CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

HENRIK SAUGMANDSGAARD ØE

apresentadas em 26 de abril de 2018 ( 1 )

Processo C‑629/16

CX

sendo interveniente

Bezirkshauptmannschaft Schärding

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria)]

«Reenvio prejudicial — Transportes internacionais rodoviários — Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a República da Turquia — Artigo 9.o — Protocolo adicional — Artigos 41.o e 42.o — Livre prestação de serviços — Cláusula de standstill — Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação CE‑Turquia — Artigos 5.o e 7.o — Livre circulação de mercadorias — Medidas de efeito equivalente a restrições quantitativas — Transportador turco de mercadorias que atravessa um Estado‑Membro em trânsito — Regulamentação nacional que sujeita esse transporte a uma autorização concedida no quadro de um contingente fixado no âmbito de um acordo bilateral celebrado entre o Estado‑Membro e a Turquia ou a uma autorização individual emitida para um transporte que revista interesse público relevante»

I. Introdução

1.

O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria) insere‑se no âmbito de um litígio que opõe o gerente de uma sociedade de transportes turca a uma autoridade administrativa austríaca que lhe aplicou uma coima por ter efetuado um transporte comercial de mercadorias a partir da Turquia e com destino à Alemanha, passando pela Áustria, sem dispor da autorização necessária para o efeito.

2.

Por força da regulamentação austríaca, o transporte comercial internacional rodoviário de mercadorias para o, através ou a partir do território austríaco não pode ser realizado sem uma autorização. Para os transportadores com sede na Turquia (a seguir «transportadores turcos»), essa autorização pode assumir a forma de uma autorização emitida no âmbito de um contingente fixado no acordo bilateral celebrado entre a República da Áustria e a República da Turquia sobre o Transporte Rodoviário ( 2 )(a seguir «Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário») ou de uma autorização individual emitida para um transporte específico que revista interesse público relevante. Essa autorização só pode ser emitida se o requerente provar suficientemente que o transporte não pode ser evitado através de medidas logísticas nem optando por um meio de transporte alternativo.

3.

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, em substância, sobre a conformidade do regime austríaco de autorização instituído para os transportadores turcos com as disposições que regem a Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia (a seguir «Associação CEE‑Turquia»), nomeadamente as previstas pelo Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia ( 3 ) (a seguir «Acordo de Associação CEE‑Turquia»), pelo Protocolo Adicional ao Acordo de Associação CEE‑Turquia ( 4 ) (a seguir «Protocolo Adicional») e pela Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação CE‑Turquia ( 5 ) (a seguir «Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação»).

4.

O órgão jurisdicional de reenvio começa por perguntar se o recorrente no processo principal pode invocar as disposições relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia para defender que o regime austríaco de autorização constitui uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas, na aceção do artigo 5.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, ou se, pelo contrário, o referido regime se integra na prestação de serviços de transporte. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta, além disso, se o regime austríaco de autorização tem um efeito discriminatório contra os transportadores turcos, em violação do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia.

5.

Nas presentes conclusões, explicarei as razões por que considero, por um lado, que a regulamentação austríaca em causa está abrangida pelo domínio da prestação de serviços de transporte e, por outro, que as disposições que regem a Associação CEE‑Turquia não se opõem a tal regulamentação desde que o órgão jurisdicional de reenvio se tenha certificado de que essa regulamentação não contém uma nova restrição à livre prestação de serviços na aceção do artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional.

II. Quadro jurídico

A.   Direito da União

1. Acordo de Associação CEE‑Turquia

6.

Nos termos do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia, «[a]s Partes Contratantes reconhecem que, no domínio da aplicação do Acordo e sem prejuízo das disposições especiais suscetíveis de serem adotadas em aplicação do artigo 8.o, é proibida qualquer discriminação exercida com base na nacionalidade, nos termos do princípio enunciado no artigo 7.o do Tratado que institui a Comunidade».

7.

O artigo 10.o do Acordo estipula:

«1.   A união aduaneira prevista no n.o 2 do artigo 2.o do Acordo abrange o conjunto do comércio de mercadorias.

2.   A união aduaneira implica:

a proibição entre os Estados‑Membros da Comunidade e a Turquia, tanto na importação como na exportação, dos direitos aduaneiros e encargos de efeito equivalente, bem como das restrições quantitativas e das medidas de efeito equivalente, que tenham por objetivo assegurar à produção nacional uma proteção contrária aos objetivos do Acordo;

[…]»

8.

Nos termos do artigo 14.o do Acordo, «[a]s Partes Contratantes acordam em inspirar‑se nos artigos 55.o, 56.o e 58.o a 65.o inclusive do Tratado que institui a Comunidade para eliminar entre si as restrições à livre prestação de serviços».

9.

O artigo 15.o do Acordo prevê que «[a]s condições e regras de extensão à Turquia das disposições do Tratado que institui a Comunidade e dos atos adotados em aplicação destas disposições no que diz respeito aos transportes serão estabelecidas tendo em conta a situação geográfica da Turquia».

2. Protocolo adicional

10.

O artigo 41.o, que figura no capítulo II do título II do Protocolo Adicional, sob a epígrafe «Direito de estabelecimento, serviços e transportes», tem a seguinte redação:

«1.   As Partes Contratantes abster‑se‑ão de introduzir, nas suas relações mútuas, novas restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços.

2.   O Conselho de Associação fixará, em conformidade com os princípios enunciados nos artigos 13.o e 14.o do Acordo de Associação, o calendário e as modalidades segundo os quais as Partes Contratantes suprimirão progressivamente, nas suas mútuas relações, as restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços.

O Conselho de Associação fixará este calendário e estas modalidades para as diferentes categorias de atividades, tendo em conta disposições análogas já adotadas pela Comunidade nestes domínios, bem como a situação especial da Turquia no plano económico e social. Será dada prioridade às atividades que contribuam de modo especial para o desenvolvimento da produção e das trocas comerciais.»

11.

O artigo 42.o, inserido no mesmo capítulo do Protocolo Adicional, prevê:

«1.   O Conselho de Associação estenderá à Turquia, de acordo com as modalidades que adote, tendo em conta, nomeadamente, a situação geográfica da Turquia, as disposições do Tratado que institui a Comunidade aplicáveis aos transportes. Pode, nas mesmas condições, estender à Turquia os atos adotados pela Comunidade em aplicação de tais disposições para os transportes ferroviários, rodoviários e por via navegável.

[…]»

3. Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação

12.

Nos termos do artigo 1.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, «[s]em prejuízo do disposto no Acordo de Ancara e nos seus protocolos complementar e adicional, o Conselho de Associação estabelece as regras de execução da fase final da união aduaneira prevista nos artigos 2.o e 5.o do referido acordo».

13.

O artigo 5.o, que figura na secção II do capítulo I da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, sob a epígrafe «Eliminação de restrições quantitativas ou medidas de efeito equivalente», dispõe:

«São proibidas entre as partes as restrições quantitativas à importação e todas as medidas de efeito equivalente.»

14.

Nos termos do artigo 7.o, «[o] disposto nos artigos 5.o e 6.o não prejudica as proibições ou restrições de importação, exportação ou trânsito justificadas por razões de moral pública, ordem pública, segurança pública, de proteção da saúde e da vida das pessoas, animais ou plantas, de proteção do património nacional com valor artístico, histórico ou arqueológico, ou de proteção da propriedade industrial e comercial. Contudo, essas proibições ou restrições não constituirão uma forma de discriminação arbitrária nem uma restrição dissimulada no comércio entre as partes».

B.   Direito austríaco

1. Lei sobre o transporte rodoviário de mercadorias

15.

Nos termos do § 1 da Güterbeförderungsgesetz (Lei relativa ao transporte rodoviário de mercadorias) de 1995 (BGBl. 593/1995, na redação publicada no BGBl. 96/2013, a seguir «GütbefG»), esta lei aplica‑se designadamente «ao transporte comercial de mercadorias realizado por empresas de transporte com recurso a veículos automóveis rodoviários, com ou sem reboque, cujo peso bruto autorizado exceda 3500 quilogramas».

16.

O § 2 da GütbefG, sob a epígrafe «Licenças obrigatórias e tipos de licença», prevê:

«(1)   O transporte comercial de mercadorias com recurso a veículos automóveis rodoviários só pode ser realizado quando devidamente concessionado, salvo disposição em contrário na presente lei (§ 4). […]»

17.

