ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

31 de outubro de 2019 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Recursos próprios — Associação dos países e territórios ultramarinos (PTU) à União Europeia — Decisão 91/482/CEE — Artigo 101.o, n.o 2 — Admissão à importação na União com isenção de direitos aduaneiros dos produtos não originários dos PTU que se encontrem em livre prática num PTU e que são reexportados em natureza para a União — Certificados de exportação EXP — Emissão irregular de certificados por parte das autoridades de um PTU — Artigo 4.o, n.o 3, TUE — Princípio da cooperação leal — Responsabilidade do Estado‑Membro que mantém relações especiais com o PTU em causa — Obrigação de compensar a perda de recursos próprios da União resultante da emissão irregular de certificados de exportação EXP — Importações de alumínio provenientes de Anguila»

No processo C‑391/17,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, entrada em 30 de junho de 2017,

Comissão Europeia, representada por A. Caeiros, J.‑F. Brakeland, L. Flynn e S. Noë, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado inicialmente por J. Kraehling, G. Brown, R. Fadoju e S. Brandon, na qualidade de agentes, assistidos por K. Beal, QC, e P. Luckhurst, barristers, e em seguida por S. Brandon e F. Shibli, na qualidade de agentes, assistidos por K. Beal, QC e P. Luckhurst, barristers,

demandado,

apoiado por:

Reino dos Países Baixos, representado por M. K. Bulterman, P. Huurnink e J. Langer, na qualidade de agentes,

interveniente,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev, M. Safjan, S. Rodin, presidentes de secção, J. Malenovský, L. Bay Larsen, T. von Danwitz (relator), C. Toader, C. Vajda, F. Biltgen e K. Jürimäe, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 2 de outubro de 2018,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 6 de fevereiro de 2019,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, por não ter compensado a perda dos recursos próprios que teriam sido declarados e colocados à disposição do orçamento da União Europeia em conformidade com o disposto nos artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CEE, Euratom) n.o 1552/89 do Conselho, de 29 de maio de 1989, relativo à aplicação da Decisão 88/376/CEE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades (JO 1989, L 155, p. 1), se não tivessem sido emitidos certificados de exportação em violação do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO 1991, L 263, p. 1, a seguir «Decisão PTU»), para as importações de alumínio provenientes de Anguila durante o período de 1999/2000, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições do artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE).

Quadro jurídico

Direito internacional

2

A Carta das Nações Unidas foi assinada em São Francisco em 26 de junho de 1945. O artigo 73.o, alínea b), desta Carta, que consta do seu capítulo XI, intitulado «Declaração relativa a territórios não autónomos», dispõe:

«Os membros das Nações Unidas que assumiram ou assumam responsabilidades pela administração de territórios cujos povos ainda não se governem completamente a si mesmos reconhecem o princípio do primado dos interesses dos habitantes desses territórios e aceitam, como missão sagrada, a obrigação de promover no mais alto grau, dentro do sistema de paz e segurança internacionais estabelecido na presente Carta, o bem‑estar dos habitantes desses territórios, e, para tal fim:

[…]

b) Promover o seu governo próprio, ter na devida conta as aspirações políticas dos povos e auxiliá‑los no desenvolvimento progressivo das suas instituições políticas livres, de acordo com as circunstâncias peculiares a cada território e seus habitantes, e os diferentes graus do seu adiantamento.»

Direito da União

Tratado CE

3

Os factos que estão na origem do incumprimento imputado são simultaneamente anteriores e posteriores à entrada em vigor do Tratado de Amesterdão que alterou o Tratado CE. Contudo, as disposições relevantes para a presente ação por incumprimento mantiveram‑se, no essencial, idênticas. O artigo 5.o do Tratado CE (posteriormente artigo 10.o CE) tinha a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros tomarão todas as medidas gerais ou especiais capazes de assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes do presente Tratado ou resultantes de atos das instituições da Comunidade. Os Estados‑Membros facilitarão à Comunidade o cumprimento da sua missão.

Os Estados‑Membros abster‑se‑ão de tomar quaisquer medidas suscetíveis de pôr em perigo a realização dos objetivos do presente Tratado.»

4

No essencial, esta disposição foi substituída pelo artigo 4.o, n.o 3, TUE.

5

A parte IV deste Tratado, intitulada «A associação dos países e territórios ultramarinos», agrupava os artigos 131.o a 137.o deste (que passaram, após alteração, a artigos 182.o CE a 188.o CE e, em seguida, a artigos 198.o a 204.o TFUE). Nos termos do referido artigo 131.o (que passou, após alteração, a artigo 182.o CE e, em seguida, a artigo 198.o TFUE):

«Os Estados‑Membros acordam em associar à Comunidade os países e territórios não europeus que mantêm relações especiais com a Bélgica, a Dinamarca, a França, a Itália, os Países Baixos e o Reino Unido. Estes países e territórios, a seguir denominados “países e territórios”, vêm enumerados na lista constante do Anexo IV do presente Tratado.

A finalidade da associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto.

Em conformidade com os princípios enunciados no preâmbulo do presente Tratado, a associação deve servir, fundamentalmente, para favorecer os interesses dos habitantes desses países e territórios e para fomentar a sua prosperidade de modo a conduzi‑los ao desenvolvimento económico, social e cultural a que aspiram.»

6

O artigo 133.o, n.o 1, do referido Tratado (que passou, após alteração, a artigo 184.o, n.o 1, CE e, em seguida, a artigo 200.o, n.o 1, TFUE) previa:

«As importações originárias dos países e territórios beneficiarão, ao entrarem nos Estados‑Membros, da eliminação total dos direitos aduaneiros que, nos termos do presente Tratado, se deve progressivamente realizar entre os Estados‑Membros».

7

De acordo com o artigo 136.o do mesmo Tratado (que passou, após alteração, a artigo 187.o CE e, em seguida, a artigo 203.o TFUE):

«Durante um período inicial de cinco anos a contar da data da entrada em vigor do presente Tratado, uma Convenção de aplicação, anexa a este Tratado, fixará as modalidades e o processo de associação entre os países e territórios e a Comunidade.

Antes do termo d[a] vigência da Convenção prevista no parágrafo anterior, o Conselho, deliberando por unanimidade, aprovará as disposições a prever para um novo período, com base nos resultados conseguidos e nos princípios enunciados no presente Tratado.»

8

O artigo 227.o, n.os 1 e 3, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 299.o, n.os 1 e 3, CE e, em seguida, a artigo 52.o, n.o 1, TUE e a artigo 355.o, n.o 2, TFUE) dispunha:

«1.   O presente Tratado é aplicável ao Reino da Bélgica, ao Reino da Dinamarca, à República Federal da Alemanha, à República Helénica, ao Reino de Espanha, à República Francesa, à Irlanda, à República Italiana, ao Grão‑Ducado do Luxemburgo, ao Reino dos Países Baixos, à República da Áustria, à República Portuguesa, à República da Finlândia, ao Reino da Suécia e ao Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte.

[…]

3.   O regime especial de associação definido na parte IV do presente Tratado é aplicável aos países e territórios ultramarinos, cuja lista consta do Anexo IV deste Tratado.

O presente Tratado não é aplicável aos países e territórios ultramarinos que mantenham relações especiais com o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não mencionados na lista referida no parágrafo anterior.»

9

A lista que figura no Anexo IV do Tratado CE (que passou, após alteração, a Anexo II do Tratado CE e, em seguida, a Anexo II do Tratado FUE), intitulada «Países e Territórios Ultramarinos aos quais se aplicam as disposições da Parte IV do Tratado», incluía, nomeadamente, Anguila.

Regulamento n.o 1552/89

10

Os artigos 2.o, 6.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1552/89 regulavam, à data dos factos, as condições em que os Estados‑Membros estavam obrigados a declarar e a colocar à disposição do orçamento da União os recursos próprios desta, entre os quais figuravam os direitos aduaneiros.

Decisão PTU

11

Os considerandos 1 e 3 da Decisão PTU tinham a seguinte redação:

«Considerando que é necessário estabelecer para um novo período as disposições aplicáveis à associação dos países e territórios ultramarinos, a seguir denominados “PTU”, à Comunidade Económica Europeia; que essas disposições se aplicam aos territórios dependentes da República Francesa, aos países e territórios dependentes do Reino Unido, aos países dependentes do Reino dos Países Baixos e, em parte, à Gronelândia;

[…]

Considerando que a Comunidade abriu, desde há longa data, o seu mercado aos produtos originários dos PTU, bem como aos dos Estados ACP; que é conveniente, dadas as relações especiais entre a Comunidade e os PTU, baseadas nas disposições do Tratado e, em especial, na sua parte IV, melhorar as suas disposições, concedendo aos PTU uma maior flexibilidade quanto às regras de origem em relação aos produtos dos PTU, adotando novas disposições quanto a determinados produtos não originários dos PTU.»

12

Nos termos do artigo 1.o desta decisão, esta tinha por objetivo promover e acelerar o desenvolvimento económico, cultural e social e o reforço das estruturas económicas dos PTU) enumerados no anexo I da referida decisão. Do n.o 5 deste anexo, Anguila constava como PTU «depend[ente] do [Reino Unido].»

13

O artigo 6.o, primeiro parágrafo, da Decisão PTU dispunha:

«No âmbito das suas competências respetivas, as autoridades que participam no processo de parceria referido no artigo 10.o da presente decisão examinarão periodicamente os resultados da aplicação da decisão, emitirão os pareceres e tomarão as iniciativas necessárias para a realização dos objetivos da presente decisão.»

14

Nos termos do artigo 10.o desta decisão:

«A fim de permitir às autoridades competentes locais dos PTU, no âmbito das constituições respetivas dos Estados‑Membros de que dependem, serem mais estreitamente associados à aplicação dos princípios da associação dos PTU à CEE, respeitando as competências dos poderes centrais respetivos dos Estados‑Membros em questão, é instituído um processo de consultas baseado no princípio da parceria entre a Comissão, o Estado e o PTU.

