ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

26 de abril de 2018 ( *1 )

«Incumprimento de Estado — Proteção da natureza — Diretiva 2009/147/CE — Conservação das aves selvagens — Zona de proteção especial (ZPE) — Classificação em ZPE dos territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das aves mencionadas no anexo I da Diretiva 2009/147 — Zona importante para a conservação das aves (ZICA) — ZICA Rila — Classificação parcial da ZICA Rila como ZPE»

No processo C‑97/17,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, intentada em 24 de fevereiro de 2017,

Comissão Europeia, representada por P. Mihaylova e C. Hermes, na qualidade de agentes,

demandante,

contra

República da Bulgária, representada por E. Petranova e L. Zaharieva, na qualidade de agentes,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente de secção, A. Rosas, C. Toader (relatora), A. Prechal e E. Jarašiūnas, juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que, não tendo incluído a totalidade da zona importante para a conservação das aves (a seguir «ZICA») que cobre o maciço de Rila (a seguir «ZICA Rila») como zona de proteção especial (a seguir «ZPE»), a República da Bulgária não classificou em ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies enumeradas no anexo I da Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativa à conservação das aves selvagens (JO 2010, L 20, p. 7, a seguir «Diretiva Aves») e, consequentemente, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva.

Quadro jurídico

2

Em conformidade com o seu artigo 1.o, n.o 1, a Diretiva Aves diz respeito à conservação de todas as espécies de aves que vivem naturalmente no estado selvagem no território europeu dos Estados‑Membros ao qual é aplicável o Tratado FUE. Tem por objeto a proteção, a gestão e o controlo dessas espécies e regulamenta a sua exploração.

3

O artigo 4.o, n.os 1 e 2, desta diretiva dispõe:

«1.   As espécies mencionadas no anexo I são objeto de medidas de conservação especial respeitantes ao seu habitat, de modo a garantir a sua sobrevivência e a sua reprodução na sua área de distribuição.

Para o efeito, são tomadas em consideração:

a)

As espécies ameaçadas de extinção;

b)

As espécies vulneráveis a certas modificações dos seus habitats;

c)

As espécies consideradas raras, porque as suas populações são reduzidas ou porque a sua repartição local é restrita;

d)

Outras espécies necessitando de atenção especial devido à especificidade do seu habitat.

Tem‑se em conta, para proceder às avaliações, as tendências e as variações dos níveis populacionais.

Os Estados‑Membros classificam, nomeadamente, em [ZPE] os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação destas espécies na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente diretiva.

2.   Os Estados‑Membros tomam medidas semelhantes para as espécies migratórias não referidas no anexo I e cuja ocorrência seja regular, tendo em conta as necessidades de proteção na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente diretiva no que diz respeito às suas áreas de reprodução, de muda e de invernada e às zonas de repouso e alimentação nos seus percursos de migração. Com esta finalidade, os Estados‑Membros atribuem uma importância especial à proteção das zonas húmidas e muito particularmente às de importância internacional.»

4

Nos termos do artigo 12.o, n.os 1 e 2, desta diretiva:

«1.   Os Estados‑Membros enviam à Comissão, de três em três anos, a contar de 7 abril de 1981, um relatório sobre a aplicação das disposições nacionais adotadas por força da presente diretiva.

2.   A Comissão elabora, de três em três anos, um relatório de síntese com base nas informações referidas no n.o 1. A parte do projeto deste relatório relativa às informações fornecidas por um Estado‑Membro é transmitida para verificação às autoridades desse Estado‑Membro. A versão definitiva do relatório é comunicada aos Estados‑Membros.»

Procedimento pré‑contencioso

5

Na sequência de uma denúncia apresentada pela Bulgarsko druzhestvo za zashtita na ptitsite (Sociedade búlgara de proteção das aves) (a seguir «BDZP»), que é membro da organização não‑governamental BirdLife International, a Comissão em 6 de junho de 2008, enviou à República da Bulgária uma notificação para cumprir em que acusava esse Estado‑Membro de não ter classificado em ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, no que se refere a seis ZICA (Rila, Kaliakra, Tsentralen Balkan, Lomovete, Pirin e Zapadni Rodopi) e, consequentemente, de não ter cumprido as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.os 1 e 2, da Diretiva Aves.

6

Nas suas respostas à notificação para cumprir, a República da Bulgária negou qualquer incumprimento da Diretiva Aves, alegando, nomeadamente, que uma parte da ZICA Rila, neste caso, o Rilski manastir (mosteiro de Rila, Bulgária) tinha, entretanto, sido objeto de uma classificação suplementar como ZPE.

7

Não tendo ficado satisfeita com todas essas respostas, a Comissão, em 17 de outubro de 2014, enviou à República da Bulgária um parecer fundamentado em que a acusa de um incumprimento das obrigações previstas no artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva. Contudo, este parecer fundamentado referia‑se apenas à ZICA Rila, na medida em que, entretanto, a ZICA Kaliakra tinha sido objeto de um processo de infração específico, sobre o qual o Tribunal de Justiça se pronunciou no seu Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária (C‑141/14, EU:C:2016:8), e em que as ZICA Tsentralen Balkan, Lomovete, Pirin e Zapadni Rodopi tinham sido classificadas numa medida muito significativa em ZPE.

8

No que se refere à ZICA Rila, a Comissão declarou no seu parecer fundamentado que apenas 72% da sua superfície total tinha sido classificada como ZPE, o que tinha por efeito restringir a proteção de 17 espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves.