O § 7 da GütbefG, sob a epígrafe «Transporte internacional», dispõe:

«(1)   O transporte comercial de mercadorias com recurso a veículos automóveis rodoviários, a partir de locais situados fora do território federal, para o ou através do território federal, ou a partir de locais situados no território federal, para o estrangeiro, é autorizado não só aos concessionários nos termos do § 2 mas também aos empresários que, segundo as disposições em vigor no Estado da sede da respetiva empresa, estão autorizados a proceder ao transporte de mercadorias com recurso a veículos automóveis rodoviários e que são titulares de um dos seguintes instrumentos de legitimação:

1.

Licença comunitária nos termos do Regulamento (CE) n.o 1072/2009 ( 6 ),

2.

Licença atribuída com base na Resolução de 14 de junho de 1973, do Conselho da Conferência Europeia dos Ministros dos Transportes (CEMT),

3.

Autorização da ministra ou do ministro federal dos Transportes, Inovação e Tecnologia, para o transporte para a, através ou a partir da Áustria,

4.

Licença atribuída pela ministra ou pelo ministro federal dos Transportes, Inovação e Tecnologia, com base em acordos bilaterais […]»

18.

O § 8 da GütbefG, sob a epígrafe «Obtenção da legitimação», prevê:

«(1)   A autorização a que se refere o § 7, n.o 1, ponto 3, é atribuída a transportes específicos de mercadorias. Só será atribuída se o transporte revestir interesse público relevante. O requerente tem de fazer prova bastante de que a viagem não pode ser evitada nem através da adoção de medidas organizativas nem através do recurso a outro meio de transporte. A autorização deverá ser recusada se o transporte de mercadorias em causa não se revelar necessário (em especial, tendo em consideração os meios de transporte disponíveis no território federal). Neste contexto, impõe‑se ter em conta os interesses em matéria de transportes e económicos da Áustria, a proteção da população e do ambiente, bem como a possibilidade de realização do transporte de mercadorias com recurso a outras estruturas de transporte. […]

(3)   É possível celebrar acordos em matéria de transporte internacional de mercadorias nos termos do § 7, com base na presente lei federal, sempre que o volume do tráfego de mercadorias o justifique. Os acordos deverão estipular que os veículos automóveis com matrícula estrangeira poderão realizar viagens para a, através e a partir da Áustria, em regime de reciprocidade. Neste contexto, poderão também ser fixados contingentes entre os Estados, cujo volume deve ser estabelecido tendo em consideração os interesses em matéria de transportes e económicos da Áustria e a proteção da população e do ambiente. […]

(4)   A repartição do contingente acordado deve seguir um processo simplificado. A autoridade competente pode certificar que os pressupostos fixados no acordo, em especial o do cumprimento do contingente acordado, se encontram preenchidos (certificado de contingente). […]»

19.

O § 9 da GütbefG dispõe:

«(1)   O empresário deve assegurar que, em todos os transportes internacionais de mercadorias, os documentos comprovativos da legitimação requerida pelo § 7, n.o 1, devidamente preenchidos e, se for caso disso, validados pela autoridade competente, se encontram a bordo do veículo.

(2)   O condutor é obrigado, em todos os transportes internacionais de mercadorias e durante todo o trajeto, a estar na posse dos documentos comprovativos da legitimação requerida pelo § 7, n.o 1, devidamente preenchidos e, se for caso disso, validados pela autoridade competente, e a apresentá‑los às autoridades fiscalizadoras quando estas o solicitem.

[…]»

20.

O § 23 da GütbefG, sob a epígrafe «Disposições em matéria contraordenacional», estabelece:

«(1)   […] [P]ratica um ilícito contraordenacional punível com coima até 7267 euros quem, na qualidade de empresário,

[…]

(3)   realizar transportes, na aceção dos §§ 7 a 9, sem estar devidamente legitimado para o efeito ou não cumprir as previsões e proibições contidas em acordos bilaterais;

[…]»

2. Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário

21.

Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário, «[o]s veículos automóveis, incluindo semirreboques, que se encontrem matriculados num dos dois Estados e que sejam utilizados para o transporte de mercadorias entre estes Estados ou em trânsito pelos mesmos carecem de documento de identificação». O n.o 2 deste artigo determina que «[a]s deslocações sem carga e os veículos com uma carga máxima até 2 toneladas não carecem de documento de identificação».

22.

O artigo 6.o deste acordo prevê:

«1.   Os documentos de identificação são emitidos em nome dos empresários do setor do transporte de mercadorias e constituem título bastante para o transporte com recurso a veículos automóveis, incluindo semirreboques.

2.   O documento de identificação emitido por um Estado constitui título bastante para o transporte para o outro Estado, a partir dele e através do mesmo.

3.   Os documentos de identificação têm de se encontrar a bordo do veículo durante todo o trajeto no Estado em que se aplicam e devem ser apresentados às autoridades fiscalizadoras desse Estado sempre que estas o solicitem.»

23.

O artigo 7.o do referido acordo dispõe:

«1.   Os documentos de identificação são emitidos pelas autoridades competentes do Estado no qual o veículo se encontra licenciado, em nome da autoridade competente do outro Estado e no quadro do contingente que deverá ser obrigatoriamente fixado para o ano seguinte, até 30 de novembro de cada ano, por consenso entre as autoridades competentes de ambos os Estados.

2.   As autoridades competentes de ambos os Estados trocam entre si o número de formulários necessários para o transporte no âmbito deste acordo.»

III. Litígio no processo principal, questão prejudicial e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

24.

CX é gerente da sociedade FU, cuja sede se situa na Turquia, que se dedica à atividade de transporte de mercadorias.

25.

Por decisão de 17 de março de 2015, o Bezirkshauptmannschaft Schärding (autoridade administrativa do distrito de Schärding, Áustria) aplicou a CX uma coima de 1453 euros (pena de substituição de 67 horas de privação de liberdade) por um transporte comercial de mercadorias (artigos têxteis) realizado pela FU, em 2 de abril de 2015, a partir da Turquia, com destino à Alemanha, passando pela Áustria, sem dispor da autorização requerida para o efeito.

26.

CX recorreu desta decisão para o Landesverwaltungsgericht Oberösterreich (Tribunal Administrativo Regional da Alta Áustria, Áustria). Por sentença de 28 de dezembro de 2015, este tribunal negou provimento ao recurso, com o fundamento de que CX tinha infringido as disposições conjugadas do § 23, n.o 1, ponto 3, e do § 7, n.o 1, ponto 4, da GütbefG, bem como do artigo 4.o, n.o 1, e dos artigos 6.o e 7.o do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário, uma vez que o condutor do veículo não apresentou a autorização exigida para efetuar o transporte internacional de mercadorias entre a Áustria e a Turquia.

27.

CX interpôs recurso desta decisão para o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo).

28.

Por decisão de 22 de novembro de 2016, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de dezembro de 2016, o Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O direito da União — em especial o [Acordo de Associação CEE‑Turquia], o [Protocolo Adicional] e a Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação […] —opõe‑se a uma regulamentação nacional nos termos da qual empresários do setor do transporte de mercadorias, com sede na República da Turquia, só podem efetuar um transporte internacional rodoviário de mercadorias com destino ao ou através do território da República da Áustria se dispuserem, em relação aos veículos utilizados, de documentos de identificação emitidos no quadro de um contingente fixado no âmbito de um acordo bilateral celebrado entre [a República da Áustria] e [a República da Turquia], ou se lhes tiver sido atribuída uma licença para um transporte específico de mercadorias, devendo o referido transporte revestir interesse público relevante e cabendo ao requerente fazer prova bastante de que a viagem não pode ser evitada nem através da adoção de medidas organizativas nem através do recurso a outro meio de transporte?»

29.

Foram apresentadas observações escritas por CX, pelos Governos austríaco e húngaro e pela Comissão Europeia. Cada um deles foi representado na audiência de 31 de janeiro de 2018.

IV. Análise

A.   Aspetos introdutórios

30.

Nos termos da regulamentação austríaca em causa, o transporte comercial internacional rodoviário de mercadorias para o, através ou a partir do território austríaco não pode ser realizado sem uma autorização. Para os transportadores com sede num Estado‑Membro da União, essa autorização pode assumir a forma de uma licença comunitária emitida ao abrigo do Regulamento n.o 1072/2009 ( 7 ). Para os transportadores com sede num país terceiro, incluindo na Turquia, essa autorização pode, em contrapartida, assumir uma das duas formas seguintes.

