ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

19 de outubro de 2017 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Responsabilidade extracontratual da União — Contrato público de serviços — Assistência técnica operacional destinada a constituir uma estrutura de rede para a atuação da parceria europeia para a inovação “Produtividade e sustentabilidade da agricultura” — Rejeição da proposta de um proponente — Proposta anormalmente baixa — Processo contraditório»

No processo C‑198/16 P,

que tem por objeto um recurso de decisão do Tribunal Geral, nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 8 de abril de 2016,

Agriconsulting Europe SA, com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por R. Sciaudone, avvocato,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por L. Di Paolo e F. Moro, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandada em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça (relator), presidente de secção, E. Levits, A. Borg Barthet, M. Berger, e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, a Agriconsulting Europe SA (a seguir «Agriconsulting») pede a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 28 de janeiro de 2016, Agriconsulting Europe/Comissão (T‑570/13, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2016:40), que julgou improcedente a ação de condenação da União Europeia no pagamento de uma indemnização pelos danos que sofreu por causa de irregularidades alegadamente cometidas pela Comissão Europeia no concurso «Constituição de uma estrutura de rede para a execução da parceria europeia de inovação “Produtividade e sustentabilidade da agricultura”» (AGRI‑2012‑PEI‑01).

Quadro jurídico

2

Com a epígrafe «Propostas anormalmente baixas», o artigo 139.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1605/2002 do Conselho, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO 2002, L 357, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE, Euratom) n.o 478/2007 da Comissão, de 23 de abril de 2007 (JO 2007, L 111, p. 13) (a seguir «Regulamento n.o 2342/2002»), dispõe, no seu n.o 1:

«Se, em relação a um determinado contrato, houver propostas que se revelem anormalmente baixas, antes de as rejeitar exclusivamente com base neste motivo, a entidade adjudicante solicita por escrito os esclarecimentos que entender necessários sobre os elementos constitutivos da proposta e verifica esses elementos, uma vez devidamente ouvidas as partes, tendo em conta as justificações fornecidas. Estes esclarecimentos podem dizer respeito, nomeadamente, à observância das disposições relativas à proteção e às condições de trabalho em vigor no local em que a prestação deve ser realizada.

[…]»

3

O artigo 146.o do Regulamento n.o 2342/2002, com a epígrafe «Comissão de avaliação das propostas e dos pedidos de participação», dispõe, no seu n.o 4:

«No caso de propostas anormalmente baixas a que se refere o artigo [139.°], a comissão de avaliação solicita os esclarecimentos que considere necessários em matéria de composição da proposta.»

Antecedentes do litígio

4

Os factos na origem do litígio foram expostos nos n.os 1 a 22 do acórdão recorrido, do seguinte modo:

«1.

Por anúncio de concurso público publicado em suplemento no Jornal Oficial da União Europeia de 7 de agosto de 2012 (JO 2012/S 61‑150‑249926), a Comissão Europeia abriu o concurso com a referência AGRI‑2012‑PEI‑01, destinado a constituir uma estrutura de rede para a atuação da parceria europeia para a inovação “Produtividade e sustentabilidade da agricultura” (a seguir “concurso”).

2.

Nos termos do ponto 1 do caderno de encargos do contrato (a seguir “caderno de encargos”), o adjudicatário tinha por missão contribuir para a criação e gestão da rede de parceria, composta por e aberta aos agentes que se ocupam de inovação e de abordagens inovadoras no setor da agricultura, como os agricultores, os investigadores, os consultores, as empresas, as organizações não‑governamentais, os consumidores e os organismos do setor público. O adjudicatário tinha a responsabilidade de estabelecer e assegurar o funcionamento do mecanismo de constituição de uma estrutura de rede, composta, por um lado, pelo pessoal afetado pelo adjudicatário à execução das missões indicadas no anúncio de concurso e, por outro, pelo local físico em que o pessoal irá trabalhar e prestar os seus serviços (a seguir “posto de informação”).

3.

As missões do adjudicatário do contrato estavam definidas no ponto 2 do caderno de encargos. Encontravam‑se divididas em nove missões principais, a saber: em primeiro lugar, a gestão do pessoal afetado às missões e à gestão do posto de informação; em segundo lugar, a animação da rede de parceria; em terceiro lugar, a atividade de implementação da rede e o desenvolvimento de instrumentos de comunicação; em quarto lugar, a atualização e manutenção de uma base de dados completa; em quinto lugar, a organização de uma lista de peritos externos; em sexto lugar, a realização de atividades de coordenação e de troca de informações; em sétimo lugar, o recenseamento das necessidades de pesquisa junto dos agentes no terreno; em oitavo lugar, o desenvolvimento do programa anual de trabalho; e, em nono lugar, o arquivo, a gestão do inventário e a salvaguarda de documentos e de informações. O caderno de encargos indicava o número mínimo de pessoal efetivo necessário para realizar as missões principais, prevendo, para esse fim, que o pessoal afetado às missões fosse composto por, pelo menos, dez pessoas “com equivalência a horário completo”, com um mínimo de seis a título permanente.

4.

Além disso, o caderno de encargos previa 27 missões adicionais, cuja execução devia ocorrer mediante pedido anual da Comissão, com um mínimo de três missões adicionais até um máximo de dez por ano, entendendo‑se que as missões adicionais n.os 24, 26 e 27 deviam, pelo menos, ser pedidas no primeiro ano. As missões adicionais englobavam a organização de grupos de reflexão, ou seja, grupos de peritos que estudam e debatem as questões especificamente relacionadas com o plano europeu de inovação (missões adicionais n.os 1 a 6), a organização de ateliers adicionais (missões adicionais n.os 7 a 9), de dias “no terreno” (missões adicionais n.os 10 a 13), de seminários adicionais (missões adicionais n.os 14 a 17), a avaliação do trabalho dos grupos operacionais (missões adicionais n.os 18 a 20), a organização de conferências (missão adicional n.o 21), da viagem e do alojamento dos participantes nos grupos de reflexão, nos ateliers e seminários (missão adicional n.o 22), a realização de missões nos Estados‑Membros (missão adicional n.o 23), a criação de uma lista de peritos (missão adicional n.o 24), o encerramento do posto de informação (missão adicional n.o 25), a criação do posto de informação (missão adicional n.o 26) e a identificação de todos os projetos pertinentes para a criação de uma base de dados (missão adicional n.o 27).