9

Em 15 de dezembro de 2014, a República da Bulgária respondeu ao parecer fundamentado, e em 7 de setembro de 2015 e em 3 de fevereiro de 2016, respetivamente, transmitiu informações complementares e uma atualização. Esse Estado‑Membro alegava, em substância, que a classificação de 72% da ZICA Rila em ZPE garantia «um nível máximo de proteção das espécies e dos seus habitats, descritos na ZICA», mas que, num espírito de cooperação, duplicaria os esforços para examinar a questão da ampliação da superfície da ZPE Rila.

10

Ao considerar que, não obstante as medidas adotadas, a República da Bulgária continuava a não cumprir as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves, a Comissão decidiu intentar a presente ação.

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

11

A República da Bulgária alega que a ação é inadmissível e invoca, em substância, dois argumentos em apoio da sua tese.

12

Em primeiro lugar, a República da Bulgária afirma que a Comissão alterou o objeto do litígio. Com efeito, ao passo que esta última a acusava, na notificação para cumprir, de não ter classificado como ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves, esta mesma instituição, no parecer fundamentado e nas conclusões da petição, baseou a sua acusação no facto de a totalidade da ZICA Rila não ter sido classificada como ZPE. Assim, a República da Bulgária não pôde cumprir as obrigações decorrentes do direito da União nem invocar os seus fundamentos de defesa contra as acusações formuladas.

13

A República da Bulgária sublinha que, ao ler a notificação para cumprir, ficou convencida de que lhe bastava garantir uma proteção suficiente das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves, de maneira que adotou as medidas necessárias para dar cumprimento à referida notificação para cumprir. Só depois de ter recebido o parecer fundamentado é que constatou que a Comissão a acusava na verdade de não ter classificado a totalidade do território da ZICA Rila como ZPE.

14

Em segundo lugar, a República da Bulgária considera que, tanto no parecer fundamentado como na petição, a Comissão não indicou corretamente o objeto do litígio nem apresentou de forma coerente e precisa as razões pelas quais considera que esse Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves.

15

Em particular, salienta que a Comissão se limitou a indicar genericamente que a classificação de apenas uma parte da ZICA Rila como ZPE tinha por efeito limitar a proteção de 17 espécies enumeradas no anexo I da Diretiva Aves sem, contudo, fornecer elementos suficientes que permitam identificar essas espécies.

16

Em resposta, a Comissão considera, no que respeita, em primeiro lugar, à alegada alteração do objeto do litígio, que as conclusões constantes da notificação para cumprir e do parecer fundamentado são idênticas e que não há nenhuma inadequação ou diferença entre os dois documentos. Alega que, durante o procedimento pré‑contencioso, tendo em conta os territórios suplementares que a República da Bulgária classificou em ZPE na sequência da notificação para cumprir, o objeto do litígio foi simplesmente limitado à parte residual não classificada da ZICA Rila.

17

No que respeita, em segundo lugar, à indicação alegadamente insuficiente do objeto do litígio, a Comissão observa que se baseou numa disposição precisa da Diretiva Aves e que forneceu a lista das 17 espécies de aves cuja conservação não era suficientemente garantida pelo facto de se ter classificado apenas uma parte da ZICA Rila como ZPE, bem como a lista das 9 espécies de aves consideravelmente afetadas por essa classificação incompleta.

Apreciação do Tribunal de Justiça

18

No que respeita à alegação relativa a uma alteração do objeto do litígio, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a notificação para cumprir tem por fim, por um lado, circunscrever o objeto do litígio e fornecer ao Estado‑Membro convidado a apresentar as suas observações os elementos necessários à preparação da sua defesa e, por outro, dar‑lhe a possibilidade de regularizar a situação antes de o processo ser submetido ao Tribunal de Justiça (Acórdãos de 28 de março de 1985, Comissão/Itália, 274/83, EU:C:1985:148, n.o 19, e de 7 de abril de 2011, Comissão/Portugal, C‑20/09, EU:C:2011:214, n.o 19 e jurisprudência referida). Com efeito, a possibilidade de o Estado‑Membro em causa apresentar as suas observações constitui, mesmo que este entenda não fazer uso dela, uma garantia essencial pretendida pelo Tratado FUE, e a sua observância é uma formalidade essencial da regularidade do processo de declaração de um incumprimento de um Estado‑Membro (Acórdão de 14 de abril de 2011, Comissão/Roménia, C‑522/09, EU:C:2011:251, n.o 16).

19

Contudo, embora o parecer fundamentado deva conter uma exposição coerente e detalhada das razões que levaram a Comissão à convicção de que o Estado‑Membro interessado não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado FUE, a notificação para cumprir não pode estar sujeita a exigências de precisão tão rigorosas, uma vez que esta só pode necessariamente consistir num primeiro resumo sucinto das acusações. Daqui resulta que nada impede a Comissão de pormenorizar, no parecer fundamentado, as acusações que já alegou de forma mais global na notificação para cumprir (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de abril de 2008, Comissão/Itália, C‑337/05, EU:C:2008:203, n.o 23, e de 13 de fevereiro de 2014, Comisssão/Reino Unido, C‑530/11, EU:C:2014:67, n.o 40).

20

No caso em apreço, há que salientar que, tanto na notificação para cumprir como no parecer fundamentado, a Comissão indicou expressamente que, não tendo classificado em ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, da referida diretiva.