Esta parceria, cujas modalidades se encontram fixadas nos artigos 234.o a 236.o da presente decisão, permitirá examinar as realizações no âmbito da associação e debater os problemas que se coloquem eventualmente nas relações entre os PTU e a Comunidade.»

15

O artigo 101.o, n.o 2, da referida decisão tinha a seguinte redação:

«Os produtos não originários dos PTU que aí se encontrem em livre prática e reexportados em natureza para a Comunidade serão admitidos à importação na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente, desde que:

tenham pago, no PTU em causa, direitos aduaneiros ou encargos de efeito equivalente de nível igual ou superior aos direitos aduaneiros aplicáveis na Comunidade à importação dos mesmos produtos originários de países terceiros que beneficiem da cláusula da nação mais favorecida,

não tenham sido objeto de isenção ou de restituição, total ou parcial, de direitos aduaneiros ou de encargos de efeito e equivalente,

sejam acompanhados de um certificado de exportação.»

16

Nos termos do artigo 108.o, n.o 1, segundo travessão, da Decisão PTU, as condições de admissão, na União, de produtos não originários dos PTU que se encontrem em livre prática num PTU, e os métodos de cooperação administrativa a eles relativos encontravam‑se definidos no anexo III desta.

17

Nos termos do artigo 234.o desta decisão:

«A ação comunitária apoia‑se tanto quanto possível numa concertação estreita entre a Comissão, o Estado‑Membro a que se encontra sujeito um PTU e as autoridades locais competentes dos PTU.

Esta concertação é a seguir denominada “parceria”.»

18

O artigo 235.o, n.os 1 e 2, da referida decisão previa:

«1.   A parceria refere‑se à programação, à preparação, ao financiamento, ao acompanhamento e à avaliação das ações empreendidas pela Comunidade no âmbito da presente decisão, bem como a todos os problemas que se coloquem nas relações entre os PTU e a Comunidade.

2.   Para o efeito, podem ser criados grupos de trabalho de associação dos PTU, de caráter consultivo e compostos pelos três parceiros referidos no artigo 234.o, quer por zona geográfica de PTU quer por grupo de PTU dependentes de um mesmo Estado‑Membro, a pedido, nomeadamente dos PTU em questão. Estes grupos serão constituídos:

quer numa base ad hoc, para tratar problemas específicos,

quer numa base permanente, para o período abrangido pela decisão de associação; neste caso, deverão reunir‑se no mínimo uma vez por ano para apreciar a execução da presente decisão ou para tratar as outras questões referidas no n.o 1.»

19

De acordo com o artigo 237.o da mesma decisão:

«Sem prejuízo das disposições específicas relativas às relações entre os PTU e os departamentos franceses ultramarinos previstas na presente decisão, esta aplica‑se aos territórios em que o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia é aplicável, nas condições nele previstas, por um lado, e aos territórios dos PTU, por outro.»

20

O artigo 2.o do anexo III da Decisão PTU, intitulado «Certificado de exportação EXP», dispunha, nos seus n.os 1 e 6:

«1.   A prova da observância do disposto no n.o 2 do artigo 101.o da decisão é fornecida pelo certificado de circulação de mercadorias EXP, cujo modelo consta do anexo 1 ao presente anexo.

[…]

6.   A emissão do certificado de exportação EXP é efetuada pelas autoridades aduaneiras do PTU de exportação, se as mercadorias puderem ser consideradas como estando em livre prática, na aceção do n.o 2 do artigo 101.o da decisão.»

21

O artigo 7.o deste anexo, intitulado «Controlo dos certificados de exportação EXP», previa:

«1.   O controlo a posteriori dos certificados de exportação EXP é efetuado por amostragem e sempre que as autoridades aduaneiras do Estado de importação tenham dúvidas fundadas quanto à autenticidade do documento ou quanto à exatidão das informações relativas à origem real da mercadoria em causa.

[…]

6.   Quando o processo de controlo ou qualquer outra informação disponível parecer indicar que as disposições do presente anexo não são respeitadas, o PTU por sua própria iniciativa ou a pedido da Comunidade efetuará os inquéritos necessários ou tomará as medidas para que esses inquéritos sejam efetuados com a urgência necessária a fim de detetar e evitar infrações dessa natureza. A Comissão pode participar nesses inquéritos.

[…]

7.   As contestações que não puderem ser resolvidas entre as autoridades aduaneiras do Estado de importação e as do Estado de exportação ou que suscitem um problema de interpretação do presente anexo serão submetidas ao Comité de Legislação Aduaneira.

[…]»

22

Conforme decorre, nomeadamente, da Comunicação COM(77)210 final da Comissão, de 13 de junho de 1977, sobre o estado da União aduaneira da Comunidade Económica Europeia, o Comité de Legislação Aduaneira, instituído pelo Conselho e presidido por um representante da Comissão, é formado por representantes dos Estados‑Membros.

Código Aduaneiro e Regulamento de aplicação

23

O artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 2700/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2000 (JO 2000, L 311, p. 17) (a seguir, «Código Aduaneiro»), dispunha:

«Exceto nos casos referidos no segundo e terceiro parágrafos do n.o 1 do artigo 217.o, não se efetuará um registo de liquidação a posteriori quando:

[…]

b)

O registo da liquidação do montante dos direitos legalmente devidos não tiver sido efetuado em consequência de um erro das próprias autoridades aduaneiras, que não podia ser razoavelmente detetado pelo devedor, tendo este, por seu lado, agido de boa‑fé e observado todas as disposições previstas na regulamentação em vigor, no que se refere à declaração aduaneira;

[…]»

24

Nos termos do artigo 239.o, n.o 1, deste código:

«Pode‑se proceder ao reembolso ou à dispensa do pagamento dos direitos de importação ou dos direitos de exportação em situações especiais, distintas das referidas nos artigos 236.o, 237.o e 238.o:

a determinar pelo procedimento do comité,

decorrentes de circunstâncias que não envolvam qualquer artifício ou negligência manifesta por parte do interessado. As situações em que pode ser aplicada esta disposição bem como as modalidades processuais a observar para esse efeito são definidas de acordo com o procedimento do comité. O reembolso ou a dispensa do pagamento pode ficar subordinado a condições especiais.»

25

O Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 (JO 1993, L 253, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1335/2003 da Comissão, de 25 de julho de 2003 (JO 2003, L 187, p. 16) [a seguir, «regulamento de aplicação» (2454/93)], continha, no título III da sua parte IV, intitulado «Cobrança do montante da dívida aduaneira», os artigos 868.o a 876.o‑A, que regulavam os pedidos apresentados nos termos do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do Código Aduaneiro. O artigo 873.o, primeiro parágrafo, deste regulamento tinha a seguinte redação:

«Após consulta de um grupo de peritos, composto por representantes de todos os Estados‑Membros reunidos no âmbito do comité para examinar o caso em apreço, a Comissão toma uma decisão que estabelece que a situação examinada permite, ou não, que se não proceda ao registo de liquidação a posteriori dos direitos em causa.»

26

O artigo 874.o do referido regulamento dispunha:

«A decisão prevista no artigo 873.o deve ser notificada ao Estado‑Membro interessado no mais curto prazo e, em qualquer caso, no prazo de um mês a contar da data do termo do prazo previsto no referido artigo.

A Comissão informa os Estados‑Membros das decisões aprovadas, a fim de ajudar as autoridades aduaneiras a decidir nas situações em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis.»

27

O artigo 875.o deste mesmo regulamento previa:

«Quando a decisão prevista no artigo 873.o estabelecer que a situação examinada permite que não se proceda ao registo de liquidação a posteriori dos direitos em causa, a Comissão pode determinar as condições em que os Estados‑Membros podem não proceder a esse registo nos casos em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis.»

28

O capítulo 3 do título IV, relativo ao reembolso e à dispensa do pagamento de direitos de importação ou de exportação, da parte IV do regulamento de aplicação tinha como epígrafe «Disposições específicas relativas à aplicação do artigo 239.o do Código [Aduaneiro]». Continha uma secção 2, relativa às decisões a adotar pela Comissão, da qual constavam os artigos 905.o a 909.o deste regulamento. O artigo 907.o deste dispunha, no seu primeiro parágrafo:

«Após consulta de um grupo de peritos, composto por representantes de todos os Estados‑Membros reunidos no âmbito do comité para examinar o caso em apreço, a Comissão toma uma decisão que estabelece que a situação específica examinada justifica, ou não, a concessão do reembolso ou da dispensa do pagamento.»

29

O artigo 908.o deste regulamento previa:

«1.   A decisão referida no artigo 907.o deve ser notificada ao Estado‑Membro interessado no mais curto prazo e, em qualquer caso, no prazo de um mês a contar da data do termo do prazo previsto no referido artigo.

A Comissão informa os Estados‑Membros das decisões aprovadas, a fim de ajudar as autoridades aduaneiras a decidir sobre os casos em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis.

2.   Com base na decisão da Comissão, notificada nas condições previstas no n.o 1, a autoridade decisória decide sobre o pedido que lhe foi apresentado.

3.   Quando a decisão prevista no artigo 907.o estabelece que a situação especial examinada justifica a concessão do reembolso ou da dispensa do pagamento, a Comissão pode determinar as condições em que os Estados‑Membros podem reembolsar ou dispensar do pagamento dos direitos nos casos em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis.»

Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002

30

O Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, de 25 de junho de 2002, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO 2002, L 248, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 1995/2006 do Conselho, de 13 de dezembro de 2006 (JO 2006, L 390, p. 1) (a seguir «regulamento financeiro»), dispõe, no seu artigo 73.o‑A:

«Sem prejuízo das disposições da regulamentação específica e da aplicação da Decisão do Conselho relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, os créditos das Comunidades sobre terceiros, bem como os créditos de terceiros sobre as Comunidades são sujeitos a um prazo de prescrição de cinco anos.

