CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MANUEL CAMPOS SÁNCHEZ‑BORDONA

apresentadas em 27 de junho de 2018 ( 1 )

Processo C‑219/17

Silvio Berlusconi,

Finanziaria d’investimento Fininvest SpA (Fininvest)

contra

Banca d’Italia,

Istituto per la Vigilanza Sulle Assicurazioni (IVASS),

sendo intervenientes:

Ministero dell’Economia e delle Finanze,

Banca Mediolanum SpA,

Holding Italiana Quarta SpA,

Fin. Prog. Italia di E. Doris & C. s.a.p.a.,

Sirefid SpA,

Ennio Doris

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália)]

«Questão prejudicial — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Mecanismo Único de Supervisão — Aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito — Procedimentos administrativos mistos da União — Fiscalização jurisdicional dos processos administrativos mistos — Órgão jurisdicional competente para apreciar um recurso de atos adotados por uma autoridade nacional — Princípio do caso julgado»

1.

A união bancária constitui um dos marcos mais importantes do processo de integração europeia desde a introdução da moeda única. A sua articulação jurídica foi levada a cabo muito rapidamente, apesar da sua enorme complexidade técnica, como resposta à grande crise financeira de 2008.

2.

Os Estados‑Membros cederam às instituições da União competências relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito e à sua resolução quando confrontadas com problemas de solvabilidade. O Banco Central Europeu (a seguir «BCE») recebeu a maior parte dos poderes para exercer essas competências, transferidas pelos Estados‑Membros, cujas autoridades nacionais de supervisão continuam, contudo, a constituir um elemento fundamental do Mecanismo Único de Supervisão (a seguir «MUS») bancária.

3.

As normas da União que regulam o MUS estabeleceram diversos procedimentos administrativos nos quais intervêm o BCE e as autoridades nacionais de supervisão. Esses procedimentos não são uma novidade no direito da União: já existiam em matéria de fundos estruturais, no âmbito agrícola ou na nomeação dos membros do Parlamento Europeu, por exemplo. Na união bancária são utilizados com muito mais intensidade e frequência que noutras áreas.

4.

O presente litígio oferece ao Tribunal de Justiça a oportunidade de se pronunciar pela primeira vez (salvo erro da minha parte) sobre um destes novos procedimentos, que regula a autorização para adquirir ou para aumentar participações qualificadas em instituições de crédito.

5.

O problema suscitado no presente reenvio consiste em determinar a quem incumbe realizar a fiscalização jurisdicional dos atos adotados no âmbito de um procedimento dessa natureza. Concretamente, trata‑se de saber se certas propostas ou projetos de decisão que as autoridades nacionais de supervisão submetem ao BCE podem ser objeto de recurso nos órgãos jurisdicionais nacionais ou se, pelo contrário, o seu conteúdo e a subsequente decisão final do BCE podem apenas ser revistos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

I. Quadro jurídico

A.   Direito da União

6.

As seguintes normas do direito da União Europeia dizem respeito ao procedimento no âmbito do qual foram adotadas as decisões impugnadas no órgão jurisdicional de reenvio:

Os artigos 22.o e 23.o da Diretiva 2013/36/UE ( 2 ), que transpõe para o direito da União os acordos de Basileia III, adotados pelo Comité de Supervisão Bancária de Basileia, que atua no âmbito do Banco de Pagamentos Internacionais ( 3 ).

Os artigos 1.o, n.o 5, e 15.o do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 ( 4 ).

Os artigos 85.o a 87.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 ( 5 ).

1. Diretiva CRD IV

7.

Nos termos do artigo 22.o («Comunicação e apreciação de projetos de aquisição»):

«1.   Os Estados‑Membros exigem que as pessoas singulares ou coletivas que, individualmente ou em concertação (“proposto adquirente”) decidam adquirir ou aumentar, direta ou indiretamente, uma participação qualificada numa instituição de crédito de modo a que a sua percentagem de direitos de voto ou de participação no capital atinja ou ultrapasse 20%, 30% ou 50% ou que a instituição de crédito se transforme em sua filial (“projeto de aquisição”), comuniquem previamente por escrito às autoridades competentes da instituição de crédito em que pretendem adquirir ou aumentar uma participação qualificada o montante dessa participação e as informações relevantes, especificadas nos termos do artigo 23.o, n.o 4. […]

2.   As autoridades competentes devem confirmar por escrito ao proposto adquirente, com a maior brevidade e impreterivelmente no prazo de dois dias úteis, a receção da comunicação referida no n.o 1 ou das outras informações referidas no n.o 3.

[…]

3.   As autoridades competentes podem, durante o prazo de apreciação, se necessário, mas nunca depois do quinquagésimo dia útil desse prazo, solicitar as informações complementares que se revelem necessárias para completar a apreciação. Este pedido deve ser apresentado por escrito e especificar as informações complementares necessárias.

[…] Quaisquer outros pedidos das autoridades competentes para efeitos de completar ou clarificar as informações ficam ao critério dessas autoridades, mas não dão lugar à suspensão do prazo de apreciação.

[…]

5.   Se as autoridades competentes decidirem opor‑se ao projeto de aquisição, devem, no prazo de dois dias úteis a contar da conclusão da apreciação e sem ultrapassar o prazo de apreciação, informar por escrito o proposto adquirente da sua decisão e da respetiva fundamentação. Sem prejuízo do direito nacional, pode ser facultada ao público, a pedido do adquirente potencial, uma exposição adequada da fundamentação da decisão. Tal não impede que um Estado‑Membro autorize a autoridade competente a publicar essa informação sem que o proposto adquirente o solicite.

6.   Se, durante o prazo de apreciação, as autoridades competentes não se opuserem por escrito ao projeto de aquisição, este considera‑se aprovado.

7.   As autoridades competentes podem fixar um prazo máximo para a conclusão do projeto de aquisição e, se necessário, prorrogar esse prazo.

8.   Os Estados‑Membros não podem impor requisitos mais rigorosos do que os estabelecidos na presente diretiva para a comunicação às autoridades competentes nem para a aprovação por parte destas de aquisições diretas ou indiretas de direitos de voto ou de participações de capital.

[…]»

8.

O artigo 23.o («Critérios de apreciação») dispõe:

«1.   Na apreciação da comunicação prevista no artigo 22.o, n.o 1, e das informações a que se refere o artigo 22.o, n.o 3, as autoridades competentes devem, a fim de garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito objeto do projeto de aquisição e tendo em conta a influência provável do proposto adquirente na referida instituição de crédito, avaliar a honorabilidade deste último e a solidez financeira do projeto de aquisição de acordo com o seguinte conjunto de critérios:

a)

Idoneidade do adquirente potencial;

b)

Idoneidade, conhecimentos, competências e experiência, nos termos previstos no artigo 91.o, n.o 1, do membro do órgão de administração e do membro da direção de topo que dirigirão a atividade da instituição de crédito em resultado da aquisição proposta;

c)

Solidez financeira do proposto adquirente, designadamente em função do tipo de atividade exercida ou a exercer na instituição de crédito objeto do projeto de aquisição;

[…]

2.   As autoridades competentes só podem opor‑se ao projeto de aquisição se existirem motivos razoáveis para tal, com base nos critérios enunciados no n.o 1, ou se as informações prestadas pelo proposto adquirente forem incompletas.

[…]»

9.

Nos termos do n.o 1 do artigo 119.o («Sujeição das companhias financeiras a supervisão em base consolidada»):

«1.   Os Estados‑Membros adotam as medidas necessárias, sempre que tal se revele adequado, para incluir as companhias financeiras e as companhias financeiras mistas na supervisão em base consolidada.»

2. Regulamento MUS

10.

Nos termos do considerando 11:

«[…] Deverá portanto ser criada uma união bancária na União, assente num conjunto único de regras exaustivo e pormenorizado para os serviços financeiros no mercado interno como um todo, e composto de um mecanismo único de supervisão e de novos enquadramentos para a garantia de depósitos e a resolução. […]» No âmbito do MUS, este regulamento atribui ao BCE competências específicas para a supervisão prudencial das instituições de crédito.

11.

O artigo 1.o («Objeto e âmbito de aplicação») dispõe:

«O presente regulamento confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, com vista a contribuir para a segurança e a solidez das instituições de crédito e para a estabilidade do sistema financeiro na União e em cada Estado‑Membro, tendo plena e diligentemente em conta a unidade e a integridade do mercado interno, e por base a igualdade de tratamento das instituições de crédito com vista a evitar a arbitragem regulamentar.

[…]

O presente regulamento não prejudica as responsabilidades nem os poderes conexos das autoridades competentes dos Estados‑Membros participantes no exercício das atribuições de supervisão não conferidas ao BCE pelo presente regulamento.»

12.

O artigo 4.o dispõe:

«1.   No[s] termos do artigo 6.o, cabe ao BCE, de acordo com o n.o 3 do presente artigo, exercer em exclusivo, para fins de supervisão prudencial, as seguintes atribuições relativamente à totalidade das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes:

[…]

c)

Apreciar as notificações de aquisição e alienação de participações qualificadas em instituições de crédito, exceto no caso da resolução bancária e sob reserva do disposto no artigo 15.o;

[…]

3.   Para efeitos do exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento e com o objetivo de assegurar elevados padrões de supervisão, o BCE aplica toda a legislação aplicável da União e, no caso de diretivas, a legislação nacional que as transpõe. Caso a legislação aplicável da União seja constituída por regulamentos, e nos casos em que esses regulamentos concedam expressamente certas opções aos Estados‑Membros, o BCE deve aplicar também a legislação nacional relativa ao exercício dessas opções.

[…]»

13.

Nos termos do artigo 6.o, n.o 2, tanto o BCE como as autoridades nacionais competentes (a seguir «ANC») estão sujeitos ao dever de cooperação leal, bem como à obrigação de trocarem informações, e, sem prejuízo dos poderes do BCE para receber diretamente as informações comunicadas de forma contínua pelas instituições de crédito ou para ter acesso direto a essas informações, as autoridades nacionais competentes devem, em especial, fornecer ao BCE todas as informações necessárias para que este exerça as atribuições que lhe são conferidas pelo referido regulamento.

14.

O artigo 15.o («Avaliação das aquisições de participações qualificadas») tem a seguinte redação:

«1.   Sem prejuízo das isenções previstas no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), a notificação da aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito estabelecida num Estado‑Membro participante, ou as informações com ela relacionadas, são apresentadas às autoridades nacionais competentes do Estado‑Membro em que a instituição de crédito está estabelecida, nos termos dos requisitos estabelecidos na legislação nacional aplicável baseada nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo.

2.   A autoridade nacional competente avalia a aquisição proposta e envia ao BCE […] a notificação acompanhada de uma proposta de decisão de oposição ou de não oposição à aquisição, baseada nos critérios estabelecidos nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo; a autoridade nacional competente coadjuva ainda o BCE nos termos do artigo 6.o

3.   O BCE toma uma decisão de oposição ou de não oposição à aquisição com base nos critérios de avaliação estabelecidos na legislação aplicável da União e pelo procedimento e dentro dos prazos de avaliação nela previstos.»

3. Regulamento‑Quadro do MUS

15.

O Regulamento‑Quadro do MUS, adotado em conformidade com o artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento MUS, regula o âmbito de cooperação no MUS entre o BCE e as ANC.

