Membros podem adotar boas condições agrícolas e ambientais para fins ambientais (v., por analogia, Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 27).

38

Estes princípios, invocados para a interpretação do artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro de 2003, que estabelece regras comuns para os regimes de apoio direto no âmbito da política agrícola comum e institui determinados regimes de apoio aos agricultores e altera os Regulamentos (CEE) n.o 2019/93, (CE) n.o 1452/2001, (CE) n.o 1453/2001, (CE) n.o 1454/2001, (CE) n.o 1868/94, (CE) n.o 1251/1999, (CE) n.o 1254/1999, (CE) n.o 1673/2000, (CEE) n.o 2358/71 e (CE) n.o 2529/2001 (JO 2003, L 270, p. 1), valem para a interpretação do artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013, cuja redação é semelhante.

39

Segundo o artigo 93.o deste último regulamento, as normas em matéria de boas condições agrícolas e ambientais fazem parte das regras de condicionalidade que, tal como previsto no artigo 91.o do referido regulamento, devem ser respeitadas sob pena de uma sanção administrativa. Estas normas são definidas a nível nacional, estão enumeradas no Anexo II do mesmo regulamento e dizem respeito, nomeadamente, ao domínio do ambiente.

40

O artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013 obriga os Estados‑Membros a definir, a nível nacional ou regional, normas mínimas a cumprir pelos beneficiários de auxílios no que respeita às boas condições agrícolas e ambientais, com base no Anexo II do mesmo regulamento.

41

À semelhança do que estava previsto no Anexo IV do Regulamento n.o 1782/2003, a norma BCAA 7, constante do Anexo II do Regulamento n.o 1306/2013 e cujo tema principal se designa «Paisagem, nível mínimo de manutenção», abrange a manutenção das características das paisagens entre os requisitos e normas a respeitar nesse âmbito. Entre as características das paisagens referidas no Anexo II deste último regulamento figuram as sebes, as lagoas, as valas, as árvores em linha, agrupadas ou isoladas, as orlas dos campos e os socalcos.

42

No caso em apreço, importa determinar se um túmulo marcado com pedras é suscetível, como consideram o Governo estónio e a Comissão, de ser qualificado de «característica da paisagem», cuja manutenção figura entre as normas enunciadas no Anexo II do Regulamento n.o 1306/2013.

43

Uma vez que o conceito de «características das paisagens» não se encontra definido no Regulamento n.o 1306/2013, há que interpretá‑lo, como salientou a advogada‑geral no n.o 26 das suas conclusões, tendo em conta a sua aceção habitual e o contexto em que é geralmente utilizado (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 34).

44

A este respeito, importa salientar que uma interpretação restritiva do conceito de «características das paisagens», que, nomeadamente, excluiria os elementos resultantes de intervenções humanas, seria contrária à margem de apreciação de que beneficiam os Estados‑Membros na sua definição, nos termos do artigo 94.o deste regulamento, das exigências mínimas para as boas condições agrícolas e ambientais (v., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 37).

45

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que as características das paisagens constituem componentes físicos do ambiente e que os requisitos relativos à manutenção dessas características devem contribuir para a sua conservação como componentes físicos (Acórdão de 16 de julho de 2009, Horvath, C‑428/07, EU:C:2009:458, n.o 41).

46

Ora, a conservação de túmulos marcados com pedras contribui para a preservação de elementos do património histórico e cultural de um Estado‑Membro como componentes físicos do ambiente.

47

Atendendo às considerações precedentes, importa responder à primeira questão que o artigo 93.o, n.o 1, o artigo 94.o e o Anexo II do Regulamento n.o 1306/2013 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que um Estado‑Membro imponha, como norma em matéria de boas condições agrícolas e ambientais referidas nesse Anexo II, a conservação, numa superfície agrícola, de túmulos marcados com pedras, cuja deslocação implique uma violação dessa norma e, consequentemente, a redução dos pagamentos devidos ao agricultor em causa.

Quanto à segunda questão

48

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 72.o, n.o 1, alínea a), o artigo 91.o, n.os 1 e 2, o artigo 93.o, n.o 1, e o artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013, bem como o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c) e e), do Regulamento n.o 1307/2013, devem ser interpretados no sentido de que as obrigações em matéria de boas condições agrícolas e ambientais devem ser cumpridas na totalidade da exploração agrícola ou apenas na superfície agrícola para a qual foi concretamente pedido o apoio.

49

A este respeito, o artigo 91.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1306/2013 prevê a aplicação de uma sanção administrativa em caso de incumprimento das regras de condicionalidade quando, nomeadamente, estiver em causa a superfície da exploração agrícola, sendo a exploração definida, para efeitos do título VI desse regulamento, no qual esta disposição se insere, no artigo 91.o, n.o 3, alínea a), do referido regulamento como o conjunto das unidades de produção e superfícies situadas no território de um mesmo Estado‑Membro e geridas pelo beneficiário de pagamentos diretos, entre outros.