21

A única diferença existente entre estes documentos reside no facto de que, na notificação para cumprir, a Comissão indicou que a República da Bulgária não cumpria a sua obrigação de classificar como ZPE todos territórios mais apropriados para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves, ao passo que, no parecer fundamentado e na petição, não tendo ficado satisfeita com os territórios classificados como tal por esse Estado‑Membro na sequência da notificação para cumprir, precisou o objeto do litígio, limitando‑o à parte residual não classificada da ZICA Rila.

22

Por conseguinte, tendo em conta que a totalidade da ZICA Rila figurava na lista dos territórios mais apropriados, em número e em extensão, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves, a República da Bulgária não tem fundamento para afirmar que a Comissão alterou o objeto do litígio.

23

No que diz respeito à alegação baseada na indicação supostamente insuficiente do objeto do litígio na petição, há que salientar que, nos termos do artigo 120.o, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça e da jurisprudência a ele relativa, a petição inicial deve indicar o objeto do litígio e conter a exposição sumária dos fundamentos. Esta indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir à parte demandada preparar a sua defesa e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. Daqui resulta que os elementos essenciais de facto e de direito em que se funda uma ação devem decorrer, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição e que os pedidos desta última devem ser formulados de forma inequívoca a fim de evitar que o Tribunal de Justiça decida ultra petita ou que não se pronuncie sobre uma acusação (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de janeiro de 2010, Comissão/República Checa, C‑343/08, EU:C:2010:14, n.o 26; de 15 de junho de 2010, Comissão/Espanha, C‑211/08, EU:C:2010:340, n.o 32; e de 15 de novembro de 2012, Comissão/Portugal, C‑34/11, EU:C:2012:712, n.o 44).

24

Além disso, é jurisprudência constante que o Tribunal de Justiça deve examinar se o parecer fundamentado e a ação apresentam as acusações de forma coerente e precisa, para permitir ao Tribunal de Justiça apreender exatamente o alcance da violação do direito da União imputada, condição necessária para poder verificar a existência do incumprimento alegado (Acórdão de 15 de novembro de 2012, Comissão/Portugal, C‑34/11, EU:C:2012:712, n.o 43 e jurisprudência referida).

25

No caso em apreço, há que salientar que, nas conclusões do parecer fundamentado e da petição, a Comissão indicou expressamente que a ação por incumprimento se baseava numa inobservância por parte da República da Bulgária das obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves.

26

Por outro lado, nos fundamentos do parecer fundamentado e da petição, a Comissão alegou que a classificação apenas parcial da ZICA Rila como ZPE tinha por efeito uma «restrição considerável» da proteção de 17 espécies de aves mencionadas no anexo I da referida diretiva, a saber o mocho‑de‑tengmalm (Aegolius funereus), a galinha‑do‑mato (Bonasa bonasia), a águia‑cobreira (Circaetus gallicus), o pica‑pau‑de‑dorso‑branco (Dendrocopos leucotos), o pica‑pau‑preto (Dryocopus martius), o falcão‑peregrino (Falco peregrinus), o mocho‑pigmeu (Glausidium passerinum), o pica‑pau‑tridáctilo (Picoides tridactylus), o tetraz (Tetrao urogallus), a águia‑real (Aquila chrysaetos), o noitibó‑da‑europa (Caprimulgus europaeus), o codornizão (Crex crex), o pica‑pau‑mediano (Dendrocopos medius), o bufo‑real (Bubo bubo), o picanço‑de‑dorso‑vermelho (Lanius collurio), a cotovia‑dos‑bosques (Lullula arborea), o falcão‑abelheiro (Pernis apivorus), precisando inclusive que as 9 primeiras espécies estavam «consideravelmente afetadas».

27

Assim, deve considerar‑se que a Comissão apresentou as suas acusações de forma coerente e precisa, na aceção da jurisprudência que figura nos n.os 23 e 24 do presente acórdão.

28

Por conseguinte, há que julgar a ação admissível.

Quanto ao mérito

Argumentos das partes

29

A Comissão alega que, não tendo classificado a totalidade da ZICA Rila como ZPE, a República da Bulgária não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves.

30

A este respeito, a Comissão sublinha a importância para a conservação das aves da parte da ZICA Rila não classificada como ZPE, critica o facto de determinadas espécies de aves estarem privadas da proteção que lhes garantiria uma classificação integral da ZICA Rila como ZPE, e defende a pertinência das provas apresentadas para demonstrar a necessidade dessa classificação integral.

31

Em primeiro lugar, no que diz respeito à parte da ZICA Rila não classificada como ZPE, que cobre a zona situada junto ao maciço de Rila em torno dos limites das ZPE Rila e Rilski manastir, a Comissão salienta o facto de uma proporção considerável desta parte, ou seja, 75%, ser constituída por florestas antigas, essencialmente de coníferas, propicias à conservação do mocho‑pigmeu, do mocho‑de‑tengmalm e do pica‑pau‑tridáctilo, dos quais se encontram nessas florestas as maiores populações nidificantes do país, por um lado, e da águia‑real, do tetraz, do falcão‑peregrino, do pica‑pau‑preto, do pica‑pau‑de‑dorso‑branco, do noitibó‑da‑europa e das galinhas‑do‑mato, por outro. Toda a ZICA Rila faz parte dos sítios prioritários, na Bulgária e ao nível da União, para estas espécies.