5.

Em conformidade com as disposições do caderno de encargos, o adjudicatário do contrato devia igualmente prever efetivos suficientes para que, para além das missões principais, o pessoal afetado às missões pudesse executar as tarefas previstas nas missões adicionais n.os 24 e 27, cuja realização estava prevista no decurso do primeiro ano do contrato.

6.

Nos termos do ponto 6 do caderno de encargos, o contrato é celebrado por um período de dez meses, sendo renovável por um período máximo de doze meses. O contrato prevê um orçamento máximo global de 2500000 euros por ano para a execução conjunta das missões principais e das missões adicionais, sendo o orçamento máximo anual para as missões principais de 1400000 euros e de 1500000 euros o das missões adicionais.

7.

Nos termos do ponto 7.5 do caderno de encargos, o processo do concurso é composto, em primeiro lugar, pela fase de exame das propostas com base em critérios de rejeição, seguido do exame das propostas com base em critérios de seleção, em segundo lugar, pela fase de avaliação das propostas com base em critérios de adjudicação (avaliação qualitativa e avaliação do preço) e, em terceiro lugar, pela fase de adjudicação do contrato com base no critério da proposta economicamente mais vantajosa. Os critérios de rejeição, seleção e adjudicação aplicados pela Comissão eram mencionados no ponto 9 do caderno de encargos.

8.

A Comissão recebeu cinco propostas, entre as quais a da demandante. Todos os proponentes passaram na primeira fase do processo do concurso, que consistia na análise da sua proposta com base em critérios de rejeição e de seleção, e chegaram à segunda fase do processo, que consistia na avaliação das propostas com base nos quatro critérios de adjudicação seguintes:

critério de adjudicação n.o 1: abordagem da relação entre ciência e prática;

critério de adjudicação n.o 2: abordagem relativa à execução das missões principais e adicionais;

critério de adjudicação n.o 3: organização prática das tarefas;

critério de adjudicação n.o 4: propostas para a criação de um posto de informação em Bruxelas (Bélgica).

9.

No âmbito da segunda fase do processo, apenas dois proponentes, concretamente a demandante e a Vlaamse Landmaatschappij (a seguir “VLM”), obtiveram a pontuação mínima exigida no caderno de encargos para os critérios de adjudicação. Estas duas proponentes chegaram, assim, à fase de avaliação dos seus preços, que ascendiam a 1320112,63 euros para a demandante e a 2316124,83 euros para a VLM.

10.

Resulta da ata da reunião da comissão de avaliação de 20 de novembro de 2012 que a demandante foi classificada em primeiro lugar e que, tendo dúvidas sobre o caráter anormalmente baixo da sua proposta, a comissão de avaliação concluiu que lhe deviam ser pedidas informações relativamente ao preço das missões adicionais.

11.

Por carta de 22 de novembro de 2012, a Comissão informou a demandante de que a comissão de avaliação tinha considerado anormalmente baixos os preços indicados para as missões adicionais. Pediu‑lhe explicações detalhadas sobre o cálculo dos preços propostos para as missões adicionais n.os 1 a 21 e n.o 25, indicando que a sua proposta poderia ser rejeitada caso não fossem apresentadas explicações convincentes.

12.

Por carta de 29 de novembro de 2012, a demandante respondeu ao pedido de informações da Comissão fornecendo‑lhe explicações gerais e uma lista dos custos utilizados para a formulação das suas propostas de preço relativamente àquelas missões adicionais.

13.

Resulta do relatório final de avaliação da proposta da demandante, de 19 de dezembro de 2012, que a comissão de avaliação analisou as explicações desta última e constatou, designadamente, a existência de empregos cruzados de efetivos entre as missões principais e as missões adicionais, não conformes com as exigências do caderno de encargos. Modificou, assim, a pontuação atribuída à proposta da demandante para o critério de adjudicação n.o 3, que passou de 11,8 a 7 pontos, sendo a pontuação mínima exigida de 7,5 pontos em 15. A comissão de avaliação concluiu desse modo a sua apreciação, por um lado, confirmando o seu parecer quanto ao caráter anormalmente baixo da proposta da demandante e, por outro, constatando que, com base nas novas informações transmitidas por esta última, a sua proposta já não atinge a pontuação mínima exigida pelo caderno de encargos para o critério de adjudicação n.o 3. Por consequência, a mesma comissão recomendou a adjudicação do contrato à VLM.

14.

Por carta de 25 de março de 2013, a Comissão informou a demandante de que a sua proposta não tinha sido escolhida, dado que não atingiu o mínimo requerido pelo critério de adjudicação n.o 3 e de que a mesma tinha sido considerada anormalmente baixa relativamente aos preços propostos para executar determinadas missões adicionais. A Comissão decidiu adjudicar o contrato à VLM nesse mesmo dia.

15.

Por carta de 26 de março de 2013, a demandante pediu o nome do adjudicatário do contrato, bem como as características e as vantagens da proposta do mesmo. A Comissão transmitiu‑lhe estas informações por carta de 27 de março de 2013.

16.

Por carta de 29 de março de 2013, a demandante pediu mais informações à Comissão relativamente à avaliação da sua proposta. A Comissão respondeu‑lhe por carta de 10 de abril de 2013.

17.

Por carta de 12 de abril de 2013, a demandante censurou a autoridade adjudicante por falta de comunicação dos esclarecimentos necessários relativamente à avaliação do primeiro e segundo critérios, pela alteração da sua apreciação técnica após a abertura da proposta financeira, pela avaliação incorreta da implicação do chefe de equipa e do seu adjunto nas missões adicionais e pelo caráter erróneo das conclusões relativas à proposta da VLM.

18.

Por correio eletrónico enviado à Comissão na mesma data, a demandante pediu a esta última o acesso aos relatórios da comissão de avaliação e à proposta do adjudicatário, com fundamento no artigo 6.o do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43).

19.