31.

Em primeiro lugar, em conformidade com o § 7, n.o 1, ponto 4, da GütbefG, os transportadores com sede num país terceiro podem beneficiar de uma autorização emitida no âmbito de um acordo internacional. No que diz respeito aos transportadores turcos, o Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário prevê a fixação de um contingente anual dos transportes mediante a concertação entre as autoridades competentes dos dois Estados ( 8 ). Essas autorizações são concedidas aos transportadores turcos pelas autoridades turcas competentes, dentro dos limites do contingente fixado. O Governo austríaco salienta, a este respeito, que, atualmente, a República da Áustria e a República da Turquia acordaram um contingente anual de 21000 autorizações (contingente de base) ( 9 ), ao qual acresce um número variável de autorizações a título de recompensa ( 10 ), bem como autorizações concedidas no âmbito da Conferência Europeia dos Ministros dos Transportes (CEMT) («autorização CEMT») ( 11 ). Ao todo, a Turquia dispõe anualmente de cerca de 90000 a 100000 transportes rodoviários em trânsito através da Áustria.

32.

Em segundo lugar, os transportadores turcos têm a possibilidade de solicitar uma autorização nos termos do § 7, n.o 1, ponto 3, e do § 8, n.o 1, da GütbefG («autorização individual»). Esta autorização só é emitida para um transporte específico que revista interesse público relevante e na condição de o requerente fazer prova bastante de que o transporte não pode ser evitado através de medidas logísticas nem optando por um meio de transporte alternativo ( 12 ).

33.

Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o regime austríaco de autorização instaurado para os transportadores turcos é compatível com as disposições que regem a Associação CEE‑Turquia.

34.

CX alega que não é esse o caso. Em primeiro lugar, o referido regime restringe a livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia, em violação do artigo 5.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, ao permitir o trânsito apenas a um número limitado de transportadores turcos. O contingente fixado para os transportadores turcos é insuficiente. Por conseguinte, estes transportadores são obrigados a utilizar a «Rollende Landstraße» (transporte combinado rodoferroviário) ( 13 ), o que acarreta despesas suplementares e aumenta o tempo de transporte em relação ao transporte rodoviário ( 14 ). Tal significa que as mercadorias provenientes da Turquia encarecem e, em última análise, tornam‑se menos competitivas. As restrições associadas à contingentação dos transportes têm, portanto, efeitos económicos significativos para os fabricantes e os compradores dessas mercadorias e minam a eficácia da união aduaneira. Em segundo lugar, o regime austríaco de contingentação dos transportes leva a uma discriminação dos transportadores turcos, em violação do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia, dado que as restrições associadas à contingentação não se aplicam aos transportadores da União.

35.

O órgão jurisdicional de reenvio começa por se interrogar sobre se CX pode invocar a livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia, apesar de FU ser uma empresa de transporte de mercadorias que não fabrica, ela própria, as mercadorias que transporta, e se CX pode sustentar, em particular, que os requisitos aplicáveis à FU para beneficiar da autorização exigida pela GütbefG constituem uma medida de efeito equivalente a restrições quantitativas, na aceção do artigo 5.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação. O órgão jurisdicional de reenvio considera, nesta fase, que o caso vertente não deve ser examinado na perspetiva da livre circulação de mercadorias, porque, em sua opinião, no âmbito do Acordo de Associação CEE‑Turquia, a livre circulação de mercadorias, a livre prestação de serviços e o setor dos transportes são considerados matérias distintas umas das outras, que deverão ser aplicadas pela Associação a níveis e ritmos diferentes. Existem sérias razões para pensar que o domínio dos transportes devia ser deliberadamente excluído e não ser aplicado através da livre circulação de mercadorias ( 15 ).

36.

Se o Tribunal de Justiça considerar que CX pode invocar a livre circulação de mercadorias para sustentar que a regulamentação austríaca em causa conduz a uma restrição desta liberdade ou, pelo menos, a uma discriminação dos nacionais turcos na aceção do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia, coloca‑se então, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a questão de saber se esta restrição é justificada ao abrigo do artigo 7.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação.

37.

Na análise que se segue, irei tratar, em primeiro lugar, da questão da qualificação da regulamentação austríaca em causa à luz das disposições que regulamentam a Associação CEE‑Turquia. A este respeito, explicarei as razões por que considero, à semelhança dos Governos austríaco e húngaro e da Comissão, que essa regulamentação se integra no domínio dos serviços de transporte e que as disposições previstas na Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia não são aplicáveis a tal regulamentação (secção B. 1). Em segundo lugar, afastarei os argumentos contrários invocados por CX a respeito da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à livre circulação de mercadorias (secção B. 2). Em terceiro lugar, examinarei a regulamentação em causa à luz da cláusula de standstill, enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional, que proíbe a introdução de novas restrições à livre prestação de serviços (secção B. 3). Por último, abordarei brevemente a questão de uma eventual discriminação dos transportadores turcos na aceção do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia (secção B. 4).

B.   Quanto à questão prejudicial

1. Quanto à qualificação da regulamentação em causa e às disposições aplicáveis a essa regulamentação

38.

A questão prejudicial submetida pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo) começa por levantar uma questão relativa à qualificação da regulamentação em causa à luz das disposições que regem a Associação CEE‑Turquia ( 16 ). Tal regulamentação integra‑se nas disposições relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia ou, antes, nas relativas à prestação de serviços no domínio dos transportes?

39.

À semelhança dos Governos austríaco e húngaro e da Comissão, inclino‑me para a segunda hipótese.

40.

A este respeito, baseio‑me nas considerações seguintes.

41.

Em primeiro lugar, há que observar que, no âmbito da Associação CEE‑Turquia, a livre circulação de mercadorias, a livre prestação de serviços e os transportes constituem matérias distintas, sujeitas a diferentes regras ( 17 ). Estas regras refletem níveis variáveis de liberalização dos mercados em questão. Enquanto a livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia é garantida, designadamente, pelas disposições da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação relativa à união aduaneira ( 18 ), os domínios dos serviços e dos transportes continuam, no estado atual de desenvolvimento da Associação CEE‑Turquia, no essencial, sem ser liberalizados ( 19 ).

42.

No que respeita, em especial, ao domínio dos transportes, o artigo 15.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia prevê que «[a]s condições e regras de extensão à Turquia das disposições do Tratado que institui a Comunidade e dos atos adotados em aplicação destas disposições no que diz respeito aos transportes serão estabelecidas tendo em conta a situação geográfica da Turquia». Além disso, o artigo 42.o do Protocolo Adicional prevê que o Conselho de Associação amplie, de acordo com as modalidades que adotar, tendo em conta a situação geográfica da Turquia, as disposições do Tratado que institui a Comunidade aplicáveis aos transportes e que aquele pode, nas mesmas condições, estender à Turquia os atos adotados pela Comunidade em aplicação de tais disposições, designadamente para os transportes rodoviários.

43.

Todavia, há que constatar que, até agora, o Conselho de Associação não adotou modalidades para esse efeito. No estado atual de desenvolvimento da Associação CEE‑Turquia, não existe, portanto, nenhuma regulamentação específica em matéria de transportes ( 20 ).

44.

Em segundo lugar, quanto à questão de saber se uma legislação nacional se integra numa ou noutra das liberdades de circulação, há que, segundo jurisprudência assente, tomar em consideração o objeto da legislação em causa ( 21 ). Considero que isto também se aplica, por analogia, à qualificação de uma regulamentação nacional à luz das disposições que regem a Associação CEE‑Turquia.

45.

No que diz respeito à regulamentação austríaca em causa no processo principal, considero que esta visa, no essencial, determinar as condições a satisfazer para realizar transportes comerciais internacionais rodoviários de mercadorias para o, através ou a partir do território austríaco ( 22 ). A este respeito, esta legislação prevê, nomeadamente, que esses transportes só podem ser realizados ao abrigo de uma autorização que, para os transportadores turcos, pode assumir a forma de uma autorização emitida no quadro do contingente fixado ao abrigo do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário ou de uma autorização individual para os transportes que revistam um interesse público relevante ( 23 ). Por outras palavras, a regulamentação austríaca em causa impõe restrições ao acesso dos transportadores turcos ao mercado dos transportes internacionais rodoviários de mercadorias.