16.

O artigo 85.o («Notificação às ANC da aquisição de uma participação qualificada») dispõe:

«1.   A ANC que receba uma notificação da intenção de aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito estabelecida no respetivo Estado‑Membro participante deve comunicar ao BCE essa notificação o mais tardar cinco dias úteis após a confirmação da sua receção de acordo com o previsto no artigo 22.o, n.o 2, da Diretiva 2013/36/UE.

2.   A ANC notificará o BCE caso tenha de suspender o período de avaliação devido a um pedido de informação adicional. A ANC enviará tal informação adicional ao BCE no prazo de cinco dias úteis a contar da receção da mesma.

3.   A ANC informará igualmente o BCE da data até à qual a decisão de oposição ou de não oposição à aquisição de uma participação qualificada deve ser comunicada ao requerente nos termos da legislação nacional aplicável.»

17.

O artigo 86.o («Avaliação de possíveis aquisições») dispõe:

«1.   A ANC à qual é reportada a intenção de adquirir uma participação qualificada numa instituição de crédito avaliará se essa aquisição cumpre todas as condições previstas na legislação nacional ou da União aplicável. Após essa apreciação, a ANC elaborará um projeto de decisão no sentido de o BCE se opor ou não à aquisição.

2.   A ANC apresentará ao BCE um projeto de decisão de oposição ou de não oposição à aquisição pelo menos 15 dias úteis antes do termo do prazo de avaliação definido pela legislação aplicável da União.»

18.

O artigo 87.o («Decisão do BCE sobre a aquisição») dispõe:

«O BCE decidirá se se dever opor ou não à aquisição com base na sua avaliação da aquisição proposta e do projeto de decisão da ANC. É aplicável o direito de audiência previsto no artigo 31.o»

B.   Direito italiano

1. Legislação relativa à supervisão financeira: Texto unificado bancário ( 6 )

19.

O artigo 19.o do TUB atribui à Banca d’Italia (a seguir «Banco de Itália») a competência para emitir as autorizações de aquisição de participações privilegiadas em instituições financeiras. Concretamente, o seu n.o 5 especifica que as autorizações são atribuídas quando se verificam as «condições necessárias para garantir uma gestão sã e prudente do banco, avaliando a qualidade potencial do adquirente e a solidez financeira do projeto de aquisição em conformidade com os seguintes critérios: a reputação do potencial adquirente na aceção do artigo 25.o».

20.

Nos termos do artigo 25.o, n.o 1 («Participações de capital»), os titulares das participações indicadas no artigo 19.o devem preencher requisitos de honorabilidade e satisfazer critérios de competência e de integridade que assegurem a gestão sã e prudente do banco ( 7 ).

21.

Transitoriamente, o artigo 2.o, n.o 8, do Decreto Legislativo n.o 72 de 2015 determinou que as normas anteriores relativas aos requisitos de honorabilidade dos titulares das participações em instituições financeiras continuavam a aplicar‑se.

22.

Essas normas constavam do Decreto ministerial n.o 144, de 18 de março de 1998 ( 8 ), cujo artigo 1.o precisa as condenações que se repercutem negativamente na idoneidade e que implicam o incumprimento do requisito.

23.

O artigo 2.o do Decreto n.o 144 de 1998, dispunha, de modo transitório, que, «para os participantes no capital de um banco à data de entrada em vigor do presente regulamento, o incumprimento de qualquer um dos requisitos do artigo 1.o que não estavam previstos na legislação anterior é irrelevante se se tiver verificado anteriormente à mesma data, e apenas em relação a participações já detidas».

24.

Quanto às sociedades financeiras mistas, o artigo 63.o do TUB submeteu os seus titulares de participações qualificadas às obrigações impostas aos titulares de participações qualificadas em instituições bancárias. O artigo 67.o‑A, n.o 2, do TUB dispõe que o Banco de Itália e o Istituto per la Vigilanza Sulle Assicurazioni (a seguir «IVASS») devem assegurar conjuntamente o respeito dessas obrigações quando as referidas sociedades têm a sua sede em Itália e são sociedades‑mãe de grupos financeiros italianos, na sua totalidade ou em parte.

2. Legislação relativa ao procedimento contencioso administrativo

25.

O procedimento contencioso administrativo italiano prevê o denominado «giudizio di ottemperanza» (ação de execução), no âmbito do qual o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália) apresentou as questões prejudiciais.

26.

Nos termos do artigo 21.o‑F, n.o 1, da Lei n.o 241, de 7 de agosto de 1990 ( 9 ), «[é] nulo o ato administrativo […] que viole o caso julgado […]».

27.

Nos termos do artigo 112.o, n.o 1, do Código do Procedimento Administrativo ( 10 ), «as medidas dos tribunais administrativos devem ser executadas pelas administrações públicas e pelas outras partes».

28.

O n.o 2 desta disposição dispõe:

«A ação executiva pode ser proposta para a aplicação:

[…]

c)

das decisões transitadas em julgado e outras medidas equiparáveis dos tribunais ordinários, com a finalidade de obrigar a administração pública a dar cumprimento, no que diz respeito aos processos concluídos, aos casos julgados.

[…]»

29.

Nos termos do artigo 114.o, n.o 4, alínea b), do Código do Procedimento Administrativo, o juiz a quem cabe decidir a ação de execução, em caso de procedência do recurso, «declara nulos os eventuais atos que violem o caso julgado».

30.

O artigo 2909.o do Código Civil italiano dispõe que as conclusões constantes de uma decisão transitada em julgado impõem‑se em todos os seus elementos às partes, aos seus herdeiros e aos seus sucessores.

II. Processo principal e questões prejudiciais

31.

Desde meados dos anos noventa, S. Berlusconi detinha, através da sua filial Fininvest, uma participação qualificada superior a 30% na Mediolanum SpA (a seguir «sociedade Mediolanum»). Esta última era uma sociedade financeira mista, cotada em bolsa e sociedade‑mãe do grupo financeiro Mediolanum, de que fazia parte a Banca Mediolanum SpA, detida a 100% pela sociedade Mediolanum.

32.

No acórdão n.o 35729/13, a Corte Suprema di Cassazione (Supremo Tribunal de Cassação, Itália) condenou S. Berlusconi, como autor de um crime de fraude fiscal, a uma pena de prisão de quatro anos (dos quais três foram perdoados) e às penas acessórias de inibição do exercício de funções públicas e de funções de direção em pessoas coletivas durante um período de dois anos. O acórdão transitou em julgado em 1 de agosto de 2013.

33.

Após a aprovação do Decreto Legislativo n.o 53 de 4 de março de 2014 ( 11 ), a Fininvest (por conta de S. Berlusconi) apresentou um pedido de autorização para deter participações qualificadas na sociedade Mediolanum.

34.

O Banco de Itália indeferiu o referido pedido com o acordo do IVASS, através da decisão n.o 976145/14, de 7 de outubro de 2014, declarando que S. Berlusconi não preenchia o requisito relativo à honorabilidade previsto para a detenção de participações qualificadas em intermediários financeiros.

35.

Além de indeferir o pedido, o Banco de Itália ordenou a suspensão dos direitos de voto e a alienação das participações (que excedessem o limiar de 9,999% previsto na lei) na sociedade Medionalum. Aceitou, contudo, a proposta da Fininvest de criar um trust para o qual transferir as participações em causa e fixou‑lhe um prazo de vinte dias para comunicar a sua adesão às condições formuladas para incorporação nesse trust.

36.

S. Berlusconi impugnou essa decisão no Tribunale Amministrativo Regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio, Itália), que negou provimento ao recurso através do seu acórdão n.o 7966/2015, de 5 de junho de 2015.

37.

S. Berlusconi interpôs recurso do referido acórdão (e a Fininvest um recurso a título incidental) para o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional). Nesse processo, o Banco de Itália alegou a falta de interesse em agir por parte dos recorrentes, após a fusão por «absorção inversa» entre a sociedade Mediolanum e a Banca Mediolanum.

38.

Com efeito, enquanto o referido litígio decorria, os conselhos de administração decidiram proceder a uma fusão por «absorção inversa» da sociedade Mediolanum pela Banca Mediolanum ( 12 ). Este projeto de fusão foi transmitido ao Banco de Itália em 26 de maio de 2015, para efeitos da sua autorização, em conformidade com o artigo 57.o do TUB. Consequentemente, a Fininvest tornou‑se titular de uma participação qualificada numa instituição financeira ( 13 ).

39.

Por decisão n.o 7969932/21, de 21 de julho de 2015, o Banco de Itália autorizou a fusão proposta. Uma nota, de 23 de julho de 2015, que remete para a referida decisão, confirmou a decisão de 7 de outubro de 2014, precisando que a obrigação de alienação estabelecida por essa medida devia entender‑se «às ações da Banca Mediolanum que, em consequência [da] fusão, fossem atribuídas [à Fininvest] em permuta das ações da [sociedade] Mediolanum».

40.

Por acórdão n.o 882/2016, de 3 de março de 2016, o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) julgou procedentes os recursos de S. Berlusconi e da Fininvest e anulou a decisão do Banco de Itália de 7 de outubro de 2014 ( 14 ).

41.

Para o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), a decisão de 7 de outubro de 2014 era ilegal por violação do princípio da não retroatividade, na medida em que alargava a participações anteriores à sua entrada em vigor as normas relativas à avaliação das participações qualificadas, introduzidas pela Diretiva 2007/44/CE ( 15 ) na Diretiva CRD. A Diretiva 2007/44 aplicava‑se às participações futuras, enquanto o artigo 2.o do Decreto n.o 144 de 1998 se referia às «participações já detidas» ( 16 ). Como os factos eram anteriores à entrada em vigor da nova regulamentação, não eram aplicáveis à Fininvest os requisitos de honorabilidade.

42.

Na nota n.o 491595/16, de 4 de abril de 2016, o Banco de Itália comunicou ao BCE que, na sequência da fusão da Banca Mediolanum e da sociedade Mediolanum, S. Berlusconi se tinha tornado acionista da instituição de crédito Banca Mediolanum através da sua filial Fininvest. Acrescentou que, após o Acórdão do Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) de 3 de março de 2016, tanto a obrigação de alienar a parte das suas ações que excediam 9,999% do capital do referido banco como a suspensão dos direitos de voto a ela associados tinham deixado de produzir efeitos. O Banco de Itália entendia, portanto, que a Fininvest devia apresentar um pedido de autorização relativo à sua participação qualificada na Banca Mediolanum, em conformidade com os artigos 22.o e seguintes da Diretiva CRD IV e os artigos 19.o e seguintes do TUB.

43.

Dando cumprimento às indicações do BCE (nota de 24 de junho de 2016), o Banco de Itália ordenou à Fininvest, em 14 de julho de 2016, que apresentasse um pedido de autorização no prazo de 15 dias. Uma vez que o referido pedido não foi apresentado, o Banco de Itália optou, em 3 de agosto de 2016, por dar início oficiosamente ao procedimento administrativo, precisando que a competência decisória nesta matéria era do BCE, em conformidade com o artigo 4.o do Regulamento MUS.

44.

Uma vez recebida a documentação da Fininvest, o Banco de Itália enviou ao BCE, em aplicação do artigo 15.o, n.o 2, do Regulamento MUS, uma proposta de decisão com um parecer desfavorável acerca da reputação dos compradores, convidando o BCE a opor‑se à aquisição.