Numa primeira carta de 29 de abril de 2013, a Comissão informou a demandante de que relatório da comissão de avaliação lhe seria transmitido rapidamente. Numa segunda carta do mesmo dia, a Comissão respondeu ao pedido de acesso da demandante fornecendo‑lhe uma cópia parcial do relatório de avaliação de 20 de novembro de 2012, do relatório de avaliação final de 19 de dezembro de 2012 e do relatório de avaliação global de 6 de fevereiro de 2013. Em contrapartida, a Comissão recusou comunicar‑lhe a proposta do adjudicatário invocando a proteção dos interesses comerciais da empresa em causa, com fundamento no artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

20.

Por correio eletrónico de 13 de maio de 2013, a demandante apresentou um pedido confirmativo de acesso, em conformidade com o artigo 7.o do Regulamento n.o 1049/2001. Por correio eletrónico de 14 de maio de 2013, a Comissão acusou a sua receção, tendo informado que ia responder no prazo de quinze dias úteis.

21.

Por outra carta de 13 de maio de 2013, a demandante contestou a posição da Comissão expressa na segunda carta de 29 de abril de 2013, que considerou insuficiente. Por carta de 31 de maio de 2013, a Comissão respondeu que a demandante dispunha de toda a documentação relativa ao processo de concurso que serviu de fundamento à decisão de adjudicação, referindo‑se igualmente à sua carta de 29 de abril de 2013.

22.

Relativamente ao pedido confirmativo de acesso, por carta de 4 de junho de 2013, a Comissão indicou à demandante que o prazo de resposta tinha sido prorrogado até 26 de junho de 2013. Em 26 de junho de 2013, a Comissão informou a demandante de que lhe era impossível responder ao pedido confirmativo de acesso no prazo acima referido. Por correio eletrónico de 4 de julho de 2013, a demandante solicitou uma resposta ao seu pedido confirmativo de acesso, ao qual a Comissão respondeu em 9 de julho de 2013, informando a empresa de que a resposta lhe seria enviada dentro de poucos dias. Por carta de 17 de julho de 2013, a Comissão respondeu ao pedido confirmativo de acesso da demandante confirmando a sua decisão anterior de ocultar determinadas informações contidas nos relatórios de avaliação e de não conceder o acesso à proposta do adjudicatário, em aplicação do artigo 4.o, n.o 2, primeiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.»

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

5

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de outubro de 2013, a Agriconsulting propôs uma ação pedindo que a Comissão seja condenada, primeiro, a comunicar a proposta da adjudicatária VLM e, segundo, no pagamento de uma indemnização, nos termos dos artigos 268.° TFUE e 340.° TFUE, pelos danos alegadamente causados por irregularidades cometidas pela Comissão no concurso. Pelo acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou integralmente improcedente a ação.

Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

6

A Agriconsulting pede que o Tribunal de Justiça:

anule o acórdão recorrido e devolva o processo ao Tribunal Geral para que este decida novamente em conformidade com as indicações do Tribunal de Justiça;

condene a Comissão nas despesas do presente recurso e do processo em primeira instância.

7

A Comissão pede ao Tribunal de Justiça que:

negue provimento ao recurso na íntegra;

condene a recorrente nas despesas da instância.

Quanto ao recurso

8

A Agriconsulting apresenta quatro fundamentos para o presente recurso.

Quanto ao primeiro fundamento

Argumentos das partes

9

Com o seu primeiro fundamento, dividido em duas partes, a Agriconsulting critica o Tribunal Geral por ter considerado, no n.o 46 do acórdão recorrido, que não existia qualquer nexo de causalidade entre as ilegalidades alegadamente cometidas na avaliação da sua proposta à luz dos critérios de adjudicação nos 1 e 2 e os danos que invoca na ação.

10

No âmbito da primeira parte desse fundamento, a Agriconsulting alega que o Tribunal Geral deformou e desvirtuou os seus argumentos sobre o nexo de causalidade. Com efeito, ao contrário do que afirma o Tribunal Geral nos n.os 42 e 43 do acórdão recorrido, a Agriconsulting, na ação, quis dissociar os danos constituídos pela perda de oportunidade e pelas despesas de participação no concurso da questão da rejeição da sua proposta. A esse respeito, resulta claramente do artigo 105.o da petição e do artigo 3.o da réplica em primeira instância que a perda de oportunidade e as despesas de participação constituíam, para a recorrente, danos indemnizáveis, independentemente da questão da certeza de obter o contrato.

11

No âmbito da segunda parte do seu primeiro fundamento, a Agriconsulting alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao concluir, nos n.os 43 a 45 do acórdão recorrido, que as ilegalidades invocadas quanto aos critérios de adjudicação n.os 1 e 2 não podiam dar origem a uma reparação na medida em que a rejeição da proposta da recorrente resultava das apreciações da comissão de avaliação sobre o critério de adjudicação n.o 3 e o caráter anormalmente baixo dessa proposta. Entende que, desse modo, o Tribunal Geral restringiu a ação de indemnização unicamente aos casos de ilegalidades com influência certa na adjudicação de um contrato, ao passo que, de acordo com a jurisprudência desse tribunal, qualquer irregularidade no processo de concurso suscetível de afetar as possibilidades de o contrato ser adjudicado a um proponente confere o direito à reparação.

12

A Comissão entende que o primeiro fundamento é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

13

Há que lembrar que o Tribunal Geral considerou antes de mais, no n.o 41 do acórdão recorrido, que a Agriconsulting invocava, por causa das irregularidades nos critérios de adjudicação n.os 1 e 2, dois tipos de dano, a saber, a perda de oportunidade e as despesas de participação no processo de concurso. Seguidamente, no n.o 42 desse acórdão, resumiu a argumentação desta nos termos seguintes: «[a] demandante alega que o requisito do nexo de causalidade está preenchido porque a sua proposta foi classificada em primeiro lugar e, se não se tivessem verificado as violações indicadas, deveria ter obtido a adjudicação do contrato». Por último, nos n.os 43 a 46 desse acórdão, o Tribunal Geral respondeu à argumentação assim resumida, considerando, em substância, que as alegadas ilegalidades não apresentavam um nexo de causalidade direta com os danos alegados pela recorrente.