46.

Não restam dúvidas, na minha opinião, de que tal regulamentação se integra no domínio dos serviços de transporte.

47.

Por um lado, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a liberdade de transportar mercadorias por estrada se integra, na economia geral das disposições do Tratado, no domínio da prestação de serviços em matéria de transportes ( 24 ). Não vejo motivo para não ser assim no âmbito das disposições relativas à Associação CEE‑Turquia.

48.

Por outro lado, há que observar que, anteriormente, os transportes internacionais rodoviários de mercadorias entre Estados‑Membros estavam sujeitos a regimes de autorização similares ao que está a ser atualmente implementado pela regulamentação austríaca em causa para os transportadores turcos. Esses regimes baseavam‑se, em parte, em contingentes bilaterais entre Estados‑Membros e, em parte, em contingentes comunitários ( 25 ).

49.

No acórdão Parlamento/Conselho ( 26 ), o Tribunal de Justiça declarou que o Conselho não tinha cumprido as suas obrigações resultantes do artigo 75.o do Tratado CEE (atual artigo 91.o TFUE), por não ter, nomeadamente, assegurado a livre prestação de serviços em matéria de transportes internacionais. Na sequência desse acórdão, os contingentes bilaterais e comunitários foram progressivamente suprimidos antes de serem substituídos, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 1993, pelo sistema da licença comunitária não contingentada, atualmente em vigor ( 27 ). Os atos relativos ao contingente comunitário e à licença comunitária foram adotados a título das disposições do Tratado relativas à política comum de transportes ( 28 ).

50.

Esta evolução legislativa e judiciária relativa aos transportes internacionais entre Estados‑Membros confirma, a meu ver, a conclusão de que uma regulamentação nacional como a que está em causa, que prevê um regime de autorização em matéria de transportes internacionais rodoviários, deve ser qualificada de medida no domínio dos serviços de transporte.

51.

Neste contexto, considero que o Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça no processo Lambregts Transportbedrijf ( 29 ) merece especial atenção. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 75.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Tratado CEE [atual artigo 91.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Tratado FUE], relativo à execução, pelo Conselho, da política comum de transportes, não confere aos nacionais dos Estados‑Membros direitos que estes possam invocar perante os órgãos jurisdicionais nacionais contra decisões tomadas pelas administrações nacionais em 1982. Por outras palavras, o Tribunal de Justiça considerou que esta disposição não tem um efeito direto que lhe permita ser invocada por um transportador estabelecido num Estado‑Membro, para contestar uma decisão administrativa nacional relativa às autorizações de transporte nacional e internacional.

52.

A este respeito, no n.o 14 do acórdão, o Tribunal de Justiça constatou que, «em 1982, a livre circulação de serviços no domínio dos transportes internacionais só estava […] garantida no interior bem como a partir ou com destino ao Estado‑Membro em que a empresa estivesse estabelecida e sob reserva da obtenção de uma autorização de transporte, em conformidade com os contingentes bilaterais ou comunitários em vigor nesse Estado‑Membro» ( 30 ). O Tribunal de Justiça considerou, assim, que, na falta de aplicação, pelo Conselho, do princípio da livre circulação de serviços no domínio do transporte internacional e nacional, em conformidade com as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 75.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Tratado CEE, esses serviços só podiam ser realizados dentro dos limites dos contingentes bilaterais e comunitários. Neste contexto, o Tribunal de Justiça não avaliou o possível impacto destes contingentes na livre circulação de mercadorias.

53.

Considero que o mesmo raciocínio se aplica, por maioria de razão, aos transportes internacionais efetuados por transportadores turcos no âmbito da Associação CEE‑Turquia. A este respeito, importa ter em conta que, enquanto o artigo 75.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Tratado CEE previa a obrigação de o Conselho estabelecer uma política comum de transportes ( 31 ), resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a extensão à Turquia das disposições do Tratado em matéria de transportes é meramente facultativa ( 32 ). Neste contexto, o Tribunal de Justiça declarou que o Conselho de Associação «beneficia de uma margem de apreciação consideravelmente mais ampla em matéria de transportes» ( 33 ). Assim, considero que, se o Tribunal de Justiça não aplicou o artigo 30.o do Tratado CEE (atual artigo 34.o do Tratado FUE) no processo Lambregts Transportbedrijf ( 34 ), não há que, por maioria de razão, aplicar o artigo 5.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação no presente processo.

54.

Daqui decorre, na minha opinião, que, enquanto o Conselho de Associação não tiver adotado regras relativas aos transportes, em conformidade com o artigo 15.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia e o artigo 42.o do Protocolo Adicional ( 35 ), o acesso dos transportadores turcos ao mercado dos transportes internacionais continua sujeito às condições estabelecidas pelas regulamentações nacionais dos Estados‑Membros e pelos acordos bilaterais celebrados entre os Estados‑Membros e a República da Turquia ( 36 ). Neste contexto, o número de autorizações de transporte atribuídas aos transportadores turcos depende, designadamente, das negociações efetuadas, no âmbito desses acordos, entre os Estados em causa. Gostaria de assinalar que a maioria dos Estados‑Membros criou, com base nos acordos bilaterais celebrados com a República da Turquia, regimes de autorização de transporte que apresentam semelhanças com o que está em causa no processo principal ( 37 ).

55.

A decisão de proceder à liberalização do setor dos serviços de transporte, no âmbito da Associação CEE‑Turquia, compete apenas às partes contratantes, se o considerarem oportuno, após uma análise aprofundada das implicações concretas que esta operação é suscetível de ter, à luz, designadamente, das condições de concorrência no mercado dos transportes internacionais. Neste contexto, a liberalização progressiva dos transportes internacionais entre os Estados‑Membros demonstra a necessidade de fazer acompanhar essa liberalização do estabelecimento de regras comuns, nomeadamente, em matéria de transportes ( 38 ).

56.

Nestas condições, considero que a aplicação, pelo Tribunal de Justiça, das disposições relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal poderia resultar na liberalização, até então não pretendida pelas partes contratantes, do Acordo de Associação CEE‑Turquia, do domínio dos transportes internacionais ( 39 ).

57.

À luz das considerações precedentes, concluo que uma regulamentação como a que está em causa no processo principal se integra no domínio dos serviços de transportes e que as disposições previstas na Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia, não são aplicáveis a esta regulamentação.

58.

Esta conclusão não é suscetível de ser posta em causa pelos argumentos invocados por CX sobre a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à livre circulação de mercadorias. Abordarei esses argumentos em seguida.

2. Argumentos invocados em sentido contrário

59.

Em apoio da sua tese segundo a qual as disposições relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia são aplicáveis a uma regulamentação como a que está em causa, CX invoca vários acórdãos do Tribunal de Justiça relativos a essa liberdade.

60.

Em primeiro lugar, CX baseia‑se no acórdão proferido no processo Istanbul Lojistik ( 40 ). Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que constitui um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro, na aceção do artigo 4.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, um imposto sobre os veículos automóveis que deve ser pago pelos detentores dos veículos pesados matriculados na Turquia que transitam pelo território húngaro ( 41 ).

61.

Segundo CX, se o imposto húngaro de trânsito constitui um entrave à livre circulação de mercadorias, o mesmo se deve dizer da regulamentação austríaca em causa, uma vez que o regime de contingentação dos transportes previsto nessa legislação representa um ato lesivo mais grave da livre circulação de mercadorias do que um imposto de trânsito.

62.

Em minha opinião, esse argumento não procede.

63.

Na minha opinião, a regulamentação austríaca em causa não é equiparável à que estava em causa no processo Istanbul Lojistik. Por um lado, as duas regulamentações distinguem‑se pela sua natureza. No processo Istanbul Lojistik, tratava‑se de uma medida fiscal (um imposto), ao passo que o presente processo diz respeito a uma medida de contingentação.

64.