32

Além disso, em toda a ZICA Rila, encontram‑se 130 espécies diferentes, das quais 20 são mencionadas no anexo I da Diretiva Aves e 41 são de importância europeia no plano da conservação, entre as quais se encontra uma pertencente à categoria SPEC 1, como espécie ameaçada a nível global, 14 à categoria SPEC 2, como espécies com estatuto europeu desfavorável cuja maioria da população mundial se encontra na Europa, e 26 à categoria SPEC 3, como espécies com estatuto europeu desfavorável cuja maioria da população mundial se encontra fora da Europa.

33

A totalidade da ZICA Rila é de importância mundial como área representativa do bioma alpino, uma vez que três espécies de aves limitadas a esse bioma e características do mesmo, das quatro registadas pela República da Bulgária, estão aí presentes, a saber, a trepadeira‑dos‑muros, a gralha‑de‑bico‑amarelo e a ferreirinha‑alpina. O território da ZICA Rila é também um dos mais importantes da Europa para a conservação das populações de melro—da‑rochas, de pisco‑de‑peito‑ruivo, de tentilhão‑comum, de torcicolo, de melro‑de‑peito‑branco, de tordo‑comum, de melro‑preto, de estrelinha‑de‑poupa, de toutinegra‑de‑barrete‑preto e de pintarroxo.

34

Neste contexto, a Comissão indica que os habitats e a população das espécies mais afetadas se repartem tanto pela parte da ZICA Rila classificada em ZPE como pela não classificada. Uma vez que a República da Bulgária não apresentou outros dados científicos suscetíveis de justificar que apenas uma parte da ZICA Rila seja classificada como ZPE, a Comissão recorda que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o inventário das zonas importantes para a conservação das aves da Europa (a seguir «inventário ZICA») constitui a referência mais atualizada e mais precisa para a identificação dos sítios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves.

35

Em segundo lugar, a Comissão alega que a parte da ZICA Rila, classificada como ZPE é muito insuficiente no que se refere à área de distribuição da população nacional de espécies muito importantes mencionadas no referido anexo.

36

Em apoio deste argumento, a Comissão recorda que se baseia numa avaliação da base de dados relativa às aves para as 114 ZPE inicialmente propostas pela BDZP, efetuada pela Bulgarska Akademia na Naukite (Academia das Ciências Búlgara, Bulgária) (a seguir «BAN»), posteriormente revista na sequência de um relatório elaborado em 2008 por um grupo de trabalho nacional criado pelo Ministério do Ambiente e das Águas (a seguir «Ministério do Ambiente»).

37

A Comissão acrescenta que as suas análises também se baseiam em informações provenientes da base de dados fornecida pela República da Bulgária e nos formulários normalizados de dados relativos à ZPE Rila, igualmente fornecidos pelas autoridades búlgaras.

38

Para determinar a importância de um sítio para a população de uma determinada espécie, a Comissão explica que se baseou no limiar de 1% relativo à população nidificante regional ou nacional, utilizado pela BirdLife International. A fim de excluir os casos de presença acidental e os sítios que albergam as populações menos importantes, os sítios em causa devem igualmente acolher um número importante de populações das espécies e das subespécies em causa ao nível da União.

39

Em terceiro lugar, a Comissão precisa que a importância da parte da ZICA Rila não classificada como ZPE resulta também de outros documentos que destacam a necessidade de proceder à classificação de territórios suplementares desta ZICA.

40

A este respeito, a referida instituição salienta que a proposta de classificação como ZPE de toda a ZICA Rila figurava na ordem do dia de uma reunião de 11 de março de 2011 do Natsionalen savet po biologichno raznoobrazie (Conselho Nacional para a Biodiversidade, Bulgária) (a seguir «NSBR»), instituto recentemente criado no seio da BAN, e que a referida reunião foi organizada na sequência da redação, em 28 de dezembro de 2010, por esta última, de um relatório que continha argumentos a favor da designação de três novas ZPE no maciço de Rila, abrangendo quase integralmente o território da ZICA Rila ainda não classificado como ZPE, a saber, a ZPE Rilski manastir, a ZPE Rila Yug (Rila sul) e a ZPE Rila Sever (Rila norte). Estas duas últimas zonas foram fundidas posteriormente pelo Ministério do Ambiente numa única, designada ZPE Rila buffer.

41

Enquanto o NSBR aprovou a designação da ZPE Rilski manastir, o exame da proposta de inclusão da futura ZPE Rila buffer na rede «Natura 2000» foi adiado, sem que as autoridades búlgaras se opusessem à necessidade de classificar territórios suplementares da ZICA Rila como ZPE. Para o efeito, comprometeram‑se, na sua resposta ao parecer fundamentado, a debater a referida classificação no âmbito do NSBR no mês de março de 2015.

42

Com base num acordo celebrado com o Ministério do Ambiente, a BDZP submeteu uma nova proposta de designação da ZPE Rila buffer, que devia ter sido discutida na reunião do NSBR prevista para 22 de março de 2016. Entretanto, no decurso de reuniões técnicas organizadas entre os serviços da Comissão e as autoridades búlgaras competentes, bem como durante a apresentação de informações escritas no contexto do presente processo, a República da Bulgária deixou a Comissão à espera acerca da questão de uma nova classificação em ZPE, justificando o atraso com obstáculos administrativos e processuais.

43

Além disso, a Comissão recebeu da BDZP um projeto de formulário normalizado de dados elaborado pela BAN para a futura ZPE Rila buffer, devendo esta coincidir quase inteiramente com a parte ainda não classificada da ZICA Rila. Neste projeto atribuiu‑se uma importância ainda maior à zona não classificada para a conservação das espécies em causa.