14

Quanto à primeira parte do primeiro fundamento relativa a uma alegada deformação dos argumentos da Agriconsulting pelo Tribunal Geral, refira‑se, em primeiro lugar, que, no artigo 102.o da petição, a Agriconsulting tinha indicado, a título de explicação sobre o nexo de causalidade entre as ilegalidades alegadamente cometidas no âmbito do processo de concurso, por um lado, e a perda de oportunidade que alega ter sofrido, por outro, que essa perda de oportunidade era «a consequência direta da decisão da comissão de avaliação de baixar a nota no respeitante ao critério n.o 3 e considerar anormalmente baixa a proposta».

15

Por outro lado, a recorrente tinha alegado, nos artigos 76.° e 79.° da petição, que a alegada perda de oportunidade se materializava no facto de a sua proposta ter sido classificada em primeiro e de ter sido ilegalmente privada da adjudicação do contrato.

16

Assim, no n.o 42 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não deformou os argumentos da recorrente quanto ao nexo de causalidade entre as ilegalidades invocadas e a alegada perda de oportunidade. Muito pelo contrário, reproduziu‑os tal como resultavam da petição.

17

Esta conclusão não é posta em causa pelo artigo 105.o da petição, que não serve à Agriconsulting para demonstrar o teor da sua argumentação sobre a alegada perda de oportunidade. Com efeito, as explicações que constam desse artigo são manifestamente alheias a esse assunto, uma vez que a recorrente aí refere as condições previstas na jurisprudência do Tribunal Geral para se obter o reembolso das despesas de participação no concurso. De resto, esse artigo consta da secção da petição com a epígrafe «Nexo de causalidade relativo ao dano constituído pelas despesas de participação no concurso».

18

A recorrente também não pode invocar as explicações que constam do artigo 3.o da réplica em primeira instância. Com efeito, a recorrente limitou‑se a repetir o que tinha apresentado, no artigo 105.o da petição, como a jurisprudência do Tribunal Geral relativa ao reembolso das despesas de participação, acompanhada de uma interpolação no sentido de que as alegadas ilegalidades relativas aos critérios de adjudicação n.os 1 e 2 vinham «em apoio» não só desse dano, mas também da perda de oportunidade, sem mais explicações a esse respeito. Esse artigo 3.o dá, portanto, quando muito, uma precisão sobre os tipos de dano invocados relativos a essas ilegalidades.

19

Em segundo lugar, no que respeita aos argumentos da Agriconsulting relativos ao nexo de causalidade entre, por um lado, as ilegalidades alegadas e, por outro, o dano constituído pelas despesas de participação no concurso, há que assinalar que foi essencialmente nos n.os 112 a 117 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral se pronunciou sobre o reembolso dessas despesas. Ora, a recorrente não alega no presente recurso que a presumível desvirtuação ou deformação dos seus argumentos pelo Tribunal Geral, no n.o 42 do acórdão recorrido, tivesse viciado a análise que consta desses números. Invoca, assim, uma desvirtuação sem explicar as consequências que dela extrai. Nessa medida, a primeira parte do primeiro fundamento é inoperante.

20

Daí resulta que essa primeira parte é, em parte, manifestamente improcedente e, em parte, inoperante.

21

Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, conforme resumida no n.o 11 do presente acórdão, basta observar que, nos n.os 43 a 45 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não considerou de forma abstrata e geral que as ilegalidades que afetam um processo de concurso, como as que são aqui alegadas pela Agriconsulting relativamente aos critérios de adjudicação n.os 1 e 2, nunca podem dar direito à reparação a um proponente. No caso, o Tribunal Geral limitou‑se a apreciar in concreto se esse direito à reparação existia, tendo em conta os argumentos apresentados pela recorrente a respeito do nexo de causalidade e procedendo a uma apreciação dos factos do caso.

22

Em suma, essa parte põe em causa a apreciação dos factos feita pelo Tribunal Geral quanto ao nexo de causalidade, o que está excluído da competência do Tribunal de Justiça em segunda instância, salvo no caso de desvirtuação. Ora, uma vez que, pelas razões expostas nos n.os 14 a 19 do presente acórdão, a recorrente não tem fundamentos para sustentar qualquer desvirtuação dos seus argumentos, essa parte é inadmissível.

23

Tendo em conta estas considerações, improcede integralmente o primeiro fundamento.

Quanto ao segundo fundamento

Argumentos das partes

24

No âmbito da primeira parte do seu segundo fundamento, a Agriconsulting alega que, nos n.os 56 a 62 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral desvirtuou a avaliação da comissão de avaliação e não cumpriu o seu dever de fundamentação.

25

Com efeito, tal como resulta do relatório de avaliação final, a comissão de avaliação apreciou a fiabilidade da proposta da recorrente unicamente à luz do preço proposto para as missões adicionais. Ora, o Tribunal Geral reconheceu isso, nos n.os 56 e 57 do acórdão recorrido, não deixando de concluir seguidamente que a comissão havia tido em conta essa proposta no seu conjunto. Entende que o raciocínio do Tribunal Geral a esse respeito é insuficiente, incoerente e não sustentado, uma vez que não se baseia em qualquer prova em particular, em violação da regra onus probandi incumbit ei qui dicit.

26

No âmbito da segunda parte do segundo fundamento, a Agriconsulting alega, por razões análogas às expostas no número anterior, que o Tribunal Geral substituiu pela sua a fundamentação da comissão de avaliação e desvirtuou as peças processuais.

27

A Comissão alega que o segundo fundamento é inadmissível, a título principal, e improcedente, a título subsidiário.

Apreciação do Tribunal de Justiça

28

Com as duas partes do segundo fundamento, a tratar conjuntamente, a Agriconsulting acusa o Tribunal Geral de ter desvirtuado «a apreciação da comissão de avaliação» e as «peças processuais», substituído pela sua a apreciação da comissão de avaliação e de se ter baseado em fundamentação insuficiente, contraditória e não sustentada. Esta argumentação deve ser entendida no sentido de que a recorrente alega essencialmente, por um lado, que o Tribunal Geral desvirtuou o ofício da Comissão de 25 de março de 2013 e o relatório de avaliação final e, por outro, que não cumpriu o seu dever de fundamentação.