Por outro lado, também se distinguem pelo seu objeto. Com efeito, no processo Istanbul Lojistik, o Tribunal de Justiça considerou que, «embora o imposto de circulação sobre veículos a motor não seja cobrado sobre os produtos enquanto tais, onera as mercadorias transportadas por veículos com matrícula num país terceiro, nomeadamente a Turquia, por ocasião da sua passagem pela fronteira húngara, e não, […], o serviço de transporte» ( 42 ). Em contrapartida, a regulamentação austríaca em causa no presente processo visa, precisamente, como já referi, determinar as condições a cumprir para a realização de serviços de transporte ( 43 ). Esclareço que, no processo Istanbul Lojistik, o Tribunal de Justiça se limitou a examinar o imposto enquanto tal e não procedeu a nenhum exame do regime de contingentação a que esse imposto estava ligado ( 44 ).

65.

Em segundo lugar, CX invoca uma série de acórdãos nos quais o Tribunal de Justiça reconheceu a ligação entre a atividade de transporte de mercadorias e a livre circulação de mercadorias no seio da União. Nos acórdãos em causa, o Tribunal de Justiça declarou que constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa na aceção do artigo 34.o TFUE, nomeadamente, uma proibição incidente sobre camiões com mais de 7,5 toneladas, que transportem certo tipo de mercadorias, de circular num troço de autoestrada que constitui uma das principais vias de comunicação terrestres na região em causa ( 45 ), e uma regulamentação que impõe durações e distâncias máximas pequenas de transporte de animais vivos destinados a abate ( 46 ).

66.

Segundo CX, resulta desta jurisprudência que uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, embora esteja tecnicamente ligada ao transporte de mercadorias, restringe necessariamente a circulação de mercadorias ao só permitir o livre trânsito a um número restrito de transportadores e ao orientar assim os fluxos comerciais para outros itinerários alternativos ou em meios de transporte que impliquem um acréscimo de tempo e custos ( 47 ).

67.

Este argumento não pode proceder.

68.

Com efeito, há que constatar que a jurisprudência invocada por CX respeitava a regulamentações nacionais com natureza muito diferente da regulamentação austríaca em causa no presente processo.

69.

Por um lado, as regulamentações em apreço referiam‑se não às condições a satisfazer com vista à realização de serviços de transporte (condições de acesso ao mercado dos transportes), como no presente caso, mas sim às condições em que podem ser transportadas certas mercadorias (condições de transporte das mercadorias) ( 48 ). A este respeito, o Tribunal de Justiça considerou que as condições impostas relativas ao meio de transporte, à duração e à distância de transporte eram suscetíveis de restringir a livre circulação das mercadorias em causa ( 49 ).

70.

Por outro lado, contrariamente à regulamentação austríaca em causa, as regulamentações a que a jurisprudência invocada por CX diz respeito não visavam alguns transportadores, mas aplicavam‑se, de maneira geral, a qualquer transporte de mercadorias abrangido pelo seu âmbito de aplicação. Foi nesta ótica que o Tribunal de Justiça considerou que as condições de transporte impostas eram suscetíveis de entravar a livre circulação das mercadorias em causa e, em especial, o seu livre trânsito ( 50 ).

71.

Ora, há que observar que a regulamentação austríaca em causa no processo principal não impõe restrições às condições de transporte das mercadorias provenientes da Turquia. Com efeito, por força desta regulamentação, as mercadorias podem circular livremente por estrada para o, através ou com partida do território austríaco. Apenas está limitada a possibilidade de os transportadores turcos transportarem essas mercadorias. Por outras palavras, as mercadorias turcas podem circular livremente na Áustria, mas não necessariamente em camiões turcos. Acresce que esta regulamentação não visa as mercadorias provenientes da Turquia, visto que também se aplica aos transportes, por transportadores turcos, de mercadorias provenientes dos Estados‑Membros, incluindo da Áustria.

72.

Daqui resulta, em minha opinião, que, mesmo admitindo que a regulamentação austríaca em causa esteja abrangida pelas disposições relativas à livre circulação de mercadorias, esta regulamentação não é incompatível com o princípio geral da liberdade de trânsito de mercadorias no interior da União, reconhecido pelo Tribunal de Justiça como consequência dessa liberdade ( 51 ).

73.

Em conclusão, considero que os argumentos invocados por CX não são suscetíveis de pôr em causa a qualificação da regulamentação austríaca visada enquanto medida abrangida pelo domínio dos serviços de transporte. Daqui resulta que as disposições previstas na Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação relativas à livre circulação de mercadorias entre a União e a Turquia não são aplicáveis a tal regulamentação.

74.

Essa regulamentação deve, contudo, respeitar a cláusula de standstill, enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional ( 52 ). Esta questão será analisada na secção que se segue.

3. Quanto à cláusula de standstill enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional

75.

O artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional prevê uma cláusula de standstill, nos termos da qual as partes contratantes abster‑se‑ão de introduzir, nas suas relações mútuas, novas restrições, nomeadamente, à livre prestação de serviços. Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a referida cláusula é suscetível de se aplicar aos serviços de transporte e pode ser invocada por uma empresa estabelecida na Turquia que efetua legalmente prestações de serviços num Estado‑Membro ( 53 ).

76.

A cláusula de standstill proíbe genericamente a introdução de qualquer nova medida que tenha por objeto ou por efeito submeter o exercício, por um nacional turco, nomeadamente, da liberdade de prestação de serviços no território de um Estado‑Membro a condições mais restritivas do que as que lhe eram aplicáveis à data da entrada em vigor do Protocolo Adicional em relação a esse Estado‑Membro ( 54 ). Para determinar se a referida cláusula se opõe a uma regulamentação nacional como a que está em causa, importa, portanto, analisar se esta contém uma restrição à livre prestação de serviços e, em caso afirmativo, se essa restrição deve ser considerada como sendo nova ( 55 ).

77.

No que respeita, em primeiro lugar, à questão de saber se a regulamentação em causa no processo principal comporta uma restrição à livre prestação de serviços, considero que esta questão exige uma resposta afirmativa. Recordo, a este respeito, que, em conformidade com jurisprudência constante, uma regulamentação nacional que subordina o exercício de prestações de serviços no território nacional, por uma empresa estabelecida noutro Estado‑Membro, à emissão de uma autorização administrativa constitui uma restrição ao princípio fundamental consagrado no artigo 56.o TFUE ( 56 ).

78.

No que respeita, em segundo lugar, à questão de saber se a regulamentação em causa constitui uma restrição nova, há que determinar se essa regulamentação tem caráter de novidade, no sentido de que tem por consequência agravar a situação dos transportadores turcos relativamente à que resultava das regras que lhes eram aplicáveis na Áustria à data de entrada em vigor do Protocolo Adicional em relação a esse Estado‑Membro ( 57 ).

79.

A este respeito, o Governo austríaco refere que o regime de contingentação previsto no Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário já vigorava no momento da entrada em vigor do Protocolo Adicional relativamente à República da Áustria, por ocasião da sua adesão à União em 1 de janeiro de 1995 ( 58 ).

80.

Sem prejuízo da verificação deste aspeto, que compete ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, afigura‑se, portanto, que a regulamentação austríaca em causa não contém uma nova restrição à livre prestação de serviços na aceção do artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional ( 59 ).

4. Quanto ao princípio da não discriminação em razão da nacionalidade à luz do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia

81.

CX considera que a regulamentação austríaca em causa conduz a uma discriminação dos transportadores turcos, em violação do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia, que proíbe toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade no âmbito da aplicação do referido acordo, uma vez que as restrições associadas ao regime de contingentação dos transportes não valem para os operadores estabelecidos na União ( 60 ).

82.

À semelhança dos Governos austríaco e húngaro e da Comissão, considero que o artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia não se opõe a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, isto pelas seguintes razões.

83.

Em primeiro lugar, considero que o artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia não se aplica a tal regulamentação. Com efeito, esta disposição estatui que se aplica «sem prejuízo das disposições especiais suscetíveis de serem adotadas em aplicação do artigo 8.o» do dito acordo ( 61 ). Embora, no estado atual de desenvolvimento da Associação CEE‑Turquia, não haja regras específicas em matéria de transportes ( 62 ), não é de excluir que tais regras possam ser adotadas pelo Conselho de Associação ao abrigo do artigo 15.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia e do artigo 42.o do Protocolo Adicional. Como a Comissão salienta com razão, o facto de se aplicar o artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal anteciparia, portanto, o conteúdo de uma eventual regulamentação em matéria de transportes.

84.