44

A importância da parte da ZICA Rila ainda não classificada como ZPE para as espécies tipicamente florestais referidas no anexo I da Diretiva Aves, em especial o tetraz, o pica‑pau‑de‑dorso‑branco e o pica‑pau tridáctilo, resulta também dos novos planos de ação para estas espécies financiados pelo Ministério do Ambiente através do Programa Operacional «Ambiente» 2007‑2013.

45

Por último, no que respeita aos argumentos da República da Bulgária invocados durante o procedimento pré‑contencioso para justificar a classificação apenas parcial da ZICA Rila como ZPE, relativos, nomeadamente, ao direito de os Estados‑Membros estabelecerem uma hierarquia entre as diferentes prioridades, como o desenvolvimento socioeconómico e as condições geográficas do país, a falta de fiabilidade dos dados disponíveis, a vontade de respeitar um único calendário para a escolha das ZPE e dos sítios de importância comunitária e assegurar que estas zonas coincidam no máximo, a Comissão considera que estes argumentos não se baseiam em nenhum critério ornitológico e, portanto, não são pertinentes nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves.

46

Em sua defesa, a República da Bulgária alega, em substância, cinco argumentos.

47

Em primeiro lugar, a República da Bulgária sublinha que os Estados‑Membros dispõem de uma margem de apreciação quanto à escolha dos territórios mais apropriados para a classificação como ZPE.

48

Recorda que o simples facto de um sítio ser apropriado para a conservação de determinadas espécies não basta para fundamentar uma obrigação de classificar esse sítio como ZPE. As autoridades nacionais dispõem, a este respeito, de um melhor conhecimento da situação local. Além disso, a atualização dos dados científicos é necessária para determinar a situação das espécies mais ameaçadas e a das espécies que constituem um património comum da União para classificar em ZPE os territórios mais apropriados. A este respeito, uma presença muito limitada em número de populações de espécies em determinados territórios não é suficiente para os considerar os mais apropriados para a conservação das espécies em causa.

49

Recorda igualmente que, segundo a jurisprudência, os Estados‑Membros podem demonstrar através de elementos de prova científicos que as obrigações decorrentes do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves podem ser cumpridas classificando em ZPE outros territórios que não os resultantes do inventário das ZICA e abrangendo uma superfície total inferior à destes últimos (acórdão de 20 de março de 2003, Comissão/Itália, C‑378/01, EU:C:2003:176, n.o 18). Acrescenta que, com base na margem de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem na aplicação dos critérios ornitológicos para identificar os territórios mais apropriados à conservação das espécies enumeradas no anexo I da Diretiva Aves, fez uma distinção entre, por um lado, os territórios mais importantes para a conservação das espécies de aves em causa, referidas no artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva e, por outro, os territórios menos importantes que sofrem uma forte pressão antropogénica.

50

A República da Bulgária contesta o raciocínio da Comissão, segundo o qual as ZICA constituem necessariamente os territórios mais apropriados, em número e em extensão, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves. Segundo este Estado‑Membro, apesar do inventário ZICA constituir, na falta de provas científicas em contrário, um elemento de referência que permite apreciar se o Estado‑Membro classificou em ZPE territórios suficientes, em número e em extensão, para oferecer proteção a todas as espécies de aves enumeradas no anexo I da Diretiva Aves, esse inventário não é juridicamente vinculativo (Acórdão de 7 de dezembro de 2000, Comissão/França, C‑374/98,EU:C:2000:670, n.o 25). Por conseguinte, os Estados‑Membros poderiam respeitar as obrigações decorrentes do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves, classificando como ZPE territórios diferentes dos resultantes do inventário ZICA.

51

Em segundo lugar, a República da Bulgária alega que a Comissão desvirtuou os factos, as provas e os argumentos apresentados.

52

Assim, sustenta, em primeiro lugar, que incumbe à Comissão demonstrar que uma determinada área deve ser classificada como ZPE. Na petição, a Comissão afirma que a República da Bulgária não questiona a importância da ZICA Rila para a conservação das aves. Deste modo, a Comissão desvirtua os argumentos apresentados pela República da Bulgária durante o período pré‑contencioso. Com efeito, a presente ação não tem por objeto a importância da ZICA Rila para a conservação das aves. A República da Bulgária defende neste contexto que a classificação de 72% da ZICA Rila é suscetível de assegurar um nível máximo de proteção das espécies e dos seus habitats. Em seguida, a Comissão refere‑se, na sua petição, a dados que figuram numa tabela fornecida pela República da Bulgária nas informações adicionais do mês de julho de 2009 e extrai daí determinadas conclusões. Contudo, não é possível determinar em que dados precisos se baseia a Comissão a este respeito. Por último, segundo a Comissão, resulta dos dados e das análises disponíveis que há uma restrição da cobertura relativamente a 17 espécies de aves enumeradas no anexo I da Diretiva Aves. Ora, parece que as conclusões da Comissão se baseiam principalmente nas informações provenientes de organizações não‑governamentais, cuja atualidade e fiabilidade são duvidosas.