29

A esse respeito, há que lembrar que, no n.o 55 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral refere a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual o caráter anormalmente baixo de uma proposta deve ser apreciado face à composição da proposta e à prestação em causa (v., por analogia, acórdão de 18 de dezembro de 2014, Data Medical Service, C‑568/13, EU:C:2014:2466, n.o 50). Seguidamente, no n.o 56 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral resumiu o conteúdo do ofício da Comissão de 25 de março de 2013, que informa a recorrente de que a sua proposta era rejeitada, e o conteúdo do relatório de avaliação final. No n.o 57 desse acórdão, considerou que as anomalias que levaram a comissão de avaliação a concluir pelo caráter anormalmente baixo da proposta da recorrente diziam respeito mais em particular a certas missões adicionais. Contudo, nos n.os 58 a 61 desse acórdão, o Tribunal Geral considerou, nomeadamente, que, tendo em conta a importância económica e financeira das missões adicionais no montante do contrato em causa, as anomalias detetadas podiam ferir a coerência da proposta da Agriconsulting no seu todo. Concluiu daí, no n.o 62 do mesmo acórdão, que a comissão de avaliação tinha efetuado a sua apreciação do caráter anormalmente baixo da proposta da Agriconsulting face à composição da proposta e à prestação em causa, tendo em conta os elementos relevantes para essa prestação.

30

Assim, no que respeita, em primeiro lugar, a uma eventual desvirtuação da prova pelo Tribunal Geral, há que lembrar que essa desvirtuação deve transparecer de forma manifesta nos autos, sem que seja necessário proceder a uma nova apreciação dos factos e da prova (acórdãos de 20 de novembro de 2014, Intra‑Presse/Golden Balls, C‑581/13 P e C‑582/13 P, não publicado, EU:C:2014:2387, n.o 39 e jurisprudência aí referida, e de 26 de outubro de 2016, Westermann Lernspielverlage/EUIPO, C‑482/15 P, EU:C:2016:805, n.o 36 e jurisprudência aí referida).

31

Não obstante, no caso, a coberto de uma desvirtuação da prova, a Agriconsulting pretende, na realidade, obter uma nova apreciação dos factos, o que está fora da competência do Tribunal de Justiça em segunda instância (v., por analogia, acórdãos de 2 de setembro de 2010, Calvin Klein Trademark Trust/IHMI, C‑254/09 P, EU:C:2010:488, n.o 49, e de 19 de março de 2015, MEGA Brands International/IHMI, C‑182/14 P, EU:C:2015:187, n.o 47 e jurisprudência aí referida).

32

Com efeito, a Agriconsulting não alega que a leitura feita pelo Tribunal Geral do ofício da Comissão de 25 de março de 2013 e do relatório de avaliação final esteja ferida de uma qualquer inexatidão material. Pelo contrário, a recorrente reconhece que o Tribunal Geral resumiu corretamente o seu teor no n.o 56 do acórdão recorrido. O que contesta é a apreciação feita pelo Tribunal Geral, nos n.os 57 a 61 desse acórdão, do conteúdo desses documentos à luz do contexto em que se inserem, incluindo a importância económica e financeira das missões adicionais no contrato em causa, e a conclusão que este daí extraiu no sentido de que as anomalias detetadas eram suscetíveis de ferir a fiabilidade da proposta da Agriconsulting no seu todo.

33

Consequentemente e nessa medida, o segundo fundamento é inadmissível.

34

Em segundo lugar, quanto às alegações da Agriconsulting de que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de fundamentação, é certo que a questão de saber se a fundamentação de um acórdão do Tribunal Geral é contraditória ou insuficiente constitui uma questão de direito que pode ser invocada em segunda instância (acórdão de 16 de julho de 2009, Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão, C‑385/07 P, EU:C:2009:456, n.o 71 e jurisprudência aí referida).

35

Contudo, ao alegar que a fundamentação do acórdão recorrido é contraditória, a Agriconsulting pretende uma vez mais obter uma nova apreciação dos factos. Com efeito, a consideração que consta do n.o 57 do acórdão recorrido, segundo a qual «as anomalias mencionadas […] dizem mais concretamente respeito a determinadas missões adicionais», não é, em si mesma, incompatível com a conclusão que consta do n.o 62 desse acórdão de que «a comissão de avaliação efetuou a sua apreciação atendendo à composição da proposta e à prestação em causa». Na realidade, a recorrente contesta as apreciações de ordem factual que constam dos n.os 58 a 61 desse acórdão e que levaram o Tribunal Geral dessa consideração a essa conclusão.

36

Quanto à falta de fundamentação alegada pela recorrente, resulta das considerações que constam dos n.os 57 a 61 do acórdão recorrido, referidas no n.o 29 do presente acórdão, que o Tribunal Geral fundamentou suficientemente a conclusão, no n.o 62 do acórdão recorrido, de que a comissão de avaliação tinha agido de acordo com a jurisprudência resultante do acórdão de 18 de dezembro de 2014, Data Medical Service (C‑568/13, EU:C:2014:2466).

37

Daí resulta que se rejeita integralmente o segundo fundamento da recorrente por ser parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento

Argumentos das partes

38

Com o seu terceiro fundamento, a Agriconsulting alega, numa primeira parte, que o Tribunal Geral, nos n.os 64 a 69 do acórdão recorrido, deformou e desvirtuou a sua petição. Com efeito, apesar de ela ter invocado o caráter arbitrário, irracional, subjetivo e indefinido dos preços e dos custos de referência utilizados pela comissão de avaliação na apreciação do caráter anormalmente baixo da sua proposta (a seguir «parâmetros económicos de referência»), o Tribunal Geral não conheceu do seu mérito. Limitou‑se a considerar, no n.o 66 do acórdão recorrido, que a recorrente não tinha demonstrado a seriedade da sua proposta.

39

Nesse âmbito, a recorrente acusa igualmente o Tribunal Geral de ter negligenciado a prova que ela produziu para demonstrar que esses parâmetros económicos não eram fiáveis. Mais precisamente, o Tribunal Geral não teve em conta uma simulação da qual resultava que, ao aplicar às missões principais os mesmos parâmetros económicos, o orçamento previsto no caderno de encargos para essas missões era insuficiente.

