Processo C‑111/16

Processo penal

contra

Giorgio Fidenato e o.

(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunale di Udine)

«Reenvio prejudicial — Agricultura — Géneros alimentícios e alimentos para animais geneticamente modificados — Medidas de emergência — Medida nacional destinada a proibir o cultivo de milho geneticamente modificado MON 810 — Manutenção ou renovação da medida — Regulamento (CE) n.o 1829/2003 — Artigo 34.o — Regulamento (CE) n.o 178/2002 — Artigos 53.o e 54.o — Requisitos de aplicação — Princípio da precaução»

Sumário — Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 13 de setembro de 2017

  1. Aproximação das legislações—Géneros alimentares e alimentos geneticamente modificados para animais—Regulamento n.o 1829/2003—Medidas de emergência que podem ser adotadas para fazer face a um risco grave para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente—Estado‑Membro que informou oficialmente a Comissão da necessidade de tomar essas medidas—Produto autorizado por esse regulamento ou nos seus termos e que não é manifestamente suscetível de representar um risco grave para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente—Dever de a Comissão adotar essas medidas—Inexistência

    (Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.o 178/2002, artigos 53.o e 54.o, n.o 1, e n.o 1829/2003, artigo 34.o)

  2. Aproximação das legislações—Géneros alimentares e alimentos geneticamente modificados para animais—Regulamento n.o 1829/2003—Assunção de um risco grave para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente—Avaliação e gestão a cargo da Comissão e do Conselho sob fiscalização do juiz da União—Adoção e execução pelos Estados‑Membros de medidas de emergência na falta de uma decisão a nível da União—Competência dos tribunais nacionais para conhecer da legalidade dessas medidas à luz dos pressupostos de fundo previstos no artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003 e dos pressupostos processuais previstos no artigo 54.o do Regulamento n.o 178/2002—Adoção de uma decisão a nível da União—Caráter vinculativo das apreciações de facto e de direito contidas nessa decisão para todos os órgãos do Estado‑Membro destinatário, incluindo para os seus tribunais

    (Artigos 267.o, segundo e terceiro parágrafos, TFUE e 288.o TFUE; Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.o 178/2002, artigos 54.o e 58.o, e n.o 1829/2003, artigo 34.o)

  3. Aproximação das legislações—Géneros alimentares e alimentos geneticamente modificados para animais—Regulamento n.o 1829/2003—Medidas de emergência que podem ser adotadas para fazer face a um risco grave para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente—Estado‑Membro que informou oficialmente a Comissão da necessidade de tomar essas medidas—Facto de a Comissão não ter tomado tais medidas—Possibilidade de o Estado‑Membro tomar essas medidas a nível nacional—Possibilidade de este manter ou renovar essas medidas na falta de uma decisão da Comissão que imponha a sua prorrogação, alteração ou revogação

    (Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.o 178/2002, artigos 53.o e 54.o, e n.o 1829/2003, artigo 34.o)

  4. Aproximação das legislações—Géneros alimentares e alimentos geneticamente modificados para animais—Regulamento n.o 1829/2003—Medidas de emergência que podem ser adotadas para fazer face a um risco grave para a saúde humana, para a saúde animal ou para o ambiente—Possibilidade de os Estados‑Membros adotarem essas medidas unicamente com base no princípio da precaução, sem preencher os requisitos materiais previstos no artigo 34.o do regulamento—Inexistência

    (Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.o 178/2002, artigos 7.o, 53.o e 54.o, e n.o 1829/2003, artigo 34.o)

  1.  O artigo 34.o do Regulamento (CE) n.o 1829/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativo a géneros alimentícios e alimentos para animais geneticamente modificados, lido em conjugação com o artigo 53.o do Regulamento (CE) n.o 178/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro de 2002, que determina os princípios e normas gerais da legislação alimentar, cria a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos e estabelece procedimentos em matéria de segurança dos géneros alimentícios, deve ser interpretado no sentido de que a Comissão Europeia não é obrigada a adotar medidas de emergência, na aceção deste último artigo, quando um Estado‑Membro a informa oficialmente, em conformidade com o artigo 54.o, n.o 1, deste último regulamento, acerca da necessidade de adotar tais medidas, quando não for manifesto que um produto autorizado pelo Regulamento n.o 1829/2003 ou em conformidade com o mesmo é suscetível de representar um risco grave para a saúde humana, a saúde animal ou o ambiente.