53

Em terceiro lugar, a República da Bulgária alega que a Comissão não fornece nenhum elemento de prova em apoio da sua ação. Sustenta que não há dados científicos irrefutáveis que demonstrem a necessidade de classificar a totalidade da ZICA Rila como ZPE e que os dados em que se baseia a ação da Comissão não são fiáveis ou não estão atualizados. Em março de 2014, a República da Bulgária comunicou à Comissão dados resultantes do relatório a que se refere o artigo 12.o da Diretiva Aves, relativos às espécies de aves em causa, dados esses que não foram tidos em consideração no parecer fundamentado nem na petição inicial. Esse Estado‑Membro comunica, a este respeito, uma série de dados que põem em causa a exatidão dos dados da BDZP utilizados pela Comissão, de modo que é necessário recolher dados científicos adicionais. Os próprios dados da BDZP suscitam dúvidas quanto à necessidade de classificar a totalidade da ZICA Rila como ZPE. Neste contexto, embora incumba à BDZP efetuar a seleção e a avaliação iniciais dos territórios que representam as ZICA na República da Bulgária, esta não apresentou as informações de que dispõe sobre os dados ornitológicos para os territórios situados fora das ZPE designadas às autoridades búlgaras competentes nem aos peritos científicos.

54

Por outro lado, a República da Bulgária considera que a Comissão não explicou o método e as análises que a levaram a concluir que a atual classificação de uma parte da ZICA Rila como ZPE é insuficiente. Refere, a este respeito, que não foram tidos em conta os dados mais recentes. A República da Bulgária sublinha igualmente que, na reunião do NSBR de 22 de março de 2016, os peritos manifestaram dúvidas quanto à oportunidade de classificar a totalidade da ZICA Rila como ZPE.

55

Além disso, a República da Bulgária afirma que os cálculos da Comissão não podem ser considerados exatos.

56

No que se refere ao critério de que se devem incluir os territórios que integram pelo menos 1% da população nidificante nacional de uma espécie, a República da Bulgária considera que este não é o único critério que pode e deve ser aplicado para identificar uma ZPE. O reduzido número de aves presentes em determinados territórios é um fator que também deve ser tido em consideração.

57

Por outro lado, contesta a falta de atualização dos dados utilizados pela Comissão resultantes do projeto de biótopo Corine Land Cover, que datam dos anos 1990 ou 2000, assinalando que existem dados mais recentes resultantes do referido projeto, que datam dos anos 2006 e 2012. A República da Bulgária considera que foram apresentados ao Ministério do Ambiente dados mais atuais no âmbito do projeto de plano de gestão do Parque Nacional Rila para os anos de 2015 a 2024. Além disso, considera que a Comissão não teve em consideração nem examinou, quer no parecer fundamentado quer na petição, os dados relativos às espécies de aves no que respeita às obrigações decorrentes do artigo 12.o da Diretiva Aves para os anos de 2008 a 2012.

58

Em quarto lugar, a República da Bulgária alega que, devido a dificuldades relacionadas com o processo interno, não foi possível proceder à classificação, ainda que parcial, como ZPE da parte da ZICA Rila ainda não classificada. Com efeito, o NSBR, que é competente para examinar as propostas de ZPE, não chegou a uma posição comum sobre a necessidade de tal classificação devido a contradições relativas aos dados científicos existentes e à sua fiabilidade insuficiente, bem como às divergências de posição entre os membros do NSBR sobre os critérios ornitológicos aplicáveis.

59

Em quinto lugar, no que diz respeito à compreensão dos argumentos da República da Bulgária, apresentada pela Comissão na sua petição, esse Estado‑Membro alega, em primeiro lugar, que, contrariamente à conclusão da Comissão, o possível desenvolvimento económico futuro na zona não classificada da ZICA Rila não era determinante na sua decisão de não classificar a totalidade da ZICA Rila como ZPE. A República da Bulgária alega que, em qualquer caso, dispõe do direito de estabelecer uma hierarquia das suas prioridades. Em segundo lugar, a razão da não classificação da ZPE Rila buffer inicialmente projetada não é, como sustenta a Comissão, a falta de fiabilidade dos dados disponíveis, mas a falta de dados atuais e inequívocos que demonstrem a necessidade da sua classificação. Em terceiro lugar, no que respeita à suposta vontade de respeitar um único calendário para a escolha das ZPE e dos sítios de importância europeia, a República da Bulgária salienta que não tinha invocado este argumento para justificar a não classificação integral da ZICA Rila como ZPE.

Apreciação do Tribunal de Justiça

60

Em primeiro lugar, há que recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves impõe aos Estados‑Membros a classificação como ZPE dos territórios que obedeçam aos critérios ornitológicos definidos por estas disposições (Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária, C‑141/14, EU:C:2016:8, n.o 27 e jurisprudência referida).

61

Em segundo lugar, os Estados‑Membros são obrigados a classificar como ZPE todos os locais que, em aplicação de critérios ornitológicos, se revelem os mais apropriados com vista à conservação das espécies em causa (Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária, C‑141/14, EU:C:2016:8, n.o 28 e jurisprudência referida).

62

Em terceiro lugar, relativamente à classificação parcial de determinadas regiões, o Tribunal de Justiça já declarou, por um lado, que a classificação em ZPE não pode resultar de um exame isolado do valor ornitológico de cada uma das superfícies em causa, mas deve ser efetuada com base na consideração dos limites naturais do ecossistema em causa e, por outro, que os critérios ornitológicos, em que a classificação deve assentar exclusivamente, devem ter fundamento científico (Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária, C‑141/14, EU:C:2016:8, n.o 30 e jurisprudência referida).