Em segundo lugar, mesmo admitindo que o artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia seja aplicável a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal, considero que essa regulamentação não conduz a uma discriminação na aceção desta disposição.

85.

A este respeito, há que observar que a regulamentação austríaca em causa não estabelece nenhuma distinção em função do local de estabelecimento do transportador ( 63 ). O tratamento diferenciado invocado por CX, consoante o transportador esteja ou não estabelecido num Estado‑Membro, é apenas a consequência dos diferentes quadros regulamentares aplicáveis aos transportadores estabelecidos na União, por um lado, e aos transportadores estabelecidos na Turquia, por outro. Enquanto os primeiros estão sujeitos às regras comuns relativas aos transportes internacionais, nomeadamente as estabelecidas no Regulamento n.o 1072/2009, os últimos não estão sujeitos a essas regras.

86.

Daqui resulta que apenas os transportadores estabelecidos na União têm a possibilidade de utilizar uma licença comunitária emitida nos termos do Regulamento n.o 1072/2009, a qual constitui uma das formas de autorização que satisfazem as exigências da regulamentação austríaca em causa. Para os transportadores turcos cuja atividade não esteja abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 1072/2009, essa possibilidade não existe e, por conseguinte, esses transportadores são obrigados a recorrer a outras formas de autorização para cumprir os requisitos da regulamentação austríaca em causa ( 64 ). Esta diferença, que é devida às disparidades entre as regras aplicáveis aos transportadores da União e aos transportadores turcos, não pode ser eliminada através do artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia. Por outras palavras, considero que esta disposição não pode ser invocada para obter uma liberalização do domínio dos transportes internacionais, até então não pretendida pelas partes contratantes do Acordo de Associação CEE‑Turquia ( 65 ).

87.

Nesta base, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 9.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia não se opõe a uma regulamentação como a que está em causa no processo principal.

V. Conclusão

88.

À luz das considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda da seguinte forma à questão prejudicial colocada pelo Verwaltungsgerichtshof (Supremo Tribunal Administrativo, Áustria):

O Acordo que cria uma Associação entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia, assinado em Ancara, em 12 de setembro de 1963, pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados‑Membros da CEE e a Comunidade, por outro, concluído, aprovado e confirmado, em nome desta última, pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de dezembro de 1963, o Protocolo Adicional assinado em 23 de novembro de 1970, em Bruxelas, e concluído, aprovado e confirmado, em nome da Comunidade, pelo Regulamento (CEE) n.o 2760/72 do Conselho, de 19 de dezembro de 1972, e a Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação CE‑Turquia, de 22 de dezembro de 1995, relativa à execução da fase final da união aduaneira, não se opõem a uma regulamentação nacional como a que está em causa no processo principal, por força da qual as empresas de transporte de mercadorias com sede na Turquia só podem efetuar o transporte comercial internacional de mercadorias por meio de veículos a motor com destino a ou através do território da Áustria se dispuserem, para os veículos a motor, de documentos que são emitidos no quadro de um contingente fixado no âmbito de um acordo bilateral entre a República da Áustria e a República da Turquia ou de uma autorização emitida para um transporte específico de mercadorias, entendendo‑se que este deve apresentar um interesse público relevante e que cabe ao requerente fazer prova bastante de que o transporte não pode ser evitado através de medidas logísticas nem optando por um meio de transporte alternativo, desde que o órgão jurisdicional de reenvio se tenha certificado de que essa regulamentação não contém uma nova restrição à livre prestação de serviços na aceção do artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) Abkommens zwischen dem Bundesminister für Handel, Gewerbe und Industrie der Republik Österreich und dem Außenminister der Türkischen Republik über den internationalen Straßenverkehr (Acordo entre o Ministro Federal do Comércio, do Artesanato e da Indústria da República da Áustria e o Ministro dos Negócios Estrangeiros da República da Turquia sobre o transporte internacional rodoviário) (BGBl. 274/1970, na versão do BGBl. 327/1976).

( 3 ) Acordo assinado em Ancara, em 12 de setembro de 1963, pela República da Turquia, por um lado, e pelos Estados‑Membros da CEE e a Comunidade, por outro, concluído, aprovado e confirmado, em nome desta última, pela Decisão 64/732/CEE do Conselho, de 23 de dezembro de 1963 (JO 1964, 217, p. 3685; EE 11 F1 p. 18).

( 4 ) Protocolo assinado em Bruxelas, em 23 de novembro de 1970, concluído, aprovado e confirmado, em nome da Comunidade, pelo Regulamento (CEE) n.o 2760/72 do Conselho, de 19 de dezembro de 1972 (JO 1972, L 293, p. 3; EE 11 F1 p. 213).

( 5 ) Decisão de 22 de dezembro de 1995, relativa à execução da fase final da união aduaneira (JO 1996, L 35, p. 1).

( 6 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece regras comuns para o acesso ao mercado do transporte internacional rodoviário de mercadorias (JO 2009, L 300, p. 72).

( 7 ) Este regulamento é aplicável apenas aos veículos de transporte matriculados num Estado‑Membro da União. V. artigo 1.o, n.o 1, e artigo 2.o, n.os 1 e 2, alínea a), do referido regulamento, bem como as minhas Conclusões no processo Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:282, n.o 100). V., além disso, o § 7, n.o 1, ponto 1, da GütbefG.

( 8 ) V. artigo 7.o, n.o 1, do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário e § 8, n.os 3 e 4, da GütbefG.

( 9 ) O Governo austríaco refere que as últimas negociações relativas ao contingente tiveram lugar em 2014 e que, desde então, as autoridades turcas não abordaram as autoridades austríacas com vista a obter uma adaptação do contingente. O Governo austríaco explica, além disso, que cada autorização inclui dois trajetos de transporte e que o contingente de autorizações é feito através de uma comissão mista com base nas estatísticas económicas.

( 10 ) O Governo austríaco explica que, para três trajetos de transporte combinado rodoferroviário, os transportadores turcos recebem duas autorizações a título de recompensa.

( 11 ) No que se refere ao regime CEMT, v. Relatório n.o 85830‑TR do Banco Mundial, de 28 de março de 2014, Evaluation of the EU‑Turkey Customs Union, n.o 107, e relatório final da ICF Consulting Ltd, de 14 de outubro de 2014, Study on the economic impact on an agreement between the EU and the Republic of Turkey, elaborado por iniciativa da Comissão, pp. 13 e 14. Este último faz referência a 4258 licenças concedidas aos transportadores turcos no ano de 2014 (para transportes entre ou através de países membros da CEMT). Nos termos do § 7, n.o 1, ponto 2, da GütbefG, uma autorização CEMT preenche o requisito da autorização.

( 12 ) O Governo austríaco indica que, em 2015 e 2016, não houve pedidos de autorizações individuais, ao abrigo do § 7, n.o 1, ponto 3, e do § 8, n.o 1, da GütbefG.

( 13 ) Resulta da decisão de reenvio que se trata de um transporte combinado em que o semirreboque é transportado por caminho de ferro.

( 14 ) Segundo CX, o tempo de espera no terminal de transporte combinado rodoferroviário de Maribor atinge frequentemente 97 a 107 horas, num troço de 260 km. V., a este respeito, Relatório n.o 85830‑TR do Banco Mundial, supramencionado, p. 54, que refere custos suplementares de 250 euros por camião, por trânsito, e o dobro do tempo de transporte.

( 15 ) A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio faz referência a uma decisão proferida pelo Bundesverwaltungsgericht (Tribunal Administrativo Federal, Alemanha), em 30 de junho de 2011 (BVerwG, Urt. v. 30.6.2011 ‑ 3 C 18/10, NVwZ 2012, 247).

( 16 ) O Acordo de Associação CEE‑Turquia, o Protocolo Adicional e a Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação fazem parte integrante da ordem jurídica da União. V., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 1990, Sevince (C‑192/89, EU:C:1990:322, n.os 8 e 9 e jurisprudência referida).

( 17 ) V., nomeadamente, artigos 10.o, 14.o e 15.o do Acordo de Associação CEE‑Turquia, artigos 2.o a 30.o, 41.o e 42.o do Protocolo Adicional e os artigos 2.o a 7.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação.