    (cf. n.o 30, disp. 1)

  2.  V. texto da decisão.

    (cf. n.os 37‑41)

  3.  O artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003, lido em conjugação com o artigo 54.o do Regulamento n.o 178/2002, deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro pode, depois de ter oficialmente informado a Comissão Europeia da necessidade de recorrer a medidas de emergência, e quando a mesma não tenha adotado nenhuma medida em conformidade com o artigo 53.o do Regulamento n.o 178/2002, por um lado, tomar tais medidas a nível nacional e, por outro, mantê‑las ou renová‑las, enquanto a Comissão não tiver adotado, em conformidade com o artigo 54.o, n.o 2, deste último regulamento, a decisão que impõe a sua prorrogação, alteração ou revogação.

    (cf. n.o 42, disp. 2)

  4.  O artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003, lido em conjugação com o princípio da precaução tal como consagrado no artigo 7.o do Regulamento n.o 178/2002, deve ser interpretado no sentido de que não confere aos Estados‑Membros a faculdade de adotar, em conformidade com o artigo 54.o do Regulamento n.o 178/2002, medidas de emergência provisórias, baseando‑se apenas nesse princípio, sem que estejam preenchidos os requisitos materiais previstos no artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003.

    Com efeito, se, como salientou o advogado‑geral no n.o 78 das suas conclusões, o princípio da precaução, tal como consagrado no artigo 7.o do Regulamento n.o 178/2002, é um princípio geral da legislação alimentar, o legislador da União estabeleceu, no artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003, uma regra precisa para a tomada de medidas de emergência em conformidade com os procedimentos referidos nos artigos 53.o e 54.o do Regulamento n.o 178/2002. É certo que, como o Tribunal de Justiça declarou no n.o 71 do acórdão de 8 de setembro de 2011, Monsanto e o. (C‑58/10 a C‑68/10, EU:C:2011:553), os requisitos previstos no artigo 54.o, n.o 1, do Regulamento n.o 178/2002 aos quais está subordinada a adoção de medidas de emergência devem ser interpretados tendo em conta, nomeadamente, o princípio da precaução, com o objetivo de assegurar um elevado nível de proteção da vida e da saúde humana, procurando simultaneamente garantir a livre circulação de géneros alimentícios e alimentos para animais seguros e sãos, a qual constitui um aspeto essencial do mercado interno. Não obstante, este princípio não pode ser interpretado no sentido de que permite eliminar ou alterar, em particular flexibilizando‑as, as disposições previstas no artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003.

    Por outro lado, há que observar, como salientou o advogado‑geral no n.o 68 das suas conclusões, que as medidas provisórias de gestão dos riscos que podem ser adotadas com base no princípio da precaução e as medidas de emergência tomadas em aplicação do artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003 não obedecem ao mesmo regime. Com efeito, decorre do artigo 7.o do Regulamento n.o 178/2002 que a adoção destas medidas provisórias está subordinada à condição de que uma avaliação das informações disponíveis revele a possibilidade de efeitos nocivos para a saúde, mas que persista uma incerteza científica. Em contrapartida, o artigo 34.o do Regulamento n.o 1829/2003 permite recorrer a outras medidas de emergência «sempre que for evidente» que um produto autorizado por este último regulamento seja suscetível de constituir um risco «grave» para a saúde humana, a saúde animal ou o ambiente.

    (cf. n.os 46‑48, 50, 54, disp. 3)