50

Os artigos 93.o e 94.o do mesmo regulamento fazem referência ao conjunto das superfícies agrícolas de uma exploração. Assim, o artigo 93.o precisa o conteúdo das regras de condicionalidade, citando, nomeadamente, as boas condições agrícolas e ambientais das terras, que devem ser entendidas como o conjunto das terras agrícolas da exploração. No que diz respeito ao artigo 94.o, este obriga os Estados‑Membros a assegurar que todas as superfícies agrícolas, incluindo as terras que já não sejam utilizadas para fins produtivos, são mantidas em boas condições agrícolas e ambientais.

51

Importa constatar que nenhuma destas disposições estabelece uma distinção — no que se refere ao respeito das regras de condicionalidade e, em especial, das boas condições agrícolas e ambientais — entre as superfícies agrícolas relativamente às quais foi apresentado um pedido de ajuda e aquelas em relação às quais tal não sucedeu.

52

Aliás, seria contrário à própria finalidade do sistema de condicionalidade, que, segundo o considerando 54 do Regulamento n.o 1306/2013, visa contribuir para o desenvolvimento de uma agricultura sustentável, exigir o cumprimento das regras de condicionalidade unicamente em relação às superfícies agrícolas para as quais tenham sido pedidos apoios.

53

Com efeito, por um lado, os requisitos decorrentes dessas regras devem, em conformidade com o considerando 54 deste regulamento, estar relacionados com a atividade agrícola ou com a superfície da exploração agrícola, o que se traduz na obrigação de respeitar as referidas regras também em relação às terras que já não sejam utilizadas para fins de produção agrícola, conforme previsto no artigo 94.o do referido regulamento.

54

Por outro lado, se o incumprimento das referidas regras apenas fosse sancionado se dissesse respeito a uma superfície agrícola para a qual foi pedido apoio, existiria um risco de evasão às regras de condicionalidade pelos agricultores. Como salientou a advogada‑geral no n.o 58 das suas conclusões, bastaria para tanto que, relativamente a um determinado ano, um agricultor não incluísse no seu pedido de apoio uma superfície agrícola com um elemento paisagístico incómodo para a sua atividade, que poderia deslocar ou destruir antes de, no ano seguinte, incluir esta superfície no seu pedido de apoio, sem incorrer em qualquer sanção administrativa.

55

Atendendo às considerações precedentes, importa responder à segunda questão que o artigo 72.o, n.o 1, alínea a), o artigo 91.o, n.os 1 e 2, o artigo 93.o, n.o 1, e o artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013, bem como o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c) e e), do Regulamento n.o 1307/2013, devem ser interpretados no sentido de que as obrigações em matéria de boas condições agrícolas e ambientais, previstas no Regulamento n.o 1306/2013, devem ser cumpridas na totalidade da exploração agrícola e não apenas na superfície agrícola para a qual foi concretamente pedido o apoio.

Quanto às despesas

56

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

O artigo 93.o, n.o 1, o artigo 94.o e o Anexo II do Regulamento (UE) n.o 1306/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao financiamento, à gestão e ao acompanhamento da política agrícola comum e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 352/78, (CE) n.o 165/94, (CE) n.o 2799/98, (CE) n.o 814/2000, (CE) n.o 1290/2005 e (CE) n.o 485/2008 do Conselho, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a que um Estado‑Membro imponha, como norma em matéria de boas condições agrícolas e ambientais referidas no Anexo II, a conservação, numa superfície agrícola, de túmulos marcados com pedras, cuja deslocação implique uma violação dessa norma e, consequentemente, a redução dos pagamentos devidos ao agricultor em causa.

 

2)

O artigo 72.o, n.o 1, alínea a), o artigo 91.o, n.os 1 e 2, o artigo 93.o, n.o 1, e o artigo 94.o do Regulamento n.o 1306/2013, bem como o artigo 4.o, n.o 1, alíneas b), c) e e), do Regulamento (UE) n.o 1307/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, que estabelece regras para os pagamentos diretos aos agricultores ao abrigo de regimes de apoio no âmbito da política agrícola comum e que revoga o Regulamento (CE) n.o 637/2008 do Conselho e o Regulamento (CE) n.o 73/2009 do Conselho, devem ser interpretados no sentido de que as obrigações em matéria de boas condições agrícolas e ambientais, previstas no Regulamento n.o 1306/2013, devem ser cumpridas na totalidade da exploração agrícola e não apenas na superfície agrícola para a qual foi concretamente pedido o apoio.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: estónio.