45.

O Conselho de Supervisão do BCE acolheu os argumentos do Banco de Itália e aprovou um projeto de decisão, que enviou à Fininvest e a S. Berlusconi para que estes apresentassem observações. Uma vez cumprido este trâmite, o referido conselho aprovou a decisão de 25 de outubro de 2016 ( 17 ), sem que o Conselho do BCE suscitasse posteriormente objeções.

46.

Nessa decisão, o BCE considerou que havia dúvidas fundadas quanto à honorabilidade dos adquirentes da participação na Banca Mediolanum. Tendo em conta que S. Berlusconi, acionista maioritário e proprietário efetivo da Fininvest, era o adquirente indireto da participação na Banca Mediolanum e que tinha sido condenado por decisão transitada em julgado a quatro anos de prisão por fraude fiscal, o BCE entendeu que não cumpria a exigência de honorabilidade imposta pela legislação nacional aos titulares de participações qualificadas. Além disso, S. Berlusconi havia cometido outras irregularidades e tinha sido objeto de outras condenações, tal como outros membros dos órgãos de direção da Fininvest.

47.

Atendendo a todas as considerações anteriores, o BCE deduziu que os adquirentes da participação qualificada na Banca Mediolanum não cumpriam a exigência de honorabilidade e que existiam sérias dúvidas quanto à sua capacidade para assegurar no futuro uma gestão sã e prudente dessa instituição financeira. Consequentemente, o BCE opôs‑se à aquisição pela Fininvest e por S. Berlusconi da participação qualificada na Banca Mediolanum.

48.

A Fininvest e S. Berlusconi impugnaram a decisão BCE de 2016 utilizando três vias judiciais:

Interpuseram um recurso ( 18 ) no Tribunal Geral, cuja instância se encontra suspensa na pendência da decisão do presente reenvio prejudicial.

A Fininvest recorreu também para o Tribunale Amministrativo Regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio) para obter a anulação dos atos do Banco de Itália preparatórios da Decisão do BCE.

Intentaram no Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) uma ação de «ottemperanza» (ação de execução), alegando que os referidos atos eram nulos por violação do acórdão transitado em julgado n.o 882/2016, de 3 de março de 2016.

49.

O Banco de Itália alega que o tribunal nacional não possui competência para apreciar o presente recurso, que tem por objeto atos preparatórios, desprovidos de conteúdo decisório e destinados à adoção de uma decisão da competência exclusiva do BCE. A decisão final desta última instituição da União só pode ser sujeita à fiscalização do Tribunal de Justiça.

50.

Após apensar os recursos de S. Berlusconi e da Fininvest, o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) sublinhou que não existem precedentes específicos do Tribunal de Justiça relativos à repartição de competências entre o juiz nacional e o juiz da União nos litígios sobre a ilegalidade dos atos das ANC praticados no âmbito deste tipo de procedimentos. Entende, também, que a questão é objetivamente controvertida, uma vez que inclui elementos quer de um processo unitário (tese do Banco de Itália) quer de um processo misto (tese de S. Berlusconi e da Fininvest). Sublinha, em todo o caso, que a fase processual que decorre perante a autoridade nacional não termina com um ato vinculativo para a autoridade europeia competente para tomar a decisão definitiva.

51.

Neste contexto, o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) submete ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«Deve o disposto nos artigos 263.o, primeiro, segundo e quinto parágrafos, conjugado com o artigo 256.o, n.o 1, [TFUE], ser interpretado no sentido de que é da competência do juiz da União, ou antes da competência do juiz nacional, um recurso interposto contra [os atos] de [abertura], de instrução e de proposta não vinculativa [adotados] pela Autoridade Nacional Competente (melhor especificadas no [n.o 1] do presente despacho) no âmbito do [procedimento] previsto nos artigos 22.o e 23.o da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, [nos] artigos 1.o, [n.o 5, 4.o, n.o 1, alínea c),] e 15.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, [nos] artigos 85.o, 86.o e 87.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, bem como [nos] artigos 19.o, 22.o e 25.o do [TUB] italiano?

Em particular, pode [invocar‑se] a competência jurisdicional do juiz da União, quando contra [esses atos não] tenha sido proposta [uma] ação geral de anulação, mas [sim uma] ação de nulidade por alegada violação […] do caso julgado [produzido] pelo acórdão n.o 882/2016, de 3 de março de 2016, do Consiglio di Stato [Conselho de Estado, em formação jurisdicional], exercida no âmbito de [uma ação] de execução de sentença, nos termos dos artigos 112.o e [seguintes] do Código de [Procedimento] Administrativo italiano — ou seja, no âmbito de um instituto peculiar do ordenamento processual administrativo nacional —, cuja decisão pressupõe a interpretação e a determinação, segundo as regras do direito nacional, dos limites objetivos do caso julgado produzido por aquele acórdão?»

III. Análise das questões prejudiciais

52.

As questões prejudiciais submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio exigem, tal como argumentou a Comissão, uma ligeira reformulação para que o Tribunal de Justiça lhes possa dar resposta de modo adequado.

53.

Em princípio, segundo jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça não é competente para fiscalizar, no âmbito dos recursos de anulação do artigo 263.o TFUE, a legalidade dos atos adotados pelas autoridades nacionais ( 19 ).

54.

Por esse motivo, deve entender‑se que o órgão jurisdicional de reenvio pretende esclarecer, com a sua primeira questão, se a competência exclusiva que o artigo 263.o TFUE atribui ao Tribunal de Justiça para fiscalizar a legalidade dos atos da União impede os órgãos jurisdicionais nacionais de fiscalizarem a legalidade dos atos nacionais de abertura, de instrução e de proposta não vinculativa adotados por uma ANC no âmbito do procedimento previsto nos artigos 4.o, n.o 1, alínea c), e 15.o do Regulamento MUS e nos artigos 85.o, 86.o e 87.o do Regulamento Quadro do MUS, procedimento que termina com uma decisão vinculativa do BCE.

55.

Com a segunda questão prejudicial, subsidiária da anterior, o órgão jurisdicional pretende saber se o Tribunal de Justiça é competente para fiscalizar a legalidade dos atos nacionais preparatórios da decisão final do BCE, quando os referidos atos são impugnados, não através da «ação geral de anulação», mas sim de uma ação (específica) de nulidade por alegada violação do caso julgado produzido pela decisão de um tribunal nacional, ação essa que foi exercida no decurso de um «giudizio di ottemperanza».

56.

Antes de analisar ambas as questões prejudiciais, considero ser necessário:

rever a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à fiscalização jurisdicional dos atos praticados no âmbito de procedimentos administrativos compostos ou mistos, nos quais intervêm instituições da União e autoridades nacionais dos Estados‑Membros; e

expor as características do procedimento administrativo aplicado pelo BCE e as ANC às autorizações de aquisições ou de aumentos de participações qualificadas em instituições de crédito.

A.   Fiscalização jurisdicional dos atos praticados nos procedimentos administrativos compostos ou mistos no direito da União

57.

A aplicação do direito da União compete, regra geral, às autoridades dos Estados‑Membros. Quando estas atuam mediante procedimentos administrativos de direito interno, a revisão dos seus atos é da competência dos órgãos jurisdicionais nacionais, que dispõem da possibilidade de interrogar por via prejudicial o Tribunal de Justiça. Num número reduzido de matérias, normalmente de competência exclusiva da União, a aplicação administrativa do direito da União é direta e realizada pelas suas instituições, órgãos ou organismos, que seguem os seus próprios procedimentos sob a fiscalização jurisdicional do Tribunal Geral e do Tribunal de Justiça.

58.

Ora, há cada vez mais situações em que o direito da União é aplicado mediante procedimentos em que intervêm instituições, órgãos ou organismos tanto da União como dos Estados‑Membros ( 20 ). Não estão regulados com caráter geral ( 21 ) no direito da União, embora tenham sido amplamente analisados pela doutrina ( 22 ).

59.

O Tribunal de Justiça pronunciou‑se até ao momento ( 23 ), de modo casuístico e não exaustivo, sobre a fiscalização jurisdicional destes procedimento mistos bem como dos atos que lhes põem termo, abordando a questão da determinação do tribunal competente do ponto de vista dos atos recorríveis ( 24 ). O tratamento dos referidos procedimentos no âmbito da união bancária constituirá um marco para esta jurisprudência ( 25 ).

60.

Como regra geral, para identificar que tribunal é competente será necessário determinar quem detém o poder de decisão real no procedimento administrativo misto. Em conformidade com esta regra, os tribunais nacionais fiscalizarão a legalidade dos atos administrativos adotados pelas autoridades nacionais quando estas decidem de modo definitivo aquele tipo de procedimentos. Simetricamente, o Tribunal de Justiça da União Europeia fiscalizará os atos administrativos das instituições da UE que ponham termo aos procedimentos mistos.

61.

Contudo, a clareza desta regra pode diminuir em duas hipóteses, nomeadamente, quando neste tipo de procedimentos:

Um ato definitivo das instituições da União se tenha baseado em atos prévios, ou preparatórios, de autoridades nacionais cuja legalidade se discuta.

Inversamente, um ato definitivo das autoridades nacionais possa estar contaminado por uma atuação anterior supostamente ilegal das instituições da União, da qual o referido ato decorra.

62.

Esta segunda hipótese não apresenta grandes dificuldades: mantém‑se a fiscalização jurisdicional atribuída aos tribunais nacionais, embora estes tenham a obrigação de submeter uma questão prejudicial de apreciação de validade ao Tribunal de Justiça, quando entendam que o ato da União pode ser inválido ( 26 ).

63.

Pelo contrário, na primeira hipótese, os problemas são mais delicados. Saber qual é o tribunal (nacional ou da União) competente para o exercício da fiscalização jurisdicional dependerá das características do procedimento em causa. Mais concretamente, da repartição do poder decisório no âmbito do referido procedimento. Utilizando este critério, a análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça permite distinguir duas situações:

Procedimentos administrativos mistos da UE com poder decisório das autoridades nacionais (jurisprudência Borelli).

Procedimentos os administrativos mistos da UE com poder decisório das instituições da União (jurisprudência Suécia/Comissão).

1. Jurisprudência Borelli

64.

O Acórdão Oleificio Borelli/Comissão ( 27 ) dizia respeito a um procedimento administrativo misto, em que o poder decisório era atribuído às autoridades nacionais. O Tribunal de Justiça considerou que um projeto só podia beneficiar da contribuição do FEOGA se tivesse sido objeto de um parecer favorável do Estado em cujo território devia ser executado. Consequentemente, caso esse parecer fosse negativo, a Comissão não podia prosseguir a análise do projeto nem, a fortiori, fiscalizar a legalidade do referido parecer.

65.

O Tribunal de Justiça concluiu que não era competente para se pronunciar relativamente à legalidade de um ato adotado por uma autoridade nacional, mesmo quando o referido ato estivesse integrado num processo de decisão comunitário em que as instituições da União estão vinculadas por ele. Os eventuais vícios do parecer nacional não podiam afetar a validade da decisão da Comissão, que recusou a contribuição pedida ( 28 ).

66.