40

Por outro lado, a Agriconsulting entende que o Tribunal Geral não lhe podia opor, como fez no n.o 66 do acórdão recorrido, o facto de não lhe ter comunicado, na sua proposta inicial, as informações capazes de demonstrar as reduções de que ela tinha beneficiado, pois nenhuma regra do processo de concurso lhe impunha que o fizesse. O Tribunal Geral também não podia criticá‑la por não ter prestado essas informações na carta de 29 de novembro de 2012 em resposta ao pedido de informações da Comissão. Com efeito, essas informações não faziam parte das informações pedidas por essa instituição no seu ofício de 22 de novembro de 2012. Por último, o Tribunal Geral não podia criticar a recorrente por não ter seguidamente comunicado os acordos de colaboração com os peritos, pois a Comissão não a tinha autorizado a fazê‑lo.

41

Com a segunda parte do seu terceiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral, nos n.os 73 a 76 do acórdão recorrido, cometeu um erro de direito ao considerar que a Comissão não tinha violado o princípio do contraditório ao recusar à recorrente o direito a prestar essas informações complementares.

42

A esse respeito, resulta de jurisprudência constante que a entidade adjudicante tem que pedir ao proponente as precisões capazes de demonstrar a seriedade da sua proposta no âmbito de um processo contraditório. Ora, no caso, na medida em que o pedido da comissão de avaliação foi formulado no sentido de que não era relativo à validade dos preços apresentados na proposta da Agriconsulting, mas sim ao método de cálculo desses preços, a recorrente afirma ter sido levada a prestar informações unicamente relativas aos elementos numéricos desse cálculo. Assim, deveria ter tido a possibilidade de prestar informações complementares para remover qualquer dúvida quanto ao fundado desses números. A esse respeito, a jurisprudência não limita a uma única comunicação o direito de um proponente apresentar observações. Pelo contrário, o princípio do contraditório implica, neste contexto, que ele possa apresentar, depois da apresentação das primeiras observações, precisões complementares, no limite do razoável.

43

Por último, numa terceira parte, a Agriconsulting considera que o Tribunal Geral cometeu vários erros de direito ao concluir, nos n.os 81 a 85 do acórdão recorrido, pela inexistência de qualquer violação do princípio da igualdade de tratamento. Antes de mais, o Tribunal Geral considerou erradamente que bastava o preço da proposta da Agriconsulting para demonstrar que essa proposta era anormalmente baixa. Seguidamente, não teve em conta o facto de, à luz dos parâmetros económicos de referência, a proposta da VLM também se revelar anormalmente baixa. Sobretudo, o Tribunal Geral deveria ter considerado que a Agriconsulting e a VLM, quanto às respetivas propostas, estavam, na realidade, na mesma situação. Com efeito, por um lado, essas propostas eram relativas ao mesmo contrato e, por outro, a sua fiabilidade era contestada pela entidade adjudicante, no caso da primeira, e pela Agriconsulting, no caso da segunda.

44

Além disso, o Tribunal Geral não analisou nem avaliou de forma adequada as provas propostas pela recorrente em apoio das suas alegações. Mais precisamente, ao considerar, no n.o 84 do acórdão recorrido, que a simulação apresentada por ela, mencionada no n.o 39 do presente acórdão, era irrelevante, o Tribunal Geral ignorou um elemento destinado precisamente a demonstrar que a proposta de VLM também era anormalmente baixa e, portanto, que, a esse respeito, esta estava em situação comparável à da recorrente.

45

A Comissão considera que o terceiro fundamento é improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

46

Para efeitos da análise do terceiro fundamento, há que inverter a ordem das suas diferentes partes.

47

Antes de mais, quanto à terceira parte desse fundamento, relativa a uma alegada violação do princípio da igualdade de tratamento, há que lembrar que esse princípio impõe que os proponentes disponham das mesmas oportunidades na formulação dos termos das suas propostas e implica, portanto, que essas propostas sejam apresentadas nas mesmas condições para todos os proponentes (despacho de 10 de novembro de 2016, Spinosa Costruzioni Generali e Melfi, C‑162/16, não publicado, EU:C:2016:870, n.o 23 e jurisprudência aí referida).

48

No caso, o Tribunal Geral, nos n.os 82 e 83 do acórdão recorrido, referiu que a proposta da VLM, calculada com base na fórmula prevista no caderno de encargos, era ligeiramente inferior ao limite máximo do orçamento previsto nesse caderno de encargos para a execução do contrato e superior, em quase um milhão de euros, à da Agriconsulting. Daí inferiu que a VLM não estava na mesma situação da Agriconsulting e que, portanto, a Comissão, sem violar o princípio da igualdade de tratamento, podia decidir verificar o caráter anormalmente baixo da proposta da recorrente sem aplicar o mesmo tratamento à da VLM.

49

Refira‑se que o tratamento diferenciado das propostas da Agriconsulting e da VLM está intrinsecamente ligado à questão da identificação das propostas anormalmente baixas e do processo que lhes é aplicado. Apreciar o mérito dos fundamentos do Tribunal Geral que constam dos n.os 82 e 83 do acórdão recorrido implica, pois, voltar às obrigações que se impõem, na matéria, à entidade adjudicante.

50

A esse respeito, o artigo 139.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2342/2002 dispõe que, se, em relação a um determinado contrato, houver propostas que se revelem anormalmente baixas, antes de as rejeitar exclusivamente com base nesse motivo, a entidade adjudicante solicitará por escrito os esclarecimentos que entender necessários sobre os elementos constitutivos da proposta e verificará, de forma contraditória, esses elementos, tendo em conta as justificações fornecidas.

51

Assim, esta disposição implica o dever de a entidade adjudicante, primeiro, identificar as propostas suspeitas, segundo, permitir aos proponentes em causa demonstrarem a respetiva seriedade, pedindo as precisões que julgue oportunas, terceiro, apreciar a relevância das explicações prestadas pelos interessados e, quarto, tomar uma decisão quanta à admissão ou rejeição dessas propostas (v., por analogia, acórdão de 27 de novembro de 2001, Lombardini e Mantovani, C‑285/99 e C‑286/99, EU:C:2001:640, n.o 55).