A data a considerar para o cálculo do prazo de prescrição e as condições para a sua interrupção serão fixadas nas normas de execução.»

Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002

31

O artigo 85.o‑B do Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 (JO 2002, L 357, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 478/2007 da Comissão, de 23 de abril de 2007 (JO 2007, L 111, p. 13) (a seguir «regulamento de execução»), intitulado «Prazos de prescrição», dispõe, no seu n.o 1, primeiro parágrafo:

«O prazo de prescrição dos créditos das Comunidades sobre terceiros começa a correr na data em que termina o prazo comunicado ao devedor na nota de débito […]»

Direito do Reino Unido

32

Nos termos do direito do Reino Unido, Anguila é um território britânico ultramarino que constitui um espaço único com os outros territórios britânicos ultramarinos e o Reino Unido, sem, contudo, fazer parte deste último.

33

Anguila dispõe de uma Constituição que prevê a instituição de um Governador, de um Conselho Executivo, de uma Assembleia, de uma Comissão de Serviços Públicos e de uma Comissão de Serviços Judiciais.

34

O Governo britânico é responsável a nível internacional pelas relações externas dos territórios britânicos ultramarinos, como Anguila. Além disso, de acordo com um princípio constitucional, o Parlamento britânico dispõe de poder para legislar sobre estes territórios.

Factos na origem do litígio

35

Durante o ano de 1998, foi implementado entre Anguila e a Corbis Trading (Anguilla) Ltd (a seguir «Corbis»), sociedade com sede em Anguila, um regime de transbordo em cujo âmbito as importações de alumínio provenientes de países terceiros eram objeto de declaração aduaneira em Anguila, sendo em seguida transportadas para a União.

36

Durante os anos de 1998 e de 1999, as autoridades de Anguila emitiram certificados de exportação EXP (a seguir «certificados EXP») para a reexportação de carregamentos de alumínio originário de países terceiros, os quais foram objeto de uma operação de transbordo em Anguila, com destino à União.

37

Tendo sido suscitadas dúvidas quanto à conformidade do regime de transbordo implementado em Anguila com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, os Commissioners for Her Majesty’s Revenue and Customs (Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido) realizaram, em novembro de 1998, um inquérito, na sequência do qual elaboraram um relatório no qual concluíram que, num primeiro momento, as empresas europeias que atuavam como importadores de alumínio em Anguila pagavam direitos aduaneiros em Anguila e obtinham um certificado EXP para essas importações de alumínio, e que, num segundo momento, lhes era atribuída, uma «ajuda para o transporte». De acordo com as conclusões desse relatório, a citada «ajuda para o transporte» era paga às referidas empresas pela Corbis, à qual as autoridades de Anguila reembolsavam os montantes pagos a título dessa ajuda. Considerando que o regime de transbordo implementado em Anguila tinha sido estabelecido, no essencial, para restituir direitos aduaneiros, o referido relatório concluía que o pagamento de tal «ajuda para o transporte» devia ser considerado uma restituição parcial dos direitos aduaneiros pagos em Anguila, contrária ao artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU.

38

Os resultados do inquérito realizado pela Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido foram transmitidos à Unidade de Coordenação da Luta Antifraude da Comissão (UCLAF).

39

Em 18 de fevereiro de 1999, a UCLAF publicou uma comunicação ao abrigo do artigo 45.o do Regulamento (CE) n.o 515/97 do Conselho, de 13 de março de 1997, relativo à assistência mútua entre as autoridades administrativas dos Estados‑Membros e à colaboração entre estas e a Comissão, tendo em vista assegurar a correta aplicação das regulamentações aduaneira e agrícola (JO 1997, L 82, p. 1) (a seguir «comunicação relativa à assistência mútua»). Nesta comunicação, a UCLAF referiu‑se às informações recebidas pela Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido a respeito do regime de transbordo implementado em Anguila, conforme se encontram resumidas no n.o 37 do presente acórdão. Por considerar que certificados EXP emitidos em tais condições são incompatíveis com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, a UCLAF recomendou às autoridades dos Estados‑Membros que rejeitassem todos os certificados EXP emitidos pelas autoridades de Anguila e adotassem medidas de salvaguarda, pedindo aos importadores uma garantia ou um depósito a título dos direitos aduaneiros devidos no momento da entrada na União.

40

Em 28 de maio de 2003, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) apresentou um relatório de missão conjunto (a seguir «relatório do OLAF de 2003») sobre os certificados EXP emitidos pelas autoridades de Anguila durante os anos de 1998 e de 1999. No ponto 4.2 deste relatório, o OLAF salientou que, durante todo este período, os procedimentos aduaneiros em vigor em Anguila não se tinham alterado e que as empresas que tinham atuado como importadoras de carregamentos de alumínio em Anguila eram referidas, nos certificados EXP emitidos pelas autoridades de Anguila, como sendo exportadoras daquelas mercadorias. De acordo com as conclusões constantes do ponto 4.2 do referido relatório, a «ajuda para o transporte» paga aos importadores da União também não se tinha alterado durante o referido período, embora a Corbis tenha alterado o conteúdo constante das faturas enviadas às autoridades de Anguila, as quais deixaram de mencionar separadamente a «ajuda para o transporte» paga pela Corbis. No ponto 4.3 do relatório do OLAF de 2003 acrescentava‑se que o incentivo económico pago sob a forma de tal ajuda ascendia, regra geral, a 25 dólares dos Estados Unidos (USD) por tonelada de alumínio importada para a União através de Anguila e podia, em determinados casos, ultrapassar este montante. Neste mesmo ponto 4.3 indicava‑se, além disso, os nomes das sociedades importadoras na União que tinham recebido pagamentos a título desta «ajuda para o transporte», bem como o montante total desses pagamentos.

41

Através da Decisão REC 03/2004 (C/2004/5358), de 28 de dezembro de 2004 (a seguir «Decisão REC 03/2004»), a Comissão considerou, no que diz respeito ao caso específico da importação em Itália, por uma empresa italiana, de 41 lingotes de alumínio em bruto, não ligado, originário de países terceiros, efetuada em 1 de abril de 1999 e abrangida por um certificado EXP emitido pelas autoridades de Anguila, que não era necessário proceder a um registo de liquidação a posteriori dos direitos de importação. Nesta decisão, a Comissão salientou que, no âmbito do inquérito realizado pela União e por determinados Estados‑Membros sobre o regime de transbordo em Anguila a partir de 1998, tinha ficado demonstrado que os operadores económicos que procediam à colocação em livre prática de alumínio em Anguila podiam beneficiar do pagamento de uma «ajuda para o transporte» que ascendia a um montante de 25 USD por tonelada deste metal, ajuda essa que era paga com base numa decisão individual adotada pelas autoridades de Anguila. A respeito da compatibilidade dos certificados EXP emitidos no contexto da concessão de tal ajuda com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, a Comissão salientou, no ponto 9 da referida decisão, o seguinte:

«Tendo examinado o modo como as disposições do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU foram aplicadas em Anguila, os serviços da Comissão concluíram que existe um nexo entre o pagamento dos direitos aduaneiros e os pagamentos subsequentes da ajuda para o transporte, que o mecanismo implementado neste território (cobrança de direitos aduaneiros seguida do pagamento de uma ajuda para o transporte) não é conforme com as disposições do artigo 101.o, n.o 2, acima referido e que o pagamento da ajuda para o transporte deve, de facto, ser interpretado como uma restituição parcial dos direitos aduaneiros. Por este motivo, as mercadorias não podiam ter sido admitidas para importação na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros».

42

Na sua Decisão REC 03/2004, a Comissão considerou, além disso, que as autoridades de Anguila tinham emitido certificados EXP embora soubessem ou devessem razoavelmente saber que o mecanismo que tinham implementado não era conforme com estas disposições. A este respeito, os pontos 21 e 22 desta decisão sublinhavam o seguinte:

«21)

[H]á que constatar que, no caso em apreço, determinados elementos permitem demonstrar que as autoridades competentes de Anguila sabiam ou, pelo menos, deviam razoavelmente saber que as mercadorias para as quais emitiam certificados EXP não reuniam as condições necessárias para poderem beneficiar do tratamento favorável para importação na Comunidade.

22)

Além disso, há que observar que as exportações de alumínio para a União Europeia provenientes de Anguila aumentaram em 1998 e 1999 de forma assinalável, progressão esta que as autoridades de Anguila não podiam ignorar estar relacionada com a concessão da referida ajuda para o transporte, embora a referida ajuda fosse paga por uma administração local distinta da que é responsável pela cobrança dos direitos aduaneiros no momento da colocação em livre prática em Anguila e da emissão dos certificados EXP.»

43

A Comissão concluiu, no entanto, nos pontos 24 a 28 daquela decisão, que o erro cometido pelas autoridades de Anguila não era detetável por um operador de boa‑fé, na aceção do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do Código Aduaneiro, o que era o caso da empresa italiana importadora em questão.

44

No ponto 31 de referida decisão, a Comissão, em conformidade com o disposto no artigo 875.o do regulamento de aplicação, esclareceu nos seguintes termos as condições em que os Estados‑Membros podem, ao abrigo do artigo 220.o, n.o 2, alínea b), do Código Aduaneiro, não proceder ao registo de liquidação a posteriori dos direitos de importação nos casos em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis:

«São comparáveis de facto e de direito ao caso em apreço os pedidos de não registo de liquidação a posteriori, apresentados nos prazos legais, relativos a operações de importação na Comunidade provenientes de Anguila quando as circunstâncias em que as operações de importação que foram efetuadas sejam comparáveis de facto e de direito com as que deram origem ao caso em apreço. Os interessados não devem, de forma nenhuma, ter estado envolvidos nas operações de encaminhamento das mercadorias desde o país de exportação até à entrada em território aduaneiro comunitário, através de Anguila. Devem ter adquirido as mercadorias ao abrigo de um contrato DDP (delivered duty paid). Devem intervir apenas como importador das mercadorias na Comunidade ou como representante de tal importador. Por último, não devem estar relacionados com o seu fornecedor, com o exportador em Anguila, com pessoas que tenham participado no encaminhamento das mercadorias desde o país de exportação até à Comunidade ou com o Governo de Anguila. […] Por último, os interessados não devem ter procedido com fraude ou negligência manifesta.»