Deste modo, o Tribunal de Justiça afastou a possibilidade de um ato da União poder ser afetado pela ilegalidade de um ato nacional num procedimento misto com predomínio do poder decisório da autoridade nacional. Esta solução, aparentemente ilógica, justificou‑se pela necessidade de impedir que atos administrativos da União pudessem ser invalidados como consequência da anulação, por órgãos jurisdicionais nacionais, de atos administrativos também nacionais, baseada na violação de normas igualmente nacionais.

67.

Para evitar as lacunas da fiscalização jurisdicional nestes casos, o Tribunal de Justiça afirmou que cabe aos órgãos jurisdicionais nacionais decidir, se necessário após reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça, quanto à legalidade do ato nacional em causa, nas mesmas condições de fiscalização que as utilizadas para qualquer ato definitivo praticado pela mesma autoridade nacional, que seja suscetível de causar prejuízo a terceiros ( 29 ).

68.

O Tribunal de Justiça alargou esta mesma jurisprudência aos processos mistos em que predomina o poder de decisão das autoridades nacionais, quando digam respeito à gestão dos fundos estruturais, à proteção das denominações geográficas ou às nomeações e destituições de membros do Parlamento Europeu. A seguir farei referência a alguns deles.

69.

No Acórdão Liivimaa Lihaveis ( 30 ), o Tribunal de Justiça declarou que um «manual» adotado por um comité de acompanhamento no âmbito de um programa operacional abrangido pelo Regulamento (CE) n.o 1083/2006 ( 31 ) e destinado a promover a cooperação territorial europeia entre dois Estados‑Membros não constituía um ato adotado por uma instituição, por um órgão ou por uns organismo da União e, consequentemente, o Tribunal de Justiça não era competente para apreciar a sua validade. Esse ato administrativo era, contudo, recorrível nas jurisdições nacionais, que podiam submeter uma questão prejudicial para verificar a sua compatibilidade com o direito da União ( 32 ).

70.

O âmbito da proteção das denominações geográficas também contém exemplos de procedimentos administrativos mistos com predominância das autoridades nacionais ( 33 ). No Acórdão Carl Kühne e o. ( 34 ), o Tribunal de Justiça afirmou que a repartição de competências entre a Comissão (que regista a denominação requerida) e as autoridades nacionais (que se pronunciaram anteriormente sobre ela, avaliando o cumprimento dos requisitos do regulamento) determina que a eventual ilegalidade do ato administrativo nacional não afeta a legalidade do Regulamento n.o 590/1999 ( 35 ).

71.

O Tribunal de Justiça acrescentou, tal como no Acórdão Borelli, que competia aos órgãos jurisdicionais nacionais pronunciar‑se relativamente à legalidade de um pedido de registo nas mesmas condições de fiscalização que as utilizadas para qualquer ato definitivo praticado pela mesma autoridade nacional, que seja suscetível de causar prejuízo aos direitos que os terceiros retiram do direito comunitário e, por conseguinte, considerar como admissível o recurso interposto para este fim, mesmo que as regras de processo internas não o prevejam nesse caso ( 36 ).

72.

Para a eleição dos membros do Parlamento Europeu também estão previstos processos mistos em que é dada predominância às autoridades nacionais. O Tribunal de Justiça, após distinguir as competências respetivas do Parlamento e das autoridades nacionais para a verificação dos poderes dos eurodeputados, declarou que compete a estas últimas proclamar os resultados em conformidade com as normas nacionais que respeitam o direito da União. Consequentemente, o Parlamento Europeu, nos termos do artigo 12.o do Ato de 1976, teria de registar a proclamação efetuada, não tendo competência para não aceitar essa proclamação em razão de alegadas irregularidades desse ato nacional ( 37 ).

2. Jurisprudência Suécia/Comissão

73.

O Tribunal de Justiça também se pronunciou relativamente aos procedimentos administrativos mistos em que o poder decisório final é atribuído às instituições da União e onde as autoridades nacionais intervêm nas fases preliminares ou preparatórias.

74.

Nestas situações, a responsabilidade de adotar o ato definitivo, que põe termo ao processo, compete à instituição da União e, por este motivo, a sua fiscalização jurisdicional tem de ser efetuada, necessariamente, pelo Tribunal Geral e pelo Tribunal de Justiça. Além disso, os atos das autoridades nacionais nestes procedimentos têm caráter meramente preparatório, de modo que a sua revisão, da competência dos órgãos jurisdicionais nacionais ou do Tribunal de Justiça será geralmente desnecessária ( 38 ).

75.

No Acórdão Países Baixos/Comissão ( 39 ), o Tribunal de Justiça distinguiu os procedimentos mistos com poder de decisão das instituições da União daqueles em que a intervenção das autoridades nacionais é determinante. Concretamente, declarou que a organização comum de mercados no setor das bananas não se baseia numa gestão descentralizada do contingente pautal que implique um poder decisório dos Estados‑Membros ( 40 ).

76.

Outro procedimento misto com poder decisório final das instituições da União foi o analisado no Acórdão Greenpeace France e o. ( 41 ); concretamente, estava em causa a autorização de uma espécie de milho geneticamente modificada, em aplicação da Diretiva 90/220 ( 42 ). O Tribunal de Justiça entendeu que quando o órgão jurisdicional nacional reconhece que, em virtude de irregularidades no exame da notificação pela autoridade nacional competente, previsto no artigo 12.o, n.o 1, da Diretiva 90/220, esta não pôde validamente transmitir o dossiê com parecer favorável à Comissão, na aceção do n.o 2 dessa disposição, tal facto não constitui fundamento para que o referido órgão jurisdicional possa fiscalizar a validade do ato da Comissão, poder que é exclusivo do Tribunal de Justiça pela via indireta da questão prejudicial de apreciação da validade ( 43 ).

77.

Por último, no Acórdão Suécia/Comissão ( 44 ), o Tribunal de Justiça analisou outra modalidade de procedimento misto sob a fiscalização das autoridades da União. Estava em causa o pedido de acesso a documentos das instituições, quando estes têm origem nos Estados‑Membros, tal como preveem os artigos 4.o e 5.o do Regulamento n.o 1049/2001 ( 45 ). A instituição da União Europeia adota a decisão que recusa ou permite o acesso ao documento pedido, após autorização do Estado‑Membro de origem.

78.

O Tribunal de Justiça considerou que estava em causa um procedimento em que participavam a instituição comunitária e o Estado‑Membro, com a finalidade de determinar se o acesso a um documento devia ser recusado com fundamento numa das exceções materiais previstas no artigo 4.o, n.os 1 a 3, do referido regulamento.

79.

Nestas condições, afirmou, «é da competência do juiz comunitário fiscalizar, a pedido do interessado a quem foi oposta uma recusa de acesso pela instituição solicitada, se essa recusa pode ser validamente fundamentada nas referidas exceções, quer essa recusa resulte da apreciação das mesmas pela própria instituição ou pelo Estado‑Membro em causa. De resto, há que observar que, do ponto de vista do referido interessado, a intervenção do Estado‑Membro não afeta o caráter comunitário da decisão que a instituição lhe dirige posteriormente em resposta ao pedido de acesso que lhe foi apresentado relativamente a um documento que está na sua posse.» ( 46 ).

B.   Procedimento administrativo de autorização das participações qualificadas em instituições de crédito

80.

Com a autorização (obrigatória) das participações qualificadas pretende assegurar‑se que só têm acesso ao setor bancário pessoas singulares ou coletivas que não ponham em risco o seu bom funcionamento. Designadamente, a avaliação tem por objeto verificar que o proposto adquirente goza de boa reputação e possui a solidez financeira necessária, de modo que a instituição cujas participações vão ser adquiridas continue a cumprir os seus requisitos prudenciais. A avaliação contribui também para evitar que a operação seja financiada com fundos resultantes de atividades ilícitas.

81.

O artigo 2.o, ponto 1, do Regulamento MUS remete para a definição de «participação qualificada» do artigo 4.o, n.o 1, ponto 36, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 ( 47 ). Por «participação qualificada» entende‑se «uma participação direta ou indireta numa empresa que represente percentagem não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto ou que permita exercer uma influência significativa na gestão dessa empresa».

82.

O artigo 22.o da Diretiva CRD IV impõe a necessidade da autorização prévia para a aquisição ou o aumento ( 48 ) de participações qualificadas. Todos os supervisores da União, quer os dos Estados que fazem parte da união bancária quer os dos que não fazem, têm de cumprir o processo de autorização.

1. Critérios para conceder a autorização

83.

O artigo 23.o da Diretiva CRD IV harmoniza os critérios substantivos para apreciar a aquisição ou o aumento de uma participação qualificada ( 49 ). Essa harmonização é, todavia, parcial, uma vez que a diretiva não desenvolve os elementos precisos para o cumprimento de cada um destes critérios, que devem ser apreciados em aplicação das normas nacionais.

84.

Para harmonizar a prática dos Estados, as autoridades europeias de supervisão adotaram em 2016 Orientações conjuntas relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro ( 50 ). No que diz respeito às instituições bancárias, a base jurídica dessas orientações encontra‑se no artigo 16.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1093/2010 ( 51 ), nos termos do qual a Autoridade Bancária Europeia, a fim de definir práticas de supervisão coerentes, eficientes e eficazes no âmbito do SESF e garantir uma aplicação comum, uniforme e coerente da legislação da União, emite orientações e recomendações dirigidas às autoridades competentes ou a instituições financeiras.

85.

Embora as orientações sejam atos jurídicos não vinculativos, os Estados desenvolvem todos os esforços para dar cumprimento a essas orientações (e às recomendações) através da técnica conhecida como «comply or explain» ( 52 ). Segundo as informações fornecidas na audiência, as autoridades italianas aceitaram aplicar estas orientações de 2016 numa decisão do Comitato Interministeriale per il Credito ed il Risparmio (Comité interministerial para o crédito e a poupança) adotada em 2017.

2. Procedimento de autorização

86.

O procedimento para conceder este tipo de autorizações é regulado pelo artigo 4.o, n.o 1, alínea c), pelo artigo 6.o, n.o 4, e pelo artigo 15.o do Regulamento MUS, completados pelos artigos 85.o a 87.o do Regulamento‑Quadro do MUS.

87.

Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea c), lido em conjugação com o artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento MUS, o BCE tem competência exclusiva para avaliar e decidir a aquisição e o aumento de participações qualificadas em todas as instituições financeiras submetidas ao mecanismo único de supervisão, independentemente de serem mais ou menos significativas e de estarem sob a supervisão direta do BCE ou das ANC.

88.

Esta circunstância demonstra que o Regulamento MUS estabeleceu «um mecanismo de supervisão genuinamente integrado», em que os processus essenciais são idênticos, em termos gerais, para todas as instituições de crédito, quer sejam «significativas» ou «menos significativas», e em que estão envolvidos tanto o BCE como as ANC.

89.

Os procedimentos administrativos comuns estabelecidos pelo Regulamento MUS são utilizados relativamente às autorizações para aceder à atividade bancária ou para proceder à sua revogação, bem como para avaliar as aquisições e os aumentos de participações qualificadas.

90.

Concretamente, o BCE exerce a sua competência de fiscalização das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas nos termos do artigo 15.o do Regulamento MUS, completado pelos artigos 85.o a 87.o do Regulamento‑Quadro do MUS. No procedimento a seguir para esse efeito, intervêm o BCE enquanto instituição decisória e as ANC enquanto instâncias responsáveis pela preparação das decisões.