( 18 ) Nos termos do seu artigo 2.o, n.o 1, o Acordo de Associação CEE‑Turquia tem por objeto promover o reforço contínuo e equilibrado das relações comerciais e económicas entre a Comunidade Económica Europeia, por um lado, e a Turquia, por outro. A este respeito, o n.o 2 do referido artigo prevê o estabelecimento progressivo de uma união aduaneira em fases sucessivas. A Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação fixa, como resulta do seu artigo 1.o, as regras de execução da fase final da união aduaneira entre a Comunidade Económica Europeia e a Turquia resultante do Acordo de Associação CEE‑Turquia.

( 19 ) No que respeita à cláusula de standstill, enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional, v. n.os 75 a 80 das presentes conclusões.

( 20 ) V., neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑369/01, EU:C:2003:572, n.o 98). No que se refere ao domínio dos serviços, o Conselho de Associação adotou, com base no artigo 41.o, n.o 2, do Protocolo Adicional, a Decisão n.o 2/2000, de 11 de abril de 2000, sobre o início das negociações com vista à liberalização dos serviços e à abertura recíproca dos mercados públicos entre a Comunidade e a Turquia (JO 2000, L 138, p. 27). No entanto, até à data, o Conselho de Associação não realizou uma liberalização substancial neste domínio. V. Acórdão de 24 de setembro de 2013, Demirkan (C‑221/11, EU:C:2013:583, n.os 13 e 46).

( 21 ) V. Acórdão de 7 de setembro de 2017, Eqiom e Enka (C‑6/16, EU:C:2017:641, n.o 40 e jurisprudência referida). A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, quando uma medida nacional está relacionada tanto com a livre circulação de mercadorias como com a livre prestação de serviços, o Tribunal aprecia, em princípio, à luz de apenas uma destas duas liberdades fundamentais se se revela que uma é completamente secundária da outra e que lhe pode ser subordinada. V. Acórdão de 4 de outubro de 2011, Football Association Premier League e o. (C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:631, n.o 78 e jurisprudência referida).

( 22 ) Esta análise não pode ser afetada pela circunstância de que, nos termos do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário, os trajetos em vazio estão isentos do regime de contingentação. V. n.o 21 das presentes conclusões.

( 23 ) V. § 7, n.o 1, e § 8, n.os 1, 3 e 4, da GütbefG, bem como o artigo 4.o, n.o 1, e o artigo 7.o do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário. V., igualmente, n.os 30 a 32 das presentes conclusões.

( 24 ) Acórdão de 11 de junho de 1987, Bodin e Minguet & Thomas (241/86, EU:C:1987:280, n.o 6). No n.o 13 desse acórdão, o Tribunal de Justiça declarou que a aplicação de uma legislação nacional relativa à altura máxima dos veículos que é conforme com os valores‑limite fixados por uma diretiva comunitária não pode ser considerada uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa na aceção do artigo 30.o do Tratado CEE (atual artigo 34.o TFUE).

( 25 ) V. Regulamento (CEE) n.o 1018/68 do Conselho, de 19 de julho de 1968, relativo à constituição de um contingente comunitário para os transportes rodoviários de mercadorias efetuados entre Estados‑Membros (JO 1968, L 175, p. 13). A este regulamento seguiu‑se o Regulamento (CEE) n.o 2829/72 do Conselho, de 28 de dezembro de 1972, relativo ao contingente comunitário para os transportes rodoviários de mercadorias efetuados entre Estados‑Membros (JO 1972, L 298, p. 16), que foi prorrogado e alterado pelo Regulamento (CEE) n.o 3256/74 do Conselho, de 19 de dezembro de 1974 (JO 1974, L 349, p. 5), por sua vez, prorrogado pelo Regulamento (CEE) n.o 3331/75 do Conselho, de 18 de dezembro de 1975 (JO 1975, L 329, p. 9), e revogado, em definitivo, pelo Regulamento (CEE) n.o 3164/76 do Conselho, de 16 de dezembro de 1976, relativo ao contingente comunitário para os transportes rodoviários de mercadorias efetuados entre Estados‑Membros (JO 1976, L 357, p. 1; EE 07 F2 p. 42).

( 26 ) Acórdão de 22 de maio de 1985 (13/83, EU:C:1985:220).

( 27 ) V. Regulamento (CEE) n.o 1841/88 do Conselho, de 21 de junho de 1988, que altera o Regulamento n.o 3164/76 (JO 1988, L 163, p. 1), que previa um aumento do contingente comunitário durante um período transitório e a abolição, a partir de 1 de janeiro de 1993, dos contingentes comunitários, dos contingentes bilaterais entre Estados‑Membros e dos contingentes aplicáveis aos transportes em trânsito com destino a e provenientes de países terceiros, para os transportadores comunitários. V., além disso, o Regulamento (CEE) n.o 881/92 do Conselho, de 26 de março de 1992, relativo ao acesso ao mercado dos transportes rodoviários de mercadorias na Comunidade, efetuados a partir do ou com destino ao território de um Estado‑Membro, ou que atravessem o território de um ou vários Estados‑Membros (JO 1992, L 95, p. 1). Este regulamento foi revogado e substituído pelo Regulamento n.o 1072/2009.

( 28 ) Em especial, o artigo 75.o do Tratado CEE e o artigo 71.o do Tratado CE (atual artigo 91.o TFUE).

( 29 ) Acórdão de 13 de julho de 1989 (4/88, EU:C:1989:320).

( 30 ) O sublinhado é meu.

( 31 ) V., a este respeito, Acórdão de 22 de maio de 1985, Parlamento/Conselho (13/83, EU:C:1985:220, n.o 50).

( 32 ) A este respeito, o Tribunal de Justiça refere que foi utilizada a forma verbal «pode», no artigo 42.o do Protocolo Adicional. V. Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑396/01, EU:C:2003:572, n.o 97).

( 33 ) V. Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑396/01, EU:C:2003:572, n.o 96).

( 34 ) Acórdão de 13 de julho de 1989 (4/88, EU:C:1989:320).

( 35 ) V. n.os 42 e 43 das presentes conclusões.

( 36 ) V., no entanto, no que respeita à cláusula de standstill, enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional, n.os 75 a 80 das presentes conclusões.

( 37 ) Para uma lista dos acordos bilaterais celebrados entre os Estados‑Membros e a República da Turquia e os contingentes fixados ao abrigo desses acordos, v. anexo 14 do Relatório n.o 85830‑TR do Banco Mundial, supramencionado, e anexo C do relatório final da ICF Consulting Ltd, supramencionado. No que diz respeito às diferenças entre os regimes dos Estados‑Membros, v. pp. 8 a 13 do último desses relatórios. Acrescento que o Regulamento n.o 1072/2009 faz expressamente referência à existência dos acordos bilaterais relativos aos transportes entre os Estados‑Membros e países terceiros. V. considerando 3 e artigo 1.o, n.o 3, alínea a), do referido regulamento.

( 38 ) A este respeito, gostaria de salientar, a título de exemplo, que o Acordo entre a União Europeia e a Confederação Suíça no domínio dos transportes visa, por um lado, liberalizar o acesso das partes contratantes ao seu mercado de transportes rodoviário e ferroviário das mercadorias e passageiros e, por outro lado, determinar as modalidades de uma política coordenada dos transportes. V. artigo 1.o, n.o 1, do Acordo entre a Comunidade Europeia e a Confederação Suíça relativo ao Transporte Ferroviário e Rodoviário de Passageiros e de Mercadorias (JO 2002, L 114, p. 91). V., além disso, Togan, S., e Bayar, G., «Liberalizing Transport Sectors and the Effects of Infrastructure Development», The Liberalization of Transportation Services in the EU and Turkey, Oxford University Press, 2016, p. 239.

( 39 ) A questão de uma eventual liberalização do referido domínio é objeto de diversos estudos. V., designadamente, Relatório n.o 85830‑TR do Banco Mundial, supramencionado, n.os 99 a 113, e relatório final da ICF Consulting Ltd, supramencionado, pp. 36 e segs. Este último invoca um aumento do valor do comércio CEE‑Turquia de, aproximadamente, 3,5 mil milhões de euros em caso de plena liberalização dos transportes internacionais entre a União e a Turquia.

( 40 ) Acórdão de 19 de outubro de 2017 (C‑65/16, EU:C:2017:770).