45

Na Decisão REM 03/2004 [(2006) 2030], de 24 de maio de 2006 (a seguir «Decisão REM 03/2004»), a Comissão pronunciou‑se sobre um regime de transbordo posto em prática em São Pedro e Miquelão para importações na União de alumínio originário de países terceiros através desse PTU, regime esse que pressupunha igualmente a cobrança de direitos aduaneiros seguida do pagamento de uma «ajuda para o transporte» de 25 USD por tonelada deste metal aos operadores económicos que colocassem alumínio em livre prática no referido PTU. A Comissão considerou, uma vez mais, que tal regime não era conforme com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU e que as autoridades deste mesmo PTU sabiam ou deviam razoavelmente saber que as condições de emissão de um certificado EXP não estavam reunidas. Nestas circunstâncias, a Comissão concluiu que havia que proceder à dispensa do pagamento dos direitos de importação, por força do artigo 239.o do Código Aduaneiro. Além disso, a Comissão confirmou a apreciação que fizera do regime de transbordo implementado em Anguila, esclarecendo, ao abrigo do artigo 908.o do regulamento de aplicação, que os Estados‑Membros podem reembolsar ou dispensar o pagamento dos direitos de importação que sejam «relativos a operações de importação na [União] provenientes de São Pedro e Miquelão, de Anguila e das Antilhas holandesas, quando as circunstâncias em que as operações de importação que tenham sido efetuadas sejam comparáveis de facto e de direito com as que deram origem ao caso em apreço».

46

Durante o período que decorreu entre março de 1999 e junho de 2000, foi importado para Itália alumínio originário de países terceiros, tendo sido apresentados certificados EXP emitidos pelas autoridades de Anguila no decurso do ano de 1999. Durante esse ano, as referidas autoridades emitiram doze certificados EXP.

47

No decurso de 2006 e de 2007, as autoridades italianas informaram a Comissão de que tinham adotado várias decisões que concediam dispensa do pagamento de direitos de importação relativos à importação de alumínio proveniente de Anguila ao abrigo das Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004. A pedido da Comissão, as autoridades italianas forneceram‑lhe informações adicionais em 2010.

48

Por carta de 8 de julho de 2010, a Comissão pediu ao Reino Unido, com base no artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3.o TUE), que compensasse a perda dos recursos próprios da União que resultava, na opinião da Comissão, do facto de as autoridades de Anguila terem emitido certificados EXP incompatíveis com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, impedindo as autoridades italianas de receberem direitos aduaneiros sobre as importações em causa. Nesta carta, a Comissão esclareceu que qualquer atraso na compensação desta perda daria origem a juros de mora.

49

À referida carta seguiu‑se uma troca de correspondência entre a Comissão e o Reino Unido.

Procedimento pré‑contencioso

50

Em 27 de setembro de 2013, a Comissão enviou ao Reino Unido uma notificação para cumprir na qual pedia a este Estado‑Membro que compensasse a perda de recursos próprios correspondente aos direitos aduaneiros que tinham sido objeto das decisões de dispensa do pagamento emitidas pelas autoridades italianas, ao abrigo das Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004.

51

Por carta de 21 de novembro de 2013, o Reino Unido respondeu a esta notificação para cumprir rejeitando qualquer responsabilidade pelos atos cometidos por Anguila e qualquer violação do direito da União.

52

Em 17 de outubro de 2014, a Comissão enviou ao Reino Unido um parecer fundamentado, ao qual este Estado‑Membro respondeu mantendo a sua posição.

53

Não tendo o Reino Unido procedido à compensação pedida, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

Quanto à ação

Argumentos das partes

54

A Comissão sustenta que o Reino Unido está obrigado, por força do princípio da cooperação leal consagrado no artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE), a compensar a perda de recursos próprios tradicionais que, na opinião da Comissão, resultou do facto de as autoridades de Anguila terem emitido, no decurso do ano de 1999, doze certificados EXP em violação das disposições da Decisão PTU e de terem, deste modo, impedido as autoridades italianas de recuperar os direitos aduaneiros relativos às importações em causa. A este respeito, a Comissão esclarece que com a sua ação pretende que seja declarado que o Reino Unido não cumpriu esta obrigação de compensação, independentemente do montante dessa perda, cuja determinação não requereu ao Tribunal de Justiça.

55

Em primeiro lugar, a Comissão considera que o Reino Unido deve, na qualidade de Estado‑Membro, assumir a responsabilidade pelos atos adotados e pelas negligências cometidas pelas autoridades de Anguila, contrárias à Decisão PTU, tendo em conta as relações especiais que mantém com o seu PTU, o qual, de acordo com a Comissão, não é um Estado independente e é parte integrante daquele Reino.

56

A Comissão acrescenta que o Reino Unido não pode invocar a autonomia administrativa de que Anguila beneficia para justificar a inobservância das suas obrigações decorrentes do princípio da cooperação leal. Além disso, o Reino Unido mantém os poderes necessários para evitar que dos atos ou das omissões deste PTU resulte uma perda de recursos próprios para o orçamento da União. Em especial, o Parlamento britânico dispõe de um poder ilimitado para legislar no que respeita aos PTU do Reino Unido.

57

Em segundo lugar, a Comissão recorda que o princípio da cooperação leal impõe aos Estados‑Membros que adotem todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União. No caso em apreço, a emissão irregular de certificados EXP pelas autoridades de Anguila impediu a cobrança dos direitos aduaneiros e a colocação destes direitos à disposição do orçamento da União como recursos próprios. Ora, por não ter compensado esta perda de recursos próprios, o Reino Unido entravou o bom funcionamento do sistema de recursos próprios da União, na medida em que a referida perda deve ser compensada por todos os Estados‑Membros através de um aumento dos recursos próprios baseados no rendimento nacional bruto. Por conseguinte, a proteção do orçamento da União exige que o Reino Unido possa ser responsabilizado a título da violação, por parte das autoridades de Anguila, da Decisão PTU e que compense a consequente perda de recursos.

58

Em terceiro lugar, a Comissão sustenta que, no caso de os recursos próprios em causa não serem compensados, o Reino Unido está obrigado a pagar juros de mora sobre o montante correspondente a essa perda. De acordo com a Comissão, a obrigação de pagar tais juros de mora não se baseia na regulamentação da União em matéria de recursos próprios, antes fazendo parte da obrigação de cooperação leal, tendo em conta o nexo indissociável que existe entre a obrigação de declarar os recursos próprios da União, a de os inscrever na conta da Comissão nos prazos fixados e, por último, a de pagar juros de mora.

59

No que respeita aos factos que estão na origem do incumprimento imputado ao Reino Unido, a Comissão alega, baseando‑se no relatório do OLAF de 2003, que as autoridades de Anguila emitiram, durante o ano de 1999, doze certificados EXP e concederam em simultâneo aos importadores da União uma «ajuda para o transporte». Na medida em que a concessão de tal ajuda deve ser considerada, de acordo com as Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004, uma restituição parcial de direitos aduaneiros efetuada por Anguila, estes certificados foram emitidos em violação do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU. Tendo em conta as indicações constantes dos referidos certificados, bem como as declarações de importação transmitidas pelas autoridades italianas, estes mesmos certificados terão sido utilizados para efeitos da importação de alumínio com isenção de direitos aduaneiros e, consequentemente, causaram uma perda de recursos próprios da União, perda essa que o Reino Unido não compensou.

60

O Reino Unido, apoiado pelo Reino dos Países Baixos, contesta o incumprimento que lhe é imputado. Em primeiro lugar, alega que nem o Código Aduaneiro nem a legislação da União relativa aos recursos próprios, nem sequer a Decisão PTU, permitem responsabilizar Anguila, perante a União, pelos erros cometidos pelas suas próprias autoridades na aplicação desta decisão e pela perda de recursos próprios daí resultante. Por conseguinte, o Reino Unido também não pode ser responsabilizado por tais erros pelo simples facto de que ser o Estado‑Membro ao qual Anguila se encontra ligada.

61

De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça que decorre do Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979 (EU:C:1979:224, n.o 62), há que distinguir a responsabilidade dos Estados‑Membros relativamente às relações internacionais de um PTU das obrigações que incumbem a estes Estados por força do direito da União. A este respeito, o Reino Unido salienta que, nos termos do artigo 227.o, n.o 3, do Tratado CE (que passou a artigo 299.o, n.o 3, CE e, em seguida, a artigo 355.o, n.o 2, TFUE), Anguila é considerada uma entidade distinta deste Estado‑Membro à qual as disposições gerais dos Tratados não se aplicam quando não exista uma referência expressa neste sentido. Ora, a tese da Comissão alarga as obrigações constantes do artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE) às ações e às omissões dos PTU, sem que tal esteja expressamente previsto no direito da União, em especial na Decisão PTU. Não havendo disposição expressa neste sentido, o Reino Unido não pode ser obrigado a prevenir qualquer violação desta decisão por parte de Anguila, nem ser responsável por essa violação perante a União.