91.

Esse procedimento desenvolve‑se do seguinte modo ( 53 ):

A instituição requerente apresenta as notificações de aquisição ou de aumento de uma participação qualificada à ANC competente, que é a do Estado‑Membro em que tem sede a instituição que se pretende adquirir.

A ANC comunica ao BCE a receção da notificação da intenção de adquirir ou de aumentar uma participação qualificada, num prazo não superior a cinco dias úteis, contados a partir da confirmação da receção pelo requerente. Não se poderá concluir o processo enquanto não tiver sido disponibilizada a informação solicitada. Portanto, os requerentes devem certificar‑se de que os seus pedidos estão completos e corretamente estruturados. Se o primeiro exame de um pedido revelar omissões ou incoerências, a ANC que o tenha recebido instará imediatamente o requerente a introduzir as alterações necessárias.

Uma vez apresentado o pedido e verificada a integridade do seu conteúdo, a ANC que o tenha recebido, o BCE e, sendo esse o caso, as restantes ANC envolvidas efetuam uma avaliação complementar. Esta avaliação tem por objeto assegurar que todas as partes envolvidas conhecem em detalhe o modelo de negócio e a sua viabilidade e, para esse efeito, abarcará todos os critérios definidos na legislação nacional e na da União.

A ANC proporá ao BCE um projeto de decisão, opondo‑se ou não à aquisição ou ao aumento das participações qualificadas. A partir desse momento, a decisão definitiva relativa à aprovação ou ao indeferimento do pedido é da responsabilidade exclusiva do BCE. Quando se considere que o pedido deve ser indeferido ou que é necessário impor condições adicionais, o requerente terá direito a ser ouvido.

A decisão que põe termo ao procedimento é da competência do BCE, que segue a tramitação habitual para a tomada de decisões no âmbito da união bancária, prevista no artigo 26.o, n.os 6 e 8, do Regulamento MUS: o Conselho de Supervisão do BCE submete o projeto completo de decisão ao Conselho do BCE e a decisão é considerada adotada salvo oposição deste num prazo máximo de dez dias.

Uma vez adotada a decisão definitiva, o BCE procede à sua notificação ao requerente. Se a aquisição for indeferida ou se o proposto adquirente entender que essa decisão o prejudica de algum modo, poderá pedir a sua revisão pela Comissão de Reexame do BCE, previsto no artigo 24.o do Regulamento MUS.

C.   Primeira questão prejudicial: fiscalização jurisdicional dos atos nacionais preparatórios no procedimento de autorização de aquisição de participações qualificadas em instituições de crédito.

92.

O procedimento para autorizar a aquisição ou o aumento de participações qualificadas em instituições financeiras é, tal como acabo de expor, de natureza mista, porque nele intervêm o BCE, enquanto autoridade que aprecia, e as ANC, enquanto instâncias responsáveis pela preparação das decisões. Abordarei, em primeiro lugar, as questões ligadas à competência para decidir e, posteriormente, farei referência à fiscalização jurisdicional da decisão final que nele será proferida.

1. Competência decisória final

93.

A intervenção das ANC, após a apresentação do pedido, limita‑se à verificação do cumprimento das condições para autorizar a operação, estabelecidas pelo direito da União e pelo direito nacional. A sua função termina com a submissão ao BCE de um projeto ou de uma proposta de decisão, que em nenhum caso vincula esta instituição.

94.

A partir dessa proposta inicia‑se a fase decisória do procedimento misto, já sob a exclusiva responsabilidade do BCE, que, finalmente, terá de autorizar ou indeferir o pedido de aquisição ou de aumento da participação qualificada. Trata‑se, na minha opinião, de uma competência decisória exclusiva do BCE, pelos motivos expostos a seguir.

95.

Em primeiro lugar, o artigo 87.o do Regulamento‑Quadro do MUS dispõe que «[o] BCE decidirá se se deve opor ou não à aquisição com base na sua avaliação da aquisição proposta e do projeto de decisão da ANC». Tal como afirma o Banco de Itália, desta disposição deduz‑se que o BCE dispõe de um poder de apreciação completo sobre os elementos fáticos e jurídicos para a adoção da sua decisão final. A proposta que lhe é enviada pela ANC constitui um elemento adicional de ponderação, mas não necessariamente único. Nada impede o BCE de praticar atos de instrução e de investigação autónomos ( 54 ) e de chegar a uma conclusão diferente da proposta pela ANC, que não o vincula ( 55 ).

96.

O projeto da ANC, insisto, não condiciona, juridicamente, a decisão posterior do BCE. É verdade que poderá, em função dos seus próprios méritos, ter maior ou menor influência nesta última, mas essa característica é comum a outros atos (por exemplo, um parecer não vinculativo) em qualquer procedimento. A ANC não tem nenhum poder decisório específico, para além da realização da instrução da primeira fase do procedimento, uma vez apresentado o pedido de autorização. Não se trata, portanto, de um processo de codecisão entre a ANC e o BCE, como parece entender S. Berlusconi nas suas observações escritas.

97.

Em segundo lugar, é possível que o BCE opte por alterar a sua decisão final, afastando‑se da proposta da ANC a que tinha aderido, após intervenção do Comité de Reexame ( 56 ), se o recurso do potencial adquirente for total ou parcialmente deferido ( 57 ). O BCE pode, também, incluir na sua decisão final condições para autorizar a aquisição ou o aumento de uma participação qualificada que não constem da proposta da ANC.

98.

Em terceiro lugar, o facto de a fase inicial do procedimento se desenvolver na ANC não significa que o BCE seja alheio à referida fase. O artigo 85.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS prevê que as ANC às quais é enviada uma notificação de uma intenção de adquirir uma participação qualificada numa instituição de crédito informem o BCE nos cinco dias úteis seguintes à confirmação da sua receção. Além disso, o artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento MUS dispõe que tanto o BCE como as ANC estão sujeitos ao dever de cooperação leal, bem como à obrigação de trocarem informações.

99.

Em quarto lugar, o projeto de decisão submetido pela ANC ao BCE não é notificado pela autoridade nacional ao requerente, o que confirma o seu caráter de mero ato preparatório interno da decisão final do BCE, sem relevância jurídica nem para o requerente nem para terceiros ( 58 ).

100.

Em quinto lugar, o procedimento de autorização da aquisição ou do aumento de participações qualificadas distingue‑se de outros semelhantes, como o da autorização para o exercício da atividade bancária. Neste último, a ANC tem, nos termos do artigo 14.o, n.o 2, do Regulamento MUS ( 59 ), capacidade para adotar autonomamente a decisão de indeferimento do pedido de autorização, que comunica ao requerente e produz efeitos perante ele e perante terceiros. Trata‑se de um ato definitivo, cuja fiscalização jurisdicional pode ser realizada pelos órgãos jurisdicionais nacionais, com possibilidade de reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça. Pelo contrário, no procedimento de autorização de aquisição de participações qualificadas as ANC não têm essa competência.

101.

Em sexto lugar, nos termos do artigo 22.o, n.o 6, da Diretiva CRD IV, se, durante o prazo de apreciação, as autoridades competentes não se opuserem por escrito ao projeto de aquisição, este considera‑se aprovado. Em caso de inação das ANC, para evitar que se verifique esta espécie de silêncio administrativo positivo, o BCE pode intervir (em conformidade com o artigo 9.o, n.o 1, terceiro parágrafo, do Regulamento MUS) ( 60 ), chamando a ANC a pronunciar‑se sobre o pedido de autorização de aquisição ou de aumento de uma participação qualificada. Esta circunstância realça a intervenção do BCE no referido procedimento desde o seu início e o facto de que é essa instituição que exerce a fiscalização exclusiva sobre ele.

2. Fiscalização jurisdicional das decisões proferidas nestes procedimentos

102.

Uma vez assente que a tramitação da autorização para adquirir ou para aumentar participações qualificadas em instituições financeiras é realizada mediante um procedimento misto, cuja decisão definitiva compete exclusivamente ao BCE, importa analisar a fiscalização jurisdicional das decisões nele adotadas.

103.

Para determinar o regime de fiscalização jurisdicional aplicável, tanto a jurisprudência Borelli como a jurisprudência Suécia/Comissão têm em atenção a repartição concreta de competências entre as autoridades nacionais e as instituições da União. Quando o poder decisório é das autoridades nacionais, aplica‑se a jurisprudência Borelli; quando é da autoridade da União, entra em jogo a jurisprudência Suécia/Comissão.

104.

O MUS é uma estrutura complexa e multinível, constituída pelo BCE e pelas ANC, na qual o BCE ocupa uma posição central, assume a responsabilidade do funcionamento do sistema e fiscaliza o conjunto das tarefas do mecanismo ( 61 ). O BCE dispõe, para o cumprimento destes objetivos, de poderes exclusivos no âmbito do MUS. A intervenção das ANC obedece à lógica do exercício descentralizado destes poderes, e não a uma distribuição de competências próprias entre o BCE e as autoridades nacionais ( 62 ).

105.

No procedimento de autorização de participações qualificadas, o BCE concentra o poder decisório final de modo exclusivo, tal como na maioria dos procedimentos administrativos mistos da união bancária. Simetricamente, a competência exclusiva para fiscalizar o exercício desse poder concentrado cabe ao Tribunal Geral e ao Tribunal de Justiça ( 63 ).

106.

Entendo que é difícil refutar esta afirmação. De facto, a Fininvest interpôs um recurso de anulação, que se encontra pendente no Tribunal Geral (T‑913/16), contra a decisão do BCE que indeferiu a aquisição da participação qualificada na Banca Mediolanum.

107.

O caráter preparatório dos atos das ANC na fase inicial do procedimento confirma, se necessário, a fiscalização jurisdicional exclusiva do Tribunal de Justiça tanto das decisões de autorização de aquisições ou de aumentos de participações qualificadas em instituições bancárias, como das propostas que antecedem essas decisões.

108.

De acordo com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, só se pode impugnar a validade dos atos adotados pelas instituições da União, qualquer que seja a sua natureza ou forma, que se destinem a produzir efeitos jurídicos vinculativos suscetíveis de afetar os interesses do recorrente, modificando de forma caracterizada a sua situação jurídica. Por este motivo, quando estão em causa atos ou decisões cuja elaboração é realizada em diversas fases, só são recorríveis os que fixam de modo definitivo a posição (normalmente, da Comissão ou do Conselho) no fim do referido procedimento. Não são recorríveis, pelo contrário, as medidas intermédias ou preparatórias cujo objetivo consista em preparar a decisão definitiva ( 64 ).

109.

Esta jurisprudência é extrapolável para os procedimentos em que a intervenção preparatória, meramente auxiliar, é realizada por uma autoridade nacional. Quando o ato desta autoridade se limita a uma proposta, que, por definição, não tem natureza decisória, esse ato não tem a capacidade de incidir na esfera jurídica de nenhuma pessoa, singular ou coletiva. É desprovido do caráter que permitiria a sua impugnação autónoma. Os eventuais vícios de que sofreria decorrentes da elaboração da proposta poderão, também, ser invocados na impugnação da decisão final que o conteúdo da mesma venha a ter.

110.