( 41 ) A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, referindo‑se, nomeadamente, ao artigo 66.o da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, que a interpretação das disposições do Tratado FUE relativas à livre circulação de mercadorias na União é transponível para as disposições relativas à livre circulação de mercadorias na união aduaneira resultante do Acordo CEE‑Turquia. Nos termos deste artigo, as disposições da Decisão n.o 1/95 do Conselho de Associação, na medida em que sejam idênticas, quanto ao conteúdo, às normas correspondentes do Tratado CE, atual TFUE, devem ser interpretadas em conformidade com as decisões do Tribunal de Justiça na matéria. V. Acórdão de 19 de outubro de 2017, Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:770, n.os 38 e 44).

( 42 ) O sublinhado é meu. V. Acórdão de 19 de outubro de 2017, Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:770, n.o 46). A este respeito, o Tribunal de Justiça assinalou que o imposto húngaro em causa devia ser pago no momento da entrada dos veículos pesados no território húngaro e que o montante deste imposto dependia de critérios ligados, nomeadamente, à quantidade de mercadorias que podiam ser transportadas e ao fim a que se destinavam. V. n.o 45 do referido acórdão. V., também, as minhas Conclusões no processo Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:282, n.o 59).

( 43 ) V. n.o 45 das presentes conclusões.

( 44 ) O mesmo é válido para as minhas Conclusões no processo Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:282). V., nomeadamente, n.os 49, 52 e 69 dessas conclusões.

( 45 ) Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Áustria (C‑320/03, EU:C:2005:684), e de 21 de dezembro de 2011, Comissão/Áustria (C‑28/09, EU:C:2011:854).

( 46 ) Acórdão de 11 de maio de 1999, Monsees (C‑350/97, EU:C:1999:242). CX invoca, além disso, o Acórdão de 9 de dezembro de 1997, Comissão/França (C‑265/95, EU:C:1997:595), relativo a atos de violência cometidos no território francês contra produtos agrícolas originários de outros Estados‑Membros; Acórdão de 12 de junho de 2003, Schmidberger (C‑112/00, EU:C:2003:333), relativo a um encerramento completo da autoestrada de Brenner durante cerca de 30 horas; e o Acórdão de 23 de outubro de 2003, Rioglass e Transremar (C‑115/02, EU:C:2003:587), em que uma medida de retenção aduaneira atrasava a circulação das mercadorias e podia levar a que ficassem completamente bloqueadas.

( 47 ) V., igualmente, n.o 34 das presentes conclusões.

( 48 ) V., no que se refere ao objeto da regulamentação austríaca em causa, o n.o 45 das presentes conclusões.

( 49 ) V., a este respeito, Acórdão de 21 de dezembro de 2011, Comissão/Áustria (C‑28/09, EU:C:2011:854, n.o 114), em que o Tribunal de Justiça afirmou que a proibição de os veículos pesados de mais de 7,5 toneladas, que transportem certo tipo de mercadorias, circularem num troço da autoestrada A 12 obstava «à utilização de um meio de transporte para estes produtos, neste corredor de tráfego transalpino».

( 50 ) V., nomeadamente, Acórdão de 15 de novembro de 2005, Comissão/Áustria (C‑320/03, EU:C:2005:684, n.o 66), do qual resulta que, «ao proibir a circulação de veículos pesados com peso bruto superior a 7,5 toneladas que transportem determinadas categorias de mercadorias num troço rodoviário de primeira importância, que constitui uma das principais vias de comunicação terrestres entre o sul da Alemanha e o norte da Itália, o regulamento controvertido coloca um entrave à livre circulação de mercadorias e, em especial, ao seu livre trânsito». V., igualmente, neste sentido, Acórdão de 21 de dezembro de 2011, Comissão/Áustria (C‑28/09, EU:C:2011:854, n.o 116). V., ainda, o Acórdão de 11 de maio de 1999, Monsees (C‑350/97, EU:C:1999:242, n.o 23). Os Acórdãos de 9 de dezembro de 1997, Comissão/França (C‑265/95, EU:C:1997:595), de 12 de junho de 2003, Schmidberger (C‑112/00, EU:C:2003:333), e de 23 de outubro de 2003, Rioglass e Transremar (C‑115/02, EU:C:2003:587), diziam respeito a situações que implicavam a imobilização completa das mercadorias em causa.

( 51 ) V. Acórdão de 21 de dezembro de 2011, Comissão/Áustria (C‑28/09, EU:C:2011:854, n.o 113 e jurisprudência referida). O princípio geral da liberdade de trânsito aplica‑se igualmente no âmbito da Associação CEE‑Turquia. V., neste sentido, Acórdão de 19 de outubro de 2017, Istanbul Lojistik (C‑65/16, EU:C:2017:770, n.os 42 e 44).

( 52 ) O órgão jurisdicional de reenvio não se interroga expressamente sobre a cláusula de standstill, enunciada no artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional, mas questiona o Tribunal de Justiça, de maneira geral, sobre a compatibilidade da regulamentação em causa com o referido protocolo. Recordo, a este respeito, que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, mesmo que, no plano formal, o órgão jurisdicional de reenvio tenha limitado as suas questões à interpretação de certas disposições do direito da União, tal circunstância não obsta a que o Tribunal de Justiça lhe forneça todos os elementos de interpretação do direito da União que possam ser úteis para a decisão do processo que lhe foi submetido, independentemente de esse órgão jurisdicional lhes ter feito ou não referência no enunciado das suas questões. A este respeito, compete ao Tribunal de Justiça extrair do conjunto dos elementos fornecidos pelo órgão jurisdicional nacional, e nomeadamente da fundamentação da decisão de reenvio, os elementos do direito da União que exigem interpretação tendo em conta o objeto do litígio. V. Acórdão de 19 de outubro de 2017, Otero Ramos (C‑531/15, EU:C:2017:789, n.o 40).

( 53 ) V., neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑369/01, EU:C:2003:572, n.os 92, 93, 102 e 105). Segundo jurisprudência constante, o artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional tem efeito direto. Consequentemente, esta disposição pode ser invocada nos órgãos jurisdicionais dos Estados‑Membros pelos nacionais turcos a quem se aplica. V. Acórdão de 24 de setembro de 2013, Demirkan (C‑221/11, EU:C:2013:583, n.o 38 e jurisprudência referida).

( 54 ) V. Acórdão de 24 de setembro de 2013, Demirkan (C‑221/11, EU:C:2013:583, n.o 39 e jurisprudência referida).

( 55 ) V. Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑369/01, EU:C:2003:572, n.o 110).

( 56 ) Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑369/01, EU:C:2003:572, n.o 111). Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os princípios admitidos no quadro dos artigos do Tratado relativos à livre prestação de serviços devem ser transpostos, tanto quanto possível, para os nacionais turcos, a fim de eliminar as restrições à livre prestação de serviços entre as partes contratantes. V. Acórdão de 24 de setembro de 2013, Demirkan (C‑221/11, EU:C:2013:583, n.o 43 e jurisprudência referida).

( 57 ) V., neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 2003, Abatay e o. (C‑317/01 e C‑396/01, EU:C:2003:572, n.o 116).

( 58 ) A título subsidiário, o Governo austríaco alega que a regulamentação em causa é, em todo o caso, justificada por uma razão imperiosa de interesse geral, nomeadamente pelos interesses da economia e pela proteção da população e do ambiente. Segundo a Comissão, nenhum elemento sugere uma incompatibilidade da regulamentação em causa com a cláusula de standstill. CX e o Governo húngaro não se pronunciaram sobre a questão da conformidade da legislação em causa com a cláusula de standstill.

( 59 ) Acrescento que, em meu entender, a adaptação contínua da dimensão do contingente fixado para os transportadores turcos a título do Acordo Áustria‑Turquia sobre Transporte Rodoviário não pode ser considerada uma nova restrição na aceção do artigo 41.o, n.o 1, do Protocolo Adicional. A este respeito, recordo que o número de autorizações é determinado em negociações bilaterais entre os Estados em causa, tendo em conta, nomeadamente, interesses económicos e o volume de tráfego internacional. V. n.o 54 das presentes conclusões e § 8, n.o 3, da GütbefG.

( 60 ) V. n.o 34 das presentes conclusões.

( 61 ) O sublinhado é meu.

( 62 ) V. n.o 43 das presentes conclusões.

( 63 ) V. n.os 15 a 20 das presentes conclusões.

( 64 ) V. n.os 30 a 32 das presentes conclusões.

( 65 ) V., igualmente, n.o 56 das presentes conclusões.