62

O Reino Unido considera que, atendendo à autonomia de que Anguila dispõe nos termos do direito constitucional nacional, a tese segundo a qual é responsável pelos atos das autoridades deste PTU contraria o artigo 4.o, n.o 2, TUE, bem como o princípio de direito internacional consuetudinário refletido no artigo 73.o da Carta das Nações Unidas. Com efeito, nos termos do direito constitucional nacional, Anguila não faz parte do Reino Unido, antes formando uma unidade constitucional distinta deste e dispondo de um amplo grau de autonomia, nomeadamente em matéria aduaneira e fiscal. Na medida em que Anguila está organizada de acordo com a sua própria Constituição escrita, o poder para legislar de que o Parlamento britânico dispõe em relação a Anguila não lhe permite intervir nas atividades quotidianas deste território.

63

Em segundo lugar, o Reino Unido sustenta que a tese segundo a qual é responsável pelos atos das autoridades de Anguila e, por este motivo, está obrigado a compensar as perdas de recursos próprios resultantes de uma violação da Decisão PTU por parte destas autoridades não se pode basear no artigo 5.o do Tratado CE (que passou a artigo 10.o CE e, em seguida, a artigo 4.o, n.o 3, TUE). Com efeito, nenhum elemento do texto deste artigo prevê tal responsabilidade. Assim, esta tese é contrária ao princípio da segurança jurídica, que se impõe com especial rigor quando se trata de uma regulamentação passível de comportar encargos financeiros.

64

Além disso, uma vez que a Decisão PTU reconhece às autoridades dos PTU um papel central nas questões de associação, as autoridades de Anguila contestaram a interpretação invocada pela Comissão e pediram a convocação de um grupo de trabalho encarregado de tratar qualquer problema que se coloque nas relações entre os PTU e a União, nos termos do artigo 235.o da Decisão PTU, bem como a aplicação do procedimento de parceria, referido no artigo 7.o, n.o 7, do Anexo III dessa decisão. De acordo com o Reino Unido, a Comissão devia ter aplicado estas medidas previstas na Decisão PTU para tratar eventuais erros cometidos pelas autoridades de Anguila.

65

O Reino Unido acrescenta que também não está obrigado a pagar juros de mora, uma vez que não existe base jurídica a este respeito. O artigo 11.o do Regulamento n.o 1552/89 não é aplicável ao presente processo.

66

No que se refere, por último, aos factos que estão na origem do incumprimento que lhe é imputado, o Reino Unido contesta a irregularidade dos certificados EXP emitidos no decurso do ano de 1999 porquanto a Comissão não demonstrou que estes certificados deram origem à concessão de uma «ajuda para o transporte». A este respeito, o Reino Unido salienta que, a partir de novembro de 1998, as faturas enviadas pela Corbis às autoridades de Anguila deixaram de conter uma referência a uma qualquer «ajuda para o transporte», passando a referir‑se a «serviços prestados» por esta sociedade. Além disso, em 22 de janeiro de 1999, a Assembleia de Anguila adotou uma resolução segundo a qual todos os produtos que transitassem por Anguila para a União deviam ficar sujeitos a um direito aduaneiro equivalente ao direito aduaneiro da União aplicável a esse produto. Em todo o caso, o Reino Unido considera que tal «ajuda para o transporte» não deve ser considerada uma restituição parcial de direitos aduaneiros incompatível com o artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU.

67

Segundo o Reino Unido, a Comissão também não demonstrou que a eventual emissão irregular dos referidos certificados EXP implicou uma perda de recursos próprios. A este respeito, para além de contestar que estes certificados tenham efetivamente sido apresentados às autoridades italianas, o Reino Unido questiona a existência de um nexo de causalidade entre a eventual emissão irregular dos referidos certificados e a perda de recursos próprios invocada. Com efeito, na sua opinião, se as autoridades italianas tivessem adotado as medidas de salvaguarda recomendadas na comunicação relativa à assistência mútua, os operadores em questão teriam eventualmente renunciado a importar as mercadorias em causa para a União. Além disso, se as exigências relativas ao comportamento destes operadores, especificadas no n.o 31 da Decisão REC 03/2004, não tinham sido observadas, as autoridades italianas deviam ter procedido à cobrança dos direitos aduaneiros, pelo que o Reino Unido não pode responsabilizado a este respeito.

68

Por outro lado, segundo o Reino Unido, a jurisprudência decorrente do Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento (C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.os 47 e 48), opõe‑se, no presente caso, à constatação segundo a qual o Reino Unido não cumpriu a alegada obrigação de compensar o montante, eventualmente acrescido de juros, equivalente à perda de recursos próprios resultante da emissão irregular de certificados EXP por parte das autoridades de Anguila. Com efeito, a Comissão intentou a presente ação dezassete anos depois de as importações em causa terem sido realizadas e mais de doze anos após a publicação da Decisão REC 03/2004 e, consequentemente, após o termo do prazo razoável que a Comissão devia respeitar, de acordo com esta jurisprudência.

Apreciação do Tribunal de Justiça

69

A título preliminar, há que sublinhar que, embora, à época do comportamento das autoridades de Anguila que está na origem da presente ação por incumprimento, o princípio da cooperação leal estivesse consagrado no artigo 5.o do Tratado CE e tivesse, posteriormente, estado consagrado no artigo 10.o CE, estas disposições, quando a Comissão pediu ao Reino Unido que compensasse a perda de recursos próprios que, na sua opinião, resulta deste comportamento, tinham sido substituídas pelo artigo 4.o, n.o 3, TUE. Daqui decorre que a ação deve ser analisada à luz do princípio da cooperação leal conforme consagrado nesta última disposição.

70

Por força do artigo 4.o, n.o 3, segundo parágrafo, TUE, o Reino Unido, na qualidade de Estado‑Membro da União, está obrigado a tomar todas as medidas gerais ou específicas adequadas para garantir a execução das suas obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes dos atos das instituições da União.

71

Embora incumba, para este efeito, a todas as autoridades deste Estado‑Membro assegurar o respeito pelas normas do direito da União no âmbito das suas competências, o referido Estado‑Membro continua a ser, por força do artigo 258.o TFUE, o único responsável, perante a União, pelo cumprimento das obrigações que resultam deste direito (v., neste sentido, Acórdãos de 4 de outubro de 2012, Byankov, C‑249/11, EU:C:2012:608, n.o 64 e jurisprudência referida, bem como de 13 de maio de 2014, Comissão/Espanha, C‑184/11, EU:C:2014:316, n.o 43 e jurisprudência referida).

72

Ora, como a Comissão esclareceu na sua réplica, a presente ação por incumprimento não se baseia em erros cometidos pelas autoridades do Reino Unido, mas na responsabilidade deste Estado‑Membro devido a uma perda de recursos próprios resultante da violação das disposições da Decisão PTU que regem a emissão de certificados EXP por parte das autoridades de Anguila.

73

Conforme resulta do artigo 227.o, n.o 3, do Tratado CE, lido em conjugação com o Anexo IV deste (que passou a artigo 299.o, n.o 3, CE e Anexo II do Tratado CE e, em seguida, a artigo 355.o, n.o 2, TFUE e Anexo II do TFUE), Anguila constava entre os PTU enumerados no referido anexo e estava, por este motivo, sujeita ao regime especial de associação definido na parte IV do Tratado CE, que agrupava os artigos 131.o a 137.o deste (que passaram a artigos 182.o CE a 188.o CE e, em seguida, a artigos 198.o a 204.o TFUE), regime esse cujas modalidades e procedimentos foram definidos na Decisão PTU, com base no artigo 136.o do referido Tratado (que passou a artigo 187.o CE e, em seguida, a artigo 203.o TFUE).

74

Neste contexto, importa sublinhar que, embora o Tribunal de Justiça já tenha declarado que as disposições gerais do Tratado CE, a saber, as que não figuram na parte IV deste, não são aplicáveis aos PTU sem referência expressa (Acórdão de 5 de junho de 2014, X e TBG, C‑24/12 e C‑27/12, EU:C:2014:1385, n.o 45 e jurisprudência referida), o incumprimento imputado ao Reino Unido não está abrangido pela situação contemplada nesta jurisprudência. Com efeito, a Comissão não alega que o princípio da cooperação leal se aplica a Anguila, antes sustentando que o Reino Unido está obrigado, por força deste princípio, a responder pelas consequências da emissão irregular de certificados EXP pelas autoridades de Anguila. Ora, como se recordou no n.o 70 do presente acórdão, o referido princípio impõe‑se ao Reino Unido na qualidade de Estado‑Membro da União.

75

À luz destas considerações, há que analisar, em primeiro lugar, se o Reino Unido é responsável, ao abrigo das obrigações que lhe incumbem na qualidade de Estado‑Membro a título do artigo 4.o, n.o 3, TUE, perante a União, por uma eventual emissão de certificados EXP realizada pelas autoridades de Anguila em violação da Decisão PTU, em segundo lugar, se o Reino Unido está obrigado, por força desta disposição, a compensar o montante, acrescido de juros de mora, se for o caso, de uma eventual perda de recursos próprios da União daí resultante e, em terceiro lugar, em caso de resposta afirmativa, se o incumprimento imputado ao Reino Unido tem fundamento.

Quanto à responsabilidade do Reino Unido devido a uma eventual emissão irregular de certificados EXP pelas autoridades de Anguila

76

A Comissão sustenta que é devido às relações especiais que ligam Anguila ao Reino Unido que este Estado‑Membro deve ser responsabilizado, perante a União, pelos atos e omissões das autoridades de Anguila nos casos em que estas emitiram certificados EXP em violação da Decisão PTU.

77

O Reino Unido é um dos Estados‑Membros que, de acordo com o artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), mantêm «relações especiais» com PTU. Nos termos desta disposição, a sujeição destes países e territórios ao regime especial de associação definido na parte IV do Tratado CE baseava‑se, à época da emissão desses certificados, nessas relações especiais.

78

As referidas relações especiais caracterizam‑se pelo facto de os PTU não serem Estados independentes, antes constituindo países e territórios que dependem desse Estado, o qual assegura nomeadamente a sua representação no plano internacional [v., neste sentido, Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224, n.o 62, e Parecer 1/94 (Acordos anexos ao acordo que cria a OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 17].