63

Para contestar a tese da Comissão segundo a qual a parte da ZICA Rila, classificada como ZPE é insuficiente, a República da Bulgária alega, antes de mais, que os Estados‑Membros gozam de uma margem de apreciação na aplicação dos critérios ornitológicos para identificar os territórios mais apropriados à conservação das espécies enumeradas no anexo I da Diretiva Aves.

64

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que a margem de apreciação de que gozam os Estados‑Membros na escolha dos territórios mais apropriados à classificação em ZPE não se refere à oportunidade de classificar em ZPE os territórios que se revelem os mais apropriados segundo critérios ornitológicos, mas apenas a aplicação destes critérios com vista à identificação dos territórios mais apropriados à conservação das espécies enumeradas no anexo I da Diretiva Aves (Acórdão de 14 de janeiro de 2016, Comissão/Bulgária, C‑141/14, EU:C:2016:8, n.o 29 e jurisprudência referida).

65

Como resulta da jurisprudência referida no número anterior, e como a Comissão sublinhou com razão, por um lado, se é verdade que os Estados‑Membros gozam de uma certa margem de apreciação no que respeita à escolha das ZPE, a decisão relativa à sua classificação e delimitação deve basear‑se apenas nos critérios ornitológicos definidos pela Diretiva Aves. Por conseguinte, ao ter estabelecido, a fim de identificar os territórios mais apropriados para a classificação em ZPE, uma distinção entre os territórios mais importantes para a conservação das espécies mencionadas no artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva e os territórios menos importantes e que sofrem uma forte pressão antropogénica, a República da Bulgária não se manteve dentro dos limites da margem de apreciação de que gozam os Estados‑Membros.

66

Por outro lado, uma vez que, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves, os Estados‑Membros classificam nomeadamente como ZPE os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação destas espécies, um Estado‑Membro não pode, por gozar de uma margem de apreciação no que respeita à escolha das ZPE, classificar como ZPE sítios cujo número e extensão total são manifestamente inferiores ao número e à extensão total dos sítios considerados os mais apropriados. (v., neste sentido, Acórdão de 19 de maio de 1998, Comissão/Países Baixos, C‑3/96, EU:C:1998:238, n.o 63).

67

Por conseguinte, a República da Bulgária não pode invocar a margem de apreciação de que gozam os Estados‑Membros para justificar a classificação apenas parcial como ZPE de territórios que, no seu conjunto, respondem aos critérios ornitológicos determinados pelo artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves.

68

Seguidamente, a República da Bulgária sustenta, em substância, que as provas apresentadas pela Comissão em apoio do alegado incumprimento não são cientificamente fiáveis e baseiam‑se em dados não atualizados.

69

A este propósito, importa recordar que, no âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, incumbe à Comissão demonstrar a existência do incumprimento alegado. A Comissão deve apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para este poder verificar a existência desse incumprimento, não podendo fundar‑se numa qualquer presunção (Acórdão de 21 de julho de 2016, Comissão/Roménia, C‑104/15, não publicado, EU:C:2016:581, n.o 83 e jurisprudência referida).

70

Todavia, esta instituição, que não dispõe de poderes próprios de investigação na matéria, dependente amplamente dos elementos fornecidos por eventuais denunciantes, por entidades privadas ou públicas ativas no território do Estado‑Membro em causa, bem como por esse mesmo Estado‑Membro. Do mesmo modo, qualquer documento oficial emitido pelas autoridades do Estado‑Membro em causa pode ser considerado uma fonte válida de informações para efeitos da instauração, pela Comissão, do processo previsto no artigo 258.o TFUE (Acórdão de 16 de julho de 2015, Comissão/Eslovénia, C‑140/14, não publicado, EU:C:2015:501, n.o 40 e jurisprudência referida).

71

No que se refere, em primeiro lugar, à alegada falta de fiabilidade dos dados científicos e jurídicos apresentados pela Comissão, há que salientar que esses dados, dos quais uma parte foi fornecida pelas próprias autoridades búlgaras, foram sujeitos, durante os anos de 2007 a 2010, a um conjunto de avaliações efetuadas pela BAN, pela BDZP e por grupos de trabalho ad hoc compostos por peritos que representavam as autoridades búlgaras, os meios académicos e as organizações não‑governamentais, e foram seguidamente objeto de debates e de atualizações em reuniões de peritos, no seio do NSBR.

72

Ora, resulta desses mesmos dados que a parte não classificada como ZPE da ZICA Rila, neste caso o sítio Rila buffer, constitui um habitat favorável a várias espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves. Além disso, toda a ZICA Rila é de importância primordial para um grande número dessas espécies, e os habitats das mais afetadas repartem‑se tanto pela parte da ZICA classificada em ZPE como pela que não o é.

73

Contrariamente ao argumento da República da Bulgária de que a Comissão não precisou o método nem as análises utilizados para cada uma das espécies em causa, há que constatar que esta instituição apresentou, na petição, elementos pertinentes quanto a esse método e às referidas análises, e apresentou, em especial, tabelas que evidenciam o grau de afetação para cada espécie em causa.

74

Do mesmo modo, no que se refere aos resultados das reuniões do NSBR de 11 de março de 2011 e de 22 de março de 2016, após as quais a República da Bulgária decidiu adiar a sua decisão sobre a eventual classificação do local Rila buffer como ZPE, há que observar que o NSBR não conseguiu chegar a um consenso quanto a esta classificação devido, por um lado, à oposição não dos peritos científicos mas dos funcionários dos diferentes ministérios implicados no processo, bem como dos presidentes de câmara e, por outro, aos condicionalismos relacionados com o procedimento interno relativo à classificação como ZPE.