52

Ora, é só na condição de a fiabilidade de uma proposta ser, a priori, duvidosa que as obrigações decorrentes dessa disposição se impõem à entidade adjudicante, incluindo, no caso, a de verificar em pormenor a seriedade dos preços propostos por meio dos parâmetros económicos de referência.

53

No caso, na medida em que a comissão de avaliação tinha identificado a proposta da recorrente como, à primeira vista, anormalmente baixa e considerado que a da VLM não apresentava, a priori, qualquer anormalidade, podia, sem violar o princípio da igualdade de tratamento entre os proponentes, dar abertura ao processo contraditório previsto no artigo 139.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2342/2002 a respeito da primeira e verificar em pormenor os seus preços por meio dos parâmetros económicos de referência sem dar o mesmo tratamento à VLM. Assim, decidiu bem o Tribunal Geral, nos n.os 82 e 83 do acórdão recorrido, no sentido de que essas duas empresas, no tocante às respetivas propostas, não estavam na mesma situação.

54

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento da Agriconsulting de que o preço de uma proposta não permite, só por si, considerar que essa proposta é anormalmente baixa.

55

A esse respeito, na falta de uma definição do conceito de «proposta anormalmente baixa» ou de regras que permitam a identificação de uma proposta desse tipo no artigo 139.o, n.o 1, ou no artigo 146.o, n.o 4, do Regulamento n.o 2342/2002, cabe à entidade adjudicante determinar o método a utilizar para identificar as propostas anormalmente baixas (v., por analogia, acórdão de 18 de dezembro de 2014, Data Medical Service, C‑568/13, EU:C:2014:2466, n.o 49 e jurisprudência aí referida), sem prejuízo de que esse método seja objetivo e não discriminatório (v., por analogia, acórdão de 27 de novembro de 2001, Lombardini e Mantovani, C‑285/99 e C‑286/99, EU:C:2001:640, n.os 68 e 69).

56

No caso, como refere o Tribunal Geral, nos n.os 81 e 82 do acórdão recorrido, a comissão de avaliação identificou o caráter anormalmente baixo da proposta da Agriconsulting ao comparar o seu montante com o orçamento total máximo previsto no caderno de encargos, no montante de 2500000 euros. Ora, enquanto a proposta da VLM estava ligeiramente abaixo desse orçamento, a da Agriconsulting era inferior em quase um milhão de euros.

57

Ao contrário do que alega a recorrente, de acordo com a jurisprudência lembrada no n.o 55 do presente acórdão, nada impede a entidade adjudicante de comparar as propostas com o orçamento previsional do caderno de encargos e identificar uma delas, à primeira vista, como anormalmente baixa quando o montante dessa proposta seja consideravelmente inferior a esse orçamento previsional. A recorrente não demonstrou, nomeadamente, de que modo seria essa prática não objetiva ou discriminatória.

58

Por último, quanto aos argumentos da Agriconsulting de que o Tribunal Geral deveria ter considerado que a VLM estava, na realidade, na mesma situação que ela, há que assinalar, por um lado, que o simples facto de a recorrente contestar a fiabilidade da proposta da VLM não permite concluir pela comparabilidade das situações. Tendo em conta as considerações expostas nos n.os 52 e 53 do presente acórdão, era ainda necessário que a Agriconsulting demonstrasse as razões pelas quais a entidade adjudicante deveria ter duvidado, à primeira vista, da fiabilidade da proposta da VLM.

59

Por outro lado, refira‑se que o Tribunal Geral teve razão ao considerar, no n.o 84 do acórdão recorrido, que a simulação apresentada pela recorrente era irrelevante a esse respeito. Com efeito, essa simulação, que consistia em verificar em pormenor os preços apresentados na proposta da VLM por meio dos parâmetros económicos de referência, não é suscetível de demonstrar as razões pelas quais, a montante, a entidade adjudicante deveria ter duvidado da seriedade dessa proposta não obstante o seu valor estar muito próximo do orçamento previsional do caderno de encargos.

60

Daí resulta que improcede a terceira parte do terceiro fundamento.

61

Seguidamente, quanto à segunda parte desse fundamento relativa a uma alegada violação do princípio do contraditório, há que lembrar que o Tribunal Geral, depois de enumerar, no n.o 71 do acórdão recorrido, as obrigações resultantes do artigo 139.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2342/2002, cujos termos são lembrados no n.o 50 do presente acórdão, considerou, nos n.os 72 a 76 do acórdão recorrido, que, no caso presente, o processo contraditório previsto nessa disposição fora respeitado e que a recorrente tivera a possibilidade de justificar os seus custos e as suas tarifas considerados excessivamente baixos.

62

Contudo, a Agriconsulting alega, em substância, que a entidade adjudicante só respeita as obrigações que decorrem desse artigo 139.o, n.o 1, quando, para além do respeito formal das etapas do processo contraditório previsto nessa disposição, o proponente em causa tiver tido efetivamente a possibilidade de justificar os seus custos e tarifas. No caso, isso implicaria que a recorrente tivesse sido autorizada a prestar informações complementares às que constavam da sua carta de resposta de 29 de novembro de 2012, na medida em que a formulação do ofício de 22 de novembro de 2012 da Comissão não lhe permitia apreciar corretamente as informações pedidas por essa instituição.

63

A esse respeito, basta observar esse argumento assenta numa premissa de facto rejeitada pelo Tribunal Geral. Com efeito, este analisou o conteúdo do ofício da Comissão de 22 de novembro de 2012, no n.o 77 do acórdão recorrido, na medida em que essa instituição não tinha interrogado a recorrente unicamente quanto ao método de cálculo dos preços constantes da sua proposta, mas sim quanto a todos os elementos que tinham contribuído para a formação desses preços.

64

Ora, na medida em que o Tribunal de Justiça não pode, em segunda instância e na falta de desvirtuação, voltar a conhecer dos factos tal como apurados pelo Tribunal Geral, a segunda parte do terceiro fundamento é inadmissível.