79

Nos termos do artigo 131.o do Tratado CE (que passou a artigo 182.o CE e, em seguida, a artigo 198.o TFUE), só beneficiam da aplicação do regime especial de associação definido na parte IV deste Tratado, que visa promover o desenvolvimento económico, social e cultural dos PTU, os países e territórios que mantêm relações especiais com o Estado‑Membro em questão, o qual pediu que o regime especial de associação lhes fosse aplicável. No que diz respeito, concretamente, a Anguila, que depende do Reino Unido, este território foi acrescentado à lista dos PTU constante do Anexo IV do Tratado CEE (que passou a Anexo II do Tratado CE e, em seguida, a Anexo II do Tratado FUE), por força do artigo 24.o, n.o 2, do Ato relativo às condições de adesão às Comunidades Europeias do Reino da Dinamarca, da Irlanda e do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte e às adaptações dos Tratados (JO 1972, L 73, p. 14).

80

Assim, os termos utilizados, nomeadamente, no primeiro considerando bem como no artigo 234.o e no artigo 235.o, n.o 2, da Decisão PTU para designar o Estado‑Membro «a que se encontra sujeito» um PTU constituem a expressão das relações especiais existentes entre estes, nos termos do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE). Esta interpretação é corroborada pelo artigo 1.o da Decisão PTU, lido em conjugação com o anexo I, n.o 5, desta, do qual resulta que Anguila era um PTU «dependente do [Reino Unido]».

81

Além disso, no âmbito do referido regime especial de associação, os produtos originários de Anguila beneficiavam, em conformidade com o artigo 133.o, n.o 1, do Tratado CE (que passou a artigo 184.o, n.o 1, CE e, em seguida, a artigo 200.o, n.o 1, TFUE), de um acesso privilegiado ao mercado interno com isenção dos direitos aduaneiros, acesso esse que a Decisão PTU alargava, como enunciava o seu terceiro considerando, a determinados produtos não originários desse PTU. Por força do artigo 101.o, n.o 2, dessa decisão, lido em conjugação com o artigo 108.o, n.o 1, segundo travessão e com o anexo III desta, os produtos não originários dos PTU que se encontrassem em livre prática num PTU e fossem reexportados em natureza para a União podiam ser importados com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente, desde que esses produtos tivessem pago, no referido PTU, direitos aduaneiros ou encargos de efeito equivalente de nível igual ou superior aos direitos aduaneiros aplicáveis na União à importação desses mesmos produtos originários de países terceiros que beneficiassem da cláusula da nação mais favorecida, não tivessem sido objeto de isenção ou de restituição, total ou parcial, de direitos aduaneiros ou de encargos de efeito equivalente e fossem acompanhados de um certificado EXP.

82

Ora, a emissão de certificados EXP pelas autoridades de Anguila era regida pelo direito da União. De facto, nos termos do artigo 2.o, n.os 1 e 6, do anexo III da Decisão PTU, a qual era aplicável aos territórios dos PTU por força do seu artigo 237.o, estes certificados, que comprovavam o respeito pelas disposições do artigo 101.o, n.o 2, desta decisão, deviam ser emitidos pelas autoridades dos PTU. Assim, quando estas autoridades emitiam tais certificados, estavam obrigadas a respeitar as exigências contidas nesse artigo 101.o, n.o 2.

83

Além disso, os procedimentos previstos na Decisão PTU para resolver os diferendos ou os problemas que pudessem surgir neste contexto refletiam o caráter central que revestiam, para o regime de associação definido na parte IV do Tratado CE, as relações especiais, na aceção do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), entre o PTU em causa e o Estado‑Membro a que se encontrava sujeito.

84

A este respeito, importa ter em conta, em especial, o artigo 7.o, n.o 7, do anexo III da Decisão PTU, nos termos do qual os diferendos relativos à legalidade dos certificados EXP que não pudessem ser resolvidos entre as autoridades aduaneiras de Estado de importação e as do PTU de exportação deviam sê‑lo ao nível do Comité de Legislação Aduaneira, no âmbito de um procedimento no qual participava, nomeadamente, um representante do Estado‑Membro a que o PTU de exportação estava sujeito, mas não as autoridades locais competentes desse PTU.

85

Além disso, no que respeita à eventual resolução de problemas que se pudessem colocar no contexto de uma emissão irregular de certificados EXP no âmbito da parceria referida nos artigos 234.o e 235.o da Decisão PTU, há que constatar que esta parceria não podia assentar num diálogo bilateral entre o PTU em causa e a Comissão, antes tornava necessária uma concertação trilateral na qual deviam participar, para além da Comissão, o Estado‑Membro a que o PTU se encontra sujeito e as autoridades locais competentes deste. Nos termos do artigo 10.o, primeiro parágrafo, dessa decisão, a participação do Estado‑Membro a que o PTU se encontra sujeito nessa concertação trilateral era necessária para garantir o respeito pelas «competências dos poderes centrais respetivos dos Estados‑Membros em questão».

86

Nestas condições, a existência de relações especiais, na aceção do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE), entre o Reino Unido e Anguila pode dar origem a uma responsabilidade específica do referido Estado‑Membro perante a União quando as autoridades deste PTU emitem certificados EXP em violação da referida decisão.

87

Todavia, o Reino Unido contesta a existência de tal responsabilidade. Primeiro, sustenta que se deve distinguir entre Anguila e o Reino Unido na qualidade de Estado‑Membro, nos termos da jurisprudência decorrente do Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979 (EU:C:1979:224, n.o 62). Segundo, é opinião do Reino Unido que o sistema de cooperação administrativa estabelecido na Decisão PTU permitia que se abordassem diretamente as autoridades de um PTU, pelo que a Comissão não pode responsabilizar o Reino Unido pelos atos daquelas autoridades ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, TUE. Terceiro, o reconhecimento de tal responsabilidade viola a autonomia constitucional de Anguila, em violação do artigo 4.o, n.o 2, TUE e do artigo 73.o da Carta das Nações Unidas.

88

No que diz respeito ao primeiro argumento, é certo que o Tribunal de Justiça decidiu, no essencial, no n.o 62 do parecer referido no número anterior, que, quando um Estado‑Membro celebra um acordo internacional como representante internacional de um PTU que depende do referido Estado, não atua na qualidade de Estado‑Membro. Contudo, essa constatação, que permitiu ao Tribunal de Justiça concluir que tal representação não tinha impacto na «delimitação das esferas de competência dentro da Comunidade», não é pertinente para apreciar a responsabilidade de um Estado‑Membro no contexto da emissão, por parte das autoridades de um PTU que depende desse Estado‑Membro, de certificados EXP em violação da Decisão PTU, emissão essa que era regulada pelas normas do direito da União aplicáveis no território dos PTU.

89

No que respeita ao segundo argumento do Reino Unido, relativo ao sistema de cooperação administrativa estabelecido pela Decisão PTU, é verdade que, em conformidade com o disposto no artigo 7.o, n.o 6, do anexo III desta decisão, incumbia às autoridades do PTU em causa, nomeadamente, efetuar os inquéritos necessários quando o processo de controlo referido no artigo 7.o, n.o 1, deste anexo ou qualquer outra informação disponível parecesse indicar que as disposições deste anexo não eram respeitadas. Contudo, por um lado, este mesmo n.o 6 previa que a Comissão «pode participar» nos inquéritos que visassem detetar e evitar infrações às disposições que regem a emissão dos certificados EXP, sem que lhe fosse imposta uma obrigação a este respeito. Por outro lado, embora o artigo 7.o, n.o 7, do referido anexo previsse que os litígios decorrentes de tais inquéritos ou que suscitassem um problema de interpretação «serão submetidos» a um procedimento de regulação de diferendos, resulta dos próprios termos dessa disposição que esta visava apenas os litígios entre o Estado de importação e o PTU de exportação e, consequentemente, não se impunha à Comissão.

90

Por outro lado, contrariamente ao que o Reino Unido sustenta, as disposições relativas à concertação denominada «parceria» também não se opõem a que um Estado‑Membro possa ser responsabilizado, nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE, por uma emissão irregular de certificados EXP por parte das autoridades dos seus PTU. De facto, de acordo com a própria redação do artigo 234.o da Decisão PTU, a ação da União devia apenas apoiar‑se «tanto quanto possível» nessa concertação entre a Comissão, o Estado‑Membro a que o PTU se encontra sujeito e as autoridades locais competentes deste. Além disso, de acordo com o artigo 235.o, n.o 2, dessa decisão, «podem ser criados» grupos de trabalho de associação, a pedido, nomeadamente, dos PTU em questão, para tratar de todos os problemas que se coloquem entre os PTU e a União. Assim, embora seja certo que este processo de parceria, no presente caso, não foi aplicado, não deixa também de ser certo que a redação destas disposições indica que estas conferiam natureza facultativa a tal aplicação.

91

O terceiro argumento, relativo à autonomia constitucional de Anguila, também não pode proceder, uma vez que o Reino Unido não explica de que forma a responsabilidade de um Estado‑Membro pelos atos dos seus PTU, que não prejudica missões que a Decisão PTU confia a estes últimos, pode afetar a respetiva autonomia.

92

Importa ainda apreciar a questão de saber quais são os tipos de erros cometidos por um PTU no contexto da emissão de certificados EXP a título dos quais se pode responsabilizar o Estado‑Membro a que este se encontra sujeito.

93

A este respeito, resulta do princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de outubro de 2010, Stils Met, C‑382/09, EU:C:2010:596, n.o 44, e de 5 de dezembro de 2017, Alemanha/Conselho, C‑600/14, EU:C:2017:935, n.o 94).