Em suma, os órgãos jurisdicionais nacionais não podem pronunciar‑se relativamente a meros atos preparatórios, praticados pelas ANC, que tenham feito parte de um procedimento misto cuja decisão exclusiva é competência do BCE. De outro modo, os órgãos jurisdicionais nacionais assumiriam, na realidade, a fiscalização material de decisões que não são da competência das ANC, mas sim do BCE, o que, além disso, poderia resultar em situações paradoxais ( 65 ).

111.

Por conseguinte, entendo que deve ser atribuída aos órgãos jurisdicionais da União, e não aos nacionais, a fiscalização jurisdicional de todos os atos adotados no âmbito do procedimento de autorização de aquisições e de aumentos de participações qualificadas em instituições bancárias.

112.

Esta atribuição de competência jurisdicional não é, naturalmente, isenta de dificuldades. Para salvaguardar o direito à tutela jurisdicional efetiva dos lesados, os tribunais da União terão de esclarecer, quando neles seja suscitada esta questão, se os atos preparatórios das ANC, cujo conteúdo o BCE tenha adotado posteriormente, incorriam em vícios de nulidade de tal natureza que tinham contaminado irremediavelmente todo o processo.

113.

Sob esta perspetiva, a eventual ilegalidade da proposta do Banco de Itália deverá ser fiscalizada pelo Tribunal Geral em sede de recurso de anulação interposto contra a decisão final do BCE (processo T‑913/16), porque esta instituição dispunha de margem de apreciação para adotar ou não a proposta da ANC.

114.

Além disso, esta solução é coerente com a previsão do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento MUS ( 66 ). Com ela, é confiada ao BCE a aplicação do direito nacional que desenvolve diretivas e, excecionalmente, regulamentos em matéria de união bancária, fundamentando o alargamento da fiscalização jurisdicional do Tribunal de Justiça a estas situações ( 67 ).

115.

Em função dos argumentos anteriores, entendo que o artigo 263.o TFUE:

atribui ao Tribunal de Justiça competência exclusiva para fiscalizar a legalidade dos atos adotados no âmbito do procedimento previsto no artigo 4.o, n.o 1, alínea c), e no artigo 15.o do Regulamento MUS e nos artigos 85.o, 86.o e 87.o do Regulamento‑Quadro do MUS; e

impede os órgãos jurisdicionais nacionais de fiscalizarem a legalidade dos atos nacionais de abertura, de instrução e de proposta adotados pela autoridade nacional competente no âmbito do referido procedimento, que termina com uma decisão definitiva do BCE.

D.   Segunda questão prejudicial: âmbito das decisões nacionais com autoridade de caso julgado relativas à fiscalização jurisdicional dos atos preparatórios nacionais

116.

Da resposta que recomendo à primeira questão infere‑se, logicamente, a resposta à segunda. Ao reivindicar a competência exclusiva do Tribunal Geral e do Tribunal de Justiça para o exercício da fiscalização jurisdicional dos atos adotados nestes procedimentos, negando‑a aos órgãos jurisdicionais nacionais, é irrelevante que estes últimos possam ser chamados a pronunciar‑se no âmbito de um «giudizio di ottemperanza» ou de qualquer outra modalidade processual do seu direito interno.

117.

Com efeito, a atribuição de competência constitui um pressuposto obrigatório para a validade da atuação jurisdicional posterior. Se um tribunal não é competente, simplesmente não pode atuar, nem mediante uma via processual nem outra. O «giudizio de ottemperanza» é uma dessas vias com as quais o ordenamento processual italiano pretende que seja respeitada a autoridade do caso julgado de uma decisão judicial anterior ( 68 ).

118.

S. Berlusconi e a Fininvest pretendem beneficiar dessa via, invocando o Acórdão proferido em 3 de março de 2016 pelo Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) como fundamento de nulidade da proposta de decisão enviada ao BCE pelo Banco de Itália no âmbito do procedimento de autorização. Mas se, tal como já afirmei, os tribunais italianos não têm competência para apreciar os atos preparatórios praticados pelas ANC, o referido argumento terá de ser invocado no Tribunal Geral (como aconteceu no recurso T‑913/16), e não nos tribunais nacionais.

119.

Por conseguinte, entendo que não é possível invocar a autonomia processual do Estado italiano para justificar que a (eventual) autoridade de caso julgado do Acórdão de 3 de março de 2016 atribua a um órgão jurisdicional nacional competência para fiscalizar a legalidade das atuações do Banco de Itália destinadas à preparação da decisão final do BCE.

120.

Não creio, portanto, que o Tribunal de Justiça deva ir mais longe, no que respeita à questão, ainda não apreciada, da incidência do referido acórdão no presente processo. Contudo, a título meramente subsidiário, explicarei por que motivos considero que não existe nem identidade subjetiva nem identidade objetiva (necessárias para apreciar a autoridade do caso julgado) entre o litígio objeto do acórdão de 3 de março de 2016 e o presente litígio.

121.

Quanto à identidade objetiva:

O recurso anterior dizia respeito à decisão do Banco de Itália e do IVASS n.o 976145/14, de 7 de outubro de 2014, que declarou que S. Berlusconi não preenchia o requisito de honorabilidade previsto para a titularidade de participações qualificadas em empresas de intermediação financeira.

O presente litígio diz respeito à legalidade da proposta do Banco de Itália (posteriormente reproduzida pela decisão BCE de 2016) que se opôs à aquisição da participação qualificada na Banca Mediolanum, realizada indiretamente por S. Berlusconi através da Fininvest. O motivo desta oposição tem o seu fundamento na condenação transitada em julgado à pena de quatro anos de prisão por fraude fiscal, a que fez referência o acórdão do Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional). Mas tanto o Banco de Itália como o BCE ponderaram também outros elementos adicionais, alguns deles posteriores ao acórdão de 3 de março de 2016, para considerar que não estava satisfeita a exigência de honorabilidade dos adquirentes ( 69 ).

122.

Quanto à identidade subjetiva:

O BCE não participou, nem o poderia ter feito, no processo que culminou com o acórdão de 3 de março de 2016, enquanto no presente processo dos autos o seu papel é central.

A decisão do BCE de 2016 afirma a falta de honorabilidade dos adquirentes, que imputa não apenas ao «acionista de controlo e adquirente indireto, S. Berlusconi, mas também a outro membro do conselho de administração e a um membro do conselho de fiscalização da Fininvest SpA, bem como à própria Fininvest» ( 70 ).

123.

Além disso, as aquisições de participações qualificadas são diferentes, a legislação aplicável varia e mudou o procedimento, cuja decisão compete agora exclusivamente ao BCE.

124.

Não havendo, portanto, identidade objetiva nem subjetiva entre o litígio apreciado no acórdão transitado em julgado do Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) de 3 de março de 2016 e o ora pendente, dificilmente se pode aceitar a aplicação do princípio do caso julgado.

125.

Em última análise, e a título duplamente subsidiário, o princípio do caso julgado não pode ser invocado para garantir a execução de decisões proferidas em clara violação das normas do direito da União ( 71 ), como as que possam interferir na competência exclusiva do BCE para autorizar as aquisições de participações qualificadas.

IV. Conclusão

126.

Atendendo às considerações anteriores, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões submetidas pelo Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) nos seguintes termos:

«1)

O artigo 263.o TFUE, conjugado com o artigo 4.o, n.o 1, alínea c), e o artigo 15.o do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito, e com os artigos 85.o, 86.o e 87.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas:

atribui ao Tribunal de Justiça da União Europeia competência exclusiva para fiscalizar a legalidade dos atos adotados no âmbito do procedimento, previsto nos artigos referidos de ambos os regulamentos, com vista a autorizar as aquisições e os aumentos de participações qualificadas em instituições bancárias; e

impede que os órgãos jurisdicionais nacionais fiscalizem a legalidade das decisões de abertura, de instrução e de proposta de decisão tomadas pelas autoridades nacionais competentes no âmbito desse procedimento, cuja decisão final compete ao Banco Central Europeu.

2)

A falta de competência dos órgãos jurisdicionais nacionais para fiscalizar a legalidade das decisões tomadas no âmbito do referido procedimento não pode ser comprometida pelo exercício de uma ação de execução (giudizio di ottemperanza) em que é invocada a pretensa violação do caso julgado atribuída a uma decisão anterior de um tribunal nacional.»


( 1 ) Língua original: espanhol.

( 2 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338) (conhecida como Diretiva CRD IV).

( 3 ) Os acordos denominados Basileia III são um conjunto de medidas adotadas internacionalmente, que o Comité de supervisão Bancária de Basileia desenvolveu em resposta à crise financeira. O seu objetivo consiste em reforçar a regulação, a supervisão e a gestão do risco dos bancos. V. informação a este respeito na página Internet do Comité de Supervisão Bancária de Basileia https://www.bis.org/bcbs/basel3_es.htm.

( 4 ) Regulamento do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63) (a seguir «Regulamento MUS»).

( 5 ) Regulamento do Banco Central Europeu, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o Banco Central Europeu e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (Regulamento‑Quadro do MUS) (JO 2014, L 141, p. 1).

( 6 ) Decreto legislativo 1 settembre 1993, n.o 385, Testo unico delle leggi in materia bancaria e creditizia (Testo unico bancario) [Decreto legislativo n.o 385, de 1 de setembro de 1993, Texto unificado das leis em matéria bancária e creditícia (Texto unificado bancário; a seguir «TUB»)]. No momento em que ocorreram os factos do processo principal, as normas relativas às participações qualificadas em instituições financeiras constavam do título II do TUB na sua versão resultante do Decreto Legislativo n.o 72, de 12 de maio de 2015, que transpôs para o direito italiano o conteúdo da Diretiva CRD IV.

( 7 ) O n.o 2 remetia, para efeitos da determinação específica desses requisitos, para uma norma futura [a adotar pelo Ministero dell’Economia e delle Finanze (Ministério da Economia e Finanças), após parecer do Banco de Itália], que não foi adotada.

( 8 ) Decreto 18 marzo 1998, n.o 144, regolamento recante norme per l’individuazione dei requisiti di onorabilità dei partecipanti al capitale sociale delle banche e fissazione della soglia rilevante (Decreto n.o 144, de 18 de março de 1998, regulamento que estabelece as normas para a determinação dos requisitos de honorabilidade dos participantes no capital social dos bancos e para a fixação do limiar relevante; a seguir «Decreto n.o 144 de 1998»)

( 9 ) Legge 7 agosto 1990, n.o 241, nuove norme in materia di procedimento amministrativo e di diritto di acceso ai documenti amministrativi (Lei n.o 241, de 7 de agosto de 1990, que estabelece novas normas em matéria de procedimento administrativo e de direito de acesso aos documentos administrativos), conforme alterada pela Lei n.o 15, de 11 de fevereiro de 2005.

( 10 ) Codice del processo amministrativo, decreto legislativo 2 luglio 2010, n.o 104 (Código do Procedimento Administrativo, Decreto Legislativo de 2 de julho de 2010, n.o 104).

( 11 ) Decreto Legislativo 4 de marzo 2014, n.o 53, attuazione della direttiva 2011/89/UE. [Decreto Legislativo n.o 53, de 4 de março de 2014, que transpõe para o direito italiano a Diretiva 2011/89/UE (do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de novembro de 2011, que altera as Diretivas 98/78/CE, 2002/87/CE, 2006/48/CE e 2009/138/CE no que se refere à supervisão complementar das entidades financeiras de um conglomerado financeiro (JO 2011, L 136, p. 113)], que estendem às sociedades financeiras mistas a aplicação do requisito de honorabilidade dos dirigentes, exigidos para as instituições bancárias.