65

Por último, quanto à primeira parte desse fundamento, relativa a uma alegada desvirtuação e deformação da petição da Agriconsulting pelo Tribunal Geral, verifica‑se que a recorrente tinha alegado, no artigo 68.o da petição, que a unidade de custo de referência utilizada no cálculo dos custos dos peritos era subjetiva e não tinha em conta o facto de ela ter conseguido negociar tarifas mais baixas com os peritos nem as suas capacidades organizacionais e comerciais.

66

A esse respeito, o Tribunal Geral referiu, nos n.os 66 e 67 do acórdão recorrido, que as afirmações da recorrente de que poderia ter negociado com os peritos tarifas inferiores às previstas nos parâmetros económicos de referência não tinham suporte.

67

Por outro lado, o Tribunal Geral considerou, no n.o 68 desse acórdão, que a Agriconsulting não tinha confirmado, através de números, o seu argumento de que a unidade de custo utilizada no cálculo do custo dos peritos era um parâmetro subjetivo. Além disso, referiu que o facto de a Agriconsulting invocar negociações de tarifas com os peritos da mesma categoria dos peritos das missões principais destinam‑se a confirmar que esses custos eram mais baixos do que a norma, sem que com isso tivessem sido prestadas justificações precisas.

68

Há que observar, assim, que o Tribunal Geral não ignorou o argumento da recorrente e deu‑lhe resposta bastante. Com efeito, podia limitar‑se a dizer, quanto a esse ponto, que a Agriconsulting não tinha demonstrado o fundado das suas asserções sobre o caráter inadequado dos parâmetros económicos de referência e as tarifas mais baixas que alegava ter conseguido negociar. De resto, a recorrente não alega que o Tribunal Geral tivesse cometido um erro de direito ao atribuir‑lhe a ela o ónus dessa prova. Não pode, pois alegar que o Tribunal Geral deformou ou desvirtuou a sua petição.

69

Quanto à alegação da Agriconsulting de que o Tribunal Geral ignorou a simulação que ela tinha apresentado para demonstrar o caráter arbitrário e não fiável dos parâmetros económicos de referência, basta lembrar que o presente recurso é limitado às questões de direito. Assim, só o Tribunal Geral tem competência para apurar e apreciar os factos relevantes e para apreciar o valor a dar às provas que lhe são apresentadas, sem prejuízo dos casos de desvirtuação desses factos ou provas (despacho de 11 de novembro de 2003, Martinez/Parlamento, C‑488/01 P, EU:C:2003:608, n.o 53 e jurisprudência aí referida).

70

Ora, a recorrente não apresentou elementos capazes de demonstrar essa desvirtuação. De resto, há que observar que o Tribunal Geral não abstraiu dessa simulação, uma vez que o acórdão recorrido a menciona várias vezes, nomeadamente no seu n.o 84. O facto de o Tribunal Geral não a ter referido nos n.os 63 a 69 desse acórdão manifesta, nem mais nem menos, que não a considerou probatória nesse contexto, apreciação que, rejeitada qualquer desvirtuação, é da sua exclusiva competência.

71

Por último, quanto ao argumento da Agriconsulting exposto no n.o 40 do presente acórdão, refira‑se que, na medida em que, nos n.os 72 a 76 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que a recorrente tinha tido a possibilidade de justificar os seus custos e as suas tarifas, teve razão ao criticá‑la por não ter sustentado as suas afirmações. Além disso, admitindo que a recorrente pretende, com esse argumento, pôr em causa essa consideração do Tribunal Geral, esse argumento é inadmissível, pelas razões que constam do n.o 64 do presente acórdão.

72

Daí resulta que a primeira parte do terceiro fundamento é parcialmente inadmissível e parcialmente improcedente.

73

Por conseguinte, improcede na íntegra o terceiro fundamento da recorrente.

74

De acordo com o artigo 139.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2342/2002, o caráter anormalmente baixo da proposta da Agriconsulting é motivo bastante para fundamentar juridicamente a sua rejeição. Ora, resulta de todas estas considerações que a recorrente não conseguiu demonstrar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que, no caso, não havia qualquer violação suficientemente caracterizada do direito da União no que respeita à apreciação do caráter anormalmente baixo da sua proposta pela Comissão.

75

Consequentemente, não é necessário apreciar se é procedente ou não o outro fundamento da rejeição da proposta da Agriconsulting, a saber, a nota que lhe foi atribuída quanto ao critério de adjudicação n.o 3.

76

Além disso, o Tribunal Geral considerou, no n.o 105 do acórdão recorrido, por razões análogas às referidas no número anterior do presente acórdão, que não se pode estabelecer a existência de um nexo de causalidade entre uma eventual irregularidade cometida na apreciação da proposta à luz do critério de adjudicação n.o 3 e os lucros cessantes correspondentes à perda do contrato alegados pela recorrente. Ora, embora esta efetivamente refira, no artigo 65.o da petição do presente recurso, os desenvolvimentos do Tribunal Geral relativos ao nexo de causalidade, não parece querer impugná‑los e, de qualquer forma, não apresenta qualquer alegação nesse sentido.

77

Face ao caráter cumulativo dos pressupostos da responsabilidade extracontratual da União, conforme prevista no artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, as considerações que constam dos n.os 74 a 76 do presente acórdão bastam para negar provimento ao presente recurso da Agriconsulting, sem que seja necessário conhecer do quarto fundamento, relativo ao exame feito pelo Tribunal Geral quanto aos lucros cessantes que ela alega ter sofrido por causa da rejeição da sua proposta (v., por analogia, acórdãos de 19 de abril de 2007, Holcim (Deutschland)/Comissão, C‑282/05 P, EU:C:2007:226, n.o 57, e de 14 de outubro de 2014, Giordano/Comissão, C‑611/12 P, EU:C:2014:2282, n.o 54).

Quanto às despesas

78

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso da decisão do Tribunal Geral for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decidirá sobre as despesas.

79

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, desse regulamento, aplicável ao processo de recurso de decisão do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação da Agriconsulting e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) decide:

 

1)

Nega‑se provimento ao recurso.

 

2)

A Agriconsulting Europe SA é condenada nas despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.