75

Ora, o caráter insuficiente da classificação como ZPE da ZICA Rila não pode ser justificado por tais condicionalismos. Acresce que, como salienta a Comissão, além do facto de nenhum perito científico se ter oposto à classificação como ZPE do sítio Rila buffer, os funcionários municipais não forneceram nenhuma análise científica contra essa classificação, tendo‑se limitado a propor que sejam realizados novos estudos.

76

A este respeito, importa recordar que, embora seja verdade que qualquer classificação pressupõe que as autoridades competentes adquiriram, com base nos melhores conhecimentos científicos disponíveis, a convicção de que o sítio em causa integra os territórios mais apropriados para a proteção das aves, isso não significa, porém, que a obrigação de classificação continue, em geral, a ser inoperante enquanto essas autoridades não tiverem avaliado e verificado completamente os novos conhecimentos científicos (Acórdão de 13 de dezembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 63 e jurisprudência referida).

77

A República da Bulgária contesta igualmente a escolha feita pela Comissão de se basear no limiar de 1% relativo à população nidificante regional ou nacional, utilizado pela BirdLife International, para determinar a importância da ZICA Rila para as espécies de aves aí representadas.

78

Todavia, uma vez que é pacífico que a República da Bulgária não apresentou outros critérios ornitológicos, objetivamente verificáveis, face aos utilizados pela BirdLife International, esse limiar constitui, na falta de provas científicas contrárias, um elemento de referência que permite apreciar se esse Estado‑Membro devia ter classificado a totalidade da ZICA Rila como ZPE (v., neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, nos 53 e 54).

79

Daqui resulta que o argumento da República da Bulgária sobre a falta de fiabilidade dos dados utilizados pela Comissão não pode ser acolhido.

80

Em segundo lugar, deve também ser julgado improcedente o argumento da República da Bulgária de que existiam dados mais atuais que a Comissão ignorou, relativos a determinadas espécies, mencionados no n.o 57 do presente acórdão, que a classificação como ZPE do sítio Rila buffer visa alegadamente proteger.

81

É verdade que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a atualização de dados científicos é necessária para determinar a situação das espécies mais ameaçadas e das espécies que constituem património comum da União para classificar em ZPE os territórios mais apropriados e importa utilizar os dados científicos mais atualizados disponíveis no termo do prazo fixado no parecer fundamentado (Acórdão de 13 de dezembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 47).

82

No entanto, na falta de outros dados científicos atualizados suscetíveis de justificar uma classificação apenas parcial como ZPE da ZICO Rila, foi acertadamente que a Comissão considerou, na sua petição, que o inventário ZICA constitui a referência mais atualizada e mais precisa para apreciar se a República da Bulgária classificou um número e uma extensão suficientes de territórios como ZPE na aceção do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves (v., neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 67). Com efeito, esse inventário, apesar de não ser juridicamente vinculativo para os Estados‑Membros em causa, contém elementos de prova científica que permitem apreciar em que medida um Estado‑Membro respeitou a sua obrigação decorrente da referida disposição (v., neste sentido, Acórdão de 7 de dezembro de 2000, Comissão/França, C‑374/98, EU:C:2000:670, n.os 25 e 26).

83

Assim, o Tribunal de Justiça decidiu reiteradamente que, tendo em conta o caráter científico do inventário ZICA e a inexistência de elementos de prova científica apresentados por um Estado‑Membro para demonstrar que as obrigações decorrentes do artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves podiam ser cumpridas classificando como ZPE sítios que abrangessem uma superfície total inferior à resultante do referido inventário, este podia ser utilizado como elemento de referência que permite apreciar se um Estado‑Membro classificou como ZPE territórios suficientes em número e em extensão, na aceção deste artigo 4.o, n.o 1 (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de março de 2003, Comissão/Itália, C‑378/01, EU:C:2003:176, n.o 18, e de 13 de dezembro de 2007, Comissão/Irlanda, C‑418/04, EU:C:2007:780, n.o 52).

84

Ora, há que constatar que a República da Bulgária, que se limitou a destacar a necessidade de realizar estudos suplementares relativamente à ZICA Rila, não demonstrou, como resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, que podia cumprir as obrigações previstas no artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva Aves, classificando como ZPE sítios diferentes dos resultantes do inventário ZICA estabelecido pela BDZP para 2007, abrangendo uma superfície total inferior à destes últimos.

85

Além disso, os dados do relatório previsto no artigo 12.o dessa diretiva, que a Comissão também examinou, não revelam nenhum elemento suscetível de contradizer as conclusões da petição.

86

Resulta de todas as considerações que precedem que, não tendo incluído a totalidade da ZICA Rila como ZPE, a República da Bulgária não classificou os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva Aves, de modo que este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva.

Quanto às despesas

87

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da República da Bulgária e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) decide:

 

1)

Não tendo incluído a totalidade da zona importante para a conservação das aves que cobre o maciço de Rila como zona de proteção especial, a República da Bulgária não classificou os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação das espécies mencionadas no anexo I da Diretiva 2009/147/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de30 de novembro de 2009, relativa à conservação das aves selvagens, de modo que o este Estado‑Membro não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.o, n.o 1, desta diretiva.

 

2)

A República da Bulgária é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: búlgaro.