( 12 ) Tratava‑se de uma «fusão intragrupo, com permuta de participações de 1 por 1», com o fim de realizar a simplificação da sociedade e a racionalização organizativa do grupo bancário, dado que a sociedade Mediolanum detinha 100% das ações da Banca Mediolanum.

( 13 ) A Fininvest passou a controlar aproximadamente 30,124% do capital da Banca Mediolanum, mas só dispunha do controlo efetivo de 9,999%, uma vez que os restantes 20,125% tinham os direitos de voto suspensos e impendia sobre eles a obrigação de alienação imposta pelo Banco de Itália.

( 14 ) Quanto à exceção por falta de interesse em agir invocada pelo Banco de Itália, o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) considerou que a nota de 23 de julho de 2015 tinha caráter meramente confirmativo, uma vez que alargava, sem uma nova avaliação autónoma, a obrigação de alienação de ativos previamente imposta para as ações da Sociedade Mediolanum. Portanto, a eventual caducidade do ato confirmado implicava automaticamente a caducidade do ato confirmativo.

( 15 ) Diretiva 2007/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de setembro de 2007, que altera a Diretiva 92/49/CEE do Conselho e as Diretivas 2002/83/CE, 2004/39/CE, 2005/68/CE e 2006/48/CE no que se refere a normas processuais e critérios para a avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações em entidades do setor financeiro (JO 2007, L 247, p. 1)

( 16 ) Para o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional), não tinha havido uma revogação tácita da norma regulamentar por efeito da Diretiva 2007/44. A revogação tácita exige como pressuposto indispensável a identidade da situação regulada pela norma; pelo contrário, neste processo, as duas normas tinham um âmbito de aplicação diferente: a norma da União dizia respeito à aquisição da participação, enquanto o Decreto n.o 144 de 1998 dizia respeito à participação já adquirida e, portanto, atualmente detida.

( 17 ) ECB/SSM/20016‑7LVZJ6XRIE7VNZ4UBX81/4 (a seguir «decisão BCE de 2016»)

( 18 ) Processo Fininvest e Berlusconi/BCE (T‑913/16).

( 19 ) Acórdãos de 3 de dezembro de 1992, Oleificio Borelli/Comissão (C‑97/91, EU:C:1992:491, n.o 9); de 25 de janeiro de 2007, Dalmine/Comissão (C‑407/04 P, EU:C:2007:53, n.o 62); de 18 de dezembro de 2007, Suécia/Comissão (C‑64/05 P, EU:C:2007/802, n.o 91); e de 17 de setembro de 2014, Liivimaa Lihaveis (C‑562/12, EU:C:2014:2229, n.o 48).

( 20 ) Este tipo de procedimento corresponde ao que a doutrina denomina coadministração ou administração integrada. V. Ziller, J., «Les concepts d’administration directe, d’administration indirecte et de coadministration et les fondements du droit administratif européen», in Auby, J.‑B. e Dutheil de la Rochère, J. (eds.), Traité de Droit Administratif Européen, Bruylant, Bruxelas, 2014, pp. 327 e segs.; Hofmann, H.C.H., «Conclusions: Europe’s integrated administration», in Hofmann, H.C.H. e Türk, A. (eds.), EU Administrative Governance, p. 583; Schmidt‑Aßmann, E., «Introduction», in Jansen, O. e Schöndorf‑Haubold, B. (eds.), The European Composite Administration, Intersentia, Bruxelas, 2011, pp. 6 a 8.

( 21 ) Uma ambiciosa proposta doutrinal de codificação dos procedimentos administrativos da União é a de Mir, O., Hofmann, H.C.H., Schneider, J.‑P., Ziller, J., e o. (eds.), Código ReNEUAL de procedimiento administrativo de la Unión Europea, INAP, Madrid, 2015. O artigo 3.o, n.o 1, artigo I‑4 (4) do Código ReNEUAL define o «procedimento composto» como um procedimento administrativo em que as autoridades da União e as de um Estado‑Membro, ou de diferentes Estados‑Membros, têm funções diferentes que são interdependentes. Também constitui um procedimento composto a combinação de dois procedimentos administrativos diretamente relacionados.

( 22 ) Alonso de León, S., Composite administratives procedures in the European Union, Iustel, Madrid, 2017; Della Cananea, G., «I procedimenti amministrativi composti dell’Unione europea», in Bignami, F. e Cassese, S. (dirs.), Il procedimento amministrativo nel diritto europeo, Milano, Giuffrè, 2004; Mastrodonato, G., I procedimenti amministrativi composti nel diritto comunitario, Bari, Cacucci, 2007; Hofmann, H.C.H., «Composite decision‑making procedures in EU administrative law», en Hofmann, H.C.H., Türk, A., Legal challenges in EU administrative Law. Towards an Integrated Administration, Edward Elgar, Cheltenham, 2009, p. 136.

( 23 ) Um estudo recente pode ser lido em Brito Bastos, F., «Derivative illegality in European composite administrative procedures», Common Market Law Review, 2018, n.o 1, pp. 101 a 134.

( 24 ) Alonso de León, S., Composite administratives procedures in the European Union, Iustel, Madrid, 2017, pp. 273 a 318. V., também, os trabalhos de Eliantonio, M., «Judicial Review in an Integrated Administration: the Case of “Composite Procedures”», Review of European Administrative Law, 2014 n.o 2, pp. 65 a 102; e de Türk, A., «Judicial Review of integrated administration in the EU», in Hofmann, H.C.H. y Türk, A., Legal challenges in EU administrative Law. Towards an Integrated Administration, Edward Elgar, Cheltenham, 2009, pp. 218 a 256, designadamente, pp. 222 a 224.

( 25 ) V. Prechal, S., Widdershoven, R., Jans, J., «Introduction», in Jans, J., Prechal, S., Widdershoven, R. (eds.), Europeanisation of Public Law, Europa Law Publishing, Amsterdam, 2015, p. 33.

( 26 ) Acórdão de 22 de outubro de 1987, Foto‑Frost (314/85, EU:C:1987:452, n.os 14 e 15). V., também, Acórdãos de 10 de janeiro de 2006, IATA e ELFAA (C‑344/04, EU:C:2006:10, n.os 27 e 30), e de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 95, a seguir «Acórdão Inuit I»).

( 27 ) Acórdão de 3 de dezembro de 1992 (C‑97/91, EU:C:1992:491, a seguir «Acórdão Borelli»).

( 28 ) Acórdão Borelli, n.os 9 a 12; Despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 13 de janeiro de 2009, Occhetto e Parlamento/Donnici [C‑512/07 P(R) e C‑15/08 P(R), EU:C:2009:3, n.o 50].

( 29 ) Acórdão Borelli, n.o 13. Segundo esse acórdão, o tribunal nacional devia considerar admissível o recurso interposto para este fim, mesmo que as regras de processo internas não o previssem.

( 30 ) Acórdão de 17 setembro 2014 (C‑562/12, EU:C:2014:2229, n.o 56).

( 31 ) Regulamento do Conselho, de 11 de julho de 2006, que estabelece disposições gerais sobre o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu e o Fundo de Coesão, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1260/1999 (JO 2006, L 210, p. 25).

( 32 ) O Tribunal de Justiça considerou que «o Regulamento n.o 1083/2006, conjugado com o artigo 47.o da Carta, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição do manual do programa adotado por um comité de acompanhamento no âmbito de um programa operacional celebrado entre dois Estados‑Membros e destinado a promover a cooperação territorial europeia, na medida em que essa disposição prevê que uma decisão de um comité de acompanhamento de indeferimento de um pedido de subvenção não pode ser impugnada num tribunal de um Estado‑Membro» (Acórdão de 17 setembro 2014, Liivimaa Lihaveis, C‑562/12, EU:C:2014:2229, n.o 76).

( 33 ) O Regulamento (CEE) n.o 2081/92 do Conselho, de 14 de julho de 1992, relativo à proteção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO 1992, L 208, p. 1), instaurou um processo misto em que as associações de produtores apresentam os pedidos de registo de uma DOP ou de uma IGP nas suas autoridades nacionais. Estas devem verificar se o pedido está justificado e, quando entendem que estão cumpridos os requisitos do regulamento, enviam‑no à Comissão, que só pode realizar um mero exame formal para verificar se se encontram preenchidos os referidos requisitos.

( 34 ) Acórdão de 6 de dezembro de 2001 (C‑269/99, EU:C:2001:659, n.os 57 e 58). V., também, Acórdão de 2 de julho de 2009, Bavaria e Bavaria Italia (C‑343/07, EU:C:2009:415, n.os 55 a 57).

( 35 ) Estava em causa o registo da denominação «Spreewälder Gurken», realizado em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 590/1999 da Comissão, de 18 de março de 1999, que completa o Anexo do Regulamento (CE) n.o 1107/96 relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.o do Regulamento (CEE) n.o 2081/92 (JO 1999, L 74, p. 8).

( 36 ) Acórdão de 6 de dezembro de 2001, Carl Kühne e o. (C‑269/99, EU:C:2001:659, n.os 57 e 58). No mesmo sentido, v. Acórdão de 2 de julho de 2009, Bavaria e Bavaria Itália (C‑343/07, EU:C:2009:415, n.os 64 a 67).

( 37 ) Foi o que aconteceu nas proclamações feitas pela Junta Eleitoral italiana que foram objeto do Acórdão de 30 de abril de 2009, Itália e Donnici/Parlamento (C‑393/07 e C‑9/08, EU:C:2009:275, n.os 74 e 75); e do Despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 13 de janeiro de 2009, Occhetto e Parlamento/Donnici [C‑512/07 P(R) e C‑15/08 P(R), EU:C:2009:3]. Ao declarar inválidos, contrariamente à referida proclamação, os poderes de B. Donnici e ao confirmar o mandato de A. Occhetto, a decisão impugnada violou o artigo 12.o de referido ato.

( 38 ) Acórdãos de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão (60/81, EU:C:1981:264, n.o 12), e de 13 de outubro de 2011, Deutsche Post e Alemanha/Comissão (C‑463/10 P e C‑475/10 P, EU:C:2011:656).

( 39 ) Acórdão de 17 de outubro de 1995 (C‑478/93, EU:C:1995:324, n.os 34 a 40).

( 40 ) Nem o Conselho nem a Comissão tinham atribuído aos Estados‑Membros um poder de decisão para gerir o contingente de importação, mas estes deviam assumir determinadas funções técnicas por conta e sob a supervisão da Comissão (por exemplo, estabelecer a lista de operadores, bem como a quantidade média de bananas que cada operador vendeu nos três anos anteriores para os quais haja dados estatísticos disponíveis). Este papel dos Estados‑Membros na recolha e transmissão dos dados não pode, todavia, impedir a Comissão, chamada a assegurar a gestão quotidiana da organização comum de mercado, de controlar a precisão desses dados e de os corrigir se se verificar que duplas contagens ameaçam falsear a base do regime de importação.

( 41 ) Acórdão de 21 de março de 2000 (C‑6/99, EU:C:2000:148).