94

Ora, atendendo ao caráter preferencial e derrogatório do regime aduaneiro de que beneficiavam os produtos não originários dos PTU, nas condições previstas no artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, lido em conjugação com o artigo 108.o, n.o 1, segundo travessão, bem como com o anexo III desta, a obrigação recordada no número anterior impõe‑se com especial rigor no presente caso. Por conseguinte, a responsabilidade perante a União que recai sobre o Estado‑Membro a que um PTU esteja sujeito alarga‑se, por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE, a qualquer erro que seja cometido pelas autoridades deste PTU, no contexto da emissão de certificados EXP. Assim, deve ser rejeitado o argumento do Reino Unido segundo o qual, em substância, este Estado‑Membro não pode ser responsabilizado pela eventual emissão irregular de certificados EXP por parte das autoridades de Anguila, pelo facto de a referida emissão ser anterior à clarificação, efetuada através da Decisão REC 03/2004, do alcance das exigências previstas no artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU.

95

Atendendo a todas estas considerações, há que concluir que o Reino Unido, por força das obrigações que lhe incumbem na qualidade de Estado‑Membro nos termos do artigo 131.o, primeiro parágrafo, do Tratado CE (que passou a artigo 182.o, primeiro parágrafo, CE e, em seguida, a artigo 198.o, primeiro parágrafo, TFUE) e do artigo 4.o, n.o 3, TUE, é responsável, perante a União, por uma eventual emissão por parte das autoridades de Anguila de certificados EXP em violação da Decisão PTU [v., por analogia, acórdão hoje proferido, Comissão/Países Baixos (Responsabilidade por atos de um PTU), C‑395/17, n.o 97].

Quanto à obrigação de compensar uma eventual perda de recursos próprios, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 3, TUE

96

É jurisprudência constante que, por força do princípio da cooperação leal, os Estados‑Membros são obrigados a eliminar as consequências ilícitas decorrentes de uma violação do direito da União. Por conseguinte, compete às autoridades dos Estados‑Membros adotar, no âmbito das suas competências, todas as medidas necessárias para sanar uma violação deste direito (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de junho de 2007, Jonkman e o., C‑231/06 a C‑233/06, EU:C:2007:373, n.os 37 e 38, de 26 de julho de 2017, Comune di Corridonia e o., C‑196/16 e C‑197/16, EU:C:2017:589, n.o 35 e jurisprudência referida, bem como de 27 de junho de 2019, Belgisch Syndicaat van Chiropraxie e o., C‑597/17, EU:C:2019:544, n.o 54).

97

Na medida em que a emissão de um certificado EXP em violação do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU impede, nas condições previstas no artigo 220.o, n.o 2, alínea b), e no artigo 239.o do Código Aduaneiro, as autoridades do Estado‑Membro de importação em causa de cobrarem os direitos aduaneiros que deviam ter cobrado se tal certificado EXP não tivesse sido emitido, a perda de recursos próprios tradicionais da União que daí resulta constitui a consequência ilícita de uma violação do direito da União. Com efeito, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, tal perda deve ser compensada quer com outro recurso próprio, quer com uma adaptação das despesas (v., por analogia, Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.o 54, e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, EU:C:2006:637, n.o 88).

98

Por conseguinte, o Estado‑Membro que é responsável, perante a União, pela emissão irregular de tal certificado está obrigado, em conformidade com o princípio da cooperação leal, a adotar todas as medidas necessárias para sanar essa violação do direito da União e, em especial, deve compensar a perda de recursos próprios daí resultante [v., por analogia, acórdão hoje proferido, Comissão/Países Baixos (Responsabilidade por atos de um PTU), C‑395/17, n.o 100].

99

No que se refere, mais especificamente, à questão de saber se ao montante de tal perda de recursos próprios devem, se for caso disso, acrescer juros de mora, basta salientar que a mera compensação do montante dos direitos aduaneiros que não puderam ser cobrados não é suficiente para eliminar as consequências ilícitas da emissão irregular de um certificado EXP.

100

Esta interpretação não pode ser posta em causa pelo argumento relativo ao princípio de segurança jurídica invocado pelo Reino Unido, segundo o qual tal obrigação de compensação não pode existir quando não exista uma disposição expressa a este respeito no direito da União. Com efeito, a obrigação de compensar a perda de recursos próprios resultante da emissão irregular de certificados EXP constitui apenas uma expressão específica da obrigação, resultante do princípio da cooperação leal, segundo a qual os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas necessárias para sanar uma violação do direito da União e eliminar as respetivas consequências ilícitas. Como resulta da jurisprudência constante recordada no n.o 96 do presente acórdão, esta última obrigação abrange todas as consequências ilícitas decorrentes de uma violação desse direito, nomeadamente as que são de natureza financeira, como as que estão em causa no presente caso.

101

Contudo, os juros de mora só são calculados a partir da data do pedido apresentado ao Estado‑Membro em questão que visa compensar a perda de recursos próprios.

102

Atendendo a todas estas considerações, há que concluir que o Estado‑Membro que é responsável perante a União pela emissão irregular de certificados EXP por um PTU a ele sujeito está obrigado, em conformidade com o princípio da cooperação leal, a compensar uma eventual perda de recursos próprios, acrescida, se for caso disso, de juros de mora.

Quanto ao incumprimento imputado

103

A Comissão sustenta que, no decurso do ano de 1999, as autoridades de Anguila emitiram doze certificados EXP em violação do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU, que esta emissão irregular causou à União uma perda de recursos próprios e que o Reino Unido não cumpriu a sua obrigação de compensar essa perda.

104

No que se refere, em primeiro lugar, à alegada irregularidade dos certificados EXP em causa, a Comissão alega que as Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004, bem como o relatório do OLAF de 2003, são suficientes para demonstrar tal irregularidade. Em contrapartida, segundo o Reino Unido, recai sobre a Comissão o ónus de provar, para efeitos da presente ação por incumprimento, o caráter irregular de cada um desses certificados.

105

A este respeito, relativamente às Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004, há que recordar que, de acordo com os artigos 875.o e 908.o, n.o 3, do regulamento de aplicação, quando a Comissão adote, por força dos artigos 873.o e 907.o deste regulamento, uma decisão que determine que a situação analisada permite que não se proceda ao registo de liquidação a posteriori dos direitos em causa, a Comissão pode especificar as condições em que os Estados‑Membros podem adotar uma decisão análoga nos casos em que existam elementos de facto e de direito comparáveis (v., neste sentido, Acórdão de 26 de outubro de 2017, Aqua Pro, C‑407/16, EU:C:2017:817, n.o 68).

106

As Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004 constituem decisões que comportam tais determinações. Nestas decisões, a Comissão concluiu que as autoridades de Anguila e de São Pedro e Miquelão tinham pago, nos períodos em questão, uma «ajuda para o transporte» que ascendia a um montante de 25 USD por tonelada de alumínio aos operadores económicos que tinham procedido, primeiro, à colocação em livre prática de alumínio nesses PTU e, em seguida, à reexportação dessa mercadoria para a União. A Comissão considerou que, nestas circunstâncias, o pagamento de tal ajuda apresentava um nexo com o pagamento anterior dos direitos aduaneiros e constituía uma restituição parcial destes direitos, do que resulta que os certificados EXP emitidos pelas referidas autoridades contrariam o artigo 101.o, n.o 2, segundo travessão, da Decisão PTU. Segundo as apreciações constantes das referidas decisões, a existência de uma «ajuda para o transporte» que revista tais características foi identificada como sendo o elemento determinante para concluir pela violação desta disposição.

107

Ora, segundo a jurisprudência, as apreciações de facto e de direito constantes de uma decisão, como as Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004, impõem‑se a todos os órgãos do Estado‑Membro que seja destinatário desta e, nas condições definidas pela Comissão, aos órgãos dos outros Estados‑Membros, nos casos em que se apresentem elementos de facto e de direito comparáveis (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de novembro de 2008, Heuschen & Schrouff Oriental Foods Trading, C‑375/07, EU:C:2008:645, n.o 64 e jurisprudência referida, e de 26 de outubro de 2017, Aqua Pro, C‑407/16, EU:C:2017:817, n.o 69).

108

Além disso, há que recordar que, quando um relatório do OLAF contenha elementos relevantes no que diz respeito, nomeadamente, ao comportamento das autoridades aduaneiras do PTU de exportação, esse relatório pode ser tomado em consideração para apurar se um determinado caso apresenta elementos de facto e de direito comparáveis àquele que foi objeto de uma decisão da Comissão adotada ao abrigo dos artigos 873.o e 907.o do regulamento de aplicação (v., neste sentido, Acórdão de 26 de outubro de 2017, Aqua Pro, C‑407/16, EU:C:2017:817, n.os 55 e 70).

109

No presente caso, importa salientar que a Decisão REC 03/2004 e o relatório do OLAF de 2003 dizem respeito às práticas aduaneiras do mesmo PTU, ou seja, Anguila. Além disso, este relatório constatou, no seu ponto 4.2, que os procedimentos aduaneiros em vigor em Anguila e, não obstante uma alteração das referências constantes das faturas enviadas pela Corbis às autoridades desse PTU, a concessão de um incentivo económico pago aos importadores da União sob a forma de uma «ajuda para o transporte», não se alteraram no decurso dos anos de 1998 e de 1999. Além disso, os certificados EXP em causa foram todos emitidos no decurso do ano 1999 pelas autoridades de Anguila a favor de empresas que o ponto 4.3 do referido relatório identificou serem beneficiárias daquela ajuda.

110

Assim, as constatações que figuram no relatório do OLAF de 2003 permitem demonstrar que as autoridades de Anguila tinham emitido os certificados EXP em causa em simultâneo com a concessão de tal «ajuda para o transporte». Por conseguinte, baseando‑se neste relatório, a Comissão expôs detalhadamente, no âmbito da presente ação, que estes certificados tinham sido emitidos numa situação que apresentava elementos de facto e de direito comparáveis com a situação que foi objeto da Decisão REC 03/2004.