( 42 ) Diretiva 90/220/CEE do Conselho, de 23 de abril de 1990, relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados (JO 1990, L 117, p. 15), conforme alterada pela Diretiva 97/35/CE da Comissão, de 18 de junho de 1997, que adapta pela segunda vez ao progresso técnico a Diretiva 90/220/CEE do Conselho relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados (JO 1997, L 169, p. 72). A autorização de sementes geneticamente modificadas implicava a apresentação de um pedido à autoridade nacional competente. Esta, após analisar o seu impacto na saúde humana e no ambiente, enviava à Comissão o pedido com um parecer favorável. A Comissão, por seu turno, notificava o referido pedido a todos os Estados‑Membros para que apresentassem eventuais objeções. Se a Comissão adotar uma «decisão favorável» em conformidade com o artigo 13.o, n.o 4, da referida diretiva, a autoridade competente é obrigada a emitir a «autorização por escrito» que permita a comercialização do produto.

( 43 ) Acórdão de 21 de março de 2000, Greenpeace France e o. (C‑6/99, EU:C:2000:148, n.o 57).

( 44 ) Acórdão de 18 de dezembro de 2007 (C‑64/05 P, EU:C:2007:802).

( 45 ) Regulamento (CE) do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43)

( 46 ) Acórdão de 18 de dezembro de 2007, Suécia/Comissão (C‑64/05 P, EU:C:2007:802, n.o 94); no mesmo sentido, Despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 13 de janeiro de 2009, Occhetto e Parlamento/Donnici [C‑512/07 P(R) e C‑15/08 P(R), EU:C:2009:3, n.o 53].

( 47 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1).

( 48 ) O artigo 22.o da Diretiva CRD IV equipara, quanto ao seu tratamento, a aquisição de uma participação qualificada com o seu aumento, direto ou indireto, que se verifica quando a proporção de direitos de voto ou de capital detido atinge ou ultrapassa 20%, 30% ou 50%, ou quando a instituição de crédito se transforme em sua filial.

( 49 ) São eles a honorabilidade do proposto adquirente; a reputação e a experiência das novas direções propostas; a solidez financeira do proposto adquirente; a influência na instituição e o risco de ligações com operações de branqueamento de capitais ou de financiamento de terrorismo.

( 50 ) Orientações conjuntas da EBA (Autoridade Bancária Europeia), da EIOPA (Autoridade Europeia dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma) e da ESMA (Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados) relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro (JC/GL/2016/01), pp. 15 a 24. As suas diferentes versões linguísticas estão disponíveis na página Internet do Joint Committee of the European Supervisory Authorities em https://esas‑joint‑committee.europa.eu/Publications/Guidelines/JC_QH_GLs_PT.pdf.

( 51 ) Regulamento (UE) do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia), altera a Decisão n.o 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/78/CE da Comissão (JO 2010, L 331, p. 12; a seguir «Regulamento EBA»).

( 52 ) Nos termos do artigo 16.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento EBA, «[n]o prazo de dois meses a contar da data de emissão de uma orientação ou recomendação, cada autoridade competente confirma se dá ou tenciona dar cumprimento a essa orientação ou recomendação. Se uma autoridade competente não der ou tencionar não dar cumprimento a essa orientação ou recomendação, deve informar a Autoridade, indicando as razões da sua decisão.»

( 53 ) BCE, Guia sobre Supervisão Bancária, 2014, pp. 27 a 30.

( 54 ) No caso vertente, o BCE alterou alguns parágrafos do projeto de decisão enviado pelo Banco de Itália, em função das observações feitas pela Fininvest na audição no BCE. Esta circunstância confirma, se necessário, a independência do BCE quando tem de apreciar de modo definitivo este tipo de procedimentos.

( 55 ) No mesmo sentido, v. Lackhoff, K., Single Supervisory Mechanism. A Practitioner’s Guide, Beck, Hart, Nomos, Múnich, 2017, p. 172: o procedimento de autorização de participações qualificadas «does not consist in a two‑step procedure (with a national and an ECB part) as the authorization procedure but is in its entirety an ECB supervisory procedure» [não constitui um procedimento em duas etapas (com uma parte nacional e uma parte BCE) constitutivas do procedimento de autorização, mas sim, na sua íntegra, um procedimento de fiscalização do BCE].

( 56 ) Decisão do BCE, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (BCE/2014/16) (JO 2014, L 175, p. 47). Quanto à atuação deste órgão interno de fiscalização administrativa, v. Brescia Morra, C., Smits y R., Magliari, A., «The Administrative Board of Review of the European Central Bank: Experience After 2 Years», European Business Organisation Law Review, 2017, pp. 567 a 589.

( 57 ) Na audiência, o BCE afirmou que esta hipótese não é habitual.

( 58 ) O projeto de decisão da ANC é redigido em língua inglesa em todos os casos, para efeitos da sua comunicação ao BCE, por ser tratar do idioma de comunicação entre as ANC e o BCE no seio do MUS (artigo 23.o do Regulamento‑Quadro do MUS). A decisão final do BCE é traduzida para a língua do requerente.

( 59 ) Nos termos desta disposição, «[s]e o requerente satisfizer todas as condições de autorização previstas na legislação nacional aplicável [do] Estado, a autoridade nacional competente adota, no prazo fixado nessa legislação, um projeto de decisão a fim de propor ao BCE que conceda a autorização. O projeto de decisão é comunicado ao BCE e ao requerente da autorização. Nos outros casos, a autoridade nacional competente deve indeferir o pedido de autorização».

( 60 ) A sua redação é a seguinte: «Na medida do necessário para o exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento, o BCE pode, por meio de instruções, exigir que essas autoridades nacionais exerçam os seus poderes, nos termos e nas condições estabelecidas no direito nacional, sempre que o presente regulamento não confira esses poderes ao BCE. Essas autoridades nacionais informam cabalmente o BCE sobre o exercício desses poderes».

( 61 ) V. análise de Chiti, E. e Recine, F., «The Single Supervisory Mechanism in Action: Institutional Adjustment and the Reinforcement of the ECB Position», European Public Law, 2018, n.o 24, pp. 103 a 108; e de Lamandini, M. e Ramos Muñoz, D., EU Financial Law, CEDAM Legal Studies, Wolters Kluwer, 2016, pp. 183 a 212.

( 62 ) Esta ideia foi salientada pelo Tribunal Geral no seu Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE (T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 54), contra o qual se encontra pendente recurso (processo C‑450/17 P). V. os comentários de D’Ambrosio, R. e Lamandini, M., «La “prima volta” do Tribunale dell’Unione europea in materia di Meccanismo di Vigilanza Unico», Giurisprudenza commerciale, 2017, pp. 594 a 599; e de Adalid, S., «Le MSU, nouveau sous‑système de droit de l’Union européenne», Revue des affaires européennes, 2017, n.o 2, pp. 373 a 370.

( 63 ) Acórdão de 18 de dezembro de 2007, Suécia/Comissão (C‑64/05 P, EU:C:2007:802, n.os 93 e 94); no mesmo sentido, v. Despacho do Presidente do Tribunal de Justiça de 13 de janeiro de 2009, Occhetto e Parlamento/Donnici e Itália [C‑512/07 P(R) e C‑15/08 P(R), EU:C:2009:3, n.o 53].

( 64 ) V., designadamente, Acórdãos de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão (60/81, EU:C:1981:264, n.os 9 e 10); de 9 de setembro de 2015, Lito Maieftiko Gynaikologiko kai Cheirourgiko Kentro/Comissão (C‑506/13 P, EU:C:2015:562, n.o 16); e de 20 de setembro de 2016, de Mallis e o./Comissão e BCE (C‑105/15 P a C‑109/15 P, EU:C:2016:702, n.o 51).

( 65 ) Em face de um ato preparatório da ANC que tivesse o mesmo conteúdo que o do BCE, as decisões do órgão jurisdicional nacional e do Tribunal de Justiça poderiam ser divergentes. Esta eventualidade verificar‑se‑ia se, no caso vertente, houvesse uma decisão do tribunal italiano e outra do Tribunal Geral com soluções contraditórias.

( 66 ) A redação desta disposição é a seguinte: «Para efeitos do exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento e com o objetivo de assegurar elevados padrões de supervisão, o BCE aplica toda a legislação aplicável da União e, no caso de diretivas, a legislação nacional que as transpõe. Caso a legislação aplicável da União seja constituída por regulamentos, e nos casos em que esses regulamentos concedam expressamente certas opções aos Estados‑Membros, o BCE deve aplicar também a legislação nacional relativa ao exercício dessas opções.»

( 67 ) Mesmo nos âmbitos de supervisão bancária regulados por normas de direito interno dos Estados‑Membros e não previstos expressamente pelo direito da União, o BCE considera‑se competente para o exercício da função supervisora e efetua uma aplicação pura de normas nacionais. Tal é afirmado numa comunicação às ANC: BCE, Additional clarification regarding the ECB’s competence to exercise supervisory powers granted under national law, letter SSM/2017/0140, de 31 de março de 2017, disponível em https://www.bankingsupervision.europa.eu/banking/letterstobanks/shared/pdf/2017/Letter_to_SI_Entry_point_information_letter.pdf?abdf436e51b6ba34d4c53334f0197612. V. os comentários de Smits, R., «Competences and alignment in an emerging future. After L‑Bank: how the Eurosystem and the single Supervisory Mechanism may develop», ADEMU Working Papers Series 2017/077, pp. 16 a 24.

( 68 ) Tal como afirmou a Comissão na audiência, em resposta à defesa assertiva da singularidade deste instrumento processual italiano feita pelos advogados de S. Berlusconi, o certo é que em muitos outros Estados‑Membros existem mecanismos jurisdicionais que procuram salvaguardar a autoridade do caso julgado das decisões jurisdicionais.

( 69 ) No ponto 2.2.1 da sua decisão de 2016, o BCE teve em conta os processos penais, ou sancionatórios, abertos ou com condenações, umas definitivas e outras não, contra Ubaldo Livolsi, Ferdinando Superti Furga e Silvio Berlusconi, bem como contra a Fininvest, para declarar que os adquirentes da participação qualificada não preenchiam o requisito de honorabilidade, nos termos das normas de direito italiano e das normas da União, aplicadas em conformidade com as Orientações conjuntas da EBA, da EIOPA e da ESMA relativas à avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações qualificadas em entidades do setor financeiro.

( 70 ) Ponto 2.2.2 in fine da decisão do BCE de 2016.

( 71 ) No Acórdão de 18 de julho de 2007, Lucchini (C‑119/05, EU:C:2007:434), o Tribunal de Justiça declarou, no essencial, que o direito da União se opõe à aplicação de uma disposição do direito nacional que pretende consagrar o princípio da força de caso julgado, como o artigo 2909.o do Código Civil italiano, quando a sua aplicação obsta à recuperação de um auxílio de Estado concedido em violação do direito da União e cuja incompatibilidade com o mercado comum foi declarada por uma decisão da Comissão que se tornou definitiva (Acórdãos de 3 de setembro de 2009, Fallimento Olimpiclub, C‑2/08, EU:C:2009:506, n.o 25; de 10 de julho de 2014, Impresa Pizzarotti, C‑213/13, EU:C:2014:2067, n.o 61; e de 11 de novembro de 2015, Klausner Holz Niedersachsen, C‑505/14, EU:C:2015:742, n.o 45).