111

Ora, embora, no âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, incumba à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado, fornecendo ao Tribunal de Justiça todos os elementos necessários à verificação, por parte deste, desse incumprimento, sem se poder basear numa qualquer presunção, quando a Comissão tenha fornecido elementos suficientes que revelem que as disposições do direito da União não são corretamente aplicadas, na prática, no território do Estado‑Membro demandado, cabe a este Estado‑Membro contestar de modo substancial e pormenorizado os elementos assim apresentados e as consequências que daí decorrem (v., neste sentido, Acórdão de 28 de janeiro de 2016, Comissão/Portugal, C‑398/14, EU:C:2016:61, n.os 47 e 48 e jurisprudência referida).

112

Esta jurisprudência pode ser transposta para uma situação como a que caracteriza o presente processo, conforme decorre da conclusão formulada no n.o 95 do presente acórdão. Consequentemente, uma vez que, como resulta do n.o 110 do presente acórdão, a Comissão explicou de forma detalhada, baseando‑se no relatório do OLAF de 2003, que os certificados EXP em causa tinham sido emitidos numa situação que apresentava elementos de facto e de direito comparáveis com a que foi objeto da Decisão REC 03/2004, a Comissão não estava obrigada a apresentar, para este efeito, uma prova específica no que diz respeito a cada um destes certificados. Pelo contrário, nestas condições, incumbia ao Reino Unido contestar de modo substancial e pormenorizado as conclusões constantes desse relatório.

113

Ora, há que observar que, no presente caso, o Reino Unido não satisfez esta exigência. De facto, ao limitar‑se a formular alegações gerais, como as que são expostas no n.o 66 do presente acórdão, não apresentou nenhum elemento concreto que pusesse em causa a constatação, acolhida nomeadamente na Decisão REC 03/2004, segundo a qual a ajuda para o transporte que, de acordo com as conclusões que figuram do relatório do OLAF de 2003, tinha sido concedida no âmbito da emissão dos certificados EXP em causa devia ser considerada uma restituição parcial de direitos aduaneiros.

114

Nestas condições, está demonstrado de forma juridicamente bastante que os certificados EXP em causa foram emitidos pelas autoridades de Anguila em violação do artigo 101.o, n.o 2, da Decisão PTU.

115

Para demonstrar, em segundo lugar, que a emissão irregular dos certificados EXP em questão conduziu a uma perda de recursos próprios, a Comissão juntou aos autos, para além destes certificados, nomeadamente, declarações de importação que lhe tinham sido transmitidas pelas autoridades italianas. O Reino Unido contesta que esses documentos possam comprovar a realidade da perda de recursos próprios invocada pela Comissão.

116

A este respeito, é facto assente entre as partes que a importação de alumínio que é objeto da Decisão REC 03/2004 foi efetuada com base na apresentação dos certificados EXP em causa às autoridades italianas. Além disso, as indicações que constam destes certificados e estas declarações de importação evidenciam que, com exceção de dois casos, os referidos certificados foram todos apresentados às autoridades italianas para efeitos de importação na União de alumínio com isenção de direitos aduaneiros. De facto, a descrição idêntica da mercadoria em causa e da sua origem, a identidade do navio utilizado e da empresa que atuava como importador da União e, em especial, o facto de as referidas declarações de importação mencionarem o número de referência dos referidos certificados EXP demonstram que estes foram efetivamente apresentados àquelas autoridades.

117

Assim, com exceção de dois casos, a Comissão concluiu, baseando‑se nos certificados EXP em causa e nas declarações de importação, que todos estes certificados EXP tinham sido apresentados às autoridades italianas.

118

Embora a Comissão tenha admitido, em resposta a uma questão do Tribunal de Justiça, que os documentos anexos à sua petição não abrangem todas as importações de alumínio que invoca na sua ação por incumprimento, importa salientar que a petição da Comissão não contém um pedido quantificado. De resto, na audiência, a Comissão sublinhou que através da sua ação visa que seja constatado que o Reino Unido não cumpriu a sua obrigação de cooperação leal quando recusou, por princípio, proceder a qualquer compensação da perda de recursos próprios resultante da emissão irregular dos certificados EXP em causa, independentemente do montante dessa perda.

119

Uma vez que é facto assente que o Reino Unido não procedeu a nenhuma compensação desta natureza, não há que identificar, para efeitos do presente processo, todas as importações de alumínio efetuadas na União através da apresentação dos certificados EXP em causa nem o montante da perda de recursos próprios que daí resultou.

120

No que diz respeito à questão de saber se da emissão dos certificados EXP em causa resultou, necessariamente, uma perda de recursos próprios, há que observar que estes certificados EXP, emitidos de forma irregular, levaram as autoridades italianas a autorizar a importação na União de alumínio proveniente de Anguila com isenção de direitos aduaneiros e a adotar decisões de dispensa do pagamento e de restituição dos direitos aduaneiros.

121

O Reino Unido contesta a existência de um nexo de causalidade entre a emissão irregular dos certificados EXP em causa e esta perda de recursos próprios. Sustenta, no essencial, que as autoridades italianas podiam ter evitado essa perda se, por um lado, tivessem seguido as recomendações constantes da comunicação relativa à assistência mútua e se, por outro, tivessem verificado que as exigências relativas ao comportamento dos operadores em causa, especificadas no n.o 31 da Decisão REC 03/2004, não estavam preenchidas.

122

Contudo, a existência deste nexo de causalidade não pode ser posta em causa apenas pelo facto, invocado pelo Reino Unido, de que os operadores em causa teriam eventualmente renunciado à importação das mercadorias em causa na União se as autoridades italianas tivessem seguido as recomendações constantes da comunicação relativa à assistência mútua. Do mesmo modo, a alegação do Reino Unido segundo a qual as autoridades italianas deviam ter procedido à cobrança dos direitos aduaneiros se tivessem verificado que os operadores em causa não satisfaziam as exigências especificadas no n.o 31 da Decisão REC 03/2004 diz respeito a uma hipótese diferente da que se coloca no presente processo, no qual essas autoridades procederam, como se referiu, em substância, no n.o 47 do presente acórdão, à dispensa do pagamento ou à restituição dos direitos aduaneiros ao abrigo desta decisão.

123

Por outro lado, o Reino Unido alega que os princípios da segurança jurídica e da boa administração se opõem, no caso concreto, à possibilidade de declarar um incumprimento da obrigação de compensar essa perda, uma vez que a Comissão não pediu tal compensação num prazo razoável, de acordo com a jurisprudência decorrente do Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento (C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.o 48).

124

A este respeito, há que recordar que a jurisprudência decorrente do acórdão referido no número anterior diz respeito ao artigo 85.o‑B do regulamento de execução que fixa o momento em que começa a correr o prazo de prescrição de cinco anos do artigo 73.o‑A do regulamento financeiro na data em que termina o prazo comunicado ao devedor na nota de débito.

125

É certo que, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que, no silêncio dos textos aplicáveis, o princípio da segurança jurídica exige que a instituição em causa proceda a essa comunicação num prazo razoável, esclarecendo ainda que se deve presumir que o prazo de comunicação de uma nota de débito não é razoável quando essa comunicação seja efetuada depois de um período de cinco anos a contar do momento em que a instituição estava em princípio em condições de exigir o seu crédito (v., neste sentido, Acórdão de 13 de novembro de 2014, Nencini/Parlamento, C‑447/13 P, EU:C:2014:2372, n.os 48 e 49).

126

Contudo, sem que seja necessário analisar se o artigo 73.o‑A do regulamento financeiro e o artigo 85.o‑B do regulamento de execução se aplicam à obrigação de compensar uma perda de recursos próprios nos termos do artigo 4.o, n.o 3, TUE, como a que está em causa no caso em apreço, há que observar que a Comissão, em todo o caso, não ultrapassou o prazo de cinco anos para além do qual se deve presumir que o prazo de comunicação de uma nota de crédito não é razoável, segundo a jurisprudência decorrente do acórdão referido no número anterior. Com efeito, na medida em que, como resulta do artigo 875.o e do artigo 908.o, n.o 3, do regulamento de aplicação, competia às autoridades italianas aplicar as Decisões REC 03/2004 e REM 03/2004 e pronunciar‑se sobre a restituição ou a dispensa do pagamento dos direitos aduaneiros relativos a importações de alumínio provenientes de Anguila, a Comissão não podia pedir ao Reino Unido a compensação da perda de recursos próprios daí resultante antes de as autoridades italianas a informarem sobre as decisões que tinham adotado. Ora, é facto assente entre as partes que as autoridades italianas só forneceram esta informação à Comissão, conforme foi exposto no n.o 47 do presente acórdão, em 2006 e 2007. Por conseguinte, há que considerar que a Comissão respeitou o referido prazo quando pediu ao Reino Unido que procedesse a essa compensação no decurso do ano de 2010.

127

Consequentemente, há que constatar que o Reino Unido, por não ter compensado a perda de recursos próprios resultante da emissão irregular, à luz da Decisão PTU, por parte das autoridades de Anguila, de certificados EXP no que diz respeito a importações de alumínio provenientes de Anguila durante o período de 1999/2000, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

Quanto às despesas

128

Por força do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino Unido nas despesas e tendo este sido vencido, há que condená‑lo nas despesas.

129

Em aplicação do artigo 140.o, n.o 1, do mesmo Regulamento de Processo, segundo o qual os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas, o Reino dos Países Baixos suporta as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

Por não ter compensado a perda dos recursos próprios resultante da emissão irregular, à luz da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia, pelas autoridades de Anguila, de certificados de exportação EXP no que respeita a importações de alumínio provenientes de Anguila durante o período de 1999/2000, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do disposto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

 

2)

O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte é condenado nas despesas.

 

3)

O Reino dos Países Baixos